segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

"Hilda Hilst está superviva" - Joselia Aguiar

Valor Econômico



"Hilda Hilst está superviva"

Por Josélia Aguiar | Para o Valor, de São Paulo
Pio Figueiroa/Valor / Pio Figueiroa/Valor
Escritora morta em 2004 morou durante quatro décadas na Casa do Sol, em Campinas
Daniel Fuentes se lembra bem do dia em que Hilda Hilst (1930- 2004) o seduziu. Era adolescente, estava com uns amigos no Guarujá, onde costumavam ir pegar onda, e carregara para a praia, além da prancha, um exemplar de "Tu Não Te Moves de Ti", três novelas distintas conectadas, título dos mais densos que ela escreveu. Não era sua primeira vez com aquela literatura em nada amena, ao mesmo tempo satírica, erótica e mística, o contrário do que se pretende de um livro para férias de verão. O rapaz havia tentado ler sua obra anos antes, talvez cedo demais para compreendê-la. Não tardou porém a estabelecer a intimidade que nenhum outro leitor pode alcançar. Única criança com quem conviveu, a escritora lhe deixaria os direitos autorais exclusivos em testamento.
A herança era já missionária o bastante, quando, há três anos, se foi o pai de Fuentes, o escritor e amigo próximo da escritora Jose Luis Mora Fuentes (1951-2009), que passou para o filho o Instituto Hilda Hilst. O cargo significava a responsabilidade de preservar a Casa do Sol, sítio onde a autora viveu e ergueu grande parte de sua obra, em Campinas. Significava também assumir uma dívida de manutenção que, só de IPTU em atraso, contabilizava R$ 3 milhões. Seria razoável vender tudo, como lhe propôs uma incorporadora que planejava colocar abaixo o que existia para lotear o terreno. O jovem herdeiro-presidente de 29 anos escolheu o que considerou a "única coisa a ser feita": depois de renegociar com credores, tenta agora tornar o lugar criativo e economicamente sustentável.
Até março, quer instalar no pátio interno um teatro de arena móvel para encenar peças mais experimentais e de vanguarda - um dos projetos em andamento. A arrecadação se dá por meio de "crowdfunding", financiamento colaborativo que tem sido usado para viabilizar ideias artísticas e sociais. A procura por empresas que possam apoiar e patrocinar também começou. Espera-se atingir R$ 15 mil (R$ 11 mil já foram) na primeira etapa. Em outras, a estrutura vai ser ampliada para receber peças de maior porte. Como grande ponto de agito, há a página oficial do Instituto Hilda Hilst no Facebook. A principal ação nesta véspera de Natal é o sorteio da obra reunida em 22 volumes, promoção apoiada pela Globo Livros, responsável pela empreitada editorial.
"Hilda Hilst está superviva", diz Fuentes. A boa notícia mais recente são as novas traduções nos EUA - a autora é chamada de "o milagre literário de 2012" pela revista literária americana "Full Stop". Por mês, autoriza até dez peças. Dá seu OK a projetos audiovisuais, CDs e desfile de moda. Cada vez sobra menos tempo para a atividade de antes, a de produtor executivo em sua Catatonia Filmes. O cientista social que se formou na PUC tratou de cursar um MBA em bens culturais pela FGV. Quem o vê falando logo conclui, pela articulação e entusiasmo, que nasceu mesmo para administrar o legado da escritora.
A conversa termina debaixo da grande figueira que serviu de marco inicial da construção da Casa do Sol, em fins da década de 1960. Até então uma moça avançada para a época, habitué da boemia artística paulistana, Hilda entendeu que precisava sair daquela vida para construir a obra que queria. Vendeu o imóvel onde residia no Pacaembu, em São Paulo, se desfez dos vestidos desenhados por Dener, o grande estilista da época, e transportou os livros, um acervo que tem hoje 3 mil exemplares. O espírito conventual favoreceu rotina de criação de até dez horas por dia, como se recordam os que habitaram aqueles dias: Fuentes, sua mãe, Olga Bilenky, e Jurandy Valença, o diretor de projetos.
O isolamento não a afastou dos amigos - alguns, convidou para morar com ela, outros a visitavam sempre, e, entre os companheiros de toda a vida, os cães que chegaram a ultrapassar o número de 150 são hoje 14. Para arejar, vestia túnicas e calçava sapatilhas, compradas em lojas de produtos de Índia e Israel.
Sob o sol abrasador de dezembro, a Casa do Sol é o "único lugar ventilado em toda Campinas", segundo Olga. A pintura, na antiga técnica de caiação, garante a temperatura fresca. A cor empregada é do mesmo modo singular. O tom é um rosa amarronzado, mistura de tintas verde, vermelha e marrom que leva dois dias para ter seu ponto encontrado. Com o jardim, a grande moradia soma 9 mil m2 tombados desde o ano passado. Dentro, há móveis coloniais e rústicos, obras de arte e fotografias na parede, objetos de fundo religioso e místico em quase todos os cômodos.
A mesma inspiração de Hilda buscam os que ocupam a Casa do Sol em regime de residência artística, outro projeto em curso. Por um fim de semana ou três meses, pessoas que querem criar e estudar - muitas vezes sua obra, mas não só - têm frequentado o ambiente onde viveu quatro décadas. A estadia é "artisticamente intensa", diz Caroline Aguiar, uma das tradutoras de seus versos para o inglês. Outra residente é Anna Giovanna Rocha Bezerra, que quer estabelecer os elementos comuns na vida e na obra para escrever uma biografia da poética, sua tese de doutorado. Ela vê a casa como personagem quase constante.
Lugar onde viveu e criou, personagem de sua obra, a Casa do Sol é hoje sobretudo "a maior peça do arquivo de Hilda Hilst", como diz Fuentes. Por enquanto, a arte se sobrepõe à corrida imobiliária.


