Zero Hora - 05/10/2013
Pessoas supersticiosas são aquelas que não suportam o vazio de sentido. É
preciso preencher todos os espaços, inclusive e principalmente o do
acaso, com o véu apaziguador da circunstância cósmica inescapável. Um
raio cai a dois metros de distância de alguém, e aquele elemento da
natureza se transforma imediatamente em algum tipo de mensageiro de
sinais ocultos.
Se o raio acerta em cheio e pulveriza o azarado, haverá uma alma
inocente para dizer que era para ser, que ninguém escapa da própria
sorte e coisa e tal. Em 100% dos casos, porém, um raio é apenas um raio –
e podemos nos dar por muito satisfeitos, enquanto espécie, por termos
aprendido uma ou duas coisas que nos ajudam a evitar que eles caiam
sobre nossas cabeças com mais frequência ainda.
O filósofo-cientista-poeta romano Lucrécio, que viveu no século 1
AC, foi um dos primeiros pensadores da nossa era a sacudir o coreto da
superstição que corria solta em sua época. No poema Sobre a Natureza das
Coisas, que ecoa ideias de Epicuro e de outros filósofos gregos,
Lucrécio propõe que a humanidade deixe as superstições para trás e corra
de braços abertos para a lógica, a razão e a ciência. Ou seja: em vez
de ficar acreditando que raios são castigo dos céus, tratar de descobrir
por que caem e como dar no pé quando eles se aproximam.
O delicioso A Virada – O Nascimento do Mundo Moderno, do historiador
americano Stephen Greenblatt, conta as aventuras do caçador de livros
que encontrou os manuscritos de Lucrécio em uma empoeirada prateleira de
um mosteiro na Alemanha, em 1417. O historiador defende a tese de que a
descoberta, mais ou menos acidental, foi decisiva para a história da
humanidade.
Ao afirmar que o universo funciona sem o auxílio de forças
sobrenaturais, o livro de Lucrécio, argumenta Greenblatt, pode ter dado o
impulso que faltava para a Europa sair da trevosa e amedrontada Idade
Média, dando início ao processo histórico que desembocaria na
modernidade e na nova ordem social simbolizada pelo 14 de julho.
Uma das ideias de Lucrécio era exatamente a de que tudo que existe é
fruto de uma “virada”, um pequeno desvio que resulta em algo novo e
revolucionário. Para Greenblatt, o livro de Lucrécio marcou uma dessas
“viradas” – definitiva e luminosa.
Em 1988, um livro de capa verde e amarela veio à luz no Brasil sob a
expectativa de uma virada não menos dramática, ainda que de alcance
mais restrito: encerrar o ciclo de desigualdades, de fato e de direitos,
que marcou os primeiros 500 anos de história do nosso país. As
reportagens sobre os 25 anos da Constituição de 1988, porém, dividiram
espaço nos jornais desta semana com os resultados das investigações
sobre a morte do pedreiro Amarildo, torturado e morto pela polícia do
Rio como se a chamada “Constituição cidadã” nunca tivesse existido – ou
valesse apenas parte do tempo, para apenas parte das pessoas.
Talvez 25 anos seja um tempo muito curto para uma “virada” radical e
definitiva. Talvez a nossa esteja ali na esquina, bem perto, quase ao
alcance dos olhos. Por enquanto, não deixa de ser uma circunstância
cósmica irônica, se não inescapável, que a morte em nada excepcional ou
revolucionária de Amarildo tenha acontecido justamente num 14 de julho.
sábado, 5 de outubro de 2013
A dor dos outros - CACÁ DIEGUES
O GLOBO - 05/10/2013
Devemos prestar atenção à dor dos outros, para tentarmos atenuar a nossa
Semana passada, andei uns dias por Marechal Deodoro, cidade histórica de Alagoas, antiga capital do estado, acompanhando a IV Flimar (Festa Literária de Marechal Deodoro), organizada pelo prefeito Cristiano Matheus e por seu secretário de cultura Carlito Lima, meu amigo de infância. Dias de reencontro com tanta coisa.
Durante a Flimar, redescobri, graças a Ricardo Ramos Filho, seu neto, a extraordinária carta de Graciliano Ramos a Cândido Portinari, publicada em 1946. Um verdadeiro manifesto que, em nossa juventude de esquerda, líamos como amargo chiste do velho Graça, ao qual não tínhamos que dar tanta atenção. E no entanto devíamos ter levado mais a sério o que nosso escritor dizia ao pintor seu amigo, para o bem de sua geração e das gerações de artistas que os sucederam.
“Caríssimo Portinari”, escreve Graciliano, “(...) receio que esta resposta já não o ache fixando na tela a nossa pobre gente da roça. Não há trabalho mais digno, penso eu. Dizem que somos pessimistas e exibimos deformações; contudo as deformações e miséria existem fora da arte e são cultivadas pelos que nos censuram. (...) se elas desaparecessem, poderíamos continuar a trabalhar? Desejamos realmente que elas desapareçam ou seremos também uns exploradores, tão perversos como os outros, quando expomos desgraças? Dos quadros que você mostrou (...), o que mais me comoveu foi aquela mãe com a criança morta. Saí de sua casa com um pensamento horrível: numa sociedade sem classes e sem miséria seria possível fazer-se aquilo? Numa vida tranquila e feliz que espécie de arte surgiria? Chego a pensar que faríamos cromos, anjinhos cor de rosa, e isto me horroriza. Felizmente a dor existirá sempre, a nossa velha amiga, nada a suprimirá. E seríamos ingratos se desejássemos a supressão dela (...).”
Gostaria muito de pensar, e faço sempre um grande esforço para isso, como Bachelard, filósofo francês: “O mundo é belo antes de ser verdadeiro, o mundo é admirado antes de ser verificado.” O que significa que descobrir e se encantar com o que está à nossa volta deve ter primazia sobre ouvir o que se diz sobre o que está à nossa volta. Esse talvez seja o principal conflito da inteligência humana, a disputa eterna entre cultura e conhecimento. Os artistas sofrem com isso.
De que dor e de que mundo devemos falar quando nos deparamos com um desastre como esse de Lampedusa? Mais de 300 imigrantes ilegais, fugindo pelo Mediterrâneo de países africanos em crise, tentam chegar ao sul da Itália e morrem no naufrágio previsível de um barco sem condições de fazer os 350km da viagem, controlado por gerentes da miséria humana que cobravam mais de 1.500 dólares por cada um dos 500 passageiros, número impossível de caber em seus poucos 20 metros de extensão.
Eu sei que isso não é novo, nem raro. Eu sei que já aconteceu com albaneses que tentavam chegar ao norte da Itália, com mexicanos que atravessavam a fronteira para os Estados Unidos, com cubanos que remavam em direção à Flórida. Eu sei que isso não deixará de acontecer enquanto houver fome, miséria, opressão e guerra por aí afora, enquanto houver seres humanos desejando com desespero viver outra vida. Mas não quero me acostumar a isso, não vou me acostumar a isso.
A dor a que Graciliano se refere e não deseja suprimir faz parte da natureza humana, está sempre dentro de nós e no mundo ao nosso redor, temos que contar com ela. Nascemos para parir e parimos com dor. Os animais, as plantas, a terra toda, tudo à nossa volta vive fugindo dela, viver é tentar escapar da dor. Mas a dor de Lampedusa, dos que morreram sem conhecer a felicidade, dos que sobreviveram inutilmente e dos que, como nós, assistem perplexos a esse espetáculo brutal, essa é uma vergonha e pode muito bem ser suprimida. Como disse Francisco, acertando mais uma vez, ela é o resultado da “globalização da indiferença”.
Devemos prestar atenção à dor dos outros, para tentarmos atenuar a nossa. Vejo o desastre de Lampedusa e penso, por exemplo, nessa irracional reação corporativista aos médicos estrangeiros que querem trabalhar no Brasil. Nossas corporações são mais importantes do que o bem-estar e a saúde dos outros, num país miserável como esse? Como penso também em nossos professores em greve. Destruir equipamentos públicos, como estação de metrô, transportes coletivos, pontos de ônibus, placas de sinalização, cabines de telefone, equipamentos que servem ao resto da população, sobretudo aos mais pobres que não têm nada a ver com isso, faz parte de suas reivindicações corporativas?
Nesse e em outros exemplos mais e menos modestos, que se dane o resto, aquele que não sou eu, o outro?
Uma correção relativa ao artigo do outro sábado. O primeiro universitário da PUC-RJ a ser eleito presidente da UNE foi o estudante de direito José Baptista de Oliveira, durante o biênio 1956-57. Arthur Poener, em “O poder jovem” (ed. Civilização Brasileira, 1968), escreveu que a gestão de José Baptista “assinalou a formação da primeira frente única de católicos e comunistas no movimento estudantil, autêntica precursora do pensamento ecumênico em nosso país.”
Devemos prestar atenção à dor dos outros, para tentarmos atenuar a nossa
Semana passada, andei uns dias por Marechal Deodoro, cidade histórica de Alagoas, antiga capital do estado, acompanhando a IV Flimar (Festa Literária de Marechal Deodoro), organizada pelo prefeito Cristiano Matheus e por seu secretário de cultura Carlito Lima, meu amigo de infância. Dias de reencontro com tanta coisa.
Durante a Flimar, redescobri, graças a Ricardo Ramos Filho, seu neto, a extraordinária carta de Graciliano Ramos a Cândido Portinari, publicada em 1946. Um verdadeiro manifesto que, em nossa juventude de esquerda, líamos como amargo chiste do velho Graça, ao qual não tínhamos que dar tanta atenção. E no entanto devíamos ter levado mais a sério o que nosso escritor dizia ao pintor seu amigo, para o bem de sua geração e das gerações de artistas que os sucederam.
“Caríssimo Portinari”, escreve Graciliano, “(...) receio que esta resposta já não o ache fixando na tela a nossa pobre gente da roça. Não há trabalho mais digno, penso eu. Dizem que somos pessimistas e exibimos deformações; contudo as deformações e miséria existem fora da arte e são cultivadas pelos que nos censuram. (...) se elas desaparecessem, poderíamos continuar a trabalhar? Desejamos realmente que elas desapareçam ou seremos também uns exploradores, tão perversos como os outros, quando expomos desgraças? Dos quadros que você mostrou (...), o que mais me comoveu foi aquela mãe com a criança morta. Saí de sua casa com um pensamento horrível: numa sociedade sem classes e sem miséria seria possível fazer-se aquilo? Numa vida tranquila e feliz que espécie de arte surgiria? Chego a pensar que faríamos cromos, anjinhos cor de rosa, e isto me horroriza. Felizmente a dor existirá sempre, a nossa velha amiga, nada a suprimirá. E seríamos ingratos se desejássemos a supressão dela (...).”
Gostaria muito de pensar, e faço sempre um grande esforço para isso, como Bachelard, filósofo francês: “O mundo é belo antes de ser verdadeiro, o mundo é admirado antes de ser verificado.” O que significa que descobrir e se encantar com o que está à nossa volta deve ter primazia sobre ouvir o que se diz sobre o que está à nossa volta. Esse talvez seja o principal conflito da inteligência humana, a disputa eterna entre cultura e conhecimento. Os artistas sofrem com isso.
De que dor e de que mundo devemos falar quando nos deparamos com um desastre como esse de Lampedusa? Mais de 300 imigrantes ilegais, fugindo pelo Mediterrâneo de países africanos em crise, tentam chegar ao sul da Itália e morrem no naufrágio previsível de um barco sem condições de fazer os 350km da viagem, controlado por gerentes da miséria humana que cobravam mais de 1.500 dólares por cada um dos 500 passageiros, número impossível de caber em seus poucos 20 metros de extensão.
Eu sei que isso não é novo, nem raro. Eu sei que já aconteceu com albaneses que tentavam chegar ao norte da Itália, com mexicanos que atravessavam a fronteira para os Estados Unidos, com cubanos que remavam em direção à Flórida. Eu sei que isso não deixará de acontecer enquanto houver fome, miséria, opressão e guerra por aí afora, enquanto houver seres humanos desejando com desespero viver outra vida. Mas não quero me acostumar a isso, não vou me acostumar a isso.
A dor a que Graciliano se refere e não deseja suprimir faz parte da natureza humana, está sempre dentro de nós e no mundo ao nosso redor, temos que contar com ela. Nascemos para parir e parimos com dor. Os animais, as plantas, a terra toda, tudo à nossa volta vive fugindo dela, viver é tentar escapar da dor. Mas a dor de Lampedusa, dos que morreram sem conhecer a felicidade, dos que sobreviveram inutilmente e dos que, como nós, assistem perplexos a esse espetáculo brutal, essa é uma vergonha e pode muito bem ser suprimida. Como disse Francisco, acertando mais uma vez, ela é o resultado da “globalização da indiferença”.
Devemos prestar atenção à dor dos outros, para tentarmos atenuar a nossa. Vejo o desastre de Lampedusa e penso, por exemplo, nessa irracional reação corporativista aos médicos estrangeiros que querem trabalhar no Brasil. Nossas corporações são mais importantes do que o bem-estar e a saúde dos outros, num país miserável como esse? Como penso também em nossos professores em greve. Destruir equipamentos públicos, como estação de metrô, transportes coletivos, pontos de ônibus, placas de sinalização, cabines de telefone, equipamentos que servem ao resto da população, sobretudo aos mais pobres que não têm nada a ver com isso, faz parte de suas reivindicações corporativas?
Nesse e em outros exemplos mais e menos modestos, que se dane o resto, aquele que não sou eu, o outro?
Uma correção relativa ao artigo do outro sábado. O primeiro universitário da PUC-RJ a ser eleito presidente da UNE foi o estudante de direito José Baptista de Oliveira, durante o biênio 1956-57. Arthur Poener, em “O poder jovem” (ed. Civilização Brasileira, 1968), escreveu que a gestão de José Baptista “assinalou a formação da primeira frente única de católicos e comunistas no movimento estudantil, autêntica precursora do pensamento ecumênico em nosso país.”
Festival de insensatez - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 05/10/2013
O que causa mesmo inveja a um carioca são a segurança e a ordem nas ruas de Manhattan
Nova York não é meu sonho de cidade, talvez por falta de intimidade com a língua e com a paisagem, que me lembra Tom Jobim implicando com a altura dos prédios: “NY é para ser vista de maca”. Como cantou o grande Cole Porter, “I love Paris” — na primavera, no outono, no inverno, em “qualquer momento” (menos no verão, quando as duas ficam insuportáveis). Mas reconheço que nenhuma outra metrópole dispõe de tanta oferta cultural quanto a capital do mundo (dizem que perde para Londres, que conheço pouco). Atualmente, há cerca de 30 espetáculos em cartaz na Broadway, ou seja, pode-se ver um por noite durante um mês. Na terra do fast-food, mais do que musicais, concertos, peças, óperas e exposições, só mesmo comida. Em cada quarteirão um bar, uma lanchonete, um restaurante.
Come-se dentro, mas também do lado de fora. O nova-iorquino ou está com a boca cheia ou falando ao celular — às vezes as duas coisas ao mesmo tempo. Come-se até sentado na fonte do Lincoln Center, enquanto se espera, por exemplo, a Filarmônica de NY acompanhar Yefim Bronfman ao piano no Concerto nº 1, de Tchaikovsky. Isso, por si só, valeu a viagem. Aliás, em termos de “valeu a viagem”, há também a magnífica mostra de Edward Hopper, sem falar na nova montagem de “Pippin”, cujas riquezas da coreografia e da expressão corporal dispensam o resto. Não é preciso entender, basta ver para se deslumbrar.
Mas o que causa mesmo inveja a um carioca são a segurança e a ordem da cidade. Andando nas últimas semanas pelas ruas de Manhattan, não tive um sobressalto, uma ameaça, não vi um avanço de sinal, não ouvi uma freada brusca, um buzinaço estridente. Isso deve acontecer, claro, mas como exceção. A comparação é tanto mais chocante quando você volta e encontra a Cinelândia, palco de eventos cívicos memoráveis, transformada em campo de batalha. De um lado, a polícia usando todo tipo de truculência contra professores. Uma professora de História repete por e-mail o que ouviu dos policiais: “Vamos acabar com esses filhos da puta (...). O corpo estremecendo, os olhos lacrimejando e os ouvidos zunindo, já surda, deixei o cenário. Cenário de guerra, arapuca de arame.” A vereadora Teresa Bergher (PSDB), indignada com a violência policial, resumiu: “Um dia negro para a democracia.” De outro lado, vândalos depredando e saqueando bens públicos e até bares tradicionais como o Amarelinho e o Vermelhinho. E, se não bastasse, xingando artistas na entrada de um festival de cinema. O próximo ato deve ser queimar livros em praça pública.
De parte a parte, uma marcha de insensatez que, pelo visto, deve continuar.
O que causa mesmo inveja a um carioca são a segurança e a ordem nas ruas de Manhattan
Nova York não é meu sonho de cidade, talvez por falta de intimidade com a língua e com a paisagem, que me lembra Tom Jobim implicando com a altura dos prédios: “NY é para ser vista de maca”. Como cantou o grande Cole Porter, “I love Paris” — na primavera, no outono, no inverno, em “qualquer momento” (menos no verão, quando as duas ficam insuportáveis). Mas reconheço que nenhuma outra metrópole dispõe de tanta oferta cultural quanto a capital do mundo (dizem que perde para Londres, que conheço pouco). Atualmente, há cerca de 30 espetáculos em cartaz na Broadway, ou seja, pode-se ver um por noite durante um mês. Na terra do fast-food, mais do que musicais, concertos, peças, óperas e exposições, só mesmo comida. Em cada quarteirão um bar, uma lanchonete, um restaurante.
