domingo, 8 de setembro de 2013

Cidadezinha qualquer - Carlos Drummond de Andrade

Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Êta vida besta, meu Deus.

(Alguma poesia in Reunião, 1982)

40 anos depois, o Chile canta Victor Jara - DORRIT HARAZIM


O GLOBO - 08/09/2013

Passaram-se quarenta anos.
Duas novas gerações de chilenos
sequer eram nascidas
quando o dia se fez noite na
manhã do 11 de setembro de 1973 e a
ditadura se instalou no país por 17
anos. Mas, na próxima quarta-feira,
40º aniversário do golpe militar que
desapareceu com 2.300 opositores e
torturou perto de 40 mil, o Chile vai
relembrar.

A cada efeméride tem sido assim. E
nas datas redondas como a deste ano
o passado se aviva mais.

Em Deltona, cidade situada ao sul
de Daytona Beach, no estado da Flórida,
um vendedor de automóveis
americano de 64 anos preferiria permanecer
à margem dessas lembranças.

Ele se chama Pedro Pablo Barrientos,
tinha 24 anos e era tenente do
Exército chileno em 1973. Mudou-se
em 1989 para os Estados Unidos, onde
tratou de adquirir nova cidadania.
Esta semana, a família do músico Victor
Jara entrou com um processo contra
ele numa corte distrital de Jacksonville.
Acusa-o de ter torturado Jara
pessoalmente e sido o autor do primeiro
dos 44 tiros que vararam o corpo
do cantor popular depois de preso.

A ação foi encaminhada em nome
da viúva e de suas duas filhas pelo
Centro de Justiça e Responsabilidade,
de São Francisco, baseada na Lei de
Proteção a Vítimas de Torturas. Sancionada
em 1991, essa legislação federal
permite que cidadãos residentes
nos Estados Unidos sejam processados
em território americano quando
suspeitos de violações de direitos humanos
em outros países.

Pela primeira vez este que é um dos
episódios mais encruados do 11 de
setembro chileno parece ter uma real
chance de ser esclarecido.
Na semana inicial do golpe todos os
boatos eram críveis, por inverificáveis.
A nova ordem militar de Augusto
Pinochet havia cortado boa parte das
linhas telefônicas na capital, e o toque
de recolher era draconiano, impedindo
que uns soubessem com certeza
da sorte dos outros.

No caso de Victor Jara, soube-se apenas
que fora preso junto com uma centena
de estudantes e professores da
Universidade Técnica Estadual e que,
cinco dias depois, a bailarina inglesa
Joan Turner Jara fizera o reconhecimento
do corpo do marido no necrotério
municipal. Sepultou-o sozinha, no
Cemitério Geral de Santiago, com a
ajuda do motorista do rabecão.

O venerado Jara era a voz do Chile
socialista de Salvador Allende. Cancioneiro
e poeta, compositor popular,
professor e ativista político, além de
dramaturgo e apaixonado pelas raízes
folclóricas da Nueva Canción Chilena,
era um letrista engajado e autor
de músicas que arrebatavam a classe
operária (“Te Recuerda Amanda”).
E esta voz tinha sido eliminada. As
primeiras falsas certezas asseguravam
que ele fora levado para o Estádio
Nacional onde lhe teriam decepado
as mãos de músico antes de executá-
lo, como ocorrera com Che Guevara
após sua captura na Bolívia — só
que Guevara já estava morto ao ser
mutilado.

Na verdade, Victor Jara sequer conseguiu
chegar ao Estádio Nacional.
Morreu numa arena menor. No centro
de detenção improvisado do Estádio
Chile foi logo identificado por um oficial
e teve uma primeira avalanche de
chutes e coronhadas à vista de todos.
Com várias costelas quebradas e um
olho inutilizado, permaneceu imóvel
24 horas ao alcance da bota militar,
sem alimento ou água. Naquele mesmo
estádio, quatro anos antes, fora
aclamado vencedor do primeiro Festival
da Nueva Canción Chilena com
“Oração de um trabalhador”.

No domingo dia 16 circulara a notícia
de que alguns detentos seriam libertados,
o que levou os demais a escrever
mensagens para esposas, filhos,
pais, amigos. Victor Jara foi um
dos mais ansiosos. Só parou ao ser arrastado
por dois soldados até uma saleta
de transmissão do estádio. Mas
conseguiu deixar para trás as duas folhas
de papel que escreveu, rapidamente
escondidas pelo advogado Boris
Navia.

Não eram cartas para a mulher nem
para as filhas. Era um poema. Não tinha
título. Descrevia o ambiente à
sua volta. Foi-lhe dado, post mortem,
o título “Estadio Chile”.
Os detentos fizeram duas cópias,
entregues a um estudante e um médico
que seriam libertados. Um deles
foi revistado. Navia, que escondera o
manuscrito original numa fenda
aberta na sola do sapato, foi levado
para o centro de torturas do velódromo.
Mas a terceira cópia alçou voo e
correu mundo.

A última visão que Navia e seus
companheiros tiveram de Jara foi do
seu espancamento a golpes de fuzil
na saleta do estádio. No final da mesma
tarde, cruzaram o saguão principal
para serem transferidos para o Estádio
Nacional. Ali se depararam com
cerca de 50 cadáveres espalhados pelo
chão. Entre eles, o de Victor Jara.
Foi somente em 2009 que a investigação
conduzida pelo juiz Miguel
Vásquez conseguiu chegar ao nome
do homem que teria apertado o gatilho
do primeiro tiro contra a nuca do
prisioneiro. Depois, o oficial teria ordenado
aos soldados presentes que
prosseguissem com a fuzilaria. Embora
Pedro Barrientos negue jamais
ter sequer cruzado com o músico, a
família Jara espera que o Supremo
Tribunal chileno encaminhe o aguardado
pedido de extradição aos Estados
Unidos.

Se Barrientos algum dia retornar,
talvez se pergunte para que serviu
tanta brutalidade. O Estádio Chile foi
rebatizado de Estádio Victor Jara. As
fitas máster das gravações do músico
que a ditadura se empenhou em destruir
foram laboriosamente substituídas
por outras versões. Brotaram remixagens,
remasterizações, foi lançada
uma caixa com 9 CDs, republicada
uma antologia com seus poemas.
Bandas jovens o interpretam como
um dos seus, companheiros velhos o
cantam como no passado. Hoje, Victor
Jara teria 81 anos.

Dorrit Harazim é jornalista

MARTHA MEDEIROS - Trocas íntimas entre estranhos

ZERO HORA - 08/09/2013

Alguns poucos leitores às vezes me confundem com conselheira sentimental e me revelam seus conflitos internos, acreditando que eu possa apontar um caminho para que eles vivam melhor. Logo eu! Escrevo sobre assuntos que me interessam e, se servirem para alguém, é uma honra, mas não me sinto à vontade e nem tenho preparo para entrar na intimidade de cada leitor em particular já me atrapalho o suficiente comigo mesma.

Mas já que todos gostam de conselhos, eu inclusive, uma dica posso dar: leia o livro Pequenas Delicadezas, de Cheryl Strayed.

Já falei dessa autora antes. Foi ela que percorreu sozinha uma trilha nos Estados Unidos e narrou a experiência no aclamado Livre, que frequentou a lista dos best-sellers. Eu nem imaginava que ela escrevia uma coluna de aconselhamentos. Pois me tornei fã declarada dessa mulher.