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Valorizando pais e filhas [Cabul,Afeganistão]

Folha de São Paulo

INTELIGÊNCIA
MATIULLAH AMIN E SHABANA BASIJ-RASIKH
Educar meninas é necessário para a paz e a prosperidade
O atentado a tiros cometido pelo Taleban paquistanês contra Malala Yousafzai, mais de dois meses atrás, chamou a atenção do mundo. Malala começou em 2009 a escrever para a BBC um blog anônimo sobre como as meninas sofriam para receber educação depois de o Taleban assumir o controle do vale do Swat. Após ser baleada na cabeça em retaliação por seu trabalho, ela virou uma heroína e está se recuperando em um hospital da Inglaterra. Mas sua história é um sombrio lembrete dos desafios que muitas meninas mundo afora ainda enfrentam ao irem à escola.
A história de Malala tornou-se uma sensação no Ocidente em parte porque o terrível atentado de 9 de outubro ecoou uma percepção ocidental sobre os homens dessa região: tribais, atrasados e cruéis, capazes de ser tão violentos a ponto de tentar matar uma criança inocente simplesmente porque ela estava se manifestando por seus direitos.
Mas, depois do ataque, houve outra coisa que surpreendeu muita gente. Homens, mulheres e crianças -de diferentes origens políticas e socioeconômicas- saíram às ruas do Paquistão para condenar o ataque à Malala. Entre eles estavam pais como Ziauddin Yousafzai, o pai Malala, que é educador e líder comunitário no Swat e que teve a coragem de ser uma voz da razão e da luta pelos direitos da sua filha.
Em um documentário feito em 2009 por Adam B. Ellick, Malala disse: "Quero me tornar médica, mas meu pai me disse para virar política". Ziauddin rapidamente acrescentou: "Vejo um grande potencial na minha filha para que ela possa fazer mais do que como médica. Ela pode criar uma sociedade onde uma aluna de medicina facilmente consiga se doutorar." Eis aí um pai que não está apenas sonhando grande por sua filha, mas que, depois da conquista do Swat pelo Taleban, protestou nas ruas de Peshawar para pressionar o governo paquistanês a retomar a região dos insurgentes, de modo que Malala pudesse perseguir seus sonhos.
A história de Malala revela uma tendência emergente nessa região do mundo, no Afeganistão e no Paquistão em particular, algo que costuma ser minimizado no Ocidente: há pais que veem valor nas suas filhas e, contra todas as probabilidades, apoiam sua educação. Muitos pais estão desempenhando um papel crucial nas vidas das suas filhas, mais do que nunca. Uma menina educada pode ajudar em casa. Às vezes, isso se dá em pequenos gestos, como ao ensinar o pai a salvar um número na agenda do celular ou ao ler uma carta para ele. Isso tem mostrado aos pais como a educação das suas filhas pode beneficiar uma família.
Nos últimos anos, nos deparamos com histórias semelhantes. Uma aluna da Escola de Liderança do Afeganistão, a quem chamaremos de Saba, é da província de Helmand, outrora um reduto do Taleban. O pai de Saba continua apoiando seu sonho de receber uma formação, apesar das ameaças que ele enfrenta. Saba diz que, sabendo do compromisso do seu pai com a educação das filhas, sente-se reconfortada, fortalecida e também mais estimulada a perseguir seus sonhos.
"Se meu pai pode resistir às ameaças por mim, então devo resistir por meus direitos e pela confiança do meu pai em mim", disse ela.
Quando uma menina recebe educação, ela pode casar mais tarde, ter filhos mais saudáveis e em menor número e ganhar mais renda, da qual a maior parte ela poderá reinvestir na família -isso se traduz em paz e em prosperidade econômica de longo prazo para sua comunidade.
O mais interessante é que o pai de Saba e muitos como ele adotaram essas noções intuitivamente. O pai de Saba reconheceu que investir na educação de uma filha é algo amplamente visto como um desperdício, porque ela vai deixar a casa do pai depois de casar. Mas ele afirma: "Meu esforço para educar Saba não é um desperdício, porque se ela não me beneficiar diretamente, pelo menos poderá cuidar da sua família, e eu não precisarei me preocupar com ela".
Deveríamos reconhecer que os pais são vitais para possibilitar a educação das meninas em algumas das áreas mais inseguras do mundo. Devemos buscar o apoio dos pais convidando-os para a sala de aula, para manifestar suas preocupações e ideias. As meninas -as milhões de Malalas cujos nomes jamais saberemos- são o exército da paz e da prosperidade, e devemos lhes fornecer a educação que elas merecem, para que elas possam tornar-se as pacificadoras da qual a nossa volátil região tão desesperadamente precisa hoje.

    A evolução de Matisse rumo ao êxtase - Roberta Smith


    ROBERTA SMITH
    RESENHA DE ARTE
    O grande modernista francês Henri Matisse (1869-1954) não era alguém que gostava de aderir a causas. No início do século 20, ele liderou o breve ataque dos "fauves" -aqueles "animais selvagens" de cores fogosas-, mas se absteve dos movimentos mais simbólicos da arte moderna.
    Ele comungava com artistas do passado e periodicamente roçou ombros com o cubismo. Mas seu desejo era, como ele mesmo disse, "ir mais longe e mais a fundo na verdadeira pintura".
    Sua evolução rigorosa e inabalável é o tema de "Matisse: Em Busca da Verdadeira Pintura", no Metropolitan Museu of Art, em Nova York, uma das exposições mais emocionantes e instrutivas sobre esse pintor. Ela estará em cartaz até o dia 17 de março. Tão maravilhosa quanto sucinta, a exposição desliza pela longa carreira desse mestre francês com apenas 49 pinturas, mas quase todas são obras estelares e pivotantes.
    A exposição projeta uma nova luz sobre a tendência de Matisse a copiar e a trabalhar em séries. As pinturas procedem em pares ou em grupos alinhados pelo tema: dois arranjos de natureza-morta com frutas e compota, de 1899, duas versões de um jovem marinheiro cochilando em uma cadeira, de 1906, quatro vistas (1930 a 1914) de Notre-Dame de Paris.
    A última galeria oferece cinco pinturas do final dos anos 1940 que mostram o estúdio de Matisse em Vence em cores planas e saturadas.
    Espalhadas por oito galerias, cada par ou grupo forma seu próprio minisseminário. Juntos eles mostram a incansável hesitação de Matisse entre extremos, sempre repensando e revisando sua maneira de alcançar a grandeza com ideias radicais sobre economia e acabamento. Deve-se dar atenção a seu hábito de pintar cores escuras sobre outras claras para criar um sutil brilho inferior e sua frequente ênfase à tela branca como uma fonte de luz e textura. Ele buscava uma direção implicitamente moderna que criou uma forte intimidade entre artista, objeto e espectador. Ele afirmou: "Trabalho em direção ao que eu sinto, em direção a uma espécie de êxtase".
    A prática de copiar de Matisse surgiu de sua educação acadêmica, que por longa tradição envolvia copiar antigos mestres no Louvre. Mas ele mudou esse exercício na direção do presente, copiando obras muito mais contemporâneas e fazendo experimentações de estilos, principalmente dos pós-impressionistas. A primeira galeria inclui a homenagem de natureza-morta a Cézanne (1904) e outra obra representando o mesmo arranjo à maneira pontilhista de Paul Signac (1904-1905).
    Ainda mais interessantes são as duas naturezas-mortas de 1899 com compotas e frutas. Uma é pintada ricamente, um tributo pós-impressionista abrangente (Van Gogh, Gauguin, Cézanne, Vuillard) moldado em uma luz melíflua. A outra é despida, quase esquelética: as frutas e os vasos são denotados por silhuetas planas em cores vivas.
    É possível passar toda a visita nas segunda e terceira galerias da exposição, meditando sobre os marinheiros e os nus com echarpes brancas. É quase chocante ver que a grande "Vista de Notre-Dame" (quase toda azul) do Museu de Arte Moderna (1914) tem uma gêmea improvável do mesmo ano: uma visão relativamente realista da catedral. Nos anos 1930, Matisse começou a tirar fotos em preto e branco de suas pinturas enquanto trabalhava nelas. Em 1945, ele chegou a exibir seis pinturas, cada qual cercada de suas fotografias, na Galeria Maeght, em Paris.
    A sétima galeria da exposição no Metropolitan apresenta três telas da Maeght, entre suas fotos evidenciais. Elas estabelecem que o progresso de Matisse era muitas vezes duro, e que ele trabalhava desafiando suas dificuldades até uma imagem final que emana frescor consumado e facilidade. É claro que as pinturas de Matisse são quase sempre destilações duramente conquistadas, mas é de todo modo maravilhoso ver o processo tão amplamente registrado.[New York Times na Folha de são PaULO]