Come-se dentro, mas também do lado de fora. O nova-iorquino ou está com a boca cheia ou falando ao celular — às vezes as duas coisas ao mesmo tempo. Come-se até sentado na fonte do Lincoln Center, enquanto se espera, por exemplo, a Filarmônica de NY acompanhar Yefim Bronfman ao piano no Concerto nº 1, de Tchaikovsky. Isso, por si só, valeu a viagem. Aliás, em termos de “valeu a viagem”, há também a magnífica mostra de Edward Hopper, sem falar na nova montagem de “Pippin”, cujas riquezas da coreografia e da expressão corporal dispensam o resto. Não é preciso entender, basta ver para se deslumbrar.
Mas o que causa mesmo inveja a um carioca são a segurança e a ordem da cidade. Andando nas últimas semanas pelas ruas de Manhattan, não tive um sobressalto, uma ameaça, não vi um avanço de sinal, não ouvi uma freada brusca, um buzinaço estridente. Isso deve acontecer, claro, mas como exceção. A comparação é tanto mais chocante quando você volta e encontra a Cinelândia, palco de eventos cívicos memoráveis, transformada em campo de batalha. De um lado, a polícia usando todo tipo de truculência contra professores. Uma professora de História repete por e-mail o que ouviu dos policiais: “Vamos acabar com esses filhos da puta (...). O corpo estremecendo, os olhos lacrimejando e os ouvidos zunindo, já surda, deixei o cenário. Cenário de guerra, arapuca de arame.” A vereadora Teresa Bergher (PSDB), indignada com a violência policial, resumiu: “Um dia negro para a democracia.” De outro lado, vândalos depredando e saqueando bens públicos e até bares tradicionais como o Amarelinho e o Vermelhinho. E, se não bastasse, xingando artistas na entrada de um festival de cinema. O próximo ato deve ser queimar livros em praça pública.
De parte a parte, uma marcha de insensatez que, pelo visto, deve continuar.
João Paulo - Imprensa de efeito moral
Estado de Minas: 05/10/2013
Falar da imprensa é sempre um campo minado. As críticas caminham na lâmina de uma adaga: de um lado a acusação paranoica do golpismo; de outro o risco permanente da censura. O que deveria ser um alerta para a inteligência acaba se tornando, no entanto, a impossibilidade do debate. Para alguns, não há saída com o modelo de jornalismo vigente; para outros, sem ele nada vale a pena quando se preza a democracia. Mesmo assim, o mal-estar parece permear o cenário. Os leitores já não confiam tanto nos jornais. Mas seguem precisando, cada vez mais, de informação de qualidade para tomar suas decisões.
É por isso que é necessário sempre manter o acicate da desconfiança em funcionamento. O bom jornalismo, que é uma criação da sociedade, não dos meios de comunicação, continua sendo uma das garantias de liberdade e crítica nas sociedades contemporâneas. E é em nome dele que é preciso entender tanto os limites do modelo tradicional – que parece mergulhar numa crise econômica e de valores – quanto a transformação surgida em razão das novas tecnologias e da multiplicação dos polos de enunciação do discurso social. Há uma questão devida à aceleração da técnica que se tornou metáfora social: não precisamos mais esperar o jornal do dia seguinte para começar a viver.
Alguns fatos recentes e seu tratamento pelos meios de comunicação acendem a luz de alerta. A tendência à espetacularização do mundo, que Guy Debord dissecou em seu A sociedade do espetáculo, transforma tudo em imagens. Não se trata apenas de uma forma de simplificação do mundo, mas está em marcha uma operação nitidamente interessada: a criação de padrões que valorizam mais a representação do que a vida. O livro, de 1967, parece um espelho de nossos dias. Para Debord, assim como na economia há a tendência à acumulação de capital, na vida social se observa uma inclinação à acumulação de imagens. A realidade, despida de sua substância e concretude, se torna uma coleção de imagens. A onipresença dos meios de comunicação, guiados por essa lógica, substitui a realidade pela representação. Vivemos num mundo de sombras animadas.
O que isso significa na prática é um desvio epistemológico, ou, em outras palavras, um esvaziamento do campo do saber em proveito da ideologia. Os jornais em vez de noticiarem a realidade se esforçam para manter a dinâmica do espetáculo, o que atende mais à sensibilidade do que à razão. Num contexto com tal padrão de funcionamento, a verdade é barganhada pelo simulacro. Em tal realidade social, aparecer é o mais importante. O que o “jornalismo” de celebridades dita para o mundo social acaba se tornando padrão para todos os campos da informação, da política à economia, passando pela cultura e esporte. Em todos os campos, as notícias parecem prescindir da realidade, elas cumprem apenas sua dança em torno dos mesmos personagens e valores (quase sempre o dinheiro, o poder e a fama).
Falta de educação A forma como a imprensa vem cobrindo nos últimos meses as manifestações sociais é um bom exemplo dessa fábrica de simulacros. Mesmo com o grande investimento nas coberturas, com dezenas de repórteres e analistas de vários campos do saber, o que parece vingar é mais um efeito prévio de julgamento do que a capacidade de ir às raízes das situações. Ninguém se sente à vontade com o novo, que quase sempre é denegado, como a Mídia Ninja, por exemplo. A grande notícia foi o tumulto, não o que ele aponta. Assim como as forças repressivas possuem suas bombas de efeito moral, o jornalismo parece ter se armado de notícias de efeito moral, que fazem muito barulho e geram pouca inteligência.
A recente greve dos professores do Rio de Janeiro (como ocorreu em outras greves do setor, inclusive em Minas) se torna muito mais um campo de confrontação de corpos do que de ideias. O jornalismo, em vez de caminhar em direção ao urgente tema da melhoria da educação, se basta em noticiar manifestações e suas consequências. Como numa evidência de esquizofrenia política, a mesma imprensa que sempre foi aliada das causas da educação e ajudou a denunciar as condições dramáticas do setor deixa de lado seu patrimônio de esclarecimento social e crítica para assumir uma postura de realismo estrito e evasivo das questões de fundo. A sociedade, caso se informasse apenas pelos meios de comunicação tradicionais, teria apenas que ser contra ou a favor da repressão policial ou das estratégias de ação dos grevistas.
Mais que despolitizar, a cobertura espetacularizada torna as questões políticas em sucedâneos policiais. A mesma operação é visível em outros momentos de confronto social no Brasil e no mundo. Assim, ocupações rurais são vistas como ameaça à propriedade privada, e não como realização política da função social; a luta pelos direitos indígenas é tratada num misto de falsa condescendência (que infantiliza o debate) e decretação de atraso e afronta a interesses econômicos tradicionais; a crise do sistema de saúde é colocada na conta da universalização e dos propósitos mais generosos, e não da oposição do setor privado em defesa de seu negócio. Por outro lado, o desemprego nos países europeus, em vez de demonstrar a crise econômica, é a contraparte punitiva pela falta de radicalismo neoliberal: a culpa, mais uma vez, é das vítimas.
Índios e laranjas Para cada um desses “espetáculos” há vilões, mocinhos e cenas de apelo emocional: destruição de pobres pés de laranja de multinacionais (que ocupam indevidamente terras públicas); médicos cubanos a disputar um mercado de profissionais brasileiros (que não se interessaram por ele nem por seus pacientes); populações indígenas como defensoras de bagres e valores animistas. Voltando a Debord, é importante distinguir de que forma essa vindicação da imagem como elemento de constituição social se realiza entre nós. Para ele, havia duas maneiras de criação do poder a partir do exercício da espetacularização. A primeira era a estratégia concentrada, típica das ditaduras. A segunda, que nos diz respeito, é difusa, e assume a defesa de um modo de vida que se espalha por todos os poros da sociedade, sem que pareça fluir de um núcleo. Nesse padrão de pensamento único, o liberalismo é o nec plus ultra das pessoas responsáveis.
O pensador francês vai além: na plena vigência da sociedade do espetáculo, não é preciso sequer esconder a realidade e seus problemas mais candentes, apenas direcionar o discurso sobre a verdade para as demandas do sentimento. Assim, é possível mostrar que nosso padrão de consumo é inviável, que os salários dos professores são baixos, que a saúde pública está em crise, sem, contudo, atacar o coração do sistema. Os meios de comunicação estariam mais interessados em discutir números e dados, como se tudo não passasse de uma inevitabilidade civilizacional. Há certa convicção alienada nos rumos da história, que se compraz em indulgência política.
Outro setor em que tal lógica opera na mesma pasmaceira é a cobertura das campanhas políticas. Os candidatos já postos para a próxima eleição presidencial e para os governos de estado não precisam se manifestar em torno de projetos para os diversos setores da administração e das políticas públicas. As campanhas se tornaram território da desfaçatez: os jornalistas sabem que os candidatos não são o que apresentam em suas campanhas, mesmo assim analisam seus discursos e estratégias tendo como pano de fundo o resultado eleitoral. Jornalismo de resultados. Ou seja, se tornam peças das próprias estratégias de campanha, testando os balões de ensaio e variando, a cada dia, em torno do mesmo chorrilho de alianças, siglas e projetos pessoais. E, o pior, se acham espertos e bem informados.
O jornalismo de efeito moral gosta de jogar gás de pimenta nos olhos do leitor, acreditando que a turvação da inteligência é permanente. O que ele começa a aprender é que o efeito passa e que há outras fontes de informação. A imprensa séria pode até perder público, mas não pode perder a relevância, sob o risco de deixar o mundo mais pobre.
Cobertura de manifestação na Praça Sete pela Mídia Ninja: outro olhar? |
Falar da imprensa é sempre um campo minado. As críticas caminham na lâmina de uma adaga: de um lado a acusação paranoica do golpismo; de outro o risco permanente da censura. O que deveria ser um alerta para a inteligência acaba se tornando, no entanto, a impossibilidade do debate. Para alguns, não há saída com o modelo de jornalismo vigente; para outros, sem ele nada vale a pena quando se preza a democracia. Mesmo assim, o mal-estar parece permear o cenário. Os leitores já não confiam tanto nos jornais. Mas seguem precisando, cada vez mais, de informação de qualidade para tomar suas decisões.
É por isso que é necessário sempre manter o acicate da desconfiança em funcionamento. O bom jornalismo, que é uma criação da sociedade, não dos meios de comunicação, continua sendo uma das garantias de liberdade e crítica nas sociedades contemporâneas. E é em nome dele que é preciso entender tanto os limites do modelo tradicional – que parece mergulhar numa crise econômica e de valores – quanto a transformação surgida em razão das novas tecnologias e da multiplicação dos polos de enunciação do discurso social. Há uma questão devida à aceleração da técnica que se tornou metáfora social: não precisamos mais esperar o jornal do dia seguinte para começar a viver.
Alguns fatos recentes e seu tratamento pelos meios de comunicação acendem a luz de alerta. A tendência à espetacularização do mundo, que Guy Debord dissecou em seu A sociedade do espetáculo, transforma tudo em imagens. Não se trata apenas de uma forma de simplificação do mundo, mas está em marcha uma operação nitidamente interessada: a criação de padrões que valorizam mais a representação do que a vida. O livro, de 1967, parece um espelho de nossos dias. Para Debord, assim como na economia há a tendência à acumulação de capital, na vida social se observa uma inclinação à acumulação de imagens. A realidade, despida de sua substância e concretude, se torna uma coleção de imagens. A onipresença dos meios de comunicação, guiados por essa lógica, substitui a realidade pela representação. Vivemos num mundo de sombras animadas.
O que isso significa na prática é um desvio epistemológico, ou, em outras palavras, um esvaziamento do campo do saber em proveito da ideologia. Os jornais em vez de noticiarem a realidade se esforçam para manter a dinâmica do espetáculo, o que atende mais à sensibilidade do que à razão. Num contexto com tal padrão de funcionamento, a verdade é barganhada pelo simulacro. Em tal realidade social, aparecer é o mais importante. O que o “jornalismo” de celebridades dita para o mundo social acaba se tornando padrão para todos os campos da informação, da política à economia, passando pela cultura e esporte. Em todos os campos, as notícias parecem prescindir da realidade, elas cumprem apenas sua dança em torno dos mesmos personagens e valores (quase sempre o dinheiro, o poder e a fama).
Falta de educação A forma como a imprensa vem cobrindo nos últimos meses as manifestações sociais é um bom exemplo dessa fábrica de simulacros. Mesmo com o grande investimento nas coberturas, com dezenas de repórteres e analistas de vários campos do saber, o que parece vingar é mais um efeito prévio de julgamento do que a capacidade de ir às raízes das situações. Ninguém se sente à vontade com o novo, que quase sempre é denegado, como a Mídia Ninja, por exemplo. A grande notícia foi o tumulto, não o que ele aponta. Assim como as forças repressivas possuem suas bombas de efeito moral, o jornalismo parece ter se armado de notícias de efeito moral, que fazem muito barulho e geram pouca inteligência.
A recente greve dos professores do Rio de Janeiro (como ocorreu em outras greves do setor, inclusive em Minas) se torna muito mais um campo de confrontação de corpos do que de ideias. O jornalismo, em vez de caminhar em direção ao urgente tema da melhoria da educação, se basta em noticiar manifestações e suas consequências. Como numa evidência de esquizofrenia política, a mesma imprensa que sempre foi aliada das causas da educação e ajudou a denunciar as condições dramáticas do setor deixa de lado seu patrimônio de esclarecimento social e crítica para assumir uma postura de realismo estrito e evasivo das questões de fundo. A sociedade, caso se informasse apenas pelos meios de comunicação tradicionais, teria apenas que ser contra ou a favor da repressão policial ou das estratégias de ação dos grevistas.
Mais que despolitizar, a cobertura espetacularizada torna as questões políticas em sucedâneos policiais. A mesma operação é visível em outros momentos de confronto social no Brasil e no mundo. Assim, ocupações rurais são vistas como ameaça à propriedade privada, e não como realização política da função social; a luta pelos direitos indígenas é tratada num misto de falsa condescendência (que infantiliza o debate) e decretação de atraso e afronta a interesses econômicos tradicionais; a crise do sistema de saúde é colocada na conta da universalização e dos propósitos mais generosos, e não da oposição do setor privado em defesa de seu negócio. Por outro lado, o desemprego nos países europeus, em vez de demonstrar a crise econômica, é a contraparte punitiva pela falta de radicalismo neoliberal: a culpa, mais uma vez, é das vítimas.
Índios e laranjas Para cada um desses “espetáculos” há vilões, mocinhos e cenas de apelo emocional: destruição de pobres pés de laranja de multinacionais (que ocupam indevidamente terras públicas); médicos cubanos a disputar um mercado de profissionais brasileiros (que não se interessaram por ele nem por seus pacientes); populações indígenas como defensoras de bagres e valores animistas. Voltando a Debord, é importante distinguir de que forma essa vindicação da imagem como elemento de constituição social se realiza entre nós. Para ele, havia duas maneiras de criação do poder a partir do exercício da espetacularização. A primeira era a estratégia concentrada, típica das ditaduras. A segunda, que nos diz respeito, é difusa, e assume a defesa de um modo de vida que se espalha por todos os poros da sociedade, sem que pareça fluir de um núcleo. Nesse padrão de pensamento único, o liberalismo é o nec plus ultra das pessoas responsáveis.
O pensador francês vai além: na plena vigência da sociedade do espetáculo, não é preciso sequer esconder a realidade e seus problemas mais candentes, apenas direcionar o discurso sobre a verdade para as demandas do sentimento. Assim, é possível mostrar que nosso padrão de consumo é inviável, que os salários dos professores são baixos, que a saúde pública está em crise, sem, contudo, atacar o coração do sistema. Os meios de comunicação estariam mais interessados em discutir números e dados, como se tudo não passasse de uma inevitabilidade civilizacional. Há certa convicção alienada nos rumos da história, que se compraz em indulgência política.
Outro setor em que tal lógica opera na mesma pasmaceira é a cobertura das campanhas políticas. Os candidatos já postos para a próxima eleição presidencial e para os governos de estado não precisam se manifestar em torno de projetos para os diversos setores da administração e das políticas públicas. As campanhas se tornaram território da desfaçatez: os jornalistas sabem que os candidatos não são o que apresentam em suas campanhas, mesmo assim analisam seus discursos e estratégias tendo como pano de fundo o resultado eleitoral. Jornalismo de resultados. Ou seja, se tornam peças das próprias estratégias de campanha, testando os balões de ensaio e variando, a cada dia, em torno do mesmo chorrilho de alianças, siglas e projetos pessoais. E, o pior, se acham espertos e bem informados.
O jornalismo de efeito moral gosta de jogar gás de pimenta nos olhos do leitor, acreditando que a turvação da inteligência é permanente. O que ele começa a aprender é que o efeito passa e que há outras fontes de informação. A imprensa séria pode até perder público, mas não pode perder a relevância, sob o risco de deixar o mundo mais pobre.
