segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Fungos ameaçam acervo da Biblioteca Mário de Andrade

folha de são paulo
RAQUEL COZER
COLUNISTA DA FOLHA
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Parte do acervo da Biblioteca Mário de Andrade, o segundo maior do país, está infestada por fungos. O problema foi diagnosticado menos de dois anos após o encerramento de uma extensa reforma em seu prédio principal, ocorrida entre 2007 e 2011.
Levantamento interno feito entre dezembro de 2012 e fevereiro deste ano constatou que ao menos 15 dos 22 andares com acervo na torre principal da biblioteca, no centro de São Paulo, foram atingidos em alguma medida.
Foram 18 mil livros -incluindo raros, mais antigos- afetados, dentre os cerca de 340 mil que ficam nesses andares. No total, a biblioteca tem 7 milhões de itens, considerando livros, periódicos, mapas, fotos e documentos.
A questão foi identificada no ano passado por Maria Christina Barbosa de Almeida, que dirigiu a biblioteca no segundo mandato de Gilberto Kassab (PSD) na Prefeitura de São Paulo -gestão que iniciou a reforma na biblioteca.
Ze Carlos Barretta/Folhapress
Sala de periódicos da biblioteca, aberta ao público
Sala de periódicos da biblioteca, aberta ao público
Em março, ao passar o bastão para o novo diretor, o professor da USP Luiz Bagolin, ela entregou relatório apontando problemas na climatização. Indicado por Juca Ferreira, secretário de Cultura na gestão Fernando Haddad (PT), Bagolin assumiu o cargo oficialmente há um mês.
"A ocorrência chama a atenção. Não deveria haver fungos, já que o sistema é climatizado", disse ele à Folha.
Os fungos resultaram de uma umidade acima do ideal nos andares climatizados -chegando a superar os 60%, quando o recomendado para acervos bibliográficos é 45%.
Como quase todos os R$ 7 milhões do orçamento de 2013 da instituição já estavam empenhados quando Bagolin assumiu, foi necessário um adendo de R$ 400 mil para a higienização e restauro. O trabalho, já iniciado, deve durar de seis meses a um ano.
Nenhum livro chegou a se perder, segundo a instituição, mas volumes infectados ficam inacessíveis ao público, já que têm potencial para causar doenças, e podem ficar deformados.
Procurada para comentar o caso, a ex-diretora Maria Christina preferiu repassar à Folha o relatório que entregou a Bagolin em março.
O texto informa que, até 2007, só os cinco primeiros andares da torre, inaugurada em 1942, eram climatizados. Nunca haviam sido identificados fungos, embora uma infestação por brocas tenha atingido o acervo em 2006.
O sistema de ar condicionado começou a ser instalado em 2008 e a funcionar no segundo semestre de 2011. Entre projeto, instalação e manutenção, três empresas se envolveram no processo.
No início de 2012, foram percebidas deformidades em livros, causadas por fungos. Medidas como higienização e troca de equipamentos foram tomadas, mas no final do ano a situação se agravou.
Em maio deste ano, a biblioteca contratou o Instituto de Pesquisas Tecnológicas para diagnosticar os fungos; agora, especialistas buscam a origem do problema.
"Não sabemos se o projeto de ar condicionado está inadequado; se está adequado, mas a instalação teve problemas; ou se o projeto está adequado, a instalação está adequada e alguma coisa se desregulou", diz Bagolin.
Segundo ele, como a SP Obras fiscalizou a instalação em 2011, as empresas envolvidas não têm responsabilidade legal sobre o sistema.
O diretor lembra que a Mário de Andrade está de longe em condições melhores que a maior biblioteca do país, a Fundação Biblioteca Nacional, do Rio. Para ele, os fungos refletem um problema crônico nacional. "O Brasil engatinha no que diz respeito à preservação de acervos."
Editoria de Arte/Folhapress
DIGITALIZAÇÃO
A questão da preservação inclui a digitalização, em relação à qual Bagolin tem visão diferente da gestão anterior. Em vez de terceirizar o serviço, como vinha sendo feito, ele vem organizando um setor interno, para o qual contratou três funcionários.
"Temos 2.000 itens digitalizados num acervo de 7 milhões. Vejo no setor interno não só o serviço da digitalização, mas a aquisição de conhecimento e a chance de desenvolver pesquisa", diz.
Para 2014, a meta é comprar equipamentos básicos, que devem custar R$ 800 mil.
Outros mais caros, como robôs que viram as páginas sozinhos -como na Biblioteca Mindlin, atual parceira da Mário de Andrade na digitalização-, não são prioridade, já que obras raras têm de ser digitalizadas primeiro e suas páginas precisam ser viradas manualmente.
Outra meta é criar uma sala para crianças, hoje inexistente na instituição. O projeto, estimado em R$ 400 mil, será apresentado em outubro, em evento sobre políticas públicas para a infância.
É claro que as ideias dependem da boa vontade da atual gestão no município. Em 2012 e 2013, a BMA teve orçamentos de, respectivamente, R$ 6 milhões (após projetar R$ 11 milhões) e R$ 7 milhões (após projetar R$ 13 milhões). Para 2014, a meta é conseguir R$ 20 milhões.
RAIO-X LUIZ BAGOLIN
Eduardo Anizelli/Folhapress
Bagolin, novo diretor da BMA
Bagolin, novo diretor da BMA
Origem
Nasceu em 1964, em Ribeirão Preto (SP)
Formação
Artista plástico, com mestrado e doutorado em filosofia pela USP
Carreira
Professor e pesquisador do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP)

Quadrinhos - Charge

folha de são paulo

CHICLETE COM BANANA      ANGELI
ANGELI
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE
LAERTE
DAIQUIRI      CACO GALHARDO
CACO GALHARDO
NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES
FERNANDO GONSALES
MUNDO MONSTRO      ADÃO ITURRUSGARAI
ADÃO ITURRUSGARAI
BIFALAND, A CIDADE MALDITA      ALLAN SIEBER
ALLAN SIEBER
MALVADOS      ANDRÉ DAHMER
ANDRÉ DAHMER
GARFIELD      JIM DAVIS
JIM DAVIS