      A corrupção e os comunistas - Renato Janine Ribeiro

      VALOR ECONÔMICO: 17/12/2012


      Os comunistas foram puros - mas duros demais


      A corrupção não é problema dos comunistas. Ela perpassa tudo o que é família política, menos a deles. Até na França, com Chirac, e nos Estados Unidos, com Cheney, dizem que esteve no centro do poder. Direita, centro e esquerda a praticam. A grande exceção são os comunistas.

      Alguns deles abusaram. Ceausescu, ditador da Romênia, tinha torneiras de ouro nos banheiros. Os governantes comunistas da Europa Oriental gostavam de limusines pretas, caras. Mas, como corrupção, é pouco. São mordomias, não malfeitos. Se isso for corrupção, não escapa quase ninguém que exerça o poder, em qualquer lugar do mundo. Isso porque ele dá oportunidades de vida luxuosa, que nem sempre constituem, tecnicamente, furto ou desvio de dinheiro.

      Não esqueço o que me disse um americano, que trabalhara nos serviços de inteligência de seu país, quando tomamos um café numa praia da Estônia, em 1992. Ele tinha o projeto de colocar os pés na água de cada mar ou oceano do mundo. Entrou no Báltico (acompanhei-o) e, depois, conversamos. Estávamos num restaurante à beira-mar e ele me disse: "Este lugar era para os membros da nomenklatura comunista. Mas veja como é básico, se for comparado a um resort do mundo ocidental. Eles eram privilegiados, mas o privilégio deles, no Ocidente, estaria ao alcance de qualquer pessoa de classe média". O que, aliás, só mostrava a ineficiência do sistema, que nem privilégios conseguia gerar direito...


      São raros os casos de corrupção entre os comunistas duros e puros. Numa coluna anterior, falei da corrupção atribuída, com base na razão ou no mito, à esquerda não comunista, aquela que é liderada por uma fração minoritária da classe dominante que se torna dissidente e, por compaixão ou cálculo, decide incluir socialmente parcelas significativas das classes mais pobres.

      É bem diferente do comunismo.

      Eram mais honestos os comunistas? Eram. Queriam fazer a revolução. Algumas foram espontâneas, organizadas de baixo para cima, populares. Foi o caso da Rússia, Iugoslávia, Albânia, China, Vietnã e Cuba. Nos demais países, a força militar, geralmente soviética, impôs os regimes. Mas em todos eles se pretendia mudar por completo as relações sociais, rumo a maior justiça e igualdade. Esse projeto, ainda que mal realizado, marcou seus governos. O problema é que no final deu errado. Dos Estados que ainda se dizem comunistas, só Cuba procura fazer jus ao nome.

      Mas há grandes diferenças entre as mudanças sociais que o comunismo promoveu e as realizadas "de dentro", por uma parte da classe dominante que realiza a inclusão social de parcelas grandes dos pobres. Primeira diferença: essas iniciativas reformistas, não revolucionárias, deram mais certo. Permaneceram. Reformas como as do New Deal, lideradas por Franklin Roosevelt, nos Estados Unidos, do governo trabalhista de Attlee, na Grã Bretanha, ou de Getúlio Vargas e Lula, no Brasil, dificilmente têm volta. Na Argentina, sucessivos governos tentaram desfazer a obra de Peron; infelizmente, tiveram êxito. Mas as iniciativas moderadas resultaram melhor, a longo prazo, do que as que queriam mudar todas as relações sociais.

      Já a segunda diferença não é tão boa. Houve corrupção em muitos lugares em que a reforma proveio da classe dominante. É compreensível, já que o setor dissidente desta última estava acostumado a bens e vantagens. Também os líderes populares que ascenderam socialmente sentiram - e sentem - forte atração pelo conforto.

      Aos comunistas se deve o elogio de que foram honestos, na grande maioria, mesmo já estando no poder. Howard Fast tem páginas notáveis a respeito, no belo livro em que realiza uma crítica implacável da liderança comunista, "O Deus Nu". Mostra a honestidade profunda dos militantes, que não só punham dinheiro do próprio bolso como, também, continuavam no partido, apesar dos pesares, porque viam nele a única chance de melhorar a condição dos miseráveis e de combater as chacinas coloniais. Isso, ao mesmo tempo em que Fast condena os líderes, mas não por corrupção e sim por autoritarismo, mediocridade, falta de projeto político.