A ciência e a dor de existir - Frederico Zeymer Feu de Carvalho
Mal-estar e infelicidade que hoje
atormentam os homens e mulheres não podem ser tratados apenas como
questões que dizem respeito a diagnóstico de problemas cerebrais e
remédios
Frederico Zeymer Feu de Carvalho
Estado de Minas: 05/10/2013
“– Então, como foi a consulta?
– Foi bem... Ele me explicou que o que tenho é depressão, por causa de uma substância que falta no cérebro.
– E você falou com ele do que te aborrece?
– Não deu pra falar muito não. Ele me disse para tomar a medicação e não ficar falando muito dessas coisas que nos aborrecem.”
Esse pequeno fragmento, ouvido por acaso dentro de um ônibus, nos serve aqui de paradigma para algumas questões que dizem respeito ao tratamento do mal-estar na contemporaneidade. Nas últimas décadas, com o avanço das neurociências e das pesquisas sobre a biologia do cérebro, muito se tem propagado sobre o “tratamento científico” do sofrimento psíquico. Novos diagnósticos, como a “síndrome do pânico”, o “transtorno de déficit de atenção e hiperatividade”, o “transtorno afetivo bipolar” e outros saíram dos manuais de psiquiatria para ganhar o domínio público. Uma parte expressiva de nossa infelicidade cotidiana ganhou, assim, um nome científico. Embora afirme a existência de fronteiras entre o normal e o patológico, que nunca sabemos situar com precisão, o discurso da ciência de nossa época acaba contribuindo para a localização cerebral daquilo que pertence à esfera de nossa responsabilidade ética e para a redução da singularidade de cada um à universalidade do funcionamento cerebral.
Impulsionado pelo lobby da indústria farmacêutica, o discurso da ciência pode ser caracterizado, nesse sentido, por suas alianças com o capitalismo. É preciso, contudo, fazer a diferença entre a ciência, como uma forma discursiva que emerge na história do pensamento ocidental por volta da segunda metade do século 17, e o que resulta de seus efeitos na cultura, ou seja, uma série de falsos saberes que se servem da ciência, aos quais poderíamos emprestar o termo genérico de cientificismo.
O fragmento em epígrafe comporta, certamente, uma versão reducionista das contribuições que a ciência pode oferecer ao tratamento de nosso mal-estar, especialmente se pensarmos nos benefícios de uma boa prescrição. O ato de falar de si e narrar os seus aborrecimentos se encontra, no entanto, completamente desvalorizado, nesse caso, diante do ato de engolir a pílula.
Nossa época repercute, como nunca, essa exclusão da subjetividade. Isso pode ser constatado a cada vez que se negligencia o sujeito que existe na criança, no doente ou na loucura, ou quando o corpo é manipulado, medicalizado e modificado sem que se considerem os efeitos subjetivos desses procedimentos.
O risco da visão reducionista da ciência é de, em nome da cientificidade, tomar a própria ciência por um mito, fazendo-nos crer que o funcionamento do cérebro é a causa de nosso comportamento e de nossos humores, esquecendo que o fundamento biológico é somente o substrato de nosso ser e que sobre esse ser se derramam e se depositam as palavras e os discursos que nos formaram. A palavra pode tanto ferir quanto aliviar; ela provoca no corpo alterações fisiológicas e se liga às emoções e afetos. Antes mesmo que possamos falar ou entender o que nos é dito, somos “falados” pelo meio social que nos cerca e nos destina um lugar no mundo. A linguagem é como um órgão exterior ao nosso corpo, mesmo que seu exercício dependa do cérebro. Mas, como tal, obedece a regras socialmente compartilhadas e não uma lei natural.
O aparelho psíquico, tal como Freud o concebe, inclui o laço social e não pode ser pensado sem as parcerias sintomáticas que ligam o sujeito a um modo particular de viver e de satisfazer a pulsão sexual. Em outros termos, a realidade psíquica inclui sempre o outro, em sentido amplo, seja como parceiro, rival, objeto ou ideal. Somos um efeito tanto dos nossos laços sociais quanto dos nossos fundamentos biológico-genéticos. Como corpos vivos, somos atravessados pela linguagem e é isso que torna impossível, para o ser falante, recuperar a sua relação com uma suposta “natureza humana”.
O psiquiatra e psicanalista suíço François Ansermet – que tem trabalhado ativamente as conexões e as desconexões entre psicanálise e neurociências – lembra que é do lado daquilo que falha que se deve buscar o humano em sua possível liberdade e que, se o humano rateia mais que o rato, é também porque ele perdeu o saber instintual do animal. Essa perda instintual própria ao humano resulta do fato da linguagem: “Ser submetido à linguagem faz do homem um animal desnaturado, um animal desprogramado”. Em todo caso, prossegue Ansermet, “nada é simples no humano entre a sua suposta base biológica e o que ele é. Não há superposição possível, não há inferência direta entre uma estrutura neuronal ou genética e uma função psíquica”.
Escuta
É esse campo da palavra que se abre na experiência de uma psicanálise. Desde sua invenção por Freud, a psicanálise recolhe aquilo que o discurso da ciência não consegue acolher. Foi assim com a histeria no final do século 19; continua sendo assim no século 21. Reduzida ao mínimo, uma psicanálise se limita a dois sujeitos que trocam palavras em posição assimétrica, dado que um deles se oferece como analista para aquele que lhe dirige a palavra. Mas o que faz um analista? Ele escuta a palavra que o analisante lhe endereça e que se desenrola a partir da porta aberta pelo dispositivo analítico. O analista estimula e interpreta a fala do analisante, pontuando as suas associações, religando-as ao fio da narrativa em geral esburacada e descontínua de cada história individual.
É a partir desse depósito de palavras que, aos poucos, é possível extrair a fantasia que o sintoma envelopa. É um engano pensar que a interpretação do analista visa dar uma explicação causal ao que é dito a partir de determinações inconscientes. O que uma psicanálise visa é a invenção, própria a cada um, que lhe permita viver um pouco melhor. É esse ganho de saber que está ausente no efeito farmacológico, mesmo quando um alívio dos sintomas é obtido. No fundo, uma análise está voltada para o futuro e para a possibilidade dada a todo aquele que nela se aventura de se rearranjar com seu modo singular de vida, de maneira a torná-lo mais razoável e compatível com os laços sociais. Disso depende o ato de tomar a palavra a fim de bem dizer o que se pode dizer.
Nossa época, no entanto, se caracteriza pela oferta de objetos de consumo que prometem sempre mais satisfação, levando ao infinito essa busca que a psicanálise define como impossível: o reencontro com a satisfação perdida. É esse impossível que caracteriza o real em jogo na experiência analítica. Como se expressa Jacques Lacan, “nenhuma práxis, mais do que a análise, é orientada para o que, no coração da experiência, é o núcleo do real”.
Os avanços das neurociências interessam aos psicanalistas, especialmente se consideramos o uso de psicofármacos, muitas vezes essenciais à clínica psicanalítica. Mas as neurociências incorrem no risco de resvalarem para o delírio cientificista ao confundirem realidade psíquica com realidade cerebral, mantendo intacta a problemática do sujeito.
Ciência e psicanálise
Qual é o lugar da psicanálise entre as ciências? Ou, nas palavras de Lacan: “O que seria uma ciência que incluísse a psicanálise?”. São esses pontos de relação e de não relação entre psicanálise e ciência que a 18ª Jornada da Escola Brasileira de Psicanálise de Minas Gerais (EBP-MG) vaiá discutir nos dias 18 e 19. Para saber mais sobre a jornada: www.jornadaebpmg.blogspot.com
. Frederico Zeymer Feu de Carvalho é psicanalista, membro da Escola Brasileira de Psicanálise, mestre em filosofia e doutor em estudos linguísticos pela UFMG.
Frederico Zeymer Feu de Carvalho
Estado de Minas: 05/10/2013
Se a dor psíquica se relaciona com todas as dimensões do sujeito, por que seria possível estancá-la com uma pílula mágica? |
“– Então, como foi a consulta?
– Foi bem... Ele me explicou que o que tenho é depressão, por causa de uma substância que falta no cérebro.
– E você falou com ele do que te aborrece?
– Não deu pra falar muito não. Ele me disse para tomar a medicação e não ficar falando muito dessas coisas que nos aborrecem.”
Esse pequeno fragmento, ouvido por acaso dentro de um ônibus, nos serve aqui de paradigma para algumas questões que dizem respeito ao tratamento do mal-estar na contemporaneidade. Nas últimas décadas, com o avanço das neurociências e das pesquisas sobre a biologia do cérebro, muito se tem propagado sobre o “tratamento científico” do sofrimento psíquico. Novos diagnósticos, como a “síndrome do pânico”, o “transtorno de déficit de atenção e hiperatividade”, o “transtorno afetivo bipolar” e outros saíram dos manuais de psiquiatria para ganhar o domínio público. Uma parte expressiva de nossa infelicidade cotidiana ganhou, assim, um nome científico. Embora afirme a existência de fronteiras entre o normal e o patológico, que nunca sabemos situar com precisão, o discurso da ciência de nossa época acaba contribuindo para a localização cerebral daquilo que pertence à esfera de nossa responsabilidade ética e para a redução da singularidade de cada um à universalidade do funcionamento cerebral.
Impulsionado pelo lobby da indústria farmacêutica, o discurso da ciência pode ser caracterizado, nesse sentido, por suas alianças com o capitalismo. É preciso, contudo, fazer a diferença entre a ciência, como uma forma discursiva que emerge na história do pensamento ocidental por volta da segunda metade do século 17, e o que resulta de seus efeitos na cultura, ou seja, uma série de falsos saberes que se servem da ciência, aos quais poderíamos emprestar o termo genérico de cientificismo.
O fragmento em epígrafe comporta, certamente, uma versão reducionista das contribuições que a ciência pode oferecer ao tratamento de nosso mal-estar, especialmente se pensarmos nos benefícios de uma boa prescrição. O ato de falar de si e narrar os seus aborrecimentos se encontra, no entanto, completamente desvalorizado, nesse caso, diante do ato de engolir a pílula.
Nossa época repercute, como nunca, essa exclusão da subjetividade. Isso pode ser constatado a cada vez que se negligencia o sujeito que existe na criança, no doente ou na loucura, ou quando o corpo é manipulado, medicalizado e modificado sem que se considerem os efeitos subjetivos desses procedimentos.
O risco da visão reducionista da ciência é de, em nome da cientificidade, tomar a própria ciência por um mito, fazendo-nos crer que o funcionamento do cérebro é a causa de nosso comportamento e de nossos humores, esquecendo que o fundamento biológico é somente o substrato de nosso ser e que sobre esse ser se derramam e se depositam as palavras e os discursos que nos formaram. A palavra pode tanto ferir quanto aliviar; ela provoca no corpo alterações fisiológicas e se liga às emoções e afetos. Antes mesmo que possamos falar ou entender o que nos é dito, somos “falados” pelo meio social que nos cerca e nos destina um lugar no mundo. A linguagem é como um órgão exterior ao nosso corpo, mesmo que seu exercício dependa do cérebro. Mas, como tal, obedece a regras socialmente compartilhadas e não uma lei natural.
O aparelho psíquico, tal como Freud o concebe, inclui o laço social e não pode ser pensado sem as parcerias sintomáticas que ligam o sujeito a um modo particular de viver e de satisfazer a pulsão sexual. Em outros termos, a realidade psíquica inclui sempre o outro, em sentido amplo, seja como parceiro, rival, objeto ou ideal. Somos um efeito tanto dos nossos laços sociais quanto dos nossos fundamentos biológico-genéticos. Como corpos vivos, somos atravessados pela linguagem e é isso que torna impossível, para o ser falante, recuperar a sua relação com uma suposta “natureza humana”.
O psiquiatra e psicanalista suíço François Ansermet – que tem trabalhado ativamente as conexões e as desconexões entre psicanálise e neurociências – lembra que é do lado daquilo que falha que se deve buscar o humano em sua possível liberdade e que, se o humano rateia mais que o rato, é também porque ele perdeu o saber instintual do animal. Essa perda instintual própria ao humano resulta do fato da linguagem: “Ser submetido à linguagem faz do homem um animal desnaturado, um animal desprogramado”. Em todo caso, prossegue Ansermet, “nada é simples no humano entre a sua suposta base biológica e o que ele é. Não há superposição possível, não há inferência direta entre uma estrutura neuronal ou genética e uma função psíquica”.
Escuta
É esse campo da palavra que se abre na experiência de uma psicanálise. Desde sua invenção por Freud, a psicanálise recolhe aquilo que o discurso da ciência não consegue acolher. Foi assim com a histeria no final do século 19; continua sendo assim no século 21. Reduzida ao mínimo, uma psicanálise se limita a dois sujeitos que trocam palavras em posição assimétrica, dado que um deles se oferece como analista para aquele que lhe dirige a palavra. Mas o que faz um analista? Ele escuta a palavra que o analisante lhe endereça e que se desenrola a partir da porta aberta pelo dispositivo analítico. O analista estimula e interpreta a fala do analisante, pontuando as suas associações, religando-as ao fio da narrativa em geral esburacada e descontínua de cada história individual.
É a partir desse depósito de palavras que, aos poucos, é possível extrair a fantasia que o sintoma envelopa. É um engano pensar que a interpretação do analista visa dar uma explicação causal ao que é dito a partir de determinações inconscientes. O que uma psicanálise visa é a invenção, própria a cada um, que lhe permita viver um pouco melhor. É esse ganho de saber que está ausente no efeito farmacológico, mesmo quando um alívio dos sintomas é obtido. No fundo, uma análise está voltada para o futuro e para a possibilidade dada a todo aquele que nela se aventura de se rearranjar com seu modo singular de vida, de maneira a torná-lo mais razoável e compatível com os laços sociais. Disso depende o ato de tomar a palavra a fim de bem dizer o que se pode dizer.
Nossa época, no entanto, se caracteriza pela oferta de objetos de consumo que prometem sempre mais satisfação, levando ao infinito essa busca que a psicanálise define como impossível: o reencontro com a satisfação perdida. É esse impossível que caracteriza o real em jogo na experiência analítica. Como se expressa Jacques Lacan, “nenhuma práxis, mais do que a análise, é orientada para o que, no coração da experiência, é o núcleo do real”.
Os avanços das neurociências interessam aos psicanalistas, especialmente se consideramos o uso de psicofármacos, muitas vezes essenciais à clínica psicanalítica. Mas as neurociências incorrem no risco de resvalarem para o delírio cientificista ao confundirem realidade psíquica com realidade cerebral, mantendo intacta a problemática do sujeito.
Ciência e psicanálise
Qual é o lugar da psicanálise entre as ciências? Ou, nas palavras de Lacan: “O que seria uma ciência que incluísse a psicanálise?”. São esses pontos de relação e de não relação entre psicanálise e ciência que a 18ª Jornada da Escola Brasileira de Psicanálise de Minas Gerais (EBP-MG) vaiá discutir nos dias 18 e 19. Para saber mais sobre a jornada: www.jornadaebpmg.blogspot.com
. Frederico Zeymer Feu de Carvalho é psicanalista, membro da Escola Brasileira de Psicanálise, mestre em filosofia e doutor em estudos linguísticos pela UFMG.
Ler a vida - João Paulo
Depois do sucesso da edição de sua poesia
completa, Paulo Leminski tem relançadas quatro biografias. Poeta
analisa com criatividade e erudição as vidas e obras de Cruz e Sousa,
Bashô, Jesus e Leon Trótski
João Paulo
Estado de Minas: 05/10/2013
Paulo Leminski (1944-1989) foi um poeta e tanto. Não fosse tanto, seria quase. Em vida, fez de tudo: versos, prosa, letra de canções. Ajudou a popularizar o haikai no Brasil, traduziu do japonês, inglês, francês, e latim. De sua base em Curitiba, fez chover no piquenique da literatura brasileira. Meio polaco, meio negro, foi também judoca, faixa preta. De todas as aventuras que viveu, uma das mais impressionantes foi levar a poesia à lista dos livros mais vendidos. E, para ficar ainda mais difícil, fez isso 24 anos depois de morto. O livro Toda poesia, lançado este ano, não foi apenas um acerto de contas, mas uma pequena revolução no mais conservador dos mercados.
Jogador em meio a referências múltiplas, a obra de Leminski criou um tenso diálogo com o concretismo, com o tropicalismo, com a poesia japonesa, com as correntes teóricas que brotavam da semiótica e da filosofia de Pierce. Em cada um desses elementos a obra do poeta parecia encontrar pegadas produtivas: a capacidade de invenção gozosa, a conversa com a indústria cultural, a fuga do nacional-popular, a concisão ancorada numa filosofia quase religiosa, a aventura da interpretação sem fim.
Pop, Leminski fez ainda o exercício pouco comum em nossas letras de juntar sofisticação com capacidade de diálogo. É um dos poetas mais populares entre os jovens e um dos mais incensados pelos eruditos. Rigor sem rigidez ou, para usar sua própria definição, que estampou na capa de um de seus livros, Caprichos e relaxos. Além da poesia, sua literatura de invenção gerou ainda dois romances importantes, Catatau, que se tornou um mito (mais comentado que lidio) e o pouco valorizado Agora é que são elas, que está a merecer nova edição e leitura mais atenta.