Pequenas Delicadezas é uma seleção de perguntas e respostas publicadas no site The Rumpus, mas de forma alguma é literatura de bisbilhotice, aquela coisa de olhar pelo buraco da fechadura dos dramas alheios, o que tantas vezes revela-se piegas.

Cada carta gera um ensaio em que Cheryl conta experiências próprias para ilustrar seu pensamento sobre as questões levantadas. Esbanjando sensatez (coisa que não anda sobrando por aí), ela equaliza causas e efeitos com docilidade, mas sem abusar do bom mocismo e sem encontrar solução para tudo.

Ao contrário, ela reconhece que a vida é bem sacana às vezes. Nossos pais nem sempre foram uns anjos, nossa infância “feliz” pode ter sido uma farsa e a maneira como estamos narrando nossa história para nós mesmos pode estar cheia de ficções que já não conseguimos sustentar. Dá para mudar o passado? Não dá. A única coisa que dá para mudar é a maneira como enxergamos tudo o que nos aconteceu (e ainda acontece) e ver o que é possível perdoar, esquecer ou redimensionar.

É comum considerar o escritor como uma espécie de guru – parece que ele é imune a problemas. Cheryl se atreve no papel e se dá como exemplo justamente porque sua vida não foi um passeio de carrossel.

Porém, ela encontrou suas ferramentas de superação – a própria coluna deve ser uma delas. Sem constrangimento e com absoluta empatia, envolve-se com a dor de quem lhe escreve, mesmo suspeitando que todos sabem direitinho o que devem fazer de suas vidas, só estão aguardando que alguém, mesmo um desconhecido, lhes dê uma espécie de licença. “Se é por falta de licença, sinta-se autorizado”, é o que ela parece dizer.

Pequenas Delicadezas não explora as churumelas do amor nem pretende ser um oráculo. Apenas confirma que viver não é fácil, mas é o que temos pra hoje.

AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA » Voltando a Tiradentes‏


Estado de Minas: 08/09/2013 


–Você sabe o que é uma biela?

Pois lá ia eu a Tiradentes, creio que em 1962 (já havia biela naquele tempo). Se você olhar na internet vai descobrir que biela é toda peça de uma máquina “que serve para transmitir ou transformar o movimento retilíneo alternativo em circular contínuo”. Entendeu? Mas o fato é que lá íamos nós: Ivan Ângelo, Maria Ângela, Fernando Gabeira e Marília, Frederico de Morais e Vilma, eu e Nena, lá íamos, com mais uns amigos e vários carros, a Tiradentes. Nada era asfaltado, creio que levamos umas cinco ou seis horas…

E o pior: houve o episódio da biela, relatado também por Gabeira na sua autobiografia. Saindo de BH, minha Vemaguete parou. De repente. Um chofer de caminhão veio ajudar e afirmou categórico: “É a biela!”. E foi embora. Desolado, 15 minutos depois tentei religar o carro. Não era a biela. O carro simplesmente estava afogado.

Voltei uma vez mais a Tiradentes nesta semana. Dizem que tem 6 mil habitantes e 30 mil visitantes no Festival Gastronômico. No tempo da biela, as portas e janelas estavam todas fechadas, não havia vivalma nas ruas. Só fantasmas. Juro que cruzei com a alma de Tiradentes com uma corda no pescoço.

Agora, Tiradentes é só festa. Fui parar lá por obra e graça de amigos que acreditam na música e poesia. A culpa é de Luciana e Carlos Perktold – ela paisagista e decoradora, ele psicanalista e colecionador de obras de arte. Outra culpada é Zenilca Navarro, do Tragaluz, nossas mães já eram amigas. Há tempos me surpreendi sabendo que Zenilca cuidava da divulgação do grupo Corpo e agora, nova surpresa ao ver o esplêndido restaurante que ela (e sua parentela) montou em Tiradentes.

E tem a Elisa Freixo. Na hora que cheguei a Tiradentes ela dava um concerto de órgão na Matriz de Santo Antônio. Aquele ciclópico instrumento, com seus 680 tubos, que veio da Europa para as montanhas de Minas ainda no século 18. A essas horas, Elisa está na Alemanha com um grupo de felizardos, percorrendo uma vez mais os caminhos de Bach, com outro organista, o belga Jean Ferrard. Pois a Elisa, essa paulista que pousou em Minas por amor ao barroco e aos órgãos, achou que seria interessante que fizéssemos um concerto de cravo e poesia. Assim, ela dava uma no cravo… e eu na ferradura. Já havíamos feito umas experiências desconcertantes na Serra do Cipó e no Museu do Oratório, em Ouro Preto.

Há muito tento me acercar da música, mas quem sou eu, sem ouvido absoluto, absolutamente inepto para instrumentos musicais. Vou revelar: um dia, tentando aprender violão, a professora me disse assustada: “Engraçado, você está fazendo tudo certo, só que ao contrário…”.

Desisti dos instrumentos, apesar de ter cantado no inesquecível Madrigal Renascentista e ter feito uma ou outra música com Fagner, Martinho da Vila e Rildo Hora.

Estar em Minas. Na Minas profunda. Ser em Minas. Visitar o futuro Museu de Sant’Ana, que a industriosa Ângela Gutierrez logrou levar para Tiradentes. Ali era uma cadeia para homens e mulheres. Agora, vai reinar Sant’Ana, a avó de Jesus. Como dizia aquela música que o Simão Lacerda cantava:

“Sant’Ana é a maior santa que tenho visto,

Sant’Ana é a mãe de Deus,

Sant’Ana é a vó de Cristo!”.

E, de repente, estamos no jardim do Tragaluz ouvindo música e poesia. E quando me falaram de certas dificuldades encontradas para levar a arte a Tiradentes, estando num jardim, lembrei-me de um poeminha, tipo hai-k
ai, que expressa muitas coisas. A vida é cheia de bielas e, no entanto, temos que viajar. E lá vai o poeminha:

 “Meu conceito de jardim
determina
o que é praga ao redor de mim”.

Tv Paga


estado de Minas: 08/09/2013 


 (Cleones Ribeiro/Divulgação)

Dose dupla
De pedra a vidraça, Marina Person (foto) vai se colocar nos dois extremos da relação entrevistado-entrevistador hoje no Canal Brasil. Para começar, às 21h, ela participa do programa No divã do dr. Kurtzman, falando de seus “multifacetados trabalhos”. Já às 21h30, Marina recebe Daniel de Oliveira em O papel da vida.

Dançando
No SescTV, a série Dança contemporânea continua mostrando as companhias que participaram da edição 2013 da Bienal Sesc de Dança, em Santos. O espetáculo da vez é Hot 100 – The hot one hundred choreographers, com o bailarino Cristian Duarte, às 23h.

Sambando
O +Globosat exibe hoje, às 20h30, o documentário inédito O samba que mora em mim, gravado na quadra da Estação Primeira de Mangueira, no Rio de Janeiro. O ponto de partida é o reencontro da diretora Georgia Guerra-Peixe com sua própria história.