      E uma terceira diferença? Esta é a área escura do comunismo. As revoluções modernas mostram uma certa regularidade: agiram com uma violência que beira a crueldade. Devoravam seus próprios filhos, diz-se. Assim aconteceu na França e na Rússia, as duas grandes revoluções mais influentes no mundo. A exceção são as revoluções anteriores, a Inglesa e a Americana, menos radicais, mais duradouras em seus efeitos, mas que tiveram pouco êxito fora dos países de origem. Sua difusão mundial foi incomparavelmente menor.
      Quantas revoluções, após 1789, se inspiraram na Francesa? Quantas, após 1917, na Russa? Quase todas. Enquanto isso, a Grã Bretanha mantinha colônias e os Estados Unidos apoiavam ditaduras, com a única grande exceção da Segunda Guerra Mundial. As revoluções anglo-saxônicas não serviram "for export".

      De que serve um balanço da corrupção nas esquerdas? Quem faz uma revolução - que, ao longo do século XX, foram quase sempre comunistas - geralmente é frugal. Passa anos na selva ou na serra. Mantém muito do espírito ascético, uma vez no poder. Desonestidade é pouca. Mas há dois problemas. Primeiro: muitos desses regimes foram, ou acabaram sendo, ineficientes na economia. Segundo: usaram da violência em escala industrial. O que deixa uma conclusão triste. No fim das contas, se tivermos de escolher, a corrupção é menos ruim do que o desastre na economia e, sobretudo, a tortura, o campo de concentração e o pelotão de fuzilamento. O ideal é não ter nada disso, mas por ora é só um ideal.

      A GRANDE CHANCE » Um instante, maestro! - Mariana Peixoto‏

      A onda dos shows de calouros cresce dia a dia. Se nos canais abertos já virou uma tradição, formato ganhou impulso na TV paga. A próxima novidade é Breakout Brasil, do Sony Spin 

      Mariana Peixoto
      Estado de Minas: 17/12/2012 
      Eles ainda partem do velho show de calouros. Porém, cada reality show musical tenta buscar o seu diferencial. A TV aberta vem explorando o filão há anos, muitas vezes em versões de programas da TV norte-americana ou ingleses. Ontem, a Globo exibiu a final da primeira edição brasileira do The voice Brasil, mais uma franquia que parece ter emplacado e já promete nova temporada. Já hoje o SBT/Alterosa apresenta a final de Astros.

      Na TV paga, as produções mais populares também são exibidas aqui. Esta semana, por exemplo, o Sony transmite, ao vivo, a final de The X-factor. O mesmo canal também apresenta America’s got talent, que abre o leque e recebe, além de cantores, bailarinos e humoristas. Agora, um canal do mesmo grupo, o Sony Spin, destinado ao público jovem, está produzindo seu primeiro programa nacional: o Breakout Brasil. O formato é semelhante – o vencedor ganha contrato com a Sony Music –, mas ele vai atuar em duas vias: na TV e na internet, por meio do Google, um dos parceiros da produção.

      Terminadas as inscrições, começa hoje a fase de seleção. Na páginawww.breakoutbrasil.com o público poderá votar. Nessa primeira triagem serão escolhidos 40 nomes, 20 pelos internautas e outros 20 pelo grupo de jurados. Desses sairão somente cinco, os que efetivamente vão parar na televisão. Eles serão “treinados” pelos jurados. 

      Parte da popularidade de um reality show musical se dá justamente por causa de seu corpo de jurados. O caso mais emblemático é o de Jennifer Lopez e Steven Tyler, que, depois da participação nas duas temporadas mais recentes de American idol, voltaram ao gosto popular – tanto que nem renovaram para a edição 2013 do programa. No Breakout, que será apresentado pelo gaúcho Edu K, que foi vocalista da banda Defalla, o júri é formado por Dudu Marote (produtor de bandas como Skank e Jota Quest), Anna Butler (ex-diretora artística da MTV) e Marcello Lobato (empresário de Marcelo D2 e Pitty). 

      Edu K. comenta que as provas vão diferenciar o Breakout Brasil dos demais shows. “Por exemplo, a gente pode pegar uma banda de rock e colocá-la para tocar uma música do Jerry Adriani. Ou um É o Tchan em versão roqueira. O importante é tirar os participantes de sua zona de segurança.” Ele diz ainda que não há preocupação em encontrar um cantor de vocal perfeito. “Em geral, os programas mostram candidatos muito padronizados dentro de cada estilo. O candidato não tem que ser superafinado. Ideias novas são bem-vindas. E a internet é  uma boa maneira para catalogar o que está acontecendo.” 

      • ZAPEANDO


      » Na TV paga


      l America’s got talent (Sony, aos domingos, às 13h)
      Além de música, o show de talentos também recebe dançarinos, 
      mágicos e humoristas. Sharon Osbourne, mulher de Ozzy, é uma 
      das juradas. Atualmente, está no 
      ar a sétima temporada.

      •  American idol (Sony, a partir de fevereiro)
      Principal reality show do gênero, começa sua 12ª temporada dia 16 de fevereiro, nos EUA. No Brasil, o Sony começa a exibi-lo em 1º de fevereiro. Os novos jurados são Mariah Carey, Nicki Minaj e Keith Urban. 

      •  Breakout Brasil (Sony Spin, a partir de março)
      Já em andamento, o primeiro reality do canal pago tem sua primeira fase exclusivamente na internet. Na TV, em data ainda não definida de março, o programa só vai trazer episódios com cinco finalistas.

      •  The X-factor (Sony, semifinal e final nesta quinta-feira, ao vivo, a partir das 23h) 
      Em seu segundo ano, versão americana do programa do britânico Simon Cowell, o papa dos programas do gênero, termina na próxima semana. No júri estão Demi Lovato 
      e Britney Spears.

      » Na TV aberta


      • Astros (SBT/Alterosa)
      A final musical será exibida hoje, às 22h30. Na semana passada foi a festa de variedades. Haverá ainda edições especiais de Natal e réveillon. A emissora não confirmou se haverá nova temporada em 2013

      •  The Voice Brasil (Globo, domingos)
      A primeira temporada encerrou-se ontem. Com Tiago Leifert como apresentador e Daniele Suzuki nos bastidores, o corpo de jurados ficou formado com Claudia Leitte, Carlinhos Brown, Lulu Santos e Daniel.