Na esteira do sucesso das poesias completas, a Editora Companhia das Letras reúne as quatro biografias escritas por Paulo Leminski no livro Vida. O volume enfeixa os ensaios biográficos dedicados a personagens que nada parecem ter em comum, além da radicalidade do destino que cumpriram: Cruz e Souza, Bashô, Jesus e Trótski. Os três primeiros foram objeto de livrinhos de uma coleção que marcou época, Encanto Radical, da Editora Brasiliense, nos anos 1980. O livro dedicado a Trótski é mais ambicioso e sai do campo da literatura – mesmo Jesus é lido como um poeta-profeta – para se aventurar na política e na história cultural.
As biografias andam em alta hoje em dia. Quase sempre, no entanto, são construídas com a preocupação de esgotar o personagem, de pesquisar os vários momentos de sua vida, de conversar com os todos que conviveram com ele. Além disso, sinal dos tempos, há um interesse exagerado em marcas da vida pessoal, em revelar segredos, em fazer o inventário de amores e desamores. Por fim, as biografias se tornaram uma indústria, feita a muitas mãos, e que miram o interesse do mercado para dispor nas livrarias seus produtos com o máximo de rapidez. Quem, em sã consciência, perderia tempo lendo uma “biografia” de Justin Bieber ou de Lady Gaga? O comércio reponde: milhões de pessoas. E dá-lhe livros e árvores derrubadas.
O trabalho de Paulo Leminski vai na contramão de todos esses caminhos. O poeta curitibano tem como método soberano a inteligência. Ele lê seus personagens, em obras e atitudes, para dar ao leitor um repertório maior de compreensão do mundo, da arte e da política. Herdeiro das vanguardas, Leminski sabe que a experiência conta tanto quanto a razão. Seus biografados não se perdem no tempo nem são personagens datados. O nome do livro, Vida, é uma síntese desse propósito: o biógrafo só se interessa pelo que pulsa.
Sonoplasta
A primeira biografia publicada por Leminski foi Cruz e Souza, o negro branco, lançada originalmente em 1983. O biógrafo já começa mostrando suas armas. Em vez de se perder na conhecida linha dos estilos de época e reforçar o simbolismo do poeta negro, ele busca outras filiações, inspirado mais pela intuição que pela historiografia literária. Assim, Cruz e Souza é apresentado como um poeta que chegou ao soneto porque não era americano. Sua poesia soturna permite a Leminski uma leitura afiada: “Fosse negro norte-americano, Cruz e Sousa teria inventado o blues”. Blues e Sousa.
A pesquisa prossegue. Homem triste, o poeta leva o parceiro em busca do sentimento histórico da tristeza. E assim, banzando ou mergulhado no spleen, Cruz e Sousa é medido pela arte e Baudelaire, dos cantores de spirituals, das grandes damas do blues. Leminski traz ainda para sua leitura signos visuais das publicações da época e até do vestuário do poeta, “um dândi fantasista e caprichoso em suas roupas, africanamente escandalosas, dentro dos padrões da vestuária europeia e branca do século XIX”.
Mas o melhor está mesmo na leitura dos poemas de Cruz e Sousa. Leminski destaca seu erotismo, “uma linguagem em ereção”. Para o biógrafo, com suas imagens profusas e aveludadas, Cruz e Sousa foi um poeta priápico, que se valia de uma musa ninfomaníaca, provavelmente lésbica, com furor uterino. E completa, com exatidão: “uma musa, é claro, expressionista”. Para confirmar sua leitura, lança mão de téoricos como Edmund Wilson e Pierce, mais uma vez passando por cima da cronologia para fazer valer o sentido.
Por fim, num ensaio livre de estilística, Leminski analisa a poesia de Cruz e Sousa em seu aspecto linguístico e musical, mostrando como, por artes do simbolismo, o sentido no poeta deixa o olho para habitar o ouvido. Para o biógrafo, mais que poeta, Cruz e Sousa foi um sonoplasta. E dá-lhe leituras criativas, com uso do confesso método “pound-faustino-paideumático”. E o leitor, além de conhecer melhor Cruz e Sousa, aprende a ler poemas como “Acrobata da dor”, “O assinalado”, “Caveira”, “Dupla via láctea”, “Esquecimento” e “Rir!”.
Samurai
Bashô, a lágrima do peixe, também de 1983, deu sequência ao trabalho do biógrafo. Mais um poeta, só que desta vez um japonês, ex-samurai, do século 17. Matsuó Bashô (o nome, ensina Leminski, quer dizer bananeira) viveu até os 23 anos a serviço de seu senhor, que, depois de alcançar a iluminação, libera seus samurais. Bashô cai na estrada. Daí em diante, o biógrafo procura entender como o jovem rônin se tornou o maior poeta japonês. Como pouco se sabe do homem, Leminski mergulha na poesia.
E não pode haver melhor introdução à cultura japonesa e ao haikai do que o pequeno ensaio do poeta. Ele sintetiza a ética dos samurais, explica o caminhos das diversas artes que levam ao conhecimento, apresenta a rica tradição dos poetas japoneses, se aproxima do budismo, do zen, do paradoxal exercício do koan, revela o sentido profundo do teatro nô. Tudo para criar uma atmosfera em que a poesia e a vida de Bashô ganhem sentido para o leitor.
Mais uma vez o biógrafo deixa de lado o rigor da cronologia para propor comparações ricas. Entram em cena os filósofos romanos, Goethe e até Euclides da Cunha, que tem seu Os sertões traduzido para a linguagem poética do haikai: “A terra/ o homem/ a luta”. O grande esforço do livro é dar ao leitor a experiência da poesia. Leminski procura afastar com a mão os rigores do cartesianismo para pôr em seu lugar a consagração do instante.
Rico em informações e sacadas, Bashô, o olho do peixe é também aproximação à poesia do próprio Leminski e de seu método de leitura. Assim como seu mestre, o poeta de Curitiba transformou os momentos mais banais em uma forma de exercício espiritual, um caminho para a iluminação.
Profeta
Depois de um poeta negro e um samurai retirante, chega a vez de um profeta judeu. Jesus a. C., lançado em 1984, é lido como um signo e como um homem. O signo permite interpretar os vários sinais que são lançados ao vento, o homem manda para escanteio os mitos e devoções. O Jesus de Leminski é gente como a gente e merece o que um poeta tem de melhor a dar: uma leitura lírica.
O biógrafo sintetiza as raízes da história do Oriente Médio, passeia pela babel de línguas e histórias, analisa os modelos literários das parábolas até chegar ao que interessa: a voz dos profetas e, entre elas, a de Jesus. Como quem desenrola pergaminhos, Leminski responde perguntas que evitamos fazer sobre uma tradição que fingimos conhecer. Fala dos fariseus, da lei mosaica, da raízes judaicas de JC.
Mas o que instiga o biógrafo é o que chama de “escritura crística”. O poeta nos apresenta os recursos retóricos do despistamento, da revelação e da epifania. Mostra como um texto pode ser objeto de idolatria e apresenta as astúcias da cabala. No mais polêmico capítulo de seu livro, mostra o lado masculino e feminino de Jesus e de sua tendência para “namorar” as mulheres à sua volta. Do sexo à política, o profeta é tratado como jacobino, e, em mais uma das comparações extemporâneas do biógrafo, é colocado ao lado de Robespierre. E Leminski confessa que se estranha em não ver Jesus alinhado entre os mais radicais dos socialistas. “O programa de Jesus é uma utopia”, resume.
Revolucionário
Dando sequência à inspiração política, o quatro e último livro de Leminski reunido em Vida é Trótski, a paixão segundo a revolução, de 1986. Trabalho que exigiu maior dedicação do poeta, a biografia se preocupa em entender a alma russa (a partir da chave dostoieviskiana de Os irmãos karamázov), a história da região e os complexos movimentos políticos que se dão entre o fim do século 19 e primeira metade do século 20.
Não se entende Trótski sem o movimento comunista, a revolução de outubro, a ação de Lênin, a luta contra Stálin. Mas Leminski mostra que, ao lado da política, a biografia do revolucionário foi também feita a partir sua sensibilidade para a cultura. Sem falar do grande momento dramático da vida de Trótski, de líder da maior revolução da história de seu tempo a proscrito e renegado, expulso do país que ajudou a criar.
Como artista e ligado às vanguardas, Leminski termina seu livro sobre Trótski com reflexões sobre a arte e política, acerca da poesia de Maiakóvski, sobre realismo socialista e arte revolucionária. Homem de cultura, o revolucionário estava atento aos movimentos de seu tempo, do futurismo ao surrealismo. Certo dos descaminhos da política, morreu com a crença de que a arte era a maior aliada da revolução. Leminski assinaria em baixo.
VIDA
. De Paulo Leminski
. Editora Companhia das Letras, 390 páginas, R$ 46
João Paulo
Estado de Minas: 05/10/2013
Leminski selecionou bem suas companhias, escolhendo seus personagens da vida real entre poetas, profetas e revolucionários |
Paulo Leminski (1944-1989) foi um poeta e tanto. Não fosse tanto, seria quase. Em vida, fez de tudo: versos, prosa, letra de canções. Ajudou a popularizar o haikai no Brasil, traduziu do japonês, inglês, francês, e latim. De sua base em Curitiba, fez chover no piquenique da literatura brasileira. Meio polaco, meio negro, foi também judoca, faixa preta. De todas as aventuras que viveu, uma das mais impressionantes foi levar a poesia à lista dos livros mais vendidos. E, para ficar ainda mais difícil, fez isso 24 anos depois de morto. O livro Toda poesia, lançado este ano, não foi apenas um acerto de contas, mas uma pequena revolução no mais conservador dos mercados.
Jogador em meio a referências múltiplas, a obra de Leminski criou um tenso diálogo com o concretismo, com o tropicalismo, com a poesia japonesa, com as correntes teóricas que brotavam da semiótica e da filosofia de Pierce. Em cada um desses elementos a obra do poeta parecia encontrar pegadas produtivas: a capacidade de invenção gozosa, a conversa com a indústria cultural, a fuga do nacional-popular, a concisão ancorada numa filosofia quase religiosa, a aventura da interpretação sem fim.
Pop, Leminski fez ainda o exercício pouco comum em nossas letras de juntar sofisticação com capacidade de diálogo. É um dos poetas mais populares entre os jovens e um dos mais incensados pelos eruditos. Rigor sem rigidez ou, para usar sua própria definição, que estampou na capa de um de seus livros, Caprichos e relaxos. Além da poesia, sua literatura de invenção gerou ainda dois romances importantes, Catatau, que se tornou um mito (mais comentado que lidio) e o pouco valorizado Agora é que são elas, que está a merecer nova edição e leitura mais atenta.
Na esteira do sucesso das poesias completas, a Editora Companhia das Letras reúne as quatro biografias escritas por Paulo Leminski no livro Vida. O volume enfeixa os ensaios biográficos dedicados a personagens que nada parecem ter em comum, além da radicalidade do destino que cumpriram: Cruz e Souza, Bashô, Jesus e Trótski. Os três primeiros foram objeto de livrinhos de uma coleção que marcou época, Encanto Radical, da Editora Brasiliense, nos anos 1980. O livro dedicado a Trótski é mais ambicioso e sai do campo da literatura – mesmo Jesus é lido como um poeta-profeta – para se aventurar na política e na história cultural.
As biografias andam em alta hoje em dia. Quase sempre, no entanto, são construídas com a preocupação de esgotar o personagem, de pesquisar os vários momentos de sua vida, de conversar com os todos que conviveram com ele. Além disso, sinal dos tempos, há um interesse exagerado em marcas da vida pessoal, em revelar segredos, em fazer o inventário de amores e desamores. Por fim, as biografias se tornaram uma indústria, feita a muitas mãos, e que miram o interesse do mercado para dispor nas livrarias seus produtos com o máximo de rapidez. Quem, em sã consciência, perderia tempo lendo uma “biografia” de Justin Bieber ou de Lady Gaga? O comércio reponde: milhões de pessoas. E dá-lhe livros e árvores derrubadas.
O trabalho de Paulo Leminski vai na contramão de todos esses caminhos. O poeta curitibano tem como método soberano a inteligência. Ele lê seus personagens, em obras e atitudes, para dar ao leitor um repertório maior de compreensão do mundo, da arte e da política. Herdeiro das vanguardas, Leminski sabe que a experiência conta tanto quanto a razão. Seus biografados não se perdem no tempo nem são personagens datados. O nome do livro, Vida, é uma síntese desse propósito: o biógrafo só se interessa pelo que pulsa.
Sonoplasta
A primeira biografia publicada por Leminski foi Cruz e Souza, o negro branco, lançada originalmente em 1983. O biógrafo já começa mostrando suas armas. Em vez de se perder na conhecida linha dos estilos de época e reforçar o simbolismo do poeta negro, ele busca outras filiações, inspirado mais pela intuição que pela historiografia literária. Assim, Cruz e Souza é apresentado como um poeta que chegou ao soneto porque não era americano. Sua poesia soturna permite a Leminski uma leitura afiada: “Fosse negro norte-americano, Cruz e Sousa teria inventado o blues”. Blues e Sousa.
A pesquisa prossegue. Homem triste, o poeta leva o parceiro em busca do sentimento histórico da tristeza. E assim, banzando ou mergulhado no spleen, Cruz e Sousa é medido pela arte e Baudelaire, dos cantores de spirituals, das grandes damas do blues. Leminski traz ainda para sua leitura signos visuais das publicações da época e até do vestuário do poeta, “um dândi fantasista e caprichoso em suas roupas, africanamente escandalosas, dentro dos padrões da vestuária europeia e branca do século XIX”.
Mas o melhor está mesmo na leitura dos poemas de Cruz e Sousa. Leminski destaca seu erotismo, “uma linguagem em ereção”. Para o biógrafo, com suas imagens profusas e aveludadas, Cruz e Sousa foi um poeta priápico, que se valia de uma musa ninfomaníaca, provavelmente lésbica, com furor uterino. E completa, com exatidão: “uma musa, é claro, expressionista”. Para confirmar sua leitura, lança mão de téoricos como Edmund Wilson e Pierce, mais uma vez passando por cima da cronologia para fazer valer o sentido.
Por fim, num ensaio livre de estilística, Leminski analisa a poesia de Cruz e Sousa em seu aspecto linguístico e musical, mostrando como, por artes do simbolismo, o sentido no poeta deixa o olho para habitar o ouvido. Para o biógrafo, mais que poeta, Cruz e Sousa foi um sonoplasta. E dá-lhe leituras criativas, com uso do confesso método “pound-faustino-paideumático”. E o leitor, além de conhecer melhor Cruz e Sousa, aprende a ler poemas como “Acrobata da dor”, “O assinalado”, “Caveira”, “Dupla via láctea”, “Esquecimento” e “Rir!”.
Samurai
Bashô, a lágrima do peixe, também de 1983, deu sequência ao trabalho do biógrafo. Mais um poeta, só que desta vez um japonês, ex-samurai, do século 17. Matsuó Bashô (o nome, ensina Leminski, quer dizer bananeira) viveu até os 23 anos a serviço de seu senhor, que, depois de alcançar a iluminação, libera seus samurais. Bashô cai na estrada. Daí em diante, o biógrafo procura entender como o jovem rônin se tornou o maior poeta japonês. Como pouco se sabe do homem, Leminski mergulha na poesia.
E não pode haver melhor introdução à cultura japonesa e ao haikai do que o pequeno ensaio do poeta. Ele sintetiza a ética dos samurais, explica o caminhos das diversas artes que levam ao conhecimento, apresenta a rica tradição dos poetas japoneses, se aproxima do budismo, do zen, do paradoxal exercício do koan, revela o sentido profundo do teatro nô. Tudo para criar uma atmosfera em que a poesia e a vida de Bashô ganhem sentido para o leitor.
Mais uma vez o biógrafo deixa de lado o rigor da cronologia para propor comparações ricas. Entram em cena os filósofos romanos, Goethe e até Euclides da Cunha, que tem seu Os sertões traduzido para a linguagem poética do haikai: “A terra/ o homem/ a luta”. O grande esforço do livro é dar ao leitor a experiência da poesia. Leminski procura afastar com a mão os rigores do cartesianismo para pôr em seu lugar a consagração do instante.
Rico em informações e sacadas, Bashô, o olho do peixe é também aproximação à poesia do próprio Leminski e de seu método de leitura. Assim como seu mestre, o poeta de Curitiba transformou os momentos mais banais em uma forma de exercício espiritual, um caminho para a iluminação.
Profeta
Depois de um poeta negro e um samurai retirante, chega a vez de um profeta judeu. Jesus a. C., lançado em 1984, é lido como um signo e como um homem. O signo permite interpretar os vários sinais que são lançados ao vento, o homem manda para escanteio os mitos e devoções. O Jesus de Leminski é gente como a gente e merece o que um poeta tem de melhor a dar: uma leitura lírica.
O biógrafo sintetiza as raízes da história do Oriente Médio, passeia pela babel de línguas e histórias, analisa os modelos literários das parábolas até chegar ao que interessa: a voz dos profetas e, entre elas, a de Jesus. Como quem desenrola pergaminhos, Leminski responde perguntas que evitamos fazer sobre uma tradição que fingimos conhecer. Fala dos fariseus, da lei mosaica, da raízes judaicas de JC.