Copiar nem sempre prejudica a criatividade; na verdade, estimula

folha de são paulo
ENTREVISTA DA 2ª KAL RAUSTIALA E CHRISTOPHER SPRIGMAN
Para especialistas em propriedade intelectual, liberdade para imitar muitas vezes resulta em inovação e permite que os pobres desfrutem de símbolos do consumo
MARCELO NINIODE PEQUIMDemonizada pelos que defendem a ampliação das leis de patentes, a cópia nem sempre é inimiga da inovação. Ao contrário: com frequência, é a mãe da invenção.
É o que afirmam dois especialistas em propriedade intelectual, os norte-americanos Kal Raustiala e Christopher Sprigman, autores de "The Knockoff Economy" ("A Economia da Cópia", ainda não editado em português).
Remando contra a corrente das críticas à indústria da cópia, sobretudo a da China, eles dizem que há casos de sobra em que a liberdade para imitar resultou em inovação, como nos setores do software e da moda.
Leia trechos da entrevista que eles concederam à Folha, por e-mail.
Folha - A cópia e a criatividade podem coexistir?
Kal Raustiala e Christopher Sprigman - A opinião convencional é que copiar é ruim. Já que usualmente é mais barato copiar do que criar, copiar solaparia o incentivo à criação. É para isso que existem as leis de direitos autorais.
Na realidade, porém, copiar nem sempre prejudica a criatividade, e em certos casos até a estimula.
Um grande exemplo é a indústria da moda norte-americana. Nos EUA, é legal copiar designs de moda. Mas isso não impede que os estilistas desenhem coisas novas. Na verdade, a liberdade de cópia gera maior criatividade.
Quando cópias são feitas, o design original se torna uma tendência. Como todos sabemos, as tendências de moda um dia morrem, e o mercado exige novos designs para tomar seu lugar.
A liberdade de copiar faz com que esse ciclo gire mais rápido, dando-nos mais criatividade e opções de estilo.
Muitos outros setores são parecidos. Se compreendermos como o processo de cópia funciona, poderemos criar uma sociedade mais inovadora e criativa.
Em que casos os direitos de propriedade intelectual bloqueiam a inovação?
Quando dificultam a melhora de uma invenção. Boa parte das inovações ocorre gradualmente. Com o tempo, invenções são alteradas e refinadas para gerar produtos cada vez melhores.
Mas patentes e direitos autorais com termos excessivamente amplos podem tirar de cena os elementos básicos de um projeto ou invenção e, ao fazê-lo, tornar muito difícil ou dispendioso para terceiros a melhora de uma invenção.
A China é o maior alvo dos críticos. Vocês citariam um exemplo de cópia chinesa que resultou em inovação?
A Xiaomi é uma das fabricantes chinesas de celular com crescimento mais rápido. Criada menos de três anos atrás, a Xiaomi já vendeu 7 milhões de celulares e faturou 10 bilhões de yuans (cerca de R$ 3,8 bilhões). Os celulares da Xiaomi parecem muito familiares, porque o design imita o iPhone.
Superficialmente, a Xiaomi parece ser só mais uma imitadora chinesa. Mas isso desconsidera o aspecto mais importante da ascensão da companhia e uma importante tendência no estilo chinês de "imitação inovadora".
A Xiaomi se tornou uma força na China em parte por se parecer muito com a Apple. Mas seu sucesso na verdade se deve ao fato de ela ser o oposto da Apple.
A gigante americana é famosa pela abordagem "fechada" quanto à tecnologia. A Apple mantém controle fastidioso sobre o design de seus produtos e acredita que sabe melhor que o consumidor o que este deseja.
Enquanto a Apple se comporta de modo ditatorial, a Xiaomi é bastante democrática. Confia muito nas reações dos consumidores.
A cada sexta-feira, a companhia lança atualizações de seu sistema operacional, baseado no Android. Em poucas horas, milhares de frequentadores dos fóruns da empresa sugerem novos recursos e ajudam a resolver defeitos no software.
Assim, a Xiaomi combinou efetivamente o design da Apple e o espírito colaborativo do movimento do software aberto. A Xiaomi é claramente imitadora. Mas também inovadora.
Os senhores argumentam que a ansiedade dos EUA quanto à pirataria chinesa é "um equívoco". A proteção da propriedade intelectual não é de interesse nacional?
Alguns setores prosperam sem proteção à propriedade intelectual. Ampliar essa proteção não necessariamente significa mais sucesso ou crescimento econômico.
Veja o setor de banco de dados. Nos EUA, os bancos de dados não contam com forte proteção de copyrights. Na Europa a situação é a oposta, devido a uma mudança nas leis na década de 1990.
Mas, nos anos transcorridos desde então, o setor vem crescendo mais nos EUA que na Europa. A questão não é a propriedade intelectual, mas a inovação e o crescimento. A propriedade intelectual pode representar uma barreira para isso.
Qual é a importância social da liberdade de copiar?
A China continua a ser um país pobre, mas está crescendo com extrema rapidez. Também é uma das nações com mais desigualdade no planeta, ao lado do Brasil.
Em países com alta desigualdade, as cópias dão aos pobres a oportunidade de desfrutar de alguns dos símbolos de uma sociedade de consumo. Assim, as cópias são uma forma de aliviar ao menos em parte as pressões causadas pela desigualdade.
Isso é importante porque explica a resistência chinesa em impedir as cópias.
A tolerância da população chinesa facilita a prosperidade da indústria da cópia?
"Shanzhai", como é conhecida a cópia de baixo custo na China, significa literalmente "baluarte de bandidos". Mas na China moderna denota um tipo inteligente de cópia que toma um modelo dispendioso e o muda um pouquinho para atender ao consumidor médio.
O governo reconhece esse ponto, considerando alguns dos "shanzhai" como bons exemplos da engenhosidade do povo chinês.
Em que casos a cópia beneficia o produto original?
Bill Gates tinha razão quando disse que, "se eles pretendem roubar, melhor que roubem o nosso produto". O software, especialmente, é um bem dotado do que economistas denominam "externalidades de rede".
Isso significa que, se apenas uma pessoa usar o Microsoft Word, usá-lo não será útil para você. Mas, se todo mundo em seu escritório usar o programa, ele será muito útil e é mais provável que você opte por ele do que por um formato concorrente.
Assim, permitir cópias expande a fatia de mercado, e isso pode se tornar valioso no futuro, mesmo se as cópias atuais forem piratas.
Os senhores sugerem que os EUA deveriam levar sua história de pirataria em conta e "relaxar". Por quê?
No século 19, os EUA eram grandes copiadores, e a superpotência econômica que reinava no período, o Reino Unido, odiava isso.
Mas, com o tempo, todas aquelas cópias terminaram por ajudar muitos britânicos e criaram imenso mercado para bens britânicos. Hoje os EUA se tornaram a maior força para a expansão das leis de propriedade intelectual.
Com o tempo, a China seguirá caminho semelhante.
Sabemos que países passam a dedicar mais atenção à propriedade intelectual à medida que enriquecem e desenvolvem conhecimentos especializados, mas isso pode tomar muito tempo.
Assim, seria sábio que os EUA pensassem no futuro e reconhecessem que a China não mudará assim tão cedo e que copiar não é assim tão ruim quanto muita gente foi levada a crer.
    RAIO-X
    KAL RAUSTIALA, 47
    Atuação: diretor do Centro Burkle de Relações Internacionais e professor da Universidade da Califórnia em Los Angeles
    Especialidades: direito internacional e propriedade intelectual
    CHRISTOPHER SPRIGMAN, 47
    Atuação: professor de direito da Universidade da Virgínia
    Especialidades: lei de propriedade intelectual, políticas de competição e direito constitucional

