quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Divórcio - Eduardo Almeida Reis

Divórcio Com o advento do computador, nunca mais usei a IBM... Se os netos prometerem não brigar com o avô, será belo presente de Natal


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 10/12/2014




O mundo internético desabou com a notícia de que o jogador Kaká, ainda no São Paulo, separou-se da bela Carol Celico depois de nove anos de casamento que lhes deu dois filhos. Caroline Celico nasceu em São Paulo, em julho de 1987. Em rigor, é assunto que só interessa aos dois e não discrepa do fato de ser o casamento muito difícil: famílias diferentes, educações diferentes, sexos diferentes. Se me fosse dado palpitar, diria como philosopho que o casamento deles começou a desmoronar quando romperam com a bispa Sônia e o apóstolo Estevam Hernandes Filho, proprietários da Igreja Apostólica Renascer em Cristo. Sônia Haddad Morais Hernandes, a bispa Sônia, é empresária, escritora, compositora e apresentadora de televisão, nascida em novembro de 1958. Em setembro de 2006, a Justiça bloqueou os bens dos fundadores da Renascer em Cristo, acusados de estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Dois meses depois, O Ministério Público de São Paulo pediu a prisão preventiva do santo casal e de três outros integrantes da quadrilha religiosa.

Dia 9 de janeiro de 2007, o FBI (a polícia federal dos Estados Unidos) prendeu o casal em Miami por ingressar no país com US$ 56 mil em dinheiro, depois de declarar à alfândega que não tinha mais que 10 mil dólares, contrariando a regulamentação do Serviço de Imigração dos EUA. Foram parar no Federal Detention Center de Miami, Fl, EUA. Nesse tempo, Kaká trocava pontapés com outros jogadores para ganhar os cobres que rendiam dízimos à bispa e ao apóstolo, com a entusiasmada participação de Caroline Celico.

A partir daí, tudo é compreensível, sem que nos diga respeito. É muito de desejar que ambos sejam felizes e aprendam que, em matéria de dízimos, boa mesma é a Igreja Internacional da Graça de Deus, propriedade do bispo R. R. Soares, cunhado do bispo Edir Macedo, tio do bispo Marcelo Crivella, candidato derrotado ao governo do estado do Rio. Na igreja do bispo R. R. Soares, você pode deixar os dízimos em cobrança bancária e sabe que o piedoso pastor é especializado em desencapetamento total. Sem capeta, salvo melhor juízo, não há divórcio.

Pingo

Se dona Dilma tiver um pingo de gratidão, um pinguinho só, nomeará Guido Mantega embaixador do Brasil no Principatu de Múnegu, que é como se chama no dialeto monegasco o Principado de Mônaco ou, em francês, o Pincipauté de Monaco. É do conhecimento geral que no dia 8 de dezembro de 1191 membros de uma família de exilados genoveses, os Grimaldi, assentaram a pedra fundamental da praça fortificada onde hoje fica o palácio do Principado de Mônaco. É também do conhecimento geral que Guido Mantega nasceu em Gênova, talqualmente os Grimaldi. Portanto, é juntar a fome com a vontade de comer: um genovês representando o Brasil num principado fundado por genoveses. Ministro da senhora Rousseff durante séculos, Mantega deve ser craque na arte de engolir sapos, virtude muito apreciada nos meios diplomáticos.

Coleções
Thomas Jeffrey “Tom” Hanks, ator, produtor, roteirista e diretor norte-americano, nascido na Califórnia em 1956, está escrevendo um livro de contos. Só usa máquinas de escrever. É colecionador. A julgar por sua fortuna, deve ser a maior e melhor coleção do mundo.

Tenho de enfeite aqui na sala uma Remington portátil, que ganhei no meu aniversário de 12 anos. Pedi uma Harley-Davidson azul, meu pai foi à Mesbla e trouxe a Remington. Fiquei furioso. Com o passar dos meses, me acostumei, fiz curso de datilografia, fui comprando máquinas mais modernas, aderi às elétricas e devo ter comprado umas 10 até conhecer a IBM 82-C de esferas. Custava uma fortuna. Jamais consegui comprar a segunda, para ter uma no escritório e outra em casa.
Antes da IBM, quase comprei uma coleção de 50 máquinas à venda no Rio, nenhuma elétrica. Portanto, a maluquice do Tom Hanks não é novidade. Não comprei a coleção porque não tinha espaço, mesmo morando na fazenda. Com o advento do computador nunca mais usei a IBM, que lá está guardada num cômodo envolvida em papel-bolha. Se os netos prometerem não brigar com o avô, será belo presente de Natal.

Planeta

Manchete do provedor Terra, 6 de dezembro de 2014: FOTOS DA SEMANA: padres nus, briga no Congresso e mais. Semana teve ainda gato verde, crimes bárbaros e doenças raras descobertas pelo mundo. Não vi o gato verde, os crimes bárbaros e as doenças raras, mas apurei que os padres nus são ortodoxos russos posando para um calendário e a briga no Congresso foi aquela que vimos em nossos televisores.

O mundo é uma bola


10 de dezembro de 1510: Goa se rende às forças portuguesas comandadas por Afonso de Albuquerque. Em 1520, Martinho Lutero queima, na alemã Wittenberg, a bula Exsurge Domine decretada contra ele pelo papa Leão X. Em 1844, Horace Wells descobre as propriedades anestésicas do óxido nitroso.

 Em 1901, realizam-se em Estocolmo e Oslo as primeiras entregas dos Prêmios Nobel. O químico sueco Alfred Bernhard Nobel inventou a dinamite, substância explosiva de larga utilização em Minas nos assaltos aos caixas eletrônicos. Em 1948, a ONU adota a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Hoje é o Dia do Palhaço.

Ruminanças


“A palmatória passou, mas os problemas educacionais continuam os mesmos.” (Júlio Camargo, 1928-2007). 

Todos os dias em cartaz - Martha Medeiros

Zero Hora - 10/12/2014

Passei uma semana em Portugal e trouxe de lá algumas ideias para crônicas, mas elas terão que esperar, pois nesse meio-tempo fui assistir a Boyhood e se eu adiar meu comentário temo que você perca o filme. Pois é, estou assumidamente recomendando-o, o que sempre é um risco. Uma amiga foi ver Relatos Selvagens depois de ler a coluna em que eu o celebrava e saiu no meio, mas prefiro achar que ela estava num dia ruim, apenas.

Um casal também saiu no meio da sessão em que eu assistia a Boyhood, e estou certa de que eles receberam uma chamada avisando que sua casa estava em chamas, só pode. O filme é longo, mas curtíssimo se considerarmos que narra a trajetória de um garoto entre os seis e os 18 anos – com o mesmo ator. Um filme rodado durante 12 anos, acompanhando pacientemente um menino se transformar em homem, merece que fiquemos reles 165 minutos colados na poltrona do cinema. E esse é só um dos motivos.

Boyhood é daqueles filmes em que não acontece nada, a não ser a vida. É comovente assistir ao amadurecimento do garoto Mason através da sua relação com os pais divorciados, do convívio com sua irmã implicante, de seu despertar para a sexualidade através de revistas de mulher nua, do bullying na escola, das relações com padrastos indesejáveis, da necessidade de se autoafirmar junto aos amigos, do primeiro amor, do pavor de vir a reproduzir o mesmo destino trilhado pela geração passada e das dúvidas infinitas sobre o que ser quando crescer – se é que vale a pena crescer num mundo que oferece tão poucas saídas originais.