Mas o que instiga o biógrafo é o que chama de “escritura crística”. O poeta nos apresenta os recursos retóricos do despistamento, da revelação e da epifania. Mostra como um texto pode ser objeto de idolatria e apresenta as astúcias da cabala. No mais polêmico capítulo de seu livro, mostra o lado masculino e feminino de Jesus e de sua tendência para “namorar” as mulheres à sua volta. Do sexo à política, o profeta é tratado como jacobino, e, em mais uma das comparações extemporâneas do biógrafo, é colocado ao lado de Robespierre. E Leminski confessa que se estranha em não ver Jesus alinhado entre os mais radicais dos socialistas. “O programa de Jesus é uma utopia”, resume.
Revolucionário
Dando sequência à inspiração política, o quatro e último livro de Leminski reunido em Vida é Trótski, a paixão segundo a revolução, de 1986. Trabalho que exigiu maior dedicação do poeta, a biografia se preocupa em entender a alma russa (a partir da chave dostoieviskiana de Os irmãos karamázov), a história da região e os complexos movimentos políticos que se dão entre o fim do século 19 e primeira metade do século 20.
Não se entende Trótski sem o movimento comunista, a revolução de outubro, a ação de Lênin, a luta contra Stálin. Mas Leminski mostra que, ao lado da política, a biografia do revolucionário foi também feita a partir sua sensibilidade para a cultura. Sem falar do grande momento dramático da vida de Trótski, de líder da maior revolução da história de seu tempo a proscrito e renegado, expulso do país que ajudou a criar.
Como artista e ligado às vanguardas, Leminski termina seu livro sobre Trótski com reflexões sobre a arte e política, acerca da poesia de Maiakóvski, sobre realismo socialista e arte revolucionária. Homem de cultura, o revolucionário estava atento aos movimentos de seu tempo, do futurismo ao surrealismo. Certo dos descaminhos da política, morreu com a crença de que a arte era a maior aliada da revolução. Leminski assinaria em baixo.
VIDA
. De Paulo Leminski
. Editora Companhia das Letras, 390 páginas, R$ 46
Fora de casa - Carolina Braga
Livro da antropóloga Maxine L. Margolis
analisa por que o brasileiro se muda para outros países. Encontrado em
vários continentes, o brasuca é motivo de orgulho para sua família
Carolina Braga
Estado de Minas: 05/10/2013
A antropóloga americana Maxine L. Margolis certamente faz parte do grupo de estrangeiros que conhecem mais o Brasil do que muitos de nossos conterrâneos. Ela sabe, em especial, por que vários cidadãos deixam família, amigos, patrimônio e emprego em busca de construir uma vida no exterior. É esse o objeto de estudo do livro Goodbye Brazil: emigrantes brasileiros no mundo (Editora Contexto).
Sem parecer acadêmica demais – muito menos formal –, a professora emérita de antropologia da Universidade da Flórida nos apresenta um diagnóstico detalhado sobre o comportamento migratório. O trabalho confirma a impressão constante de quem viaja para o exterior, mesmo a passeio: tem brasileiro em todos os cantos do planeta.
“O povo brasileiro está no maior número de lugares no mundo. Talvez os equatorianos se equiparem a eles. Espalham-se por continentes como a Ásia e a Europa, além da América do Norte”, confirma a autora. Obviamente, ela vai muito além dessa impressão.
O interesse de Maxine pelo Brasil vem desde o início da carreira como antropóloga. A brasilianista desenvolveu in loco a pesquisa de sua tese doutoral sobre como se deu, no interior do Paraná, a migração da cultura do café para a criação de gado. Por causa disso, ela aprendeu português e morou cerca de um ano em Maringá. No entanto, no fim da década de 1980, passou a se concentrar nos hábitos dos emigrantes. Primeiro, nos Estados Unidos, e logo depois em outras partes do mundo.
Goodbye Brazil... é dividido em 12 capítulos. No primeiro, Maxine se apoia em números para discorrer sobre a tradição histórica brasileira de receber imigrantes em vez de emigrar, assim como na análise dos fluxos migratórios a partir daqui. A pesquisadora observa que os motivos que levam cidadãos a deixar o país são mais ligados a motivos financeiros do que políticos.
Status A autora é perspicaz na tentativa de entender o modo como o brasileiro valida quem vive no exterior. “Para algumas famílias, ter um parente nos EUA é chique, um sinal de status”, observa. Em uma narrativa que mistura dados oficiais, informações da imprensa, entrevistas e muita observação, Margolis analisa quem são os brasileiros que decidem trocar de país e como eles chegam em terras estrangeiras. Só depois a autora se dedica ao estudo de casos específicos.
O movimento migratório dos moradores de Governador Valadares mereceu atenção especial. Maxine salienta que o município do interior de Minas “é comunidade remetente de imigrantes por excelência”. Para entender esse fato, a antropóloga discorre sobre as mudanças das atividades econômicas da cidade ao longo do tempo.
De acordo com a perspectiva defendida por Maxine, se há algo que interfere na decisão de partir é o contexto econômico. Por isso, a autora reconhece o caráter mutante de seu estudo. Se em outros tempos a fragilidade brasileira nesse quesito gerou a partida de cidadãos, é bastante possível que atualmente esse fluxo esteja passando por transformações.
Até 2008, muitos brasileiros trabalhavam na construção civil norte-americana, como faxineiros e baby sitters. No entanto, esse quadro mudou. Já não se contratam babás como antigamente. “Vários perderam o emprego. Com o real mais forte em relação ao dólar, não vale a pena fazer pé-de-meia. Por isso muitos retornaram ao país”, afirma.
A escrita de Maxine Margolis chama a atenção pela riqueza de detalhes. Não apenas na interpretação dos dados recolhidos, mas na “costura” de trabalhos predecessores. Os estudos de Sueli Siqueira sobre Governador Valadares, por exemplo, foram importantes para a elaboração da análise focada no comportamento dos valadarenses.
Darcy O antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro é outra fonte significativa. Inclusive, a partir dos escritos dele Maxine Margolis discute um dos temas mais interessantes de Goodbye Brazil: o que significa ser brasileiro?. À medida que faz esse questionamento, a autora procura entender o modo como somos percebidos por outras nações e o estranhamento que ainda enfrentamos. “Para muitos brasileiros, a novidade de ser estrangeiro é desconfortável. Eles ainda não sabem como querem se identificar ou como desejam que os outros os identifiquem fora da ‘pátria amada’”.
O livro é encerrado com considerações a respeito das novas gerações. Afinal, como a autora afirma, “os brasileiros estão, de fato, procriando no exterior”. Ou seja, Goodbye, Brazil... contextualiza e analisa um movimento mutante.
Goodbye, Brazil: emigrantes brasileiros no mundo
De Maxine Margolis
Editora Contexto,
304 páginas, R$ 43,90
Carolina Braga
Estado de Minas: 05/10/2013
A antropóloga americana Maxine L. Margolis certamente faz parte do grupo de estrangeiros que conhecem mais o Brasil do que muitos de nossos conterrâneos. Ela sabe, em especial, por que vários cidadãos deixam família, amigos, patrimônio e emprego em busca de construir uma vida no exterior. É esse o objeto de estudo do livro Goodbye Brazil: emigrantes brasileiros no mundo (Editora Contexto).
Sem parecer acadêmica demais – muito menos formal –, a professora emérita de antropologia da Universidade da Flórida nos apresenta um diagnóstico detalhado sobre o comportamento migratório. O trabalho confirma a impressão constante de quem viaja para o exterior, mesmo a passeio: tem brasileiro em todos os cantos do planeta.
“O povo brasileiro está no maior número de lugares no mundo. Talvez os equatorianos se equiparem a eles. Espalham-se por continentes como a Ásia e a Europa, além da América do Norte”, confirma a autora. Obviamente, ela vai muito além dessa impressão.
O interesse de Maxine pelo Brasil vem desde o início da carreira como antropóloga. A brasilianista desenvolveu in loco a pesquisa de sua tese doutoral sobre como se deu, no interior do Paraná, a migração da cultura do café para a criação de gado. Por causa disso, ela aprendeu português e morou cerca de um ano em Maringá. No entanto, no fim da década de 1980, passou a se concentrar nos hábitos dos emigrantes. Primeiro, nos Estados Unidos, e logo depois em outras partes do mundo.
Goodbye Brazil... é dividido em 12 capítulos. No primeiro, Maxine se apoia em números para discorrer sobre a tradição histórica brasileira de receber imigrantes em vez de emigrar, assim como na análise dos fluxos migratórios a partir daqui. A pesquisadora observa que os motivos que levam cidadãos a deixar o país são mais ligados a motivos financeiros do que políticos.
Status A autora é perspicaz na tentativa de entender o modo como o brasileiro valida quem vive no exterior. “Para algumas famílias, ter um parente nos EUA é chique, um sinal de status”, observa. Em uma narrativa que mistura dados oficiais, informações da imprensa, entrevistas e muita observação, Margolis analisa quem são os brasileiros que decidem trocar de país e como eles chegam em terras estrangeiras. Só depois a autora se dedica ao estudo de casos específicos.
O movimento migratório dos moradores de Governador Valadares mereceu atenção especial. Maxine salienta que o município do interior de Minas “é comunidade remetente de imigrantes por excelência”. Para entender esse fato, a antropóloga discorre sobre as mudanças das atividades econômicas da cidade ao longo do tempo.
De acordo com a perspectiva defendida por Maxine, se há algo que interfere na decisão de partir é o contexto econômico. Por isso, a autora reconhece o caráter mutante de seu estudo. Se em outros tempos a fragilidade brasileira nesse quesito gerou a partida de cidadãos, é bastante possível que atualmente esse fluxo esteja passando por transformações.
Até 2008, muitos brasileiros trabalhavam na construção civil norte-americana, como faxineiros e baby sitters. No entanto, esse quadro mudou. Já não se contratam babás como antigamente. “Vários perderam o emprego. Com o real mais forte em relação ao dólar, não vale a pena fazer pé-de-meia. Por isso muitos retornaram ao país”, afirma.
A escrita de Maxine Margolis chama a atenção pela riqueza de detalhes. Não apenas na interpretação dos dados recolhidos, mas na “costura” de trabalhos predecessores. Os estudos de Sueli Siqueira sobre Governador Valadares, por exemplo, foram importantes para a elaboração da análise focada no comportamento dos valadarenses.
Darcy O antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro é outra fonte significativa. Inclusive, a partir dos escritos dele Maxine Margolis discute um dos temas mais interessantes de Goodbye Brazil: o que significa ser brasileiro?. À medida que faz esse questionamento, a autora procura entender o modo como somos percebidos por outras nações e o estranhamento que ainda enfrentamos. “Para muitos brasileiros, a novidade de ser estrangeiro é desconfortável. Eles ainda não sabem como querem se identificar ou como desejam que os outros os identifiquem fora da ‘pátria amada’”.
O livro é encerrado com considerações a respeito das novas gerações. Afinal, como a autora afirma, “os brasileiros estão, de fato, procriando no exterior”. Ou seja, Goodbye, Brazil... contextualiza e analisa um movimento mutante.
Goodbye, Brazil: emigrantes brasileiros no mundo
De Maxine Margolis
Editora Contexto,
304 páginas, R$ 43,90
Museu de portas abertas - Daniela Chindler
Estado de Minas: 05/10/2013
O que um visitante espera encontrar em um projeto educativo de museu? Acho que essa é uma pergunta difícil de responder. Acredito que a nossa expectativa é moldada na memória. Quem já visitou um centro cultural ou museu traz essa vivência e quem nunca participou de atividades educativas talvez faça um paralelo com a forma de aprendizado escolar. E o que nós, educadores, gostaríamos de ofertar?
Antes de mais nada, desmitificar o espaço do museu. Muitos estão sediados em antigos palácios, casarões, majestosos prédios públicos. É só olharmos os novos espaços culturais do entorno da Praça da Liberdade. Lá estamos nós, pequenos, frente ao conhecimento ou ao desconhecido. O espaço pode intimidar, ainda mais para quem está dando os primeiros passos nas galerias. E, por falar em passos, repare no mármore, nas grandes janelas, nas incríveis escadarias ou nos modernos espaços com suportes que trazem as últimas novidades da tecnologia. Quando tinha 19 anos, fui pesquisar pela primeira vez na Biblioteca Nacional, antiga Biblioteca Real formada por livros herdados dos reis de Portugal. Já estudava literatura na universidade e, é claro, que era usuária de outras bibliotecas escolares e de bairro, todas mais próximas do meu tamanho. Lembro da timidez que aquele espaço me fez sentir. Por isso gosto de dizer que o educativo é o museu de portas abertas. Lá estamos nós para dizer: “Pode vir, esta casa é de todo mundo”.
Mas não adianta dizer “da boca para fora” que o espaço é democrático, se o discurso não o for. Nosso trabalho é baseado na mediação, na troca. Mediação deriva do latim mediator, que quer dizer: meio, centro, espaço intermediário. Exemplo mediundiei – meio-dia. O termo é usado no direito, se procurarmos no site do Poder Judiciário lá está a figura do mediador. Na educação o mediador conduz o processo de aprendizagem, mas não é detentor de todo o saber. O educador acolhe, promove, provoca, incita e também aprende com o público. Os educadores estudam o conteúdo das exposições, eles têm “coisas para contar”, mas também precisam saber escutar. Uma conversa é um espaço para os dois interlocutores trocarem, senão, não é conversa e sim um discurso.
Cada visitante traz uma experiência, lembranças, uma história. O que o educador faz é aproximar o conteúdo do que está exposto a partir das indagações e referências do público. Na exposição Elles: mulheres artistas na Coleção do Pompidou está uma grande tela, O quarto azul, medindo 90 cm x116 cm da artista francesa Suzanne Valadon. O educador Marcelo Agostinho, que mediava a galeria com um grupo de alunos do ensino fundamental, parou na frente da obra e perguntou se algum deles já tinha visto alguma pintura que lembrasse aquela cena: uma mulher reclinada em uma chaise. A pergunta havia sido feita para um grupo de adultos dias antes e muitos fizeram referência à Olympia, obra de Manet, e La maja desnuda de Goya. Silêncio. Dali a pouco um menino levantou o dedo e citou uma cena do filme Vovó... Zona, estrelado por Martin Lawrence, em que a vovó, que tem formas rechonchudas, está em uma aula de arte posando como modelo vivo.
Nesse momento houve uma identificação do grupo com a tela e a partir daí o museu passou a significar mais para os alunos. O educador aproveitou a ligação e pode confortavelmente trazer novos conteúdos. O grupo conversou a respeito da palheta de cores da pintura, reparou nos elementos presentes na tela (como dois livros dispostos ao lado da mulher que chamavam a atenção pelo amarelo e vermelho) e comparou o retrato daquela mulher com a obra Dançarina deitada de Marie Laurencin. Acredito em um processo educativo em que o educador está atento, interessado no seu grupo, pois o afeto é outro ingrediente fundamental.
E como mediar? Fazendo visitas nas galerias, construindo suportes (como réplicas das obras), contando histórias, apresentando visitas teatralizadas com personagens de época, cantando, experimentando nos laboratórios. Existem inúmeras possibilidades para cada exposição. Quando o educativo é dinâmico e se repensa, o atendimento é mais criativo.
Daniela Chindler é escritora infantil, idealizadora e coordenadora do programa CCBB Educativo.
Quarto azul, de Suzanne Valadon, que integra a mostra Elles: mulheres artistas na Coleção do Centro Pompidou |
O que um visitante espera encontrar em um projeto educativo de museu? Acho que essa é uma pergunta difícil de responder. Acredito que a nossa expectativa é moldada na memória. Quem já visitou um centro cultural ou museu traz essa vivência e quem nunca participou de atividades educativas talvez faça um paralelo com a forma de aprendizado escolar. E o que nós, educadores, gostaríamos de ofertar?
Antes de mais nada, desmitificar o espaço do museu. Muitos estão sediados em antigos palácios, casarões, majestosos prédios públicos. É só olharmos os novos espaços culturais do entorno da Praça da Liberdade. Lá estamos nós, pequenos, frente ao conhecimento ou ao desconhecido. O espaço pode intimidar, ainda mais para quem está dando os primeiros passos nas galerias. E, por falar em passos, repare no mármore, nas grandes janelas, nas incríveis escadarias ou nos modernos espaços com suportes que trazem as últimas novidades da tecnologia. Quando tinha 19 anos, fui pesquisar pela primeira vez na Biblioteca Nacional, antiga Biblioteca Real formada por livros herdados dos reis de Portugal. Já estudava literatura na universidade e, é claro, que era usuária de outras bibliotecas escolares e de bairro, todas mais próximas do meu tamanho. Lembro da timidez que aquele espaço me fez sentir. Por isso gosto de dizer que o educativo é o museu de portas abertas. Lá estamos nós para dizer: “Pode vir, esta casa é de todo mundo”.