      Ronaldo Lemos

      folha de são paulo

      iPhone 'popular' aponta para o futuro da tecnologia


       
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      A ficha caiu. O futuro do consumo de tecnologia está na "base da pirâmide" social. Os 5 bilhões de habitantes desconectados do planeta tornaram-se peça importante para empresas de tecnologia.
      O Facebook anunciou na semana passada que vai entrar pesado (em parceria com empresas de celular) na expansão da internet para países pobres. O plano traz uma série de questões. Mas o anúncio aponta claramente para onde a empresa está olhando.
      A Mozilla também acaba de lançar o Firefox Phone, para população de menor renda. Feito com tecnologia 100% aberta, custa US$ 80. A primeira remessa esgotou-se em uma semana na Inglaterra (o aparelho vai ser lançado também no Brasil, na Colômbia e na Venezuela).
      Até a Apple vai soltar um celular popular. A próxima versão do iPhone será dividida em duas. O iPhone 5S será vendido nos EUA como produto topo de linha. Já o iPhone 5C, mais simples, vai para o resto mundo a preço menor. É a primeira vez que a Apple adota uma estratégia de segmentação de preço tão agressiva.
      A Samsung também entrou na jogada. Na Índia, a empresa está fabricando celulares no modelo antigo, parecido com os primeiros fones da Nokia. São de baixíssimo custo (menos de US$ 20), mas com funcionalidades um pouco melhores (veja aqui: bit.ly/samindia). Resultado: sucesso absoluto.
      O Brasil poderia ter entrado para liderar no desenvolvimento de tecnologia para a base da pirâmide social. A concorrência nesse nicho era pequena e desorganizada. A janela ficou aberta por um bom tempo. Agora começou a se fechar.
      *
      READER
      JÁ ERA Beber ou usar o celular enquanto dirige
      JÁ É Usar um aplicativo para chamar um táxi depois de beber
      JÁ VEM Pedir bebida no bar, sem fila, com aplicativos como o BarEye.com e o FlowTab.com
      ronaldo lemos
      Ronaldo Lemos é diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV e do Creative Commons no Brasil. É professor titular e coordenador da área de Propriedade Intelectual da Escola de Direito da FGV-RJ. Foi professor visitante da Universidade de Princeton. Mestre em direito por Harvard e doutor em direito pela USP, é autor de livros como "Tecnobrega: o Pará Reiventando o Negócio da Música" (Aeroplano). Escreve às segundas na versão impressa do "Tec".

      As chances de Eduardo Campos - RENATO JANINE RIBEIRO

      Valor Econômico - 26/08/2013

      Confesso ter minimizado, indevidamente, o alcance das aspirações presidenciais de Eduardo Campos. O governador de Pernambuco não é o candidato com mais chances em 2014, à primeira vista, mas no quadro atual desfruta de condições singulares que podem ser bastante favoráveis.

      Vejamos. Campos é o único candidato que, provindo da base de governo, à qual ainda pertence, é capaz de conquistar votos na oposição. Neto de Miguel Arraes, o governador mais odiado pela direita golpista de 1964, tem boas credenciais no campo que vai da esquerda ao centro. E é presidente do PSB, que disputa com o PMDB o segundo lugar na aliança governamental; dependendo do critério, é um ou outro.

      Também é quem melhor dialoga com a oposição. Sim, o PMDB pode flertar com ela, mas não dispõe, nem em Michel Temer, de um líder tão livre como Campos para dizer o que pensa. E o que ele pensa agrada a uma parte do eleitorado e dos potenciais financiadores do PSDB.

      Se o PT lidera há bom quarto de século a centro-esquerda em nosso País, e desde 1989 é uma das duas forças principais na política brasileira, a liderança da centro-direita cabe, desde 1994, ao PSDB. Mas é essa liderança que agora entra em xeque. Ou seja, a centro-direita existe e continuará existindo. Disputará com o PT, no voto, a hegemonia política no País. Mas hoje sofre uma crise de liderança que, na verdade, é uma crise interna do PSDB, afetando a vasta faixa de opinião que ele tem representado.

      Os conflitos entre Aécio Neves e José Serra pela candidatura à Presidência em 2014, intermináveis, são sinal disso. Podem resultar de ressentimentos, talvez do político paulista. Mas na verdade se trata de uma crise de destino do PSDB e de uma crise de representação da centro-direita.

      Estas duas crises merecem tratamento à parte, o que faremos em artigo futuro. Mas, por ora, vamos à conjuntura que favorece Eduardo Campos.