Enlatados
Publicação: 08/09/2013 04:00

Fim anunciado
Ainda que a sexta temporada, concluída há pouco, tenha tido alguns bons momentos, True blood já teve momentos melhores. Então, o anúncio da HBO de que a sétima temporada será a última não pegou ninguém de surpresa. Serão 10 episódios a partir de junho de 2014. Inspirado na série de livros Sookie Stackhouse, de Charlaine Harris, True blood foi lançada em 2008. Na época, com a onda vampiresca ganhando nova vida graças aos romances açucarados da tetralogia Crepúsculo, o público adulto, ávido por histórias mais apimentadas, fez a festa com a turma de vampiros, lobisomens e metamorfos. A série de livros também chegou ao fim: ao todo, foram 13 volumes.

Renovações – Já a HBO Latin America anunciou que O negócio, produção brasileira que estreou há pouco, teve sua segunda temporada confirmada para 2014. As gravações da história de três garotas de programa que investem no marketing para continuar no mercado começam este ano. A HBO confirmou também o terceiro ano de The newsroom. E quem garante é seu protagonista, o ator Jeff Daniels.

Atrás das câmeras – Depois de dirigir um episódio de Orange is the new black, ótima comédia da Netflix, Jodie Foster vai ser a diretora de um dos 13 capítulos da segunda temporada de House of cards, a grande estrela das produções do site de streaming, protagonizada por Kevin Spacey, sobre os bastidores de Washington.

Anel de fogo – Conhecido como o par de Jennifer Garner em Alias, Michael Vartan volta à TV na microssérie Ring of fire, que estreia sábado, às 20h, no A&E. Ele é o geólogo Mathew Cooper, contratado por petrolífera que faz perfurações ilegais. Após uma série de tremores, ele descobre que a região pode ser o centro de uma enorme erupção vulcânica que poderá destruir a Terra. No elenco também está Terry O’Quinn, de Lost. 

Novos tempos, novas artes - Sérgio Rodrigo Reis


Novos tempos, novas artes 

Incorporação de novas áreas no âmbito das leis de incentivo à cultura abre discussão no setor. Gastronomia, moda, design e jogos eletrônicos, entre outros, diluem as fronteiras tradicionais 

Sérgio Rodrigo Reis

Estado de Minas: 08/09/2013 


A aprovação pelo Ministério da Cultura de projetos de estilistas famosos, permitindo captação de recursos da lei federal de incentivo para promover desfiles em Paris, trouxe à cena discussões antigas, porém urgentes. Se até há pouco tempo o apoio do poder público se limitava às formas tradicionais de arte, como o cinema, música, teatro, artes plásticas e patrimônio, com as fronteiras do processo criativo cada vez mais tênues, os representantes de segmentos como a própria moda, o design, as artes digitais e a gastronomia passaram a lutar por oportunidades semelhantes. As recentes ações de inserção dessas áreas de fronteira, a despeito das polêmicas, trazem um debate necessário em relação às manifestações estéticas fora das áreas convencionalmente consolidadas. A hora parece ser de mudança.

O sociólogo Carlos Alberto Dória, autor do blog especializado em gastronomia e-Boca Livre, acha o conceito de cultura, conforme definido pelo Estado brasileiro, inclusive na Constituição Federal, anacrônico e incapaz de representar como a sociedade vê, hoje, essa esfera da vida social. Para ele, mesmo os argumentos da ministra da Cultura, Marta Suplicy, para acolher a moda nessa rubrica dos gastos públicos são anacrônicos. “Advogo um debate amplo, com participação de intelectuais e da universidade, para rever os limites legais. O Chile fez, há décadas, um esforço para estabelecer uma cartografia cultural, consultando inclusive a população para indicar o que é cultura. Os resultados foram surpreendentes. No Brasil, parece que só o ‘povo da cultura’ se preocupa com isso, pois diz respeito aos seus próprios rendimentos”, aponta.

As discussões sobre as dificuldades de inserção de outros segmentos da produção cultural nos mecanismos de fomento começam a adquirir proporção mais ampla em vários setores da sociedade. A universidade é exemplo, sobretudo quando se pensa em cursos que tentam abarcar manifestações como os jogos digitais. O professor do curso de cinema de animação e artes digitais da UFMG, Chico Marinho, acha necessário o debate. “Ainda falta uma discussão mais aberta. O caminho imaginado pelos ex-ministros da Cultura Gilberto Gil e, em seguida, Juca Ferreira, com a inclusão na pauta de outras formas de manifestações, trouxer desenvolvimento enorme e precisa ser retomado.” O professor tem consciência de que a discussão não é só do governo, mas de todos. “É simplista imaginar que é só problema do Ministério da Cultura. É um assunto presente no Brasil e em todo o mundo.”

Antes da discussão sobre políticas públicas para a área do design, Gustavo Greco acha necessário um amplo debate a ser feito sobre a própria disciplina em questão. “Acredito ser longo o caminho para que possa responder com certeza se o design está representado pelas políticas públicas, embora o governo procure, gradativamente, um entendimento sobre a importância e a participação na cultura e economia, abrindo espaço sempre que procurado.” Para ele, a sociedade brasileira tem pouco entendimento de que a sua atividade perdura aqui por mais de dois séculos, influenciando não só uma construção visual, mas uma percepção do uso e utilidade dos produtos. “O design encontra na cultura ingredientes para a sua atuação, influencia e é influenciado por uma construção coletiva. Mas o mais importante é que esteja no ambiente dos negócios, no qual ele é capaz de gerar valor, resultados, autonomia e desenvolvimento.”

Fomento federal

A demanda pela inclusão de segmentos considerados transversais é uma questão antiga no Ministério da Cultura. Existe desde 2010, quando ocorreu a apresentação do projeto de lei do Procultura. Abriu-se então a possibilidade do recebimento de propostas que efetivamente tratassem em seu objeto desses outros segmentos. Hoje há assentos desses setores nos colegiados, que são instrumentos de discussão das principais pautas das áreas técnico-artísticas (arte digital, moda, artesanato e design) e de patrimônio cultural do país na Comissão Nacional de Política Cultural.

Apesar disso, o tema é controverso até dentro do próprio governo. Prova é a recente decisão da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura de não liberar a autorização de estilistas brasileiros de captar recursos via Lei Rouanet para a produção de desfiles. A ministra, contrariando a decisão colegiada, deu parecer favorável concedendo a possibilidade de empresas financiarem apresentações na passarela, via renúncia fiscal, aos estilistas Alexandre Herchcovitch (R$ 2,6 milhões), Pedro Lourenço (R$ 2,8 milhões) e Ronaldo Fraga (R$ 2,1 milhões). “Os desfiles são memórias de um tempo no país e nós vemos como arte também. São milhares de fotógrafos e cinegrafistas que registram esses eventos. Isso é mídia espontânea do Brasil, num conceito positivo. Entendemos que os desfiles são exposições de arte do Brasil. Uma coleção de uma indústria não teria esse apoio. Não apoiamos a marca, apoiamos o conceito", explicou a ministra.

Estado e município

O debate em torno das fronteiras da produção cultural já provoca mudanças efetivas, inclusive, no poder público local. Em 2008, os projetos ligados à área da moda passaram a ser incluídos na Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, porém, como subgrupo da área de artes visuais, segmento do qual faz parte ainda o design artístico, design de moda, fotografia, artes gráficas e a filatelia. A situação exemplifica como o poder público tem dificuldade em compreender e absorver manifestações que não se enquadram em conceitos convencionais e ainda como são agrupados em outras áreas para justificar a liberação de captação de recursos.