      Ausência de gene leva à anemia - Paloma Oliveto‏


      Estudo identifica problema que causa deficiência de hemoglobina, quadro característico dos pacientes em estado grave 

      Paloma Oliveto
      Estado de Minas: 17/12/2012 
      Todo mundo conhece uma receita para combater a anemia, condição que afeta uma em cada quatro pessoas no planeta. Ingerir mais alimentos com ferro, tomar suplementos e receber injeções de vitaminas, por exemplo, são medidas simples que geralmente resolvem rapidamente o problema. Mas há casos graves, como a forma congênita, quando a pessoa nasce com uma mutação que afeta a produção das células vermelhas. Nessas situações, o paciente pode até morrer. 

      Estudo publicado na revista Nature identificou um gene que, quando ausente, induz a deficiência de hemoglobina, proteína responsável por fazer o transporte de oxigênio para as hemácias e os glóbulos vermelhos. Quando isso ocorre, as células ficam defeituosas e se rompem, levando à anemia grave. Segundo os autores, a descoberta vai ajudar a compreender melhor a fabricação das células sanguíneas e levar a tratamentos mais eficazes. 

      “Apesar de haver muitas pesquisas sobre os padrões de regulação e metabolismo dessas células, ainda existem hiatos no conhecimento sobre os genes que regulam os níveis intracelulares de ferro, o transporte de enzimas e a homeostase. Essa compreensão incompleta atrapalha o desenvolvimento de terapias-alvo para uma boa quantidade de distúrbios, incluindo as anemias congênitas”, explica o hematologista Barry Baw, coautor do estudo e professor da Faculdade de Medicina de Harvard. Com a identificação do gene Atpif 1, ele acredita que os cientistas têm em mãos um forte candidato para entender e tratar anemias e doenças mitocondriais.

      Para descobrir a mutação, os pesquisadores usaram o peixe-zebra como modelo, pois esse animal compartilha com humanos muitos genes relacionados à regulação das células sanguíneas. Entre os espécimes disponíveis, havia um embrião praticamente sem sangue nas veias. “Era exatamente isso que estávamos procurando. Uma variante do peixe-zebra com níveis muito baixos de produção sanguínea provavelmente encontra-se nesse estado porque o gene responsável pela formação das células do sangue está inativo”, diz Baw.

      O genoma do peixe anêmico foi sequenciado pelos cientistas, que identificaram a falta do gene Atpif 1 e associaram o defeito ao metabolismo de uma proteína chamada heme. Na hemoglobina, ela é responsável por deixar as moléculas de oxigênio entrarem dentro das células. Para que a proteína funcione normalmente, é preciso que outro elemento celular, a enzima ferroquelastase, seja regulada corretamente e, em indivíduos saudáveis, o responsável por isso é o Atpif 1, presente também em humanos. 

      “Nosso estudo estabeleceu uma ligação funcional única entre o gene e a modulação da síntese da proteína heme. Acredito que isso significará avanços importantes para o estudo da formação das células vermelhas”, diz Dhavnit Shah, pesquisador da Divisão de Hematologia do Boston Woman’s Hospital e principal autor do estudo. “Essas células não estão relacionadas apenas às anemias, há muitas outras doenças e síndromes relacionadas ao processo de formação dos eritrócitos, por isso acredito que estamos diante de um novo campo de investigações, que poderá solucionar muitas questões para as quais ainda não temos respostas”, afirma Shah. De acordo com ele, o estudo não terminou com a publicação do artigo na Nature. Ele e Barry Baw continuam procurando genes que revelem mecanismos até agora desconhecidos de regulação dos componentes das células sanguíneas. 

      “Identificar novos processos intracelulares não apenas leva ao desenvolvimento de novas terapias, mas pode melhorar muito os resultados do tratamento de pacientes anêmicos”, avalia Greg Hare, cientista do Instituto La Ka Shing do Hospital de St. Michael, em Toronto. A linha de pesquisa do hematologista também se concentra em padrões celulares ainda desconhecidos relacionados à anemia. “No caso de pacientes crônicos ou muito debilitados, a anemia desempenha um papel importantíssimo na progressão da doença. As transfusões de sangue são procedimentos habituais nessas condições, mas o fato é que isso não tem conseguido diminuir as taxas de mortalidade”, afirma. “Isso aponta a necessidade de uma compreensão mais aprofundada das respostas moleculares à anemia, um campo de investigações que ainda aguarda para ser desvendado.”

      Teste rápido pelo celular 
      Publicação: 17/12/2012 04:00
      Um dispositivo barato conectado ao aparelho celular poderá salvar milhares de pessoas que sofrem de anemia. Alunos de engenharia biomédica da Universidade de Johns Hopkins (EUA) desenvolveram o protótipo de um equipamento, o HemoGlobe, que consegue medir o nível de hemoglobina no sangue com resultado na hora. Basta posicionar o dedo no dispositivo para que diferentes comprimentos de onda emitidos pela pele sejam captados e interpretados por um aplicativo, na tela do celular. Dependendo da cor, é possível saber se a pessoa sofre de anemia simples, moderada ou severa. 

      O HemoGlobe poderá ser importante também para indicar locais onde a prevalência da anemia é maior. Depois de cada teste, o telefone manda uma mensagem automática com os resultados para um servidor central, que produz um mapa em tempo real indicando onde há maior concentração de casos. 

      Os estudantes projetaram o equipamento pensando nas populações de países em desenvolvimento. “Em locais onde esse acesso é mais fácil, os médicos fazem testes de rotina em grávidas e prescrevem o tratamento, que inclui suplementação de ferro. Mas nos países mais pobres, onde os hospitais nem sempre estão por perto, essa condição pode não ser detectada. Ainda assim, são regiões geralmente servidas por agentes comunitários de saúde”, observa Soumyadipta Acharya, orientador da pesquisa.

      “A equipe percebeu que todo agente comunitário carrega um poderoso computador em seu bolso — o telefone celular. Isso facilita muito, pois não foi preciso fabricar um computador portátil para ser conectado ao nosso equipamento”, conta Acharya.

       A estimativa é de que a produção de cada unidade do HemoGlobe custe de US$ 10 a US$ 20. “No primeiro ano, nos focamos na invenção de uma tecnologia que funciona. Agora, temos um grande desafio: provar que o aparelho tem um impacto real, detectando a anemia e encaminhando os pacientes para o tratamento”, diz Achayra. 