      Caso Serra deixe o PSDB para candidatar-se por outro partido, quase certamente selará sua derrota, mas também a de Aécio. Por derrota, aqui, não entendo perder, no segundo turno, para o PT. Entendo algo maior e pior: nem mesmo chegar ao segundo turno. Aqui crescem as chances de Campos, assim como as de Marina Silva.

      Agora, o desentendimento interno ao PSDB - ou, se quiserem, a cisma de Serra se dispondo até mesmo a realizar um cisma dentro do partido - já basta para enfraquecer os tucanos, mesmo que Serra não saia. Consta que, na melhor das hipóteses para Aécio, que é sua indicação presidencial sem a saída de Serra, este último fará corpo mole na campanha. Isso é ruim em termos de imagem. Basta lembrar a recente eleição paulistana, em que Marta Suplicy, frustrada pelo dedaço de Lula no intento de concorrer à prefeitura, se afastou da campanha de Haddad, somente se integrando nela nas semanas finais e cruciais. Coincidência ou não, foi quando Haddad disparou para a vitória. Pois é. Um boicote interno à candidatura Aécio já faria muito mal. Mais uma vez, a conjuntura favorece Campos - e Marina.

      E há mais uma perspectiva no horizonte. Será lamentável se uma força de opinião significativa como o Rede não puder concorrer em 2014. Mas, se o TSE puser paradeiro ao atraso dos cartórios eleitorais na verificação das assinaturas, o Rede não poderá culpar a ninguém por um eventual fracasso. Terá sido Marina que demorou mais de dois anos a se definir.

      Aliás, mesmo que Marina concorra, a ausência de palanques nos Estados expõe sua aspiração a sérias dificuldades. Suas perspectivas de sucesso são as mais difíceis, hoje, de medir.

      O que resultaria de um forfait da Rede ou do fracasso da candidatura de Marina Silva, somada a uma crise no PSDB? Aumentarão as chances para Eduardo Campos. Ele pode ganhar a preciosa indicação da segunda vaga (a primeira sendo do PT) para o turno final das presidenciais. Pode realizar o que é o sonho de Aécio, o discurso do político mineiro, que consiste em propor um governo pós-PT e não anti-PT. Também isso não é fácil, mas Campos não está marcado pelo ódio ao petismo, longe disso; e soube distanciar-se do PT não nos tempos de Lula, mas depois que ele deixou a presidência para uma sucessora sem o seu carisma. Mesmo a eleição no Recife, em 2012, que foi a segunda vitória de Campos sobre o antigo e ainda atual aliado (a primeira se deu em 2006), se deu no quadro de um enorme desgaste do então prefeito petista da capital pernambucana.

      Um candidato que vem da centro-esquerda, comprometido com causas sociais, com fama de bom gestor, falando aos empresários e que permita vivermos uma campanha que atenue o clima de ódio que cresceu entre PSDB e PT: este o perfil que Campos construiu. Isso não basta para vencer mas, numa conjuntura em que a Rede não compareça e os tucanos se dividam, pode dar certo.

      O cerne da coisa é: o que se está disputando?

      Serra só pode disputar a Presidência. Estar no segundo turno não lhe basta.

      Mas, para Aécio, Marina ou Eduardo Campos, ganhar um lugar no segundo turno já é uma grande vitória. Nas últimas três eleições, o segundo turno foi do PT e do PSDB. Agora, pela primeira vez, o lugar do PSDB está a perigo. Quem ganhar essa posição se consagra, mesmo perdendo na final do campeonato presidencial, como líder da oposição num talvez desgastado quarto mandato petista. Torna-se líder da centro-direita. E, com isso, muda os termos em que a nossa política está sendo jogada. Imaginem uma centro-direita cujo lema é o discurso sustentável. Ou que tenha em Eduardo Campos a expectativa de uma síntese entre o que é melhor do PT e o melhor do PSDB. Tudo muda.

      Tv Paga


      Estado de Minas: 26/08/2013 

      Barra Pesada 


       (Adrian Teijido/Divulgação)


      O cinema brasileiro marca mais um tento esta noite com a estreia de Boca, às 22h, no Telecine Premium. Dirigido por Flávio Frederico, tem Daniel de Oliveira (foto), Hermila Guedes e Jefferson Brasil nos papéis principais, em uma trama ambientada na célebre Boca do Lixo, área de prostituição na região central de São Paulo. Depois de uma tragédia pessoal, o personagem Hiroito deixa de ser apenas um visitante boêmio e passa a morar no local, iniciando uma carreira criminosa.

      Muitas alternativas na
      programação de filmes


      Uma segunda-feira com muita variedade no pacotão de cinema. Somente na concorrida faixa das 22h, o assinante tem pelo menos 10 boas opções: Paranormal, no Telecine Pipoca; The entitled, na HBO 2; Invasão do mundo: Batalha de Los Angeles, na HBO HD; Poltergeist – O fenômeno, na HBO Plus; A traição, no ID; Chumbo grosso, no Studio Universal; Afinado no amor, no Glitz; Separados pelo casamento, na MGM; Se beber não case, na Warner; e O tigre e o dragão, no Max Prime. Outros destaques da programação: Promessa de amor, às 21h30, no Viva; Meia-noite em Paris, às 21h50, no Max; e Maridos e mulheres, às 23h, no Comedy Central.

      SescTV prefere apostar
      nos curtas-metragens


      Os filmes O filho do vizinho (2010), de Alex Vidigal, e A grande viagem (2011), de Caroline Fioratti, estreiam hoje na série Faixa curtas, às 21h, no SescTV. O primeiro mostra o dia a dia de um menino cadeirante que, de sua janela, observa a vida dos outros e admira as aventuras do filho do vizinho. Apesar de ter vários amigos, Ronaldinho quer a amizade do filho da vizinha e este também quer ser seu amigo. Já o segundo curta narra o conflito de um idoso que confunde presente e passado e insiste em voltar aos tempos em que vendia guias de viagens.

      Médium psicografou o
      último livro de Balzac


      No Canal Brasil, a sessão É tudo verdade reservou para hoje, às 22h, o documentário inédito O último romance de Balzac. Dirigido por Geraldo Sarno em 2010, o filme reúne relatos que provocam uma reflexão a respeito dos mistérios envolvidos no ato criativo em si e faz o espectador chegar às suas próprias conclusões. Tudo isso a partir da história do médico e médium Waldo Vieira, que psicografou, em 1965, o romance Cristo espera por ti, atribuído ao escritor francês Honoré de Balzac.