A gastronomia passa por situação parecida. A Lei Estadual incluiu no último edital os projetos de gastronomia na área de preservação e restauração do patrimônio material e imaterial, no qual estão presentes ainda os segmentos arquitetônico, paisagístico, arqueológico, folclore e artesanato. O superintendente de fomento e incentivo à cultura, Felipe Amado Leite, diz que, só depois do resultado do edital, previsto para dezembro, será possível mensurar ações na área da gastronomia. Já em relação à moda e ao design, informa que as duas áreas não são representativas, tanto em termos de valor monetário quanto referente à captação. “O mecanismo de incentivo a estas áreas está disponível para a sociedade mineira, estando então a seu critério a decisão de utilizá-lo”, explica superintendente.

O debate na Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, sobretudo relacionado às políticas públicas, também já tem história e começa a produzir resultados. “A inclusão no Plano Municipal de Cultura dos jogos digitais e a recente abertura do Centro de Referência da Moda são resultados desse debate, mas ainda é preciso implementar mais ações de fomento”, salienta o presidente da fundação, Leônidas Oliveira. Antes disso, o gestor considera necessário buscar um equilíbrio conceitual do fomento, centrado por um lado na preservação dos modos de fazer constitutivos da memória e, por outro, no avanço próprio do tempo, do entendimento e atendimento à contemporaneidade. “Cabem várias e sérias reflexões que não podem entrar na lógica pura e simples do mercado, mas da economia criativa como forma de sustentabilidade”, salienta Leônidas.


"No Brasil, parece que só o ‘povo da cultura’ se preocupa com isso, pois diz respeito aos seus próprios rendimentos"

. Carlos Alberto Dória, sociólogo


"É simplista imaginar que é só problema do Ministério da Cultura. É um assunto presente no Brasil e em todo o mundo"

. Chico Marinho, professor de cinema e artes digitais da UFMG


"O design encontra na cultura ingredientes para a sua atuação, influencia e é influenciado por uma construção coletiva"

. Gustavo Grecco, designer


"Cabem várias e sérias reflexões que não podem entrar na lógica pura e simples do mercado, mas da economia criativa"

. Leônidas Oliveira, presidente da Fundação Municipal de Cultura

Para seis cordas - Eduardo Tristão Girão


INSTRUMENTAL » Para seis cordas 

Registro em CD do projeto Violão Ibérico, que já lançou livro e vídeos, reúne mestres do instrumento do Brasil e da Espanha, entre eles Guinga, Marcus Tardelli e Toninho Horta
 

Eduardo Tristão Girão

Estado de Minas: 08/09/2013 


O compositor e violonista Guinga com o musico Marcus Tardelli: encontro de mestres do instrumento que promove a união entre Brasil e Espanha (Custódio Coimbra/Divulgação)
O compositor e violonista Guinga com o musico Marcus Tardelli: encontro de mestres do instrumento que promove a união entre Brasil e Espanha

O consistente projeto Violão Ibérico começou com o lançamento de livro homônimo no fim do ano passado, escrito pelo jornalista espanhol Carlos Galilea. A obra oferece visão histórica do instrumento, das origens europeias ao inconfundível toque brasileiro. A ideia da produtora cultural Giselle Goldoni Tiso agora dá origem a outro produto: um disco batizado com o mesmo nome e recheado com 12 faixas que registram composições e performances de alguns dos melhores violonistas brasileiros – e de um espanhol.

Certa de que repertório é o que não falta para escolher, Giselle se cercou de um conselheiro especial para auxiliá-la na dificílima tarefa de decidir o que incluir no disco. Coube a ela e a Marcello Gonçalves, um dos grandes violonistas brasileiros da atualidade, eleger os critérios que deixaram de fora nomes de peso como Villa-Lobos, Egberto Gismonti, Elomar, Garoto e Dilermando Reis. Isso para não falar em mestres da canção como Gilberto Gil, João Gilberto e João Bosco.

Essas ausências em nada diminuem a qualidade do disco, estrelado por outros grandes nomes, todos eles caracterizados (na visão de Giselle e Marcello) por fazer avançar a estética do instrumento sem abrir mão da tradição. Gente do quilate de Baden Powell, João Pernambuco, Toninho Horta, Raphael Rabello, Guinga, Marcus Tardelli e Yamandu Costa. Resumindo, um time de primeira linha.

Conjugar intérpretes e compositores foi tarefa complicada, provocando as múltiplas aparições de Baden Powell (que toca em É de lei, parceria sua com Paulo César Pinheiro, e teve Formosa, escrita com Vinicius de Moraes, gravada pelo próprio Marcello) e Guinga (também autor de duas composições, Mingus samba e Cheio de dedos, sendo que é o intérprete desta última; Marcus Tardelli toca na outra).

De Minas Mestre das sete cordas, Raphael Rabello aparece em Graúna (de João Pernambuco), enquanto Zé Paulo Becker, outro gigante do violão nacional, interpreta a clássica Feira de Mangaio (Sivuca e Glória Gadelha). Todos os demais violonistas tocam suas próprias peças, caso de Marco Pereira (Bate coxa), Yamandu Costa (El negro del blanco) e Lula Galvão (Sumaré), por exemplo.

O violão mineiro, amplamente reconhecido por sua excelência (a sofisticação harmônica é sempre lembrada), é representado por dois grandes mestres, Toninho Horta e Juarez Moreira. O primeiro comparece com a pouco conhecida Estudo brasileiro; o segundo, com uma de suas peças mais difundidas, Baião barroco.

O espanhol Vicente Amigo fecha o repertório com sua composição De mi corazón al aire, retomando, assim, a conexão ibérica do projeto. Nome de destaque do violão flamenco atual, ele estudou com Manolo Sanlúcar e começou sua carreira acompanhando cantores como Camarón de la Isla. Em 2001, conquistou o Grammy Latino de melhor álbum flamenco com Ciudad de las ideas. A peça selecionada para esta coletânea foi extraída de seu disco de estreia e demonstra sua abertura a outras influências musicais.

O som e o sentido [Ricardo Aleixo] - Walter Sebastião

O poeta Ricardo Aleixo participa este mês de festival de performance na Alemanha. Compositor e artista visual, ele defende a presença do corpo e da voz na literatura 


Walter Sebastião

Estado de Minas: 08/09/2013 


Ricardo Aleixo procura captar o que escapa à percepção imediata: %u201CFaço cartografia de inframundos%u201D   (Maria Tereza Correia/EM/D.A Press)
Ricardo Aleixo procura captar o que escapa à percepção imediata: %u201CFaço cartografia de inframundos%u201D



O mineiro Ricardo Aleixo, de 53 anos, sete livros publicados, é hoje um dos poetas mais respeitados nacionalmente. Novidade, como ele mesmo reconhece, têm sido os convites para participar de festivais internacionais de poesia. Já participou de eventos em Portugal, Argentina e Estados Unidos e, este ano, passou pelo México e Alemanha. Está de partida para mais um evento, em Berlim. “Me descobriram aqui”, brinca, contando que foram os organizadores que vieram atrás dele. E dando toda a infraestrutura para as viagens – passagem, hospedagem e honorários.