      Dez perguntas e respostas para quem pretende comprar eletrônicos fora do Brasil

      Folha de São Paulo

      Na gringa
      (ALEXANDRE ARAGÃO)
      1 - Qual é o limite de compras que podem entrar no país sem pagar impostos?
      Até US$ 500, sem contar o que for comprado no "free shop" na volta. Mesmo que declare ter gastos abaixo do limite, o viajante pode ser fiscalizado.
      2 - Eletrônicos entram na cota?
      Depende. E-readers para uso pessoal e fora da caixa não entram no limite. Além disso, cada viajante pode trazer um celular, uma câmera fotográfica e um relógio para uso pessoal, também fora da caixa, fora do limite.
      3 - Qualquer celular comprado lá fora funcionará no Brasil?
      Não. Em 2013, ainda sem data definida, Anatel e operadoras colocarão em prática um sistema que impede que aparelhos sem homologação funcionem. Celulares e tablets habilitados antes de a regra entrar em vigor continuarão funcionando. Alguns modelos com 4G no exterior, como o iPhone 5, não conseguirão usar a tecnologia no Brasil.
      4 - Tablets que não foram homologados funcionarão?
      Depende. Os modelos que utilizam apenas redes wi-fi, como a versão mais simples do Google Nexus 7, funcionarão. Modelos com acesso à rede 3G não conseguirão acessá-la.
      5 - Quanto pagarei de taxas se trouxer mais de um celular?
      Quatro taxas incidem: Imposto de Importação, IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) -no caso de celulares, tablets e PCs, de 15%- e contribuições para PIS e Cofins, totalizando 74,25% a mais. Assim, se o celular custar US$ 100, ele sairá por US$ 174,25.
      6 - Vale mais a pena comprar celulares no exterior?
      Sim. Nos EUA, o iPhone 5 desbloqueado custa a partir de US$ 649. Para uso próprio, fora da caixa, não há impostos (veja pergunta 2). Com impostos, chega por cerca de R$ 2.340. Por aqui, ele sai por ao menos R$ 1.449, com plano atrelado. Desbloqueado, custa até R$ 2.699.
      7 - Existe limite no número de equipamentos que posso trazer, mesmo pagando taxas?
      Sim. Cada pessoa pode trazer até três unidades de um mesmo produto acima de US$ 10.
      8 - Existe diferença entre compras feitas com dinheiro e com cartão de crédito?
      Sim. Se a compra for feita com cartão de crédito, há cobrança de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), de 6,38%.
      9 - Que impostos são cobrados em compras feitas em sites com entrega no Brasil?
      Fora o frete, compras em outras moedas pela internet cobram IOF (de 6,38%). Para compras abaixo de US$ 500, o Imposto de Importação é de 60% sobre o valor total. Acima desse valor, o máximo é US$ 3.000 e, além do Imposto de Importação, é cobrado o ICMS, que varia de acordo com o Estado (18% em SP).
      10 - Como pago impostos de compras feitas na web?
      Depende. Alguns sites dão a opção de cobrar impostos no ato da compra. A alternativa é pagar os impostos para a transportadora que fizer a entrega, que o repassará à Receita -o produto fica retido até que tudo seja pago.

        História indígena valorizada - Mariana Peixoto

        Mapa etno-histórico dos índios brasileiros, que mostra deslocamentos, ocupações e línguas desde o século 16, passa a integrar programa Memória do Mundo, da Unesco. Acervo pertence ao Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém 

        Mariana Peixoto
        Estado de Minas: 17/12/2012
        Em 1943, o etnólogo alemão radicalizado brasileiro Curt Nimuendajú produziu documento que se tornou referência no estudo das etnias indígenas no país: o Mapa etno-histórico do Brazil e regiões adjacentes. Pertencente ao acervo do Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém (PA), ele agora é parte integrante do programa Memória do Mundo, da Unesco. Além de reconhecer a importância do documento, o projeto facilita também sua preservação.
        “O documento permite visualizar de maneira clara e precisa a imensa diversidade social e linguística do país, demonstrando além das localizações dos povos indígenas em todos os estados brasileiros os seus deslocamentos desde o século 16”, explica a coordenadora de Informação e Documentação do Museu Emílio Goeldi, Aldeídes Camarinha. No mapa produzido por Nimuendajú, as línguas indígenas são classificadas em 40 famílias linguísticas.

        O mapa entrou para o programa da Unesco por meio de candidatura. A cada ano, desde 2007 (ver destaque), uma série de documentos brasileiros se lança como candidato a entrar para o Memória do Mundo. “O museu sempre quis dar maior reconhecimento ao documento, um mapa manuscrito, normografado, colorido e produzido em grande formato. Lembro-me que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reeditou o mapa nos anos 1980”, conta Aldeídes.

        Para Ruben Caixeta, coordenador do programa de pós-graduação em antropologia da Universidade Federal de Minas Gerais, é difícil mensurar a importância da obra de Nimuendajú, “tão grande foi o impacto dela no campo acadêmico (em especial na área da etnologia) e nos processos administrativos para regularização de terras indígenas (que lançaram mão do mapa para atestar e demonstrar a longa ocupação dos territórios por diferentes grupos étnicos), tão gigantesco e abrangente foi o banco de dados disponibilizado por ela sobre a distribuição no espaço e no tempo das tribos indígenas (e suas respectivas línguas) no Brasil e nos países vizinhos”.

        A nominação no programa não implica nenhum compromisso da Unesco em destinação de recursos financeiros ou de outra natureza ao museu. “A instituição ganha a responsabilidade de preservação do documento e a sua disponibilização para o acesso ao público pesquisador. Logicamente, observadas as limitações que visem à sua preservação e segurança”, acrescenta a coordenadora do Goeldi.

        Neste mês, o Museu Goeldi recebeu o diploma pela nominação. Atualmente, o mapa está em processo de restauração. A partir de julho, ele deverá estar disponível para apreciação do público. Na edição 2012 do Memória do Mundo também foram nominados o Arquivo Herbert de Souza (1952-2003); o atlas e mapa do cartógrafo Miguel Antônio Ciera (1758); Coleção Carlos Gomes do Museu Imperial (1855-1942); a coleção de livros do tombo do Mosteiro de São Bento da Bahia (1543-1818); Fundo Câmara Municipal de Ouro Preto (1711-1889), entre outros.
        População de 
        menos de 900 mil

         Dados de pesquisa realizada em 2010 pelo IBGE indicam que há 896,6 mil índios vivendo em território nacional. Eles estariam divididos em 305 etnias e falando 274 línguas. Comparando com o primeiro levantamento do gênero, realizado em 1991, o crescimento populacional foi de 205%.