      Mônica Salmaso canta
      com o quarteto Maogani


      Ainda no Canal Brasil, às 18h45, a cantora Mônica Salmaso é a convidada de Zé Nogueira no programa Estúdio 66, acompanhada do quarteto Maogani para interpretar as canções Retire, Cabrochinha e Ave Maria no morro. Já às 21h30, no programa Espelho, Lázaro Ramos entrevista o colega Antônio Fagundes. E à meia-noite, em Matador de passarinho, Rogério Skylab recebe a produtora Maria Juça, administradora do Circo Voador, no Rio de Janeiro.

      Receita para quem está
      a fim de engolir sapos


      O Discovery Channel exibe nesta segunda-feira, às 19h50, o quarto episódio da série Perigo: receitas venenosas, que apresenta pratos diferentes e até com alimentos arriscados, que precisam ser muito bem preparados. O episódio “Anfíbios” mostra que comer sapos pode parecer um pesadelo, mas diversas pessoas se arriscam e se alimentam desse anfíbio, que é um dos mais venenosos do mundo. 

      Música em movimento[MIMO] - Mariana Peixoto

      Mimo completa 10 anos e tem abertura em Paraty com shows de Herbie Hancock e Stephan Micus.Na quinta-feira, festival chega a Ouro Preto com presenças de Gilberto Gil, Madredeus e Omar Sosa 


      Mariana Peixoto

      Estado de Minas: 26/08/2013 


      O pianista e compositor Herbie Hancock mostrou por que é um mito do jazz contemporâneo em apresentação emocionante (Fotos: Beto Figueiroa/Divulgação)
      O pianista e compositor Herbie Hancock mostrou por que é um mito do jazz contemporâneo em apresentação emocionante


      Paraty – Uma garrafa de cerveja arremessada por um bebum na porta da Catedral da Sé, em Olinda, na quarta-feira de cinzas de 2003. Tal cena incomodou tanto a produtora cultural Lu Araújo – paulista radicada no Rio de Janeiro, filha de paraibano com pernambucana –, que acabou culminando na criação de um evento com foco na música instrumental. Um ano mais tarde, a mesma igreja foi palco de um histórico concerto de Nelson Freire (800 pessoas sentadas e 1,4 mil do lado de fora para conseguir lugar) que abriu a Mostra da Música Independente de Olinda (Mimo). Uma década depois, agora transformado em Movimento Mimo, fez sua estreia no fim de semana em Paraty. Com dimensão muito maior do que poderia se supor 10 anos atrás, chega nesta quinta-feira a Ouro Preto (para sua segunda edição em Minas Gerais) e na semana seguinte a Olinda, para a edição comemorativa.

      Estreia com excelência, diga-se de passagem, sobre Paraty. A cereja do bolo veio logo na partida, com Herbie Hancock em noite absolutamente perfeita, na falta de uma palavra melhor para definir a apresentação de sexta-feira. Noite enluarada, Praça da Matriz apinhada, som cristalino, tudo convergiu para que a apresentação do genial jazzista fosse impecável. Acompanhado de trio – o baterista norte- americano Vinnie Colaiuta (fez história com Frank Zappa), o percussionista indiano Zakir Hussain e o baixista beninense Lionel Loueke –, Herbie fez uma viagem por sua própria trajetória, tanto no teclado quanto ao piano.

      O antigo parceiro de Miles Davis protagonizou longas improvisações com sua banda, ora em clima mais intimista, ora em momentos mais funkeados. Utilizou inclusive o vocoder (instrumento que sintetiza a voz, deixando-a robótica), que marcou sua fase entre o final dos anos 1970 e início dos 1980. Pegou o microfone e falou que o efeito havia sido tão banalizado que o tinha deixado de lado, voltando somente agora a reutilizá-lo. A aproximação do jazzista com o hip hop veio no final da apresentação, quando scratches anunciaram uma de suas composições mais conhecidas, Rockit (1983). Seu maior clássico, Cantaloupe Island (1964) foi citado várias vezes ao longo de digressões instrumentais.

      Duduki e nohkan
      O desafio do Mimo, ao longo dos dias, é conseguir manter o nível da abertura. Em Paraty conseguiu, principalmente pela diversidade das atrações. Caso do alemão Stephan Micus, que está pela primeira vez no país. Músico de formação nada convencional e com 20 álbuns lançados, Micus é a perfeita tradução do multi-instrumentista. Em seu currículo são contados pelo menos 100, muitos ancestrais. Micus toca instrumentos não da forma como são conhecidos em sua cultura de origem, mas em suas próprias composições.

      Na Matriz de Nossa Senhora dos Remédios, sob um silêncio respeitoso a despeito da lotação, interpretou músicas utilizando duduki (oboé armeno) e nohkan (flauta japonesa utilizada no teatro nô), entre outros. Ele encontra e estuda os instrumentos em seus próprios países. “Para entender uma música fora de sua própria cultura, você tem que viver aquele país, aprender sua filosofia, religião, arquitetura”, disse. Micus voltou, por exemplo, há pouco mais de uma semana de viagem à África. Em Botswana, viajou por 14 quilômetros numa picape em dunas de areia até chegar a uma pequena comunidade para encontrar uma kalimba. “Toda vez que tocar esse instrumento, a história de como o consegui estará com ele.”

      Já da Jordânia veio Rum Tareq Al Nasser, que comanda uma pequena orquestra de quase 20 instrumentistas. Também estreante no país, levou no sábado, para a Praça da Matriz, um repertório que busca revitalizar a música árabe, utilizando elementos do jazz, blues e reggae. Com muita percussão e cordas, conseguiu, sem palavras, comunicação total com a plateia, que pediu, por meio de palmas, que ele voltasse para um inesperado (e emocionado) bis. Nasser está no país desde o dia 20 ensaiando com jovens músicos da Orquestra de Barra Mansa, que o acompanham no naipe de cordas.