Mas não adianta dizer “da boca para fora” que o espaço é democrático, se o discurso não o for. Nosso trabalho é baseado na mediação, na troca. Mediação deriva do latim mediator, que quer dizer: meio, centro, espaço intermediário. Exemplo mediundiei – meio-dia. O termo é usado no direito, se procurarmos no site do Poder Judiciário lá está a figura do mediador. Na educação o mediador conduz o processo de aprendizagem, mas não é detentor de todo o saber. O educador acolhe, promove, provoca, incita e também aprende com o público. Os educadores estudam o conteúdo das exposições, eles têm “coisas para contar”, mas também precisam saber escutar. Uma conversa é um espaço para os dois interlocutores trocarem, senão, não é conversa e sim um discurso.
Cada visitante traz uma experiência, lembranças, uma história. O que o educador faz é aproximar o conteúdo do que está exposto a partir das indagações e referências do público. Na exposição Elles: mulheres artistas na Coleção do Pompidou está uma grande tela, O quarto azul, medindo 90 cm x116 cm da artista francesa Suzanne Valadon. O educador Marcelo Agostinho, que mediava a galeria com um grupo de alunos do ensino fundamental, parou na frente da obra e perguntou se algum deles já tinha visto alguma pintura que lembrasse aquela cena: uma mulher reclinada em uma chaise. A pergunta havia sido feita para um grupo de adultos dias antes e muitos fizeram referência à Olympia, obra de Manet, e La maja desnuda de Goya. Silêncio. Dali a pouco um menino levantou o dedo e citou uma cena do filme Vovó... Zona, estrelado por Martin Lawrence, em que a vovó, que tem formas rechonchudas, está em uma aula de arte posando como modelo vivo.
Nesse momento houve uma identificação do grupo com a tela e a partir daí o museu passou a significar mais para os alunos. O educador aproveitou a ligação e pode confortavelmente trazer novos conteúdos. O grupo conversou a respeito da palheta de cores da pintura, reparou nos elementos presentes na tela (como dois livros dispostos ao lado da mulher que chamavam a atenção pelo amarelo e vermelho) e comparou o retrato daquela mulher com a obra Dançarina deitada de Marie Laurencin. Acredito em um processo educativo em que o educador está atento, interessado no seu grupo, pois o afeto é outro ingrediente fundamental.
E como mediar? Fazendo visitas nas galerias, construindo suportes (como réplicas das obras), contando histórias, apresentando visitas teatralizadas com personagens de época, cantando, experimentando nos laboratórios. Existem inúmeras possibilidades para cada exposição. Quando o educativo é dinâmico e se repensa, o atendimento é mais criativo.
Daniela Chindler é escritora infantil, idealizadora e coordenadora do programa CCBB Educativo.
Entre becos e memórias
Entre becos e memórias
Romance de Conceição Evaristo chama atenção para importância histórica da cultura negra na formação da identidade brasileira
Margarete Aparecida de Oliveira
Estado de Minas: 05/10/2013
Poeta e romancista, Conceição Evaristo é autora de Ponciá Vicêncio, já traduzido nos EUA |
Nascida em Belo Horizonte em 1946 e residente
no Rio de Janeiro desde 1973, Conceição Evaristo é uma personalidade
singular no cenário cultural afro-brasileiro contemporâneo. Participante
ativa dos movimentos de valorização da cultura negra em nosso país,
Evaristo estreou na arte da palavra em 1990, quando passou a publicar
seus contos e poemas na série Cadernos Negros, embora tenha iniciado
suas experiências literárias no começo da década anterior. Em 2003,
trouxe a público o romance Ponciá Vicêncio, objeto de artigos e
dissertações acadêmicas desde sua publicação. Além de indicado a vários
vestibulares de universidades brasileiras, o livro foi traduzido para o
inglês e já está em segunda edição nos Estados Unidos. Em 2006, sai a
primeira edição de Becos da memória, romance iniciado na década de 1980 e
objeto destas reflexões. A autora tem ainda em seu currículo os Poemas
de recordação e outros movimentos (2008), com o tom de sensibilidade e
ternura próprio ao lirismo presente em sua ficção, e que revela um
minucioso trabalho com a linguagem. E, em 2011, os contos de Insubmissas
lágrimas de mulheres, em que trabalha conflitos próprios ao universo
das relações de gênero e etnicidade.
A produção literária de Conceição Evaristo é marcada por um posicionamento que busca privilegiar a sua vivência de mulher negra na sociedade brasileira. Sua obra em prosa é habitada por excluídos sociais, favelados, meninos e meninas de rua, mendigos, desempregados, beberrões, prostitutas, “vadios”. A escritora constrói em suas narrativas figuras memoráveis como PonciáVicêncio, Vô Vicêncio, Maria-Nova, Negro Alírio, Bondade, Tio Totó, Zaita, Naita,Di Lixão, Duzu-Querença, Ana Davenga e tantos outros, que remetem a uma determinada parcela da sociedade pouco ou quase nunca presente em nossas letras.
Centrado no drama dos moradores de uma favela prestes a ser demolida, Becos da memória ganha nova e bem cuidada edição, pela Editora Mulheres, de Florianópolis. Sob a ameaça de despejo – “o plano de desfavelamento [...] aborrecia e confundia a todos”–, vidas e sonhos, experiências e saberes, são postos em risco. A trama se desenvolve sob o olhar de uma menina de 13 anos, a narradora Maria-Nova, que vive todo o processo e se torna porta-voz das alegrias e sofrimentos dos demais: “Homens, mulheres e crianças que se amontoaram dentro de mim, como amontoados eram os barracos de minha favela”. As histórias, tecidas sem linearidade, vão surgindo a partir de um universo fraturado – a comunidade surpreendida pelo processo de remoção: “Dava a impressão de que nem eles sabiam direito por que estavam erradicando a favela. Diziam que era para construir um hospital ou uma companhia de gás, um grande clube, talvez”.
É neste espaço, nos becos sem nome e sem significação maior para os demais habitantes da cidade, que as histórias guardadas na memória de Maria-Nova percorrem o cotidiano de exclusão e miséria. O discurso da personagem mobiliza experiências, passa por traumas oriundos da escravização e recupera saberes resguardados na oralidade. Compõe assim uma narrativa entrelaçada por vozes afrodescendentes de diversas gerações, em cenários que vão do ambiente da lavoura aos “quartos de despejo” das grandes cidades. É por esta fala de menina – simultaneamente jovem e antiga – que Conceição Evaristo encena as origens e as consequências da desigualdade. De acordo com Maurice Halbwachs, em A memória coletiva, a memória individual está ligada à memória do grupo que, por sua vez, vincula-se à esfera maior da tradição, arsenal de saberes de cada sociedade. Ao colecionar histórias de si e dos seus, no momento em que o futuro ganha novos e imprecisos contornos, a personagem, e o romance como um todo, incorporam a memória coletiva para relacioná-la aos processos individuais de identificação.
Conceição Evaristo não entrega ao leitor um enredo “pronto”, linear e consecutivo. É preciso costurar “a colcha de memórias” que nos chega a partir de uma narrativa descontínua, feita de fragmentos que oscilam entre passado e presente, com os dramas e mazelas de cada um rebuscados nas lembranças da voz narrativa: “a recordação daquele mundo me traz lágrimas aos olhos. Como éramos pobres! Miseráveis talvez! [...] escrevo como uma homenagem póstuma [...] Homens, mulheres, crianças que se amontoaram dentro de mim, como amontoados eram os barracos de minha favela”.
E os retalhos de vidas vão sendo costurados pelo olhar atento às encruzilhadas do ontem com o hoje. Por meio dele vão surgindo outros narradores e narradoras, como Vó Rita, velha parteira que “dorme embolada com a Outra” e “era boa, muito boa. Hoje, quando penso em Vó Rita, é como se pensasse no mistério e na plenitude da vida”; e outras ainda, como Bondade, de cujo passado pouco se sabia, mas que “conhecia todas as misérias e grandezas da favela [...]. Com Jeito, ele acabava entrando no coração de todos” e ganhando “o apelido que merecia”; ou Cida-Cidoca, a prostituta “do rabo de ouro”. Romance de coletividade, Becos da memória traz ainda as narrativas com gosto de sangue de Tio Tatão; ou de D. Santinha, que surrou a própria nora que estava no oitavo mês de gravidez para abortar a criança e incriminar o próprio filho. Abre espaço também para a tristeza de Mãe Joana, que nunca sorria, “nem por dentro nem por fora”; e para a fala de Negro Alírio, sindicalista perseguido por suas reivindicações em prol dos direitos dos trabalhadores; e, ainda, para elogios de Ditinha, a empregada doméstica alienada e deslumbrada com a patroa: “Como D. Laura era bonita! “Muito alta, loira, com os olhos da cor daquela pedra das joias”.
Sujeitos invisíveis Na orelha do livro, Eduardo de Assis Duarte, afirma que Becos da memória “descarta a violência gratuita que marca muitas vezes a representação dos excluídos em nossas letras”. A favela representada na obra, embora marcada pela miséria, ainda não conhece a violência do tráfico. A menina curiosa retém na memória os diversos acontecimentos para, um dia, fazê-los chegar ao universo da escrita a fim de nomear o que a sociedade insiste em não ver. Sua fala recupera a história daqueles que não tiveram voz, com suas experiências e ensinamentos: “ela haveria de recontá-las um dia, ainda não se sabia como. Era muita coisa para se guardar dentro de um só peito”.
Becos da memória dialoga, pois, com a realidade presente na vida de muitos sujeitos “invisíveis” que habitam as periferias do país. Ao colocar em primeiro plano o sentimento do favelado que perde seu espaço, a narrativa de Conceição Evaristo se projeta nos dias de hoje como reflexão sobre a presença do negro na construção do país e da própria formação da identidade brasileira. O romance dramatiza a atualidade da diáspora negra, sobretudo interna, trazendo para a trama a memória como exercício de resgate histórico, chamando nossa atenção para antigos e novos problemas, velhos e atuais clamores, tudo isto num ritmo envolvente que só o talento para ficção consegue construir. Sem perder a ternura jamais, a escritora revolve a contrapelo a trajetória dos que saíram da senzala para habitar os becos de nossa modernidade.
Margarete Aparecida de Oliveira é mestranda em teoria literária e literatura comparada na Faculdade de Letras da UFMG.
Becos da Memória
• De Conceição Evaristo
• Editora Mulheres
• 270 páginas
A produção literária de Conceição Evaristo é marcada por um posicionamento que busca privilegiar a sua vivência de mulher negra na sociedade brasileira. Sua obra em prosa é habitada por excluídos sociais, favelados, meninos e meninas de rua, mendigos, desempregados, beberrões, prostitutas, “vadios”. A escritora constrói em suas narrativas figuras memoráveis como PonciáVicêncio, Vô Vicêncio, Maria-Nova, Negro Alírio, Bondade, Tio Totó, Zaita, Naita,Di Lixão, Duzu-Querença, Ana Davenga e tantos outros, que remetem a uma determinada parcela da sociedade pouco ou quase nunca presente em nossas letras.
Centrado no drama dos moradores de uma favela prestes a ser demolida, Becos da memória ganha nova e bem cuidada edição, pela Editora Mulheres, de Florianópolis. Sob a ameaça de despejo – “o plano de desfavelamento [...] aborrecia e confundia a todos”–, vidas e sonhos, experiências e saberes, são postos em risco. A trama se desenvolve sob o olhar de uma menina de 13 anos, a narradora Maria-Nova, que vive todo o processo e se torna porta-voz das alegrias e sofrimentos dos demais: “Homens, mulheres e crianças que se amontoaram dentro de mim, como amontoados eram os barracos de minha favela”. As histórias, tecidas sem linearidade, vão surgindo a partir de um universo fraturado – a comunidade surpreendida pelo processo de remoção: “Dava a impressão de que nem eles sabiam direito por que estavam erradicando a favela. Diziam que era para construir um hospital ou uma companhia de gás, um grande clube, talvez”.
É neste espaço, nos becos sem nome e sem significação maior para os demais habitantes da cidade, que as histórias guardadas na memória de Maria-Nova percorrem o cotidiano de exclusão e miséria. O discurso da personagem mobiliza experiências, passa por traumas oriundos da escravização e recupera saberes resguardados na oralidade. Compõe assim uma narrativa entrelaçada por vozes afrodescendentes de diversas gerações, em cenários que vão do ambiente da lavoura aos “quartos de despejo” das grandes cidades. É por esta fala de menina – simultaneamente jovem e antiga – que Conceição Evaristo encena as origens e as consequências da desigualdade. De acordo com Maurice Halbwachs, em A memória coletiva, a memória individual está ligada à memória do grupo que, por sua vez, vincula-se à esfera maior da tradição, arsenal de saberes de cada sociedade. Ao colecionar histórias de si e dos seus, no momento em que o futuro ganha novos e imprecisos contornos, a personagem, e o romance como um todo, incorporam a memória coletiva para relacioná-la aos processos individuais de identificação.
Conceição Evaristo não entrega ao leitor um enredo “pronto”, linear e consecutivo. É preciso costurar “a colcha de memórias” que nos chega a partir de uma narrativa descontínua, feita de fragmentos que oscilam entre passado e presente, com os dramas e mazelas de cada um rebuscados nas lembranças da voz narrativa: “a recordação daquele mundo me traz lágrimas aos olhos. Como éramos pobres! Miseráveis talvez! [...] escrevo como uma homenagem póstuma [...] Homens, mulheres, crianças que se amontoaram dentro de mim, como amontoados eram os barracos de minha favela”.
E os retalhos de vidas vão sendo costurados pelo olhar atento às encruzilhadas do ontem com o hoje. Por meio dele vão surgindo outros narradores e narradoras, como Vó Rita, velha parteira que “dorme embolada com a Outra” e “era boa, muito boa. Hoje, quando penso em Vó Rita, é como se pensasse no mistério e na plenitude da vida”; e outras ainda, como Bondade, de cujo passado pouco se sabia, mas que “conhecia todas as misérias e grandezas da favela [...]. Com Jeito, ele acabava entrando no coração de todos” e ganhando “o apelido que merecia”; ou Cida-Cidoca, a prostituta “do rabo de ouro”. Romance de coletividade, Becos da memória traz ainda as narrativas com gosto de sangue de Tio Tatão; ou de D. Santinha, que surrou a própria nora que estava no oitavo mês de gravidez para abortar a criança e incriminar o próprio filho. Abre espaço também para a tristeza de Mãe Joana, que nunca sorria, “nem por dentro nem por fora”; e para a fala de Negro Alírio, sindicalista perseguido por suas reivindicações em prol dos direitos dos trabalhadores; e, ainda, para elogios de Ditinha, a empregada doméstica alienada e deslumbrada com a patroa: “Como D. Laura era bonita! “Muito alta, loira, com os olhos da cor daquela pedra das joias”.
Sujeitos invisíveis Na orelha do livro, Eduardo de Assis Duarte, afirma que Becos da memória “descarta a violência gratuita que marca muitas vezes a representação dos excluídos em nossas letras”. A favela representada na obra, embora marcada pela miséria, ainda não conhece a violência do tráfico. A menina curiosa retém na memória os diversos acontecimentos para, um dia, fazê-los chegar ao universo da escrita a fim de nomear o que a sociedade insiste em não ver. Sua fala recupera a história daqueles que não tiveram voz, com suas experiências e ensinamentos: “ela haveria de recontá-las um dia, ainda não se sabia como. Era muita coisa para se guardar dentro de um só peito”.
Becos da memória dialoga, pois, com a realidade presente na vida de muitos sujeitos “invisíveis” que habitam as periferias do país. Ao colocar em primeiro plano o sentimento do favelado que perde seu espaço, a narrativa de Conceição Evaristo se projeta nos dias de hoje como reflexão sobre a presença do negro na construção do país e da própria formação da identidade brasileira. O romance dramatiza a atualidade da diáspora negra, sobretudo interna, trazendo para a trama a memória como exercício de resgate histórico, chamando nossa atenção para antigos e novos problemas, velhos e atuais clamores, tudo isto num ritmo envolvente que só o talento para ficção consegue construir. Sem perder a ternura jamais, a escritora revolve a contrapelo a trajetória dos que saíram da senzala para habitar os becos de nossa modernidade.
Margarete Aparecida de Oliveira é mestranda em teoria literária e literatura comparada na Faculdade de Letras da UFMG.
Becos da Memória
• De Conceição Evaristo
• Editora Mulheres
• 270 páginas
Tv Paga & Caras e Bocas
Estado de Minas: 05/10/2013
Aventura fantástica
Uma noite com ótimas opções para quem quer ver um bom filme. O destaque é a estreia de Jogos Vorazes, às 22h, na HBO. Ganhadora do Oscar por O lado bom da vida, a jovem atriz Jennifer Lawrence (foto) protagoniza esta aventura, que se passa em um futuro antiutópico, numa nação totalitária que organiza um torneio para entreter e manter a população controlada. Quando uma adolescente se oferece como voluntária para salvar a irmã, ela terá que sobreviver aos tais jogos vorazes. Stanley Tucci, Wes Bentley, Willow Shields, Liam Hemsworth e Elizabeth Banks completam o elenco.
Telecine Premium tem
seus trunfos também
Uma boa alternativa no Telecine Premium é As palavras, também às 22h. Dirigido por Brian Klugman e Lee Sternthal, o filme tem no elenco Bradley Cooper, Zoe Saldana e Dennis Quaid. A trama: um famoso autor em crise conta a história de seu mais novo livro. Com dificuldades para publicar seu primeiro romance, ele encontra um genial antigo manuscrito sem dono e decide publicá-lo como se fosse seu. O livro é um sucesso, mas o verdadeiro autor aparece para confrontá-lo.