        Para Ruben Caixeta, a realidade indígena está mais complexa hoje em dia porque muitos índios vivem fora de suas próprias comunidades, grande parte em centros urbanos. “Por outro lado, há um intenso movimento de ressurgimento étnico, isto é, comunidades que antes não se consideravam indígenas (e sim como caboclas ou camponesas), hoje estão reconstruindo suas histórias, sua relação com uma territorialidade e com práticas culturais específicas ao ‘mundo indígena’.”

        Na opinião dele, isso só se tornou possível porque o preconceito diminuiu, de certa maneira. “No interior do estado, há posições e órgãos menos desfavoráveis aos índios, daí todo esse movimento de afirmação e valorização da condição indígena por parte da população mais pobre e pelos camponeses no Brasil. Além disso tudo, a taxa de natalidade indígena cresceu enormemente nos últimos anos.” Mesmo assim, o caminho ainda é longo. “O caso atual dos índios guarani e caioá, sobretudo no Mato Grosso do Sul, é um exemplo eloquente de que há um racismo e uma violência ostensivos contra os índios.”

        Memória Homem com  caminho próprio

        Nimuendajú significa “homem que abriu seu próprio caminho”. O alemão Curt Unckel se naturalizou em 1922 como Curt Nimuendajú, nome dado de “presente” pela tribo dos guarani-ñandeva. Nascido em Iena, em 17 de abril de 1883, o etnólogo, antropólogo e linguísta passou quatro décadas entre os índios brasileiros. Chegou a São Paulo em 1903. Ao partir para a Região Norte do país, onde passou a residir, estudou os povos guarani e caingangue. Na segunda década do século 20, começou a publicar seus primeiros trabalhos.Sua obra inclui artigos publicados em todo o mundo, livros, diários de viagens, fotos, resultados de viagens e estudos pela Amazônia, Ilha de Marajó, Pará, Tocantins, entre outros lugares. “Importante lembrar que o trabalho de Nimuendajú não é somente quantitativo ou demográfico, mas um apurado estudo sobre a organização social e  cosmologia indígena”, afirma Ruben Caixeta. Além do Museu Goeldi, o legado de Nimuendajú está conservado no Museu Nacional do Rio e Janeiro e em instituições da Alemanha e e da Suécia. Ele morreu em 10 de dezembro de 1945, entre os índios tucunas, no Norte do Amazonas. O etnólogo também dá nome a uma biblioteca digital (http://biblio.etnolinguistica.org), que reúne artigos e livros raros sobre línguas culturas indígenas ul-americanas.

        Duas décadas de preservação

        O programa Memória do Mundo está completando 20 anos. No Brasil, a iniciativa da Unesco para identificar e preservar documentos e arquivos de grande valor histórico se tornou ativa a partir de 2007. A Carta de Pero Vaz de Caminha foi o primeiro documento em língua portuguesa a ser incluído no programa. Arquivos dos escritores João Guimarães Rosa e Machado de Assis; do arquiteto Oscar Niemeyer; do ex-presidente Getulio Vargas; além da Lei Áurea e de manuscritos do maestro Carlos Gomes também integram o programa.

        Papai Noel traz inflação no trenó - Marta Vieira‏

        O monstro da inflação chegou para salgar a ceia de celebração do nascimento de Cristo este ano na Grande BH, tornando-a quatro vezes mais cara em relação a 2011. São 5,16%, contra 1,27%. Carnes, frutas e embutidos são os maiores vilões. Os cálculos, com base no IPCA, são do analista do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Antonio Braz e levam em conta uma cesta contendo 34 itens. A variação pode ser maior porque o indicador inflacionário oficial desconsidera produtos como peru, panetone, bacalhau, frutas secas e castanhas, também típicos dos cardápios nas comemorações de fim de ano. Para driblar os preços e não estourar o orçamento, o consumidor tem como opção ficar de olho em ofertas e usar a criatividade para levar à cozinha e à mesa ingredientes mais acessíveis ao bolso.

        Papai Noel traz inflação no trenó 

        Custo das festas de dezembro em Belo Horizonte quadruplicou, na comparação com os gastos feitos no mesmo período do ano passado. Alta de cesta com presentes e alimentos chegou a 5,16%
         

        Marta Vieira
        Estado de Minas 17/12/2012
        A festa do Natal na Região Metropolitana de Belo Horizonte encareceu quatro vezes mais neste ano em relação à variação dos gastos de 2011, sob a pressão dos aumentos dos preços das carnes, embutidos, frutas e bebidas. O conjunto das despesas com a celebração cristã nem passou perto do clima de proteção divina que cerca a data, enfrentando uma inflação de 5,16% de janeiro a novembro, comparada com a registrada em dezembro do ano passado, baseada numa cesta contendo 34 itens típicos de consumo no período, conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No mesmo período de 2011, confrontado com dezembro de 2010, o indicador calculado pelo analista do escritório do IBGE em Minas Gerais Antonio Braz de Oliveira e Silva havia mostrado alta de 1,27%.

        Para algum consolo das famílias da capital mineira e entorno, apesar da pancada no orçamento de 2012, a inflação do Natal na Grande BH foi a terceira mais baixa entre as 11 regiões metropolitanas onde o IPCA é apurado, depois de Brasília e do Rio de Janeiro (veja o quadro). O custo da festa, no entanto, pode ter superado a evolução encontrada nos números do IBGE, uma vez que desconsidera produtos com demanda ativa nesta época, a exemplo do peru, panetone, frutas secas, castanhas e bacalhau, itens que não entram na composição do IPCA.

        A inflação natalina inclui carnes de porco, frango, filé-mignon, camarão, presunto, cerveja, eletrodomésticos e equipamentos eletrônicos, TV, som e informática, joias e bijuteria, brinquedos e material esportivo, entre outros gastos. Âncoras da carestia, o grupo dos alimentos encareceu 7,72% na Região Metropolitana de BH, ante deflação de 0,79% registrada no ano passado, seguido da remarcação de 11,15% dos preços das bebidas, que já haviam encarecido 13,10% em 2011. O resultado não surpreendeu Antonio Braz diante da elevação do custo da comida em geral neste ano.