      Bandolins
      Também neófitos no país, os belgas do quarteto MANdolinMAN estão fazendo aqui sua prova de fogo. Tocar bossa nova (têm um álbum dedicado ao gênero) ao som de bandolim. “No violão você tem seis cordas, então pode tocar seis notas. Só que o bandolim tem quatro cordas duplas, ou seja, temos que deixar duas notas de fora. Isso não é fácil”, assume o fundador do grupo, Andries Boone. À exceção de Hancock, que no Mimo só tocou em Paraty, os outros músicos se apresentam em Ouro Preto.

      E, uma vez terminada a edição 2013 do festival, o Mimo não vai esperar mais um ano para voltar à pauta. Como Movimento Mimo, abrange ainda um portal, web-rádio, aplicativo. “O festival agora é uma ação do movimento. Fizemos um plano para 10 anos e queremos chegar a 10 cidades”, afirmou Luiz Calainho (ex-executivo da Sony Music, um dos sócios da ArtRio), que se associou este ano ao projeto. Ainda estão previstas ações em grandes cidades, Belo Horizonte entre elas. Olhando para o ponto de partida, Lu Araújo se diz curiosa em saber se aquele carnavalesco bêbado tem noção do que seu ato impensado acabou gerando.

      No palco e nas telas

      O alemão Stephan Micus toca cerca de 100 instrumentos de várias regiões do mundo, imprimindo sempre sua personalidade musical (Beto Figueiroa/Divulgação)
      O alemão Stephan Micus toca cerca de 100 instrumentos de várias regiões do mundo, imprimindo sempre sua personalidade musical
      “Sou um ator frustrado que não se realizou no teatro porque ele é tão absorvente quanto a música. Já o cinema satisfaz essa necessidade em pouco tempo.” Este é Ney Matogrosso, ator. Foi “descoberto” pela cineasta Ana Carolina na década de 1980, com Sonho de valsa (1987). Mais recentemente, retornou com tudo à tela grande. Fez Luz nas trevas – A volta do bandido da luz vermelha (2010, de Helena Ignez), Primeiro dia de um ano qualquer (2012, de Domingos de Oliveira). Ainda tem um inédito, Gosto de fel (Beto Bezan), e acabou de filmar, novamente com Helena Ignez, O poder dos afetos.

      Mas o que levou Ney a Paraty foi Olho nu, documentário de Joel Pizzini sobre sua vida e trajetória artística. O longa, que estreou no Festival de Brasília de 2012, só teve uma nova exibição pública agora, com novo corte. “Tinha umas imagens ruins, o som ruim, fui para São Paulo consertá-los. Não tinha justificativa o filme ter sido apresentado em Brasília com problemas. E ainda achava longo demais. Naquele momento, me perguntaram se iriam levá-lo para outros festivais. ‘Não’, eu disse, ‘só quando estiver todo corrigido’”, afirmou Ney.

      Um ano mais tarde, deixou a sessão na noite de sábado, na Casa de Cultura, ovacionado e com muita gente do lado de fora esperando para assistir à sessão extra de Olho nu. Projeto nascido no Canal Brasil, o filme é um documentário pautado na figura de Ney Matogrosso. O artista disponibilizou 300 horas de gravações antigas (depoimentos, shows, programas em diferentes formatos) de seu próprio acervo. Pizzini gravou com ele outras duas centenas de horas. Além de Ney, somente sua mãe gravou depoimento para o filme, que foge do formato convencional. “Desde o começo do projeto tive direito de opinar. Monto meus shows, então tenho noção do espetáculo. Olho esse filme como um espetáculo.”

      Olho nu está na programação do Festival Mimo de Cinema, braço audiovisual do evento dedicado a filmes sobre música. Por causa da turnê Atento aos sinais, Ney não poderá estar presente nas sessões em Ouro Preto e Olinda. Já com datas em outros festivais, Olho nu deve chegar ao circuito comercial em março do ano que vem. “Eu não sou da música. Eu sou das artes, tanto que me misturo com teatro, cinema. “É tudo um mesmo princípio que se ramifica”, disse Ney, que deixou a sessão em Paraty acompanhado de fãs. E agora, satisfeito com o novo corte? “Ainda está um pouco longo.”

      Mimo


      Ouro Preto, de quinta a domingo. Shows, palestras e exibição de filmes. Entre as atrações, Gilberto Gil, Duo Milewski & Fortuna, Stephan Micus, Guillaume Perret & The Electric Epic, Ibrahim Maalouf, MANdolinMAN, Madredeus, Dona Onete, Música Figurata, Rum Tareq Al Nasser, Omar Sosa, Stefano Bollani & Hamilton de Holanda. Programação completa no portal www.mimo.art.br. Entrada franca.

      A repórter viajou a convite do Mimo

      Eduardo Almeida Reis-Três dias‏


      Estado de Minas: 26/08/2013 


      Sete anos de pastor Jacó servia Labão, pai de Raquel, serrana bela; mas não servia ao pai, servia a ela, que a ela só por prêmio pretendia. Os dias, na esperança de um só dia, passava contentando-se com vê-la; porém o pai, usando de cautela, em lugar de Raquel lhe dava Lia.

      Se o soneto de Luís Vaz não é exatamente assim (meu Camões anda sumido desde a mudança), é muito parecido. Lembrei-me dele, soneto, depois de passar 72 horas sem televisor. E olhem que tive um dos primeiros televisores do Rio, com o seguinte detalhe: ainda não havia televisão. Você ligava o aparelho, obviamente preto e branco, e a vizinhança afluía em peso para ver os chuviscos na telinha de 14 polegadas: um sucesso! Algum tempo depois, a TV Tupi passou a transmitir sinal com a figura de um índio, para que os técnicos pudessem instalar as antenas nos altos dos edifícios de Copacabana. E a vizinhança ficava fascinada pela figura imóvel do silvícola.


      De lá para cá, todo mundo viu. Hoje o negócio é à base do diodo emissor de luz, conhecido pela sigla LED, em inglês Light Emitting Diode, que já se usa nos sinais de trânsito (chamados semáforos em Belo Horizonte), nos faróis dos automóveis, em painéis, cortinas e pistas de LED.