Filme é o que não vai
faltar para os cinéfilos
Na concorrida faixa das 22h, o assinante tem pelo menos uma dúzia de bons filmes para escolher o que ver: O legado Bourne, no Telecine Pipoca; E se vivêssemos todos juntos?, no Telecine Cult; Se beber não case! Parte 2, na HBO 2; A inquilina, no Megapix; Colombiana – Em busca de vingança, no Max HD; O aviador, no Max Prime; Ponto de vista, no A&E; O traidor, na MGM; O desinformante, na Warner; Os reis de Dogtown, no Sony; Praça Saens Peña, no Canal Brasil; e Luzia Homem, no Futura. Outras atrações da programação: O abrigo, às 21h, no Max; Edison – Poder e corrupção, às 21h, no Cinemax; A dama na água, às 21h45, no Glitz; e O livro de Eli, às 22h30, no Universal.
Por pouco os nazistas
não fizeram sua bomba
No segmento dos documentários, o canal History exibe esta noite, às 22h, um especial de duas horas de duração sobre a 2ª Guerra Mundial, mas com um enfoque diferente, analisando o avanço da Alemanha como uma potência militar, ocorrido em apenas seis anos antes da deflagração do conflito, inclusive com a possibilidade de desenvolvimento de armas nucleares. No Nat Geo, às 23h, dois episódios inéditos dos documentários Encontro animal (“Bosque de ossos”) e Os predadores mais perigosos (“Caçadores noturnos”).
Emicida lança o primeiro
disco no Manos e minas
A Cultura sempre tem musicais bacanas no sábado. Começa hoje com o rapper Emicida lançando seu primeiro álbum de estúdio, O glorioso retorno de quem nunca esteve aqui, no programa Manos e minas, às 17h. Às 17h30, o Cultura livre recebe a banda Aláfia. Já às 21h30, na série Clássicos, a Filarmônica de Câmara Alemã de Bremen interpreta as sinfonias nº 8 e nº 9 de Beethoven. No Mutishow,
às 22h, tem O Rappa ao vivo.
Aventura fantástica
Uma noite com ótimas opções para quem quer ver um bom filme. O destaque é a estreia de Jogos Vorazes, às 22h, na HBO. Ganhadora do Oscar por O lado bom da vida, a jovem atriz Jennifer Lawrence (foto) protagoniza esta aventura, que se passa em um futuro antiutópico, numa nação totalitária que organiza um torneio para entreter e manter a população controlada. Quando uma adolescente se oferece como voluntária para salvar a irmã, ela terá que sobreviver aos tais jogos vorazes. Stanley Tucci, Wes Bentley, Willow Shields, Liam Hemsworth e Elizabeth Banks completam o elenco.
Telecine Premium tem
seus trunfos também
Uma boa alternativa no Telecine Premium é As palavras, também às 22h. Dirigido por Brian Klugman e Lee Sternthal, o filme tem no elenco Bradley Cooper, Zoe Saldana e Dennis Quaid. A trama: um famoso autor em crise conta a história de seu mais novo livro. Com dificuldades para publicar seu primeiro romance, ele encontra um genial antigo manuscrito sem dono e decide publicá-lo como se fosse seu. O livro é um sucesso, mas o verdadeiro autor aparece para confrontá-lo.
Filme é o que não vai
faltar para os cinéfilos
Na concorrida faixa das 22h, o assinante tem pelo menos uma dúzia de bons filmes para escolher o que ver: O legado Bourne, no Telecine Pipoca; E se vivêssemos todos juntos?, no Telecine Cult; Se beber não case! Parte 2, na HBO 2; A inquilina, no Megapix; Colombiana – Em busca de vingança, no Max HD; O aviador, no Max Prime; Ponto de vista, no A&E; O traidor, na MGM; O desinformante, na Warner; Os reis de Dogtown, no Sony; Praça Saens Peña, no Canal Brasil; e Luzia Homem, no Futura. Outras atrações da programação: O abrigo, às 21h, no Max; Edison – Poder e corrupção, às 21h, no Cinemax; A dama na água, às 21h45, no Glitz; e O livro de Eli, às 22h30, no Universal.
Por pouco os nazistas
não fizeram sua bomba
No segmento dos documentários, o canal History exibe esta noite, às 22h, um especial de duas horas de duração sobre a 2ª Guerra Mundial, mas com um enfoque diferente, analisando o avanço da Alemanha como uma potência militar, ocorrido em apenas seis anos antes da deflagração do conflito, inclusive com a possibilidade de desenvolvimento de armas nucleares. No Nat Geo, às 23h, dois episódios inéditos dos documentários Encontro animal (“Bosque de ossos”) e Os predadores mais perigosos (“Caçadores noturnos”).
Emicida lança o primeiro
disco no Manos e minas
A Cultura sempre tem musicais bacanas no sábado. Começa hoje com o rapper Emicida lançando seu primeiro álbum de estúdio, O glorioso retorno de quem nunca esteve aqui, no programa Manos e minas, às 17h. Às 17h30, o Cultura livre recebe a banda Aláfia. Já às 21h30, na série Clássicos, a Filarmônica de Câmara Alemã de Bremen interpreta as sinfonias nº 8 e nº 9 de Beethoven. No Mutishow,
às 22h, tem O Rappa ao vivo.
CARAS & BOCAS »
Noite quente
Fábio Jr. é um dos convidados de hoje do programa Altas horas |
Ator e cantor, Fabio Jr. é um dos galãs mais
assediados pelo público feminino no Brasil. E quem é fã certamente não
vai perder esta noite o Altas horas, que está indo ao ar um pouco mais
cedo, na Globo. É que Serginho Groisman vai entregar a ele o CD de
músicas favorito de Hebe Camargo, em uma homenagem emocionante gravada
em vídeo pelo filho e sobrinho da cantora. “Ela era uma mulher incrível.
Devia ter ouvido melhor tudo que ela tinha a dizer pessoalmente. A Hebe
era uma ótima conselheira amorosa”, conta o cantor. Ele é responsável
pelas apresentações musicais da noite, com sucessos como Só você e
Voltei a fazer planos. Fábio Jr ainda divide o palco com os convidados
Selton Mello e Maitê Proença durante a canção Alma gêmea.
Angélica vai à feira com a
amiga Vanessa Giácomo
Ainda na Globo, mas ainda mais cedo, no Estrelas, Angélica acompanha Vanessa Giácomo em uma ida à feira no Rio de Janeiro. No ar como a Aline de Amor à vida, a atriz comenta que a personagem é um grande desafio na sua carreira: “Ela é muito especial. Minha primeira grande vilã. Sou tímida e morro de vergonha de fazer as cenas sensuais. Tem sido uma grande experiência”. Enquanto param de barraca em barraca, Vanessa também fala sobre a rotina de casa com os filhos.
Raul Gil continua atrás
da melhor doméstica
Também hoje, às 14h15, no SBT/Alterosa, Raul Gil vai apresentar mais uma eliminatória do quadro “A melhor doméstica do Brasil”. As concorrentes da vez são Rosana, Neide e Cristina. A vencedora do concurso vai levar R$ 50 mil e um ano de produtos de limpeza para a patroa. Na parte musical estão previstas apresentações dos grupos Barra da Saia e Girls.
Covers desfilam os seus
talentos no tela do SBT
Quatro candidatos serão escolhidos pelos jurados do programa Famoso quem? para se transformar em seus ídolos, com a ajuda dos especialistas Lola Melnick e Marcelo Boffat. Entre os artistas escolhidos, Ney Matogrosso e Shakira. O resultado do empenho e superação de cada finalista vai ao ar às 22h15, no SBT/Alterosa. O melhor cover levará o prêmio de R$ 5 mil e ainda vai garantir uma vaga na grande final.
Regina Volpato e Claudete
Troiano dão sinal de vida
Claudete Troiano e Regina Volpato vão participar do “Jogo das 3 pistas”, amanhã, no programa Silvio Santos, ainda no SBT/Alterosa. Vence o jogo a participante que acertar mais palavras e conquistar o melhor placar. No “Jogo dos Pontinhos”, Thammy Miranda faz uma participação especial e joga com os colegas Helen Ganzarolli, Cabrito Tevez, Lívia Andrade, Flor e Carlinhos Aguiar.
Atriz Cléo Pires diz como
foi Interpretar Ana Terra
Ah, a filha de Fábio Jr., a atriz Cléo Pires, é a entrevistada do Cinejornal deste sábado, às 21h, no Canal Brasil. “Foi uma das melhores decisões da minha vida. A personagem é um presente”, diz Cléo sobre a Ana Terra de O tempo e o vento, filme de Jayme Monjardim em cartaz nos cinemas. Na entrevista a Simone Zuccolotto, Cléo comenta também sua estreia nos cinemas, com o longa Benjamin, de Monique Gardenberg, e a parceria com Selton Mello em Meu nome não é Johnny.
Com atitude
Mano Brown (foto) não é muito de dar entrevistas para jornal e TV. Mas ele participa hoje com seu grupo Racionais MCs do programa Estação periferia, às 17h, na TV Brasil (canal 65 UHF). Ícone do movimento hip- hop, o grupo trabalha com letras que abordam a realidade das periferias urbanas do país e discutem temas como crime, pobreza, preconceito social e racial, drogas e consciência política. A garotada adora!
VIVA
O canal GNT (TV paga) reprisa esta noite, às 22h, o curioso documentário Steve Jobs: um hippie milionário, que traça
o perfil do gênio que criou a Apple e revolucionou o mundo da tecnologia digital.
VAIA
Tem gente que gosta. Tanto que Papo de Mallandro emplaca uma terceira temporada quinta-feira que vem, no Multishow (TV paga). Mas Sérgio Mallandro é tão divertido quanto um tratamento de canal.
Angélica vai à feira com a
amiga Vanessa Giácomo
Ainda na Globo, mas ainda mais cedo, no Estrelas, Angélica acompanha Vanessa Giácomo em uma ida à feira no Rio de Janeiro. No ar como a Aline de Amor à vida, a atriz comenta que a personagem é um grande desafio na sua carreira: “Ela é muito especial. Minha primeira grande vilã. Sou tímida e morro de vergonha de fazer as cenas sensuais. Tem sido uma grande experiência”. Enquanto param de barraca em barraca, Vanessa também fala sobre a rotina de casa com os filhos.
Raul Gil continua atrás
da melhor doméstica
Também hoje, às 14h15, no SBT/Alterosa, Raul Gil vai apresentar mais uma eliminatória do quadro “A melhor doméstica do Brasil”. As concorrentes da vez são Rosana, Neide e Cristina. A vencedora do concurso vai levar R$ 50 mil e um ano de produtos de limpeza para a patroa. Na parte musical estão previstas apresentações dos grupos Barra da Saia e Girls.
Covers desfilam os seus
talentos no tela do SBT
Quatro candidatos serão escolhidos pelos jurados do programa Famoso quem? para se transformar em seus ídolos, com a ajuda dos especialistas Lola Melnick e Marcelo Boffat. Entre os artistas escolhidos, Ney Matogrosso e Shakira. O resultado do empenho e superação de cada finalista vai ao ar às 22h15, no SBT/Alterosa. O melhor cover levará o prêmio de R$ 5 mil e ainda vai garantir uma vaga na grande final.
Regina Volpato e Claudete
Troiano dão sinal de vida
Claudete Troiano e Regina Volpato vão participar do “Jogo das 3 pistas”, amanhã, no programa Silvio Santos, ainda no SBT/Alterosa. Vence o jogo a participante que acertar mais palavras e conquistar o melhor placar. No “Jogo dos Pontinhos”, Thammy Miranda faz uma participação especial e joga com os colegas Helen Ganzarolli, Cabrito Tevez, Lívia Andrade, Flor e Carlinhos Aguiar.
Atriz Cléo Pires diz como
foi Interpretar Ana Terra
Ah, a filha de Fábio Jr., a atriz Cléo Pires, é a entrevistada do Cinejornal deste sábado, às 21h, no Canal Brasil. “Foi uma das melhores decisões da minha vida. A personagem é um presente”, diz Cléo sobre a Ana Terra de O tempo e o vento, filme de Jayme Monjardim em cartaz nos cinemas. Na entrevista a Simone Zuccolotto, Cléo comenta também sua estreia nos cinemas, com o longa Benjamin, de Monique Gardenberg, e a parceria com Selton Mello em Meu nome não é Johnny.
Com atitude
Mano Brown (foto) não é muito de dar entrevistas para jornal e TV. Mas ele participa hoje com seu grupo Racionais MCs do programa Estação periferia, às 17h, na TV Brasil (canal 65 UHF). Ícone do movimento hip- hop, o grupo trabalha com letras que abordam a realidade das periferias urbanas do país e discutem temas como crime, pobreza, preconceito social e racial, drogas e consciência política. A garotada adora!
VIVA
O canal GNT (TV paga) reprisa esta noite, às 22h, o curioso documentário Steve Jobs: um hippie milionário, que traça
o perfil do gênio que criou a Apple e revolucionou o mundo da tecnologia digital.
VAIA
Tem gente que gosta. Tanto que Papo de Mallandro emplaca uma terceira temporada quinta-feira que vem, no Multishow (TV paga). Mas Sérgio Mallandro é tão divertido quanto um tratamento de canal.
A caminho de Frankfurt - Carlos Herculano Lopes
Autores e artistas seguem para a Alemanha
para participar do principal evento internacional dedicado aos livros.
Como país homenageado, Brasil aposta na conquista de novos mercados
Carlos Herculano Lopes
Estdo de Minas: 05/10/2013
A partir de quarta-feira, a cidade de Frankfurt, na Alemanha, estará vestida de verde e amarelo. O motivo é dos mais nobres, com direito de ser comemorado: até dia 13, o Brasil será o país homenageado na famosa feira do livro da cidade, uma das mais importantes do mundo. O evento, além de seu charme, será oportunidade de realização de negócios que envolverão alguns milhões de euros, centenas de editoras, escritores e agentes literários de 111 países confirmados, além de outros segmentos culturais.
O estande brasileiro ocupa 700 metros quadrados e reunirá 170 expositores, enquanto o pavilhão reservado ao país terá 2,5 mil metros quadrados. A participação do Brasil foi organizada pelos ministérios da Cultura e das Relações Exteriores, Fundação Biblioteca Nacional, Fundação Nacional de Artes (Funarte) e Câmara Brasileira do Livro (CBL). Os organizadores esperam receber 300 mil visitantes.
Karine Pansa, presidente da CBL, afirma que as expectativas comerciais são excelentes. “O Brasil, até então comprador de direitos autorais, passa a vendê-los no exterior”, avalia. Mas não apenas a literatura brasileira, representada por 70 autores de diversos estados, dará tom especial à festa. Para aguçar ainda mais o interesse dos alemães e visitantes de outros países, haverá festivais gastronômicos com a presença de chefs do país, além de shows, exibição de filmes e peças de teatro. A programação começou em 23 de agosto, com apresentação do rapper paulista Criolo. Desde setembro, o projeto Street-art Brazil colore as ruas de Frankfurt. Doze brasileiros apresentam grafites na fachada do Museu Schirn Kunsthalle, de um banco, pontes e quartel de polícia.
A ministra da Cultura, Marta Suplicy, participará da abertura oficial da feira. “Esta é uma extraordinária oportunidade para o Brasil fortalecer sua imagem cultural e literária na Europa”, afirma ela. Na solenidade, como representantes dos escritores falarão os romancistas Luiz Ruffato, mineiro de Cataguases, e a carioca Ana Maria Machado, presidente da Academia Brasileira de Letras.
Renato Lessa, presidente da Fundação Biblioteca Nacional, diz que a escolha dos participantes não foi fácil e contemplou, entre outros critérios, autores com obras traduzidas no exterior. “A seleção representa a criação literária brasileira sem qualquer estereótipo, mas destacando o domínio criativo”, diz ele.
A presença mineira será representativa em Frankfurt e inclui também nomes ligados às áreas de gastronomia, dança, cinema e música. No dia seguinte à abertura, na companhia de Marina Colasanti, será a vez de a belo-horizontina Angela-Lago dar o seu recado na palestra “Lirismo e ironia”. Autora de dezenas de livros dedicados ao público infantojuvenil, ela planeja manter contatos com leitores e educadores alemães. “Espero que os ouvintes gostem da nossa conversa. Vou adorar conhecer bibliotecas e as crianças. Quero ver também o que há de novo na área de e-books e aplicativos para meninos e meninas que estão aprendendo a ler.”
Quadrinhos Outro que também viajou para a Alemanha foi o desenhista Marcelo Lélis, ilustrador do Estado de Minas. Sexta-feira, ele participa da mesa “Brasil e sua cena de quadrinhos” ao lado de Fernando Gonzales e Lourenço Mutarelli. Lélis destaca a valorização dos quadrinhos pelos organizadores do evento, lembrando que essa arte, há pouco tempo, sofria forte discriminação por parte dos educadores. “Felizmente, vivemos outro momento. Até mesmo o governo brasileiro tem reconhecido a importância das histórias em quadrinhos como processo de alfabetização e difusão de conteúdos didáticos e literários. A prova está no convite para irmos a Frankfurt”, comemora. Na mala de Lélis seguirão também algumas tintas, pincéis e papéis para que ele possa desenhar o país anfitrião.