        “Em todas as regiões do país, as variações dos preços de alimentos e bebidas ficaram acima do IPCA, seja no domicílio ou fora dele”, afirma o analista do IBGE. O IPCA acumulou 5,48% de janeiro a novembro na Grande BH, impulsionado pela variação de 8,48% do grupo de alimentos e bebidas.

        Houve ainda uma revisão do cálculo do indicador, para adaptação à mais recente Pesquisa de Orçamentos Familiares, a POF, de 2008/2009, que aboliu o bacalhau, por exemplo, um produto sazonal, diferença que ajuda a entender parte das alterações da inflação do Natal de 2011 para 2012. Os preços do frango inteiro aumentaram 14,04% e os da carne de porco subiram 7,36%, em média, ganhando destaque que gera reclamações. 

        Enquanto confere o atendimento dos clientes do açougue Feijoada de Minas, no Mercado Central de BH, Rogério Belo, dono do estabelecimento, diz que a carne de porco despontou com uma elevação de preços de 10% só nos últimos seis meses. “Não há como deixar de repassar um aumento desses”, afirma. Consumidora frequente de carneiro, a aposentada Maria Aparecida da Silva já se preparou para cortar outros ingredientes da ceia de Natal para 30 pessoas da família, como parte das frutas, na tentativa de compensar o aumento da despesa com a carne preferida. O preço subiu R$ 3 por quilo em menos de três meses, saindo de R$ 19,90 para R$ 22,90. “A solução é deixar de comprar alguns produtos”, afirma.
        DE GOLE EM GOLE Insatisfeito com as remarcações da cerveja neste ano, o garçom Marcos Rogério Lima diz que chega a pagar até R$ 7 pela garrafa da bebida em bares e restaurantes da cidade, aumento médio que correspondeu a R$ 2,25, e vai tornar mais cara a festa da família. “Vamos ter de apelar para a vaquinha”, sugere, ao lado do amigo Carlos Alberto Paulino, estudante, que não dispensa a paixão na mesa do Natal. A compra direto nas distribuidoras pode ser a saída para Carlos. Elas vendem a caixa de 24 garrafas na faixa de R$ 70, ante os R$ 85 que o cliente pagaria num bar. O aperto na tributação estadual explica a alta, de acordo com Cristiano Lamêgo, superintendente do Sindicato das Indústrias de Bebidas de Minas Gerais (Sindbebidas).

        No caso da cerveja, pesa também o consumo sazonal muito forte da bebida do fim da primavera até o carnaval, que eleva os preços no varejo. Só a cachaça fugiu ao aumento médio de 2% da taxação sobre a pauta dos itens que compõem o cálculo do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) incidente nas bebidas, consideradas produto supérfluo. “Há um excesso de tributação que acaba inibindo investimentos na produção e em novas fábricas, o que poderia favorecer os preços para o consumidor”, justifica Lamêgo.


        Clientes tentam driblar preços 


        Nos extremos do ranking da inflação do Natal, a Região Metropolitana de Porto Alegre (RS) ficou na dianteira, com uma variação de 6,41%, em contraposição à elevação modesta para os padrões de 2012 de 3,51% em Brasília. A média do índice no Brasil acumulou 5,37%. “A inflação continua sob controle, mas, de fato, desejávamos uma variação mais próxima da meta (estabelecida pelo governo federal em 4,5%)”, diz Wanderley Ramalho, coordenador de pesquisas da Fundação Ipead, vinculada à UFMG, que apura os índices IPCA e IPC-R na capital mineira.

        Boa parte da elevação do IPCA no fim do ano reflete um forte componente especulativo na formação dos preços, que só o brasileiro indignado e que recusa aumentos exagerados pode evitar. “O consumidor tem de mostrar explicitamente que está vigilante. Do contrário, a componente especulativa ganha força”, diz Ramalho. Convicta desse papel, a dona de casa Lúcia Teixeira Campos não vê explicação razoável para remarcações de até 30% dos preços das carnes de boi e frango neste ano.

        Para a ceia de Natal da família, que reúne pelo menos 60 pessoas, Lúcia Campos costuma preparar bacalhau e pernil, mas se necessário não pensará duas vezes em substituir itens típicos do jantar. “Uma alternativa é comprar os ingredientes mais perto da data, porque sempre aparecem as ofertas”, recomenda. Além dos alimentos e bebidas, pesaram na inflação do Natal na capital mineira os grupos de despesas com recreação e joias e bijuterias. Os preços dos eletrodomésticos, equipamentos eletrônicos, TV, som, informática e aparelhos telefônicos, por sua vez, ajudaram a conter o fôlego do dragão. 

        A valorização do ouro, embalada pela crise financeira mundial, foi um dos fatores de encarecimento do grupo de joias e bijuterias – de 16,39%, mais do dobro da variação de 5,95% no ano passado –, na avaliação de Raimundo Viana, presidente do Sindicato das Indústrias de Joalheria, Ourivesaria, Lapidação de Pedras Preciosas e Relojoaria de Minas Gerais (Sindijoias). Outro argumento é o de que, acuada pela invasão chinesa, a indústria de folheados migrou para a fabricação de bijuterias , segmento que necessita de muita mão de obra, e valorizou a produção com o uso de pedras como o quartzo em substituição ao material sintético, movimento que ajudou a elevar os preços no varejo. “A alta reflete um produto que tem maior valor e qualidade embutidos na produção”, garante Viana. (MV)

        DAQUI PARA O FUTURO » Riscos em 2013 

        Previsões neste momento sobre o comportamento da inflação podem se limitar à pura ousadia. Para Wanderley Ramalho, coordenador da Fundação Ipead, vinculada à UFMG, a grande interrogação envolvendo os preços em 2013 é a possibilidade de estar se formando no país uma inflação reprimida. A dúvida é clara, na visão do pesquisador, sobre os efeitos da contenção de reajustes dos serviços públicos, exemplo clássico dos combustíveis. Embora não se trate de nenhuma ameaça inflacionária, Ramalho observa que se o governo retardar a correção dos preços da gasolina, ao soltar as rédeas mais à frente poderá provocar um problema no impacto que o ajuste terá em cadeia, desde o encarecimento do frete, passando pela produção da indústria até chegar às vitrines do comércio.