O fato, conta Ricardo, trouxe decisão de avançar trabalho com performances, acompanhando multiplicação de traduções de seus textos. “Existe no exterior uma valorização das performances poéticas”, acrescenta com alguma surpresa, mas satisfeito em ter novos horizontes para desenvolver atividade que sempre cultivou. “Estive em festivais que são absolutamente dedicados aos poetas e à poesia, que não têm nem crítico participando”, conta. “É momento novo. A poesia, finalmente, começa a conquistar espaço fora do livro e das revistas”, observa.

Ricardo Aleixo conta que com performances e criações para o espaço cênico os poetas têm vencido inclusive a incompreensão do idioma. “Quanto mais desconhecida é uma língua, mais se fica atento à linguagem, aos meios que o poeta usa. Se há a perda linguística, tem o ganho semântico. O que se vê e se ouve é a totalidade: tudo se torna significante”, afirma. Ele, por exemplo, tem se valido de respirações, cortes bruscos, alternância entre canto e fala, exploração de ritmos, timbres e cadências. Recursos que “transformam o texto em música criada a partir da escrita”, observa.

A participação nos encontros de poetas e de poesia mexeu com Ricardo Aleixo: “Meu sonho dourado é reativar projeto do Festival Internacional da Poesia, de 1998, que não passou da primeira edição”. O que aprendeu sobre poesia depois de sete livros publicados? “No livro Modelos vivos há um pequeno poema em que digo: ‘Quanta poesia/ fazia enquanto não fazia/ tanta poesia’. Compor poemas, para mim, significa um modo peculiar de me posicionar diante da vida e do mundo, embora não resolva qualquer problema prático ou conceitual. Poemas são reproposições de problemas, muito mais do que sua possível resolução”, responde.

Outras artes

 Ricardo Aleixo nasceu, vive e trabalha em Belo Horizonte. É compositor, cantor, performer, ensaísta, artista plástico. É o coordenador do Festival Internacional de Arte Negra (FAN). Publicou: Festim (1992), A roda do mundo (1996 e 2004, com Edimilson de Almeida Pereira), Quem faz o quê? (1999), Trívio (2001), A aranha Ariadne (2003), Máquina zero (2004), Céu inteiro (2008) e Modelos vivos (2010). O interesse por artes veio do ambiente familiar. A mãe, Íris, cantava; o pai, Américo Basílio, era cinéfilo e escrevia. “Ambos eram grandes leitores”, observa. Aos 11 cantou em grupo coral no colégio, além de fazer colagens e aprender rudimentos de cerâmica. “Hoje me sinto como menino que se vale de ferramentas que tinha, mas nunca usou, para criar os meus trabalhos”, observa Ricardo Aleixo.

“O que faço é cartografar inframundos, tudo que escapa à percepção imediata e aponta para realidade paralela que é o mundo físico e material da linguagem”, explica. Recorrente nos textos “talvez seja a escrita, a linguagem, a própria poesia em seu contínuo movimento de testar os limites, os possíveis da língua”, observa. “Mesmo quando tematizo questões como o desastre social e racial brasileiro, a cidade como lugar da política, o amor ou a amizade, faço-o enfatizando o peso da palavra como motor de transformações”, esclarece.

Até o fim deste ano lança dois livros, ambos de poemas: Mundo palavreado e Impossível como nunca ter tido rosto. Prepara para 2015 instalação chamada No que pensam os pés quando longe da bola. Está escrevendo livros sobre o artista plástico Jorge dos Anjos e o percussionista Djalma Corrêa. Textos do poeta podem ser lidos no endereço www.jaguadarte.blogspot.

três perguntas para...


Ricardo Aleixo
poeta

Como você avalia o interesse pelas performances poéticas?

O que se vê e ouve é o poeta falando, cantando, performando, usando recursos audiovisuais, das artes cênicas, efeitos tecnológicos, mas tendo como base o mais antigo instrumento da poesia: o corpo e a voz. A difusão em maior escala dos meios tecnológicos fez com que as pessoas ficassem muito confinadas em seus próprios ambientes, o que gerou retomada do contato direto entre as pessoas. Foi daí que viemos: somos oficiantes do rito da palavra em sua potência máxima. Homero não era para ser lido silenciosamente, mas para estar no corpo das pessoas.

Como fica a língua portuguesa no contexto dos festivais internacionais de poesia?

Falamos brasileiro, não português, que é língua muito celebrada nos festivais de poesia. Que se destaca pela musicalidade, o que cria atmosfera de celebração e troca. É língua mais conhecida do que imaginamos. Conheci, no México, jovens que tinham aprendido brasileiro para conhecer a nossa poesia, sobretudo a experimental. Todo mundo sabe da poesia concreta, Augusto de Campos é autor celebrado. O que me dizem é que o encaminhamento poético contemporâneo brasileiro é interessante por não ser tão cerebral como os programas estéticos europeus, que são quase fórmulas matemáticas.

Como foi sua formação em literatura, especialmente poesia?

Vivendo no Campo Alegre, bairro da periferia de Belo Horizonte, sem conhecer pessoalmente alguém que se dedicasse profissionalmente à literatura, me vi obrigado a montar por conta própria um programa de estudos. A intuição foi minha grande única mestra. Naqueles tempos lia, com grande voracidade, tudo, rigorosamente tudo que me caísse nas mãos, mas já sabia identificar aqueles poetas que primavam pela utilização de recursos como a exploração das camadas sonora e visual da palavra. Cheguei, por isso, com muita naturalidade à poesia concreta, com especial apreço pela obra de Augusto de Campos e às outras vanguardas, como o cubofuturismo russo, a sound poetry etc. Aprendi a chamar de mestre todo aquele que, com seu exemplo pessoal, me ajudou de algum modo a encontrar na poesia do passado pontos de contato com as questões do presente. 

Especialistas chamam a atenção para a importância da prevenção da saúde auditiva‏


Perda irreversível 

Especialistas chamam a atenção para a importância da prevenção da saúde auditiva e apontam os maiores riscos, entre eles o uso abusivo de aparelhos eletrônicos, como celulares e fones 


Lilian Monteiro


Estado de Minas: 08/09/2013 

Você tem escutado bem? Como anda sua compreensão das palavras? Assiste à TV com som no último volume? Usa fone em todo tipo de aparelho eletrônico, mas tão alto que as pessoas ao lado ouvem algum tipo de ruído? Anda grudado no celular? Cuidado, pois esses são sinais de alerta e atitudes que podem afetar sua saúde auditiva. Arthur Castilho, otorrinolaringologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp), alerta que os milhares de pessoas "conectadas todos os dias não imaginam os possíveis riscos que as ondas eletromagnéticas dos telefones celulares podem provocar à saúde".

Dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) mostram que o Brasil tem mais de 250 milhões de linhas ativas de telefonia móvel (1,3 linha por habitante), sendo o aparelho um dos grandes vilões dos problemas de audição. "Usualmente, os aparelhos celulares vêm com calibração de fábrica, que impede exposição acima de 80 ou 85 decibéis, mas os aparelhos hoje são smartphones e o usuário pode assistir a filmes ou escutar música. Nessa situação, é usado fone de ouvido, e a exposição é maior. Isso pode causar lesão da audição por exposição."