Para a escritora Maria Esther Maciel, professora de literatura brasileira na UFMG e cronista do EM, participar da Feira de Frankfurt é estimulante “e até um pouco assustador”. A romancista e ensaísta diz que o evento alemão pode expandir a literatura brasileira para novos mercados. “O Brasil está num momento bastante favorável aos olhos do mundo, e isso desperta o interesse das pessoas para a nossa cultura. A presença de tantos escritores e artistas na feira mostra que não somos apenas o país do futebol, das praias e do carnaval. Somos tudo isso e muito mais.”
Entre outros mineiros que marcarão presença nas discussões da Feira de Frankfurt estão os escritores Adélia Prado, Ziraldo, Ruy Castro, Fernando Morais, José Murilo de Carvalho e Affonso Romano de Sant’Anna. Há muitos anos vivendo no Rio de Janeiro, Affonso participa da mesa-redonda “Sátira canibal” com o poeta brasiliense Nicolas Behr. Também viajam para a Alemanha Nélida Piñon, Carlos Heitor Cony, Paulo Lins, Marçal Aquino, Ronaldo Correia de Brito e João Filho.
SABOR MINEIRO
Literatura à parte, Minas estará presente em outras frentes em Frankfurt. O cineasta Helvécio Marins Jr. vai exibir o longa-metragem Girimunho, codirigido por Clarissa Campolina e coprodução com a Alemanha. Marins participará de debate com Peter Schultz, doutor em literatura brasileira. Na área de gastronomia, Maria Coeli Simões Pires vai falar sobre a produção de queijo artesanal no Brasil, sobretudo na região do Serro mineiro, onde nasceu. O chef Eduardo Avelar ministrará palestra sobre a cozinha terroir (expressão criada para classificar pratos típicos microrregionais, de territórios específicos), com suas influências indígenas e de imigrantes. O chef Ivo Faria vai falar sobre a cozinha do cerrado e das tradições culinárias de Minas. A comitiva do estado conta também com os chefs Antonio Basile e Ari Kespers.
Três perguntas para...
Lúcia Riff - agente literária
1 - O que a Feira de Frankfurt pode significar para a literatura brasileira?
Desde que é feito o anúncio do homenageado, como é o caso do Brasil, muitas editoras começam a se mobilizar e a procurar títulos daquele país. Então, há aumento de contratos de autores dos países homenageados. Não se pode perder essa oportunidade. O que se espera não são contratos pontuais, mas o início de um processo. Ou seja: mais e mais contratos no futuro. E mais interesse por nossa literatura por parte da Alemanha e do resto do mundo.
2 - O que a feira representa para os autores?
Todos os convidados estão muito felizes. O saldo será altamente positivo e vamos todos aproveitar muito, mesmo que possamos, aqui ou ali, sofrer um pouco com a exaustão ou as dificuldades naturais de um evento como esse.
3 - Qual é a receptividade à literatura brasileira no exterior?
Não vamos nos iludir, achando que todas as portas estão abertas, porque não é bem assim. Há um interesse, sim, isso é fato. Mas como esse interesse é de parte de poucas editoras e para a publicação de um ou de dois livros por ano, no máximo, nosso caminho até o contrato não é dos mais fáceis. De todo modo, a situação está infinitamente melhor, sobretudo por conta da bolsa de tradução concedida pela Biblioteca Nacional.
EM 2012
88,2 milhões
de brasileiros leram pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa
469,5 milhões
de livros vendidos no país
R$ 4,8 bilhões
faturamento do setor no Brasil
58 mil
títulos lançados
9%
participação de e-books no mercado nacional
. Fonte: Retratos da leitura no Brasil/Governo Federal
“O governo brasileiro tem reconhecido a
importância dos quadrinhos como processo de alfabetização e difusão de
conteúdos didáticos e literários. A prova está no convite para irmos a
Frankfurt” - Marcelo Lélis, ilustrador
“Não somos apenas o país do futebol, das praias e do carnaval. Somos tudo isso e muito mais” - Maria Esther Maciel, escritora
Carlos Herculano Lopes
Estdo de Minas: 05/10/2013
Feira do Livro de Frankfurt funcionará como vitrine da literatura brasileira e oportunidade de negócios para as editoras |
A partir de quarta-feira, a cidade de Frankfurt, na Alemanha, estará vestida de verde e amarelo. O motivo é dos mais nobres, com direito de ser comemorado: até dia 13, o Brasil será o país homenageado na famosa feira do livro da cidade, uma das mais importantes do mundo. O evento, além de seu charme, será oportunidade de realização de negócios que envolverão alguns milhões de euros, centenas de editoras, escritores e agentes literários de 111 países confirmados, além de outros segmentos culturais.
O estande brasileiro ocupa 700 metros quadrados e reunirá 170 expositores, enquanto o pavilhão reservado ao país terá 2,5 mil metros quadrados. A participação do Brasil foi organizada pelos ministérios da Cultura e das Relações Exteriores, Fundação Biblioteca Nacional, Fundação Nacional de Artes (Funarte) e Câmara Brasileira do Livro (CBL). Os organizadores esperam receber 300 mil visitantes.
Karine Pansa, presidente da CBL, afirma que as expectativas comerciais são excelentes. “O Brasil, até então comprador de direitos autorais, passa a vendê-los no exterior”, avalia. Mas não apenas a literatura brasileira, representada por 70 autores de diversos estados, dará tom especial à festa. Para aguçar ainda mais o interesse dos alemães e visitantes de outros países, haverá festivais gastronômicos com a presença de chefs do país, além de shows, exibição de filmes e peças de teatro. A programação começou em 23 de agosto, com apresentação do rapper paulista Criolo. Desde setembro, o projeto Street-art Brazil colore as ruas de Frankfurt. Doze brasileiros apresentam grafites na fachada do Museu Schirn Kunsthalle, de um banco, pontes e quartel de polícia.
A ministra da Cultura, Marta Suplicy, participará da abertura oficial da feira. “Esta é uma extraordinária oportunidade para o Brasil fortalecer sua imagem cultural e literária na Europa”, afirma ela. Na solenidade, como representantes dos escritores falarão os romancistas Luiz Ruffato, mineiro de Cataguases, e a carioca Ana Maria Machado, presidente da Academia Brasileira de Letras.
Renato Lessa, presidente da Fundação Biblioteca Nacional, diz que a escolha dos participantes não foi fácil e contemplou, entre outros critérios, autores com obras traduzidas no exterior. “A seleção representa a criação literária brasileira sem qualquer estereótipo, mas destacando o domínio criativo”, diz ele.
A presença mineira será representativa em Frankfurt e inclui também nomes ligados às áreas de gastronomia, dança, cinema e música. No dia seguinte à abertura, na companhia de Marina Colasanti, será a vez de a belo-horizontina Angela-Lago dar o seu recado na palestra “Lirismo e ironia”. Autora de dezenas de livros dedicados ao público infantojuvenil, ela planeja manter contatos com leitores e educadores alemães. “Espero que os ouvintes gostem da nossa conversa. Vou adorar conhecer bibliotecas e as crianças. Quero ver também o que há de novo na área de e-books e aplicativos para meninos e meninas que estão aprendendo a ler.”
Quadrinhos Outro que também viajou para a Alemanha foi o desenhista Marcelo Lélis, ilustrador do Estado de Minas. Sexta-feira, ele participa da mesa “Brasil e sua cena de quadrinhos” ao lado de Fernando Gonzales e Lourenço Mutarelli. Lélis destaca a valorização dos quadrinhos pelos organizadores do evento, lembrando que essa arte, há pouco tempo, sofria forte discriminação por parte dos educadores. “Felizmente, vivemos outro momento. Até mesmo o governo brasileiro tem reconhecido a importância das histórias em quadrinhos como processo de alfabetização e difusão de conteúdos didáticos e literários. A prova está no convite para irmos a Frankfurt”, comemora. Na mala de Lélis seguirão também algumas tintas, pincéis e papéis para que ele possa desenhar o país anfitrião.
Para a escritora Maria Esther Maciel, professora de literatura brasileira na UFMG e cronista do EM, participar da Feira de Frankfurt é estimulante “e até um pouco assustador”. A romancista e ensaísta diz que o evento alemão pode expandir a literatura brasileira para novos mercados. “O Brasil está num momento bastante favorável aos olhos do mundo, e isso desperta o interesse das pessoas para a nossa cultura. A presença de tantos escritores e artistas na feira mostra que não somos apenas o país do futebol, das praias e do carnaval. Somos tudo isso e muito mais.”
Entre outros mineiros que marcarão presença nas discussões da Feira de Frankfurt estão os escritores Adélia Prado, Ziraldo, Ruy Castro, Fernando Morais, José Murilo de Carvalho e Affonso Romano de Sant’Anna. Há muitos anos vivendo no Rio de Janeiro, Affonso participa da mesa-redonda “Sátira canibal” com o poeta brasiliense Nicolas Behr. Também viajam para a Alemanha Nélida Piñon, Carlos Heitor Cony, Paulo Lins, Marçal Aquino, Ronaldo Correia de Brito e João Filho.
Grafite do paulista Alexandre Orion nas ruas de Frankfurt anuncia a presença brasileira no evento literário |
SABOR MINEIRO
Literatura à parte, Minas estará presente em outras frentes em Frankfurt. O cineasta Helvécio Marins Jr. vai exibir o longa-metragem Girimunho, codirigido por Clarissa Campolina e coprodução com a Alemanha. Marins participará de debate com Peter Schultz, doutor em literatura brasileira. Na área de gastronomia, Maria Coeli Simões Pires vai falar sobre a produção de queijo artesanal no Brasil, sobretudo na região do Serro mineiro, onde nasceu. O chef Eduardo Avelar ministrará palestra sobre a cozinha terroir (expressão criada para classificar pratos típicos microrregionais, de territórios específicos), com suas influências indígenas e de imigrantes. O chef Ivo Faria vai falar sobre a cozinha do cerrado e das tradições culinárias de Minas. A comitiva do estado conta também com os chefs Antonio Basile e Ari Kespers.
Três perguntas para...
Lúcia Riff - agente literária
1 - O que a Feira de Frankfurt pode significar para a literatura brasileira?
Desde que é feito o anúncio do homenageado, como é o caso do Brasil, muitas editoras começam a se mobilizar e a procurar títulos daquele país. Então, há aumento de contratos de autores dos países homenageados. Não se pode perder essa oportunidade. O que se espera não são contratos pontuais, mas o início de um processo. Ou seja: mais e mais contratos no futuro. E mais interesse por nossa literatura por parte da Alemanha e do resto do mundo.
2 - O que a feira representa para os autores?
Todos os convidados estão muito felizes. O saldo será altamente positivo e vamos todos aproveitar muito, mesmo que possamos, aqui ou ali, sofrer um pouco com a exaustão ou as dificuldades naturais de um evento como esse.
3 - Qual é a receptividade à literatura brasileira no exterior?
Não vamos nos iludir, achando que todas as portas estão abertas, porque não é bem assim. Há um interesse, sim, isso é fato. Mas como esse interesse é de parte de poucas editoras e para a publicação de um ou de dois livros por ano, no máximo, nosso caminho até o contrato não é dos mais fáceis. De todo modo, a situação está infinitamente melhor, sobretudo por conta da bolsa de tradução concedida pela Biblioteca Nacional.
EM 2012
88,2 milhões
de brasileiros leram pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa
469,5 milhões
de livros vendidos no país
R$ 4,8 bilhões
faturamento do setor no Brasil
58 mil
títulos lançados
9%
participação de e-books no mercado nacional
. Fonte: Retratos da leitura no Brasil/Governo Federal
“Não somos apenas o país do futebol, das praias e do carnaval. Somos tudo isso e muito mais” - Maria Esther Maciel, escritora
ARNALDO VIANA » Germinar ou geminar, eis a questão
Estado de Minas: 05/10/2013
Dou outro lado da linha, a suave voz feminina:
– Imobiliária, bom-dia!
– Bom-dia!
– Em que posso estar ajudando, senhor?
– Vi no Centro da cidade uma faixa de vocês anunciando uma casa germinada em bairro da Região Oeste. Estou certo?
– Certo, senhor! São casas de dois quartos, sala, banheiro e cozinha. O senhor gostaria de estar nos visitando, de ver o imóvel?
– Talvez! É, então, uma casa germinada, como vocês dizem?
– Com certeza!
– Interessante. Gostaria, como a senhorita diz, de estar conhecendo esse fenômeno. Suponho que vocês prepararam o terreno e plantaram a casa. Foi assim?
– Com certeza, senhor. Todo imóvel nasce de uma planta feita por arquiteto e aprovada por engenheiro.
– Nesse caso não, certo? Vocês pegaram semente da planta, enterraram, regaram e a casa germinou, cresceu forte e sadia!
– Muito engraçado, senhor. Nada disso. O imóvel foi construído por pedreiros, serventes, mestre de obras, eletricista, bombeiro, pintor…
– Com tijolo, cimento, madeira, pedras?
– Isso mesmo, senhor, com material de primeira, inclusive o hidráulico, para oferecer aos clientes um imóvel de qualidade. É uma das prioridades de nossa empresa.
– Por que casa germinada, como vocês dizem no anúncio?
– São casas construídas parede com parede. Reduz o custo e o preço final para o cliente. Mas pode ter a certeza de que o isolamento é total.
– Então, o som de uma moradia não passa para a outra?
– Claro que não. O senhor poderá estar verificando se nos visitar.
– Então, isso é que é uma casa germinada, ligada a outra, como irmãs siamesas. Estou certo?
– Como, senhor? Não entendi. Repita, por favor.
– Como irmãs siamesas…
– Não entendi, senhor. Mas isso não importa. O senhor vai estar nos visitando?
– Primeiro, preciso entender esse negócio de germinada. Acreditava que duas casas ligadas, com desenhos iguais, seriam gêmeas. E nesse caso específico, cultivadas, pedra por pedra, tijolo por tijolo, telha por telha.
– E são gêmeas, senhor, daí a expressão: germinada.
– Obrigado, senhorita. Vou geminar a ideia de conhecer o imóvel e volto a ligar. Ou seria germinar a ideia? Ganhei mais uma dúvida.
– Nós é que estamos agradecendo, senhor. E aguardamos a visita.
Em tempo: E o Cine Brasil, hein? Antiga tela de emocionantes westerns e de épicos empolgantes, a casa art déco está de volta com propostas interessantes. Oba!!! Memória resgatada e preservada. Parabéns.
>> arnaldoviana.mg@diariosassociados.com.br
– Imobiliária, bom-dia!
– Bom-dia!
– Em que posso estar ajudando, senhor?
– Vi no Centro da cidade uma faixa de vocês anunciando uma casa germinada em bairro da Região Oeste. Estou certo?
– Certo, senhor! São casas de dois quartos, sala, banheiro e cozinha. O senhor gostaria de estar nos visitando, de ver o imóvel?
– Talvez! É, então, uma casa germinada, como vocês dizem?
– Com certeza!
– Interessante. Gostaria, como a senhorita diz, de estar conhecendo esse fenômeno. Suponho que vocês prepararam o terreno e plantaram a casa. Foi assim?
– Com certeza, senhor. Todo imóvel nasce de uma planta feita por arquiteto e aprovada por engenheiro.
– Nesse caso não, certo? Vocês pegaram semente da planta, enterraram, regaram e a casa germinou, cresceu forte e sadia!
– Muito engraçado, senhor. Nada disso. O imóvel foi construído por pedreiros, serventes, mestre de obras, eletricista, bombeiro, pintor…
– Com tijolo, cimento, madeira, pedras?
– Isso mesmo, senhor, com material de primeira, inclusive o hidráulico, para oferecer aos clientes um imóvel de qualidade. É uma das prioridades de nossa empresa.
– Por que casa germinada, como vocês dizem no anúncio?
– São casas construídas parede com parede. Reduz o custo e o preço final para o cliente. Mas pode ter a certeza de que o isolamento é total.
– Então, o som de uma moradia não passa para a outra?
– Claro que não. O senhor poderá estar verificando se nos visitar.
– Então, isso é que é uma casa germinada, ligada a outra, como irmãs siamesas. Estou certo?
– Como, senhor? Não entendi. Repita, por favor.
– Como irmãs siamesas…
– Não entendi, senhor. Mas isso não importa. O senhor vai estar nos visitando?
– Primeiro, preciso entender esse negócio de germinada. Acreditava que duas casas ligadas, com desenhos iguais, seriam gêmeas. E nesse caso específico, cultivadas, pedra por pedra, tijolo por tijolo, telha por telha.
– E são gêmeas, senhor, daí a expressão: germinada.
– Obrigado, senhorita. Vou geminar a ideia de conhecer o imóvel e volto a ligar. Ou seria germinar a ideia? Ganhei mais uma dúvida.
– Nós é que estamos agradecendo, senhor. E aguardamos a visita.
Em tempo: E o Cine Brasil, hein? Antiga tela de emocionantes westerns e de épicos empolgantes, a casa art déco está de volta com propostas interessantes. Oba!!! Memória resgatada e preservada. Parabéns.
>> arnaldoviana.mg@diariosassociados.com.br
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