      Nos três dias sem tevê devo ter deixado de ver centenas de depoimentos idiotas sobre a tragédia da Vila Brasilândia, em São Paulo, SP, onde perderam a vida cinco pessoas, e críticas idiotas ao presidente do STF por ter constatado o que a humanidade pensa. Mas descobri algo que deve ser dividido com o leitor.


      Dizia-se que a televisão acabaria com o rádio e o cinema, que continuam firmes e fortes. No meu caso, descobri agora, tem prejudicado a leitura. Nas 72 horas que fiquei sem o televisor, que “congelou” em Renata Lo Prete, antes da visita do meu neto mais velho para consertar o enguiço, dei cabo da metade de um livro cuja leitura estava encruada e li um outro, inteirinho, de 589 páginas em letrinhas miúdas.


      Isso depois das atividades escrevinhantes, que tanto me divertem durante várias horas por dia. Passei a entender e louvar a figura do imenso Paulo Rónai, que, segundo li em algum lugar, não tinha televisão em casa. Sem tevê, sobrou tempo até para que o mais desarrumado dos homens sérios se transformasse em arrumador-mor. E o mais grave é que estou aprendendo. Já tenho uma gaveta de pilhas, clipes, fios carregadores de celulares, e outra de benjamins e tomadas, ou adaptadores de tomadas inventadas pelo misto de ladroeira e imbecilidade brasileira, que adotou tomada única no mundo. Dizem que, com ela, tomada só existente neste país grande e bobo, alguém faturou mais que R$ 3 bilhões. Não é nada, não é nada, US$ 1,5 bilhão no câmbio do dia: em matéria de gatunagem, o pessoal é criativo à beça e à bessa.

      Peúgas


      A televisão foi buscar um sociólogo da PUC-Rio para tentar explicar as manifestações que tomaram conta das ruas de um país grande e bobo. O ilustre professor deitou falação, boa voz e dicção razoável prejudicadas, anuladas, desmoralizadas pelo fato de usar meias brancas. Que se pode esperar de um sujeito que usa peúgas brancas fora das quadras de tênis?
      E isso numa tarde/noite em que um philosopho amigo nosso estava de meias amarelas, sem que soubesse explicar como o pavoroso par de peúgas, tamanho 12, fora parar em sua gaveta. Já lhes disse que tenho meias belgas, canos longos, que me custaram uma fortuna em euros, antes da crise europeia. De tão chiques, não tenho coragem de usá-las. Há uns seis pares ainda virgens, azuis escuros para combinar com os sapatos pretos dos homens sérios. De couro ou pelica, valha a informação.


      Deu-se que precisei passar um creme nas patas antes de calçar as botinas. Fui à gaveta das meias e lá estava o par amarelo-areia. Podia ser pior: amarelo-ovo, mas amarelo-areia já era de lascar. Tamanho 12, o par não era virgem. Dei nele uma esticada, passei o creme nos pés, vesti as peúgas, calcei as botinas e fiquei torcendo para não aparecer visita. Felizmente sou pouco visitado. Resta saber como foi que as peúgas amarelo-areia pintaram na gaveta de um homem sério.

      O mundo é uma bola


      26 de agosto de 55 a.C., Júlio César invade a Grã-Bretanha. Em 1429, Joana D’Arc entra em Paris, o que nunca foi original: até hoje, centenas de jornalistas mineiros vivem entrando em Paris. Em 1498, a Pietà é encomendada a Michelangelo pelo cardeal francês Jean Bilhères de Lagraulas, mas a mesma fonte nos diz que a encomenda foi feita no dia 21 de setembro.
      Em 1769, Francisco de Castro é autorizado a estabelecer uma fábrica de tecidos de linho em Abrantes. Em 1978, o cardeal Albino Luciani é eleito papa João Paulo I. Morreu um mês depois, falou-se em conspiração, mas é possível que tenha sido morte morrida.


      Em 1743 nasceu o francês Antoine Laurent de Lavoisier, considerado o Pai da Química, morto em 1794 pela Revolução Francesa.

      Ruminanças


      “Aguardamos a invasão prometida há tempos. Os peixes também” (Churchill, discurso pelo rádio em 21.10.1940).

      Reflexo de vidas passadas Luciane Evans


      Estado de Minas: 26/08/2013 


      Para a medicina tradicional, uma questão genética, complexa, que pode ser, talvez, causada por alterações químicas no cérebro. E, apesar de tantos estudos, ainda não se sabe ao certo a causa deles. Mas, para os médicos espíritas, os transtornos mentais têm, sim, explicações. Essa área da medicina, inclusive, é a que mais se distancia da medicina tradicional. Questões emocionais desta e de outras vidas entram em jogo. "O transtorno mental é um resquício do passado", define o presidente da Associação Mineira dos Médicos Espíritas, Andrei Moreira, apontando aí as vidas passadas como ponto de partida para essa discussão.

      Uma vez que as interpretações para os males mentais são diferentes para os médicos espíritas, na série do Estado de Minas A saúde à luz do espiritismo, que começou ontem, o tema a ser tratado nesta segunda reportagem é referente a essas explicações sobre os males da mente. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, as doenças mentais e neurológicas atingem aproximadamente 700 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, estima-se que 23 milhões de pessoas precisem de algum atendimento em saúde mental. Pelo menos 5 milhões sofrem com transtornos graves e persistentes.

      Segundo o psiquiatra e diretor-técnico do Hospital André Luiz, Roberto Lúcio Vieira, a psiquiatria é a área da medicina em que os ensinamentos espíritas mais conseguem aparecer. Isso porque, segundo ele, além de levar em consideração questões genéticas, assim como a medicina tradicional, os médicos espíritas, diante de um paciente com transtorno mental grave, levam em conta as vidas passadas. "O adoecer é o caminho para a cura. Temos percebido que muitos males, como os quadros graves de esquizofrenia, geralmente são de espíritos que, em outras vidas, abusaram muito do poder que tinham, cometeram homicídios ou tentaram o suicídio várias vezes. Quando eles adoecem nesta vida, é porque bateu a culpa da vida anterior", explica Roberto.

      Também membro da Associação Mineira Médico Espírita, Roberto, em um artigo escrito no portal da entidade, diz que a doutrina espírita tem mostrado que os processos mentais seriam frutos da atividade espiritual, com repercussão na estrutura física cerebral. "Sendo assim, o cérebro seria apenas o instrumento. No entanto, para ocorrer essa integração entre a essência espiritual, sua manifestação e a estrutura física, é necessária a existência de um elemento que seja intermediário, tanto na função quanto em sua composição. Esse corpo é chamado espiritual ou perispírito", define.

      MATÉRIA O perispírito, de acordo com o conhecimento espírita, é envoltório fluídico que uniria a alma humana ao corpo físico e,  através dele, o espírito atuaria na matéria. Mas, antes de mais nada, é preciso compreender que, para o espiritismo, somos seres em constante evolução e estar encarnado é o processo para evoluir. No livro A cura e auto-Cura: uma visão médico espírita, do homeopata Andrei Moreira, ele explica que a reencarnação é a lei biológica natural, "instrumento da evolução, em que o ser experimenta o contato com a diversidade e desenvolve aptidões necessárias ao progresso". Ele diz que a reercarnação devolve ao homem o fruto de suas escolhas, "em mecanismos naturais de reencontros, saúde ou doença".

      Segundo explica o psiquiatra espírita Jaider Rodrigues, o paciente da psiquiatria é visto por dois focos: "Levamos em conta a influência espiritual, que pode ser do próprio paciente, ou seja, questões do próprio espírito, e, também, as influências externas, que podem ser de outros espíritos que passam a influenciar no quadro mental do paciente", explica, acrescentando que todos os casos são passivos de auxílio. "Usamos os recursos da ciência, acrescidos da compreensão espírita."

      Jaider lembra do caso de uma paciente que lhe chamou a atenção. Muito bonita e, com no máximo 30 anos, essa mulher, de BH, desenvolveu um quadro de esquizofrenia grave, sem motivo aparente. "Ela entrou em um quadro psicótico e tivemos que interná-la no Hospital André Luiz, pois estava agressiva, falava coisas sem sentido. Durante as sessões mediúnicas que fazemos para os pacientes, apareceu um espírito dizendo ter sido escravo na vida anterior e contou que aquela mulher, na sua última vida, tinha sido casada com um senhor de engenho e abusava muito dos escravos, com requintes de crueldade. Nesta vida, esses espíritos a perturbaram", conta, dizendo que o espírito avisou ainda que seria difícil livrá-la dessas influências externas, e que, por mais que os médicos fizessem, nada ia adiantar. "Por um tempo, ela conseguiu melhorar. Mas não durou muito e faleceu", lamenta Jaider.

      Processo de evolução
      Geralmente, os transtornos, quando se manifestam, é a culpa do que se fez em outra vida, como apontam os estudos espíritas. Mas, de acordo com os médicos, não se trata de um castigo divino. Faz parte do processo de evolução daquele espírito. Ouvir vozes, de acordo com Jaider, pode ser, sim, um espírito falando. A obsessão, de acordo com o precursor do espiritismo, Alan Kardec, é a ação persistente que um espírito mau exerce sobre um indivíduo. "Apresenta caracteres muito diversos, desde a simples influência moral sem perceptíveis sinais exteriores até a perturbação completa do organismo e das faculdades mentais", diz em seu livro, O evangelho segundo o espiritismo. Ele diz que a obsessão ocorrerá toda vez que alguém, encarnado ou desencarnado, exercer sobre o outro constrição mental negativa.

      De acordo com Kardec, há vários tipos de obsessão, sendo o mais grave o de subjugação, em que o obsessor interfere e domina o cérebro do encarnado. A subjugação pode ser psíquica, física ou fisiopsíquica. Assim, as doenças mentais ou físicas podem, sim, de acordo com o conhecimento espírita, sofrer influências externas. Um dos tratamentos indicados são os passes, idas ao centro espírita e sessões de desobsessão, em que os médicos médiuns ajudam os espíritos desencarnados e encarnados envolvidos no processo a receber esclarecimentos, para que ambos tenham bases sólidas para mudar hábitos e atitudes, condicionando-se a atitudes mentais mais saudáveis. Segundo escreveu Francisco Cândido Xavier, ao psicografar a obra de André Luiz, Mundo maior, "o processo obsessivo não é, na realidade, uma doença, é simplesmente um reflexo de mentes doentias que se unem. Ele não é uma causa, é o efeito de um 'mal' anterior".

      REBELDES Nesses casos de transtornos mentais, além do conhecimento espírita, medicamentos são usados. Kardec acreditava que somente medicação não traria alívio. No Hospital André Luiz, em BH, que tem 45 anos de funcionamento, sendo referência para casos psiquiátricos, os pacientes, de acordo com o diretor, Roberto Lúcio Vieira, são de todas as crenças, sendo o diferencial da unidade o tratamento espiritual. Segundo ele, há no hospital 350 funcionários que trabalham voluntariamente. "Com autorização do paciente ou da família, aplicamos os conhecimentos do espiritismo." De acordo com ele, algumas doenças psiquiátricas, geralmente, são de indivíduos mais rebeldes.

      É o caso, por exemplo, da depressão, que afeta cerca de 35 milhões de pessoas no Brasil. "É uma doença que demarca a grande rebeldia do espírito", diz Roberto. Segundo Jaider, geralmente, é o espírito não se contentando com a vida que Deus lhe deu. "É como se dissesse: 'Já que não tenho a vida que quero, não aceito a vida que tenho'. Se o paciente der espaço, a gente estimula a relação com Deus e o hábito da oração", conta. Os pensamentos negativos também contribuem para o quadro.

      Outro mal apontado pelos médicos é o de Alzheimer. Segundo Roberto, assim como a medicina tradicional vem tentando entender essa doença que afeta a memória do paciente, o espiritismo busca suas explicações. Um dos esclarecimentos para a causa da enfermidade é que a grande maioria dos portadores da doença foi culturalmente pobre durante a vida, se prendeu a questões materiais e dificuldades de relacionamento. "Quando ocorre o Alzheimer, é como se fosse uma oportunidade para que essa pessoa chegue mais limpa espiritualmente o outro plano. E para os familiares é uma prova de paciência."