A gravidade, enfatiza Castilho, é que "esse tipo de lesão ocorre de maneira lenta e é irreversível". Ele reforça ainda que outro motivo de preocupação é o fato de o celular ser um emissor de ondas eletromagnéticas. "Teoricamente, na frequência em que o celular trabalha, não haveria lesão por esse motivo. Mas sabemos que há celulares 'piratas' que entram no país sem certificação e, possivelmente, podem lesar as células do organismo (não só as da audição). Há indícios de que isso possa estar ocorrendo." Então, se você não vive sem o celular, tente usar torpedo, o viva-voz, outras soluções para reduzir a exposição ou use mais o telefone fixo para chamadas de longa duração. Tente também trocar o aparelho de ouvido a cada 30 segundos para evitar o aquecimento da área e reduzir os riscos ao sistema auditivo.

PREVENÇÃO É MUITO IMPORTANTE

Em exames de checape, geralmente damos atenção ao coração, ao cérebro, ao pulmão, mas quase nunca nos lembramos da orelha (sim, seu nome científico é esse mesmo, e não ouvido). Ou melhor, fazemos isso apenas quando sentimos dor ou não escutamos direito. Segundo o otorrinolaringologista Márcio Fortini, diretor da Associação Médica de Minas Gerais (AMMG), não há uma idade exata para ir ao especialista pela primeira vez, mas ela deve ser norteada por indicação médica e por sintomas que sinalizam alguma doença.

"A prevenção é fundamental. Temos de fazer avaliações médicas periódicas, principalmente quando surgem sintomas clínicos importantes, tanto físico quanto emocional. É essencial acompanhar a criança desde o pré-natal, investigando doenças que podem comprometer o aparelho auditivo dela (toxoplasmose e rubéola, por exemplo) e realizando a triagem auditiva neonatal (teste que não tem valor diagnóstico para perda auditiva, mas pode ser um indicativo de problemas). E, principalmente, o acompanhamento pediátrico regular, vacinação em dia etc.", indica.

No caso dos adultos, Fortini reforça a importância de se proteger da poluição sonora, como a exposição a ruídos intensos por tempo prolongado, tanto no trabalho quanto na vida cotidiana. "É a causa mais comum de perda da audição. Esse fenômeno ocorre devido a lesão irreversível das células sensoriais, que ficam na parte interna da orelha e são as responsáveis pelo processamento do som. Uma vida saudável, com boa alimentação e atividade física regular, também ajuda na prevenção de doenças em todos os aparelhos do corpo humano."

O otorrinolaringologista destaca a necessidade de fazer o exame básico de ouvido para saber se está tudo bem com o órgão. "O exame é composto de avaliação visual e palpação da orelha, do canal auditivo externo, da região atrás da orelha, conhecida como mastoide, procurando identificar a presença de inchaços, vermelhidão, calor e dor. Outro procedimento importantíssimo é a otoscopia, que permite ver a membrana do tímpano e é essencial para diagnosticar otite, inflamação que pode ser infecciosa", acrescenta.

CERA Sobre a cera, que tanto incomoda e gera dúvidas, Márcio Fortini explica que sua presença é natural, e alerta: "A tentativa de limpeza inadequada ou o uso de medicamentos inapropriados são fatores de risco e têm de ser evitados. A avaliação médica deve ser feita com regularidade, pelo menos a cada seis meses naquelas pessoas que apresentam grande produção de cerume. A cera é composta por gorduras e enzimas, que protegem o ouvido de infecções por bactérias, fungos e outros micro-organismos. Ela impede que insetos e agentes estranhos penetrem no ouvido, protegendo o tímpano e a audição".

E ele avisa: "A cera produzida sai sozinha, não há necessidade de retirá-la. Por isso, é proibido usar cotonetes ou qualquer outro objeto, como palito, grampo e tampa de caneta". A insistência em removê-la causa sérios acidentes. "Se ela acumular e não sair sozinha, procure atendimento médico. A limpeza excessiva, o uso de cotonetes e de outros artefatos é totalmente contra-indicado e pode causar danos graves, como a perfuração do tímpano, que pode levar até a perda auditiva.

Além da cera, muitas pessoas reclamam de zumbido no ouvido. O médico explica que esse desconforto é um tipo de som geralmente formado dentro do ouvido ou do cérebro e só a pessoa consegue ouvi-lo. Ele diz que o zumbido pode ser parecido com o som de um apito, de uma cachoeira, de uma campainha, de uma cigarra cantando e muitos outros sons. A maioria é causada por problemas do próprio ouvido e quase sempre ocorre quando há perda da audição.

"Temos dentro da orelha a cóclea, que tem as chamadas células ciliadas, responsáveis pela audição. Elas recebem o som e o transformam em um tipo de onda elétrica, que é transmitida para o cérebro, onde essa onda é interpretada, o que faz a gente ouvir e entender o som. Quando as células ciliadas da cóclea estão doentes ou não funcionam bem, perdemos a audição e quase sempre escutamos um zumbido. Ele tem várias causas, que vão desde exposição a sons bem altos, inflamação dos ouvidos por otites, meningites, distúrbios metabólicos e hormonais, tumores, problemas do coração e da circulação do sangue no cérebro", acrescenta. Por isso é tão importante visitar um otorrinolaringologista preventivamente.

Teste de alerta

Este questionário, elaborado pela Laysom Aparelhos Auditivos, pressupõe que você não teve nenhuma situação traumática, doença, tenha se exposto ou tomado medicamentos ototóxicos (que afetam o sistema auditivo) que, de alguma forma, tenha causado uma perda menos natural. A situação típica para a utilidade deste teste é a perda lenta e gradativa que você suspeita que esteja ocorrendo ao longo dos anos. Responda sim ou não às seguintes perguntas:


1)
Você escuta as pessoas, mas tem dificuldade em compreender as palavras? Tenta compreender o discurso sem ouvir todas as palavras ou, muitas vezes, você ouve frases que não
fazem sentido?

2) Faz um bom tempo que você não ouve sons de pequenos animais, como pássaros ou insetos? Tem estado em situações na qual você não notou algum tipo de som muito baixo que os outros ouviram e que você justificou que não estava prestando atenção?

3) Pede frequentemente para que as pessoas repitam o que disseram?


4) Quando você aumenta o som da TV ou rádio no nível que acha necessário para ouvir, as pessoas reclamam do volume?

5) Você fica desconfortável em ocasiões sociais nas quais antes estava costumado a se divertir?

6) Amigos ou membros da família reclamaram que você está muito desatento ou “desligado”? E outros já sugeriram que você possa estar com alguma dificuldade de audição?

7) Você reclama que, hoje em dia, tem mais pessoas que ficam murmurando ou falando muito baixo? Você procura falar alto ao telefone, mas você acha que tem muito telefone ruim?

8) As dificuldades para ouvir lhe causam cansaço, ansiedade ou embaraço em situações novas?

9) Você sente que, devido às dificuldades para ouvir, você reduziu a frequência de visitas a amigos e parentes?

10)
Você sente que as dificuldades para ouvir podem estar prejudicando a sua vida escolar, social, familiar ou profissional?

RESULTADO
Se a resposta para algumas das perguntas for afirmativa, é recomendável procurar um médico especializado, o otorrinolaringologista, para uma avaliação mais detalhada. Se há suspeita de perda auditiva, ele solicitará alguns exames, entre eles a audiometria, que é indolor, cômodo e seguro. Consiste basicamente em responder algumas perguntas sobre a saúde auditiva, reconhecer algumas palavras comuns em diferentes níveis de volume e identificar sons
diferentes. Sua capacidade para escutar diferentes tons ou frequências produz uma curva auditiva única, que é registrada em um audiograma. O profissional o utiliza para determinar o tipo e grau da perda auditiva.

DIABETES WEEKEND » Asas aos pequenos diabéticos‏

DIABETES WEEKEND » Asas aos pequenos diabéticos
Crianças e adolescentes se encontram em Vespasiano, na Grande BH, para aprender a ser independentes e manter o tratamento sozinhos. Doença é a segunda mais comum na infância
 




Sandra Kiefer


Estado de Minas: 08/09/2013 


Menina doce: Laura, de 9 anos, recebeu o apelido na escola e encanta os pais pela responsabilidade (Leandro Couri/EM/D.A Press)
Menina doce: Laura, de 9 anos, recebeu o apelido na escola e encanta os pais pela responsabilidade



Nem só de evitar o açúcar vive o diabético. A nova regra é estimular cada vez mais a independência da criança e do adolescente diagnosticado com o diabetes mellitus, que já se tornou a segunda doença mais comum na infância, perdendo apenas para a asma. Sob a orientação dos pais e de médicos, o pequeno paciente será capaz de participar de colônias de férias, dormir na casa de parentes e até ir sozinho a festas de aniversário de colegas, onde terá de conviver com uma grande quantidade de guloseimas, doces e refrigerantes. De sexta-feira até hoje, diabéticos de 8 a 65 anos se reúnem para aprender na prática o significado de independência, no Diabetes Weekend.

Qual é o melhor método para convencer uma criança ou um adolescente de que, a partir da descoberta do diabetes, foi acesa a luz vermelha para o universo recheado de doces, guloseimas e batatas fritas? O Diabetes Weekend, que está em sua 27ª edição, procura responder essa pergunta e conscientizar os pacientes sobre a importância do tratamento. Segundo o endocrinologista Levimar Rocha Araújo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), o evento está atraindo pessoas do país inteiro a Vespasiano, na Região Metropolitana de BH, para discutir o assunto.
São cerca de 70 diabéticos reunidos em um hotel, participando de palestras, dinâmicas e atividades físicas. “Durante a colônia, eles aprendem a fazer a contagem de carboidratos para saber quanto de insulina devem aplicar. Nessa integração, vão também reconhecendo seus semelhantes, conhecendo as pessoas que convivem com a mesma questão”, disse.

Este ano, como caiu durante o feriado da Independência do Brasil, o acampamento teve como lema tornar os diabéticos mais independentes dos próprios pais. “De início, os pais ficam apavorados com a ideia de deixar o filho com mais de 8 anos dormir três noites fora de casa. Eles acham que ele não vai saber arrumar a cama, nem servir o próprio prato de comida, mas o menino sai aplicando a própria insulina", brinca o médico, entusiasta da ideia.

“Para conseguir soltar os filhos diabéticos, os pais devem buscar aumentar o conhecimento em relação à doença. Só assim vão conseguir confiar”, ensina a educadora em diabetes pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) Natália Fenner Pena. Além de mudar a alimentação e reduzir o consumo de doces, o diabético terá de seguir uma rotina diária e obrigatória, que inclui aplicar insulina e espetar as pontas dos dedos, de seis a oito vezes ao dia, como forma de medir a glicose no sangue.

MUDANÇA Depois de participar do Diabetes Weekend, a criança diabética volta outra, compara Cristina Scarpelli, de 48 anos, moradora do Bairro Santo Antônio. Sua filha, Joana, de 12, participa da colônia pela terceira vez este ano. Na primeira, a mãe fez questão de acompanhar. “Na colônia, vi crianças perdendo o medo de espetar o dedo de seis a oito vezes ao dia para medir a glicemia. Pude sentir a alegria da minha filha quando uma colega a convidou para tomar insulina juntas. Ela percebeu que não estava sozinha no mundo”, afirma Cristina. Joana descobriu há sete anos ser portadora da doença.

A mãe de Joana contou que hoje a menina é uma pessoa independente, que sabe regular sozinha a alimentação, conhece o próprio corpo, faz esportes e chega a passar férias na casa de uma tia, longe dos pais, no interior do estado. Diariamente, Cristina liga para acompanhar as medições de glicose da filha. A insulina é injetada automaticamente por meio da bomba, espécie de pâncreas artificial acoplado ao corpo. “Quando digo que sou diabética as pessoas ficam muito assustadas. Acho esquisito. Às vezes, até esqueço que eu tenho diabetes”, disse Joana.

“Se o paciente quiser, o diabetes pode se tornar um estilo de vida”, lembra Levimar Araújo, mentor da colônia, que não tem fins lucrativos e conta com um profissional de saúde para cada três pacientes. No acampamento, o diabético aprende a fazer tudo o que todas as pessoas deveriam fazer para crescer com mais saúde: alimentar melhor, praticar atividades físicas, reduzir o consumo de açúcar e aprender a controlar o próprio organismo, nesse caso com a ajuda da insulina.



Fase de atenção

Sandra Kiefer


Joana já sabe medir a glicose sozinha, sem ajuda da mãe, Cristina (Beto Novaes/EM/D.A Press  )
Joana já sabe medir a glicose sozinha, sem ajuda da mãe, Cristina
Estimular a independência do diabético de nascença ganha um complicador quando ele entra na pré-adolescência. Nessa fase, é preciso manter um olhar mais atento, devido à rebeldia natural da idade e ao aumento à resistência a insulina pelo organismo. “A transgressão do tratamento é maior na adolescência. Muitas vezes o jovem deixar de aplicar insulina por dois, três dias, tentando testar se ele tem mesmo diabetes”, alerta a nutricionista Cássia Nascimento.

A funcionária pública de Contagem Carla Fabrícia de Melo desconfiava que a filha Yasmim, de 12 anos, portadora de diabetes, estivesse comendo escondido. Com diagnóstico de diabetes tipo 1 desde os 9 anos, ela enfrentou cinco internações hospitalares nos últimos três meses. “Antes, era mais fácil controlar a alimentação da Yasmim. Agora, na pré-adolescência, sinto que ela está mais rebelde”, afirmou a mãe. Segundo ela, não há endocrinologistas disponíveis para o atendimento infantil nos hospitais da rede pública de Contagem.


De acordo com a Sociedade Brasileira do Diabetes (SBD), 17% dos diabéticos no país estão com índice glicêmico sob controle. Apenas 8% dos casos referem-se aos portadores do tipo 1. Segundo especialistas, se mantiver a glicemia abaixo de 70 mg/dl, o diabético poderá viver até mais do que um adulto sedentário. Se não for bem controlado desde cedo, porém, o diabetes pode levar a alterações renais, complicações visuais e a um risco aumentado de doenças cardíacas.
A criança muitas vezes tem vergonha de contar na instituição onde estuda que tem diabetes. “É preciso que algumas pessoas da escola saibam para poder acudir se ela passar mal e para não restringir idas mais constantes ao banheiro ou uma necessidade maior de beber água”, pontua a médica Suzana Nesi França, que coordenou esta semana, no Paraná, o II Encontro de Diabetes da Unidade de Endocrinologia Pediátrica, com o tema “Crescer com diabetes no século 21”. Ela alerta que o ideal é dar transparência cada vez maior ao diabetes no ambiente da escola, entre profissionais de saúde, cuidadores em casa e os membros da família.


VAI A UMA FESTA?
LEVE O KIT-DIABETES

Crianças e adolescentes não podem se esquecer de alguns itens quando saírem de casa. Veja as dicas da nutricionista Natália Pena

» Glicosímetro (aparelho para medir
a taxa de glicemia no sangue)

» Caneta aplicadora (nova tecnologia
de aplicação de insulina que
substitui as antigas injeções)

» Uma fonte rápida de carboidrato,
como uma bala ou mel

» Se não resistir aos doces, aplique
uma dose de insulina rápida

» Não se esqueça de comer a cada
três horas

» Se brincar muito e passar a hora de comer, coma uma dose de açúcar para regularizar os sintomas da hipoglicemia, que são palidez, suor e tonteira

» Numa festa infantil, pode optar também por levar um kit diet encontrado em lojas especializadas, que tem um
pedaço de bolo, brigadeiro e outras guloseimas dietéticas. Custa em média R$ 30


Guloseimas diet e muita diversão

Sandra Kiefer


As festas de aniversário dos colegas voltaram a ser sinônimo de diversão para as crianças diabéticas que, antes, eram impedidas de participar. Elas eram monitoradas pelos pais ou se sentiam diferentes por não poder comer balas e brigadeiros.

O autônomo Ricardo Rocha Maciel, de 33, não esconde o orgulho da filha Laura, de 9, diabética desde os 6 anos e que recebeu na escola o apelido carinhoso de “menina doce”. Segundo a madrinha dela, Fernanda Rocha Maciel Lage, Laura sabe se cuidar direitinho, melhor do que a maioria dos adultos.


Quando vai a festas de aniversário, a criança leva um kit diet. “Antes, eu comia muito errado e só tomava achocolatado. Agora, gosto de almoçar. No dia em que tem batata frita em casa, só posso comer três e tenho de comer um pouquinho de arroz”, ensina a menina. Ela também guarda no cofre as moedas destinadas à compra mensal de bombons diet, de que tanto gosta.

Eduardo Almeida Reis-Comércio‏


Estado de Minas: 08/09/2013 


Na Juiz de Fora de não muito antigamente havia imensa loja, a Casa do Compadre, que vendia tudo. Sei que “tudo” parece força de expressão, mas o fato é que a loja tinha tudo que faltava nas outras. Alguns exemplos: telefone de parede, daqueles de madeira, e imensas pilhas novas para telefones de parede; torradeiras de café, bolas de lata para rodar na chama do fogão de lenha; moedor manual de café torrado nas torradeiras de lata; ferro de engomar a carvão; lampiões a querosene – tudo isso e mais um milhão de produtos hoje incomuns, além de outros relativamente comuns.

Pormenores originais: as mercadorias não tinham etiquetas com os preços e a firma não usava aquelas maquininhas, comuns durante os anos de inflação maluca. Vejo que escrevi uma besteira: se não havia etiquetas, por que usar máquinas de etiquetar?

Era tudo calculado de cabeça pelos donos, acho que irmãos, e seus sobrinhos, que estabeleciam os preços de acordo com a cara do comprador. Como tenho cara de rico, raramente comprei alguma coisa na Casa do Compadre. Ficava no carro e pedia a um amigo que comprasse para mim. Mineiros sabem pechinchar, verbo que não aprendi até hoje. Se peço abatimento e o comerciante faz desconto expressivo, fico achando que o preço pedido era para me roubar. Nunca fiz um negócio em que não fosse enganado, salvo na compra de terras, que se valorizaram com o passar do tempo. E nas vacas, que têm filhas, netas, bisnetas. Vaca é bicho abençoado.

O certo é que a atividade comercial e a aptidão para o comércio me fascinam. Conheço vários comerciantes natos. Parecem acreditar nas virtudes das coisas que revendem e no direito divino de faturar, o que acaba fazendo que os outros acreditem neles. Mercúrio era o deus romano dos viajantes, dos comerciantes e dos ladrões. Xixi Piriá, personagem do admirável romance Vila dos Confins, do não menos admirável Mário Palmério, contava com a estima e o respeito de todos, apesar de viajar mascateando perfumes, joias e pequenos utensílios. Digamos, então, que Xixi fosse uma exceção à regra dos protegidos de Mercúrio.

Lojas modernas, com todos os recursos da informática, têm coisas inacreditáveis. Pedi a um amigo que me comprasse em Belo Horizonte determinado chuveiro elétrico, que custa pouco mais de 600 reais. A loja tem diversas filiais na cidade. Meu amigo esteve numa filial próxima do Mercado Central, onde lhe informaram que o chuveiro estava em falta. Pelo interurbano, descobri que havia uma porção de chuveiros em estoque noutra loja da mesma empresa, onde o amigo comprou e me trouxe o aparelho encomendado.

Como é mineiro meio esquentado, aproveitou para passar uma descompostura no gerente da loja dizendo ser inadmissível que um produto caro, como o tal chuveiro, fique em estoque numa das lojas enquanto as outras informam que o aparelho está em falta.

Trem-bala

No reino da fantasia instalado ao sul do equador, nenhuma ideia se compara, em idiotice, ao trem-bala. Se o robô faz a robótica, os óculos a ótica e o equilíbrio dietético yin-yang a macrobiótica, é forçoso reconhecer que os marqueteiros inventaram a idiótica, se bem que o adjetivo idiótico, relativo a idiotia ou a idiotismo, exista em português desde 1858. É puro grego: idiótikós,ê,ón 'ignorante; trivial, vulgar'.

Idiótica é outro departamento: é a ciência e técnica da bolação, veiculação e embromação dos idiotas. Como pensar em composições de alta velocidade se o sistema ferroviário brasileiro continua na Idade da Pedra? Falar em trem-bala ligando o Rio a Campinas é o mesmo que um sujeito de 20 anos, sem estudos de qualquer natureza, candidatar-se em Berkeley a um doutorado em física quântica.

O mundo é uma bola

8 de setembro de 1264: o príncipe Boleslau, o Piedoso de Kalisz, assina o Estatuto de Kalisz, carta que regulamenta as liberdades dos judeus e as obrigações dos cristãos na Polônia. O estatuído é uma delícia e está na Wikipédia, mas não encontrei o nome de batismo de Boleslau, pois ninguém pode ter esse nome, ainda que seja príncipe de Kalisz.

Em 1423, o papa Eugênio IV assina a bula Rex Regnum, um dos documentos que incentivaram o tráfico de escravos. Em 1504, primeira exibição de David, estátua de Michelangelo. Muitos especialistas acham que o bráulio de David é pequeno. Em 1612, fundação da cidade de São Luís do Maranhão, que teria a glória de ser habitada pelas famílias Sarney e Lobão.

Em 1636, fundação da Universidade Harvard, primeira instituição de ensino superior dos Estados Unidos. Anos atrás, caí na besteira de escrever Universidade de Harvard e quase fui escalpado por um leitor, ex-aluno de Harvard, porque o nome é Universidade Harvard sem o “de”.

Em 1664, os ingleses capturam dos holandeses a cidade de New Amsterdam e mudam o nome para New York. Em 1760, capitulação de Nova França (hoje Ontário e Quebec) aos ingleses. Em 1888, Jack, o Estripador, faz a sua segunda vítima.

Hoje é o Dia Internacional do Jornalista.

Ruminanças

“Não há profissão mais bela, mais interessante que a de jornalista; nenhuma exige mais talento, tato e vivacidade” (León Daudet, 1867-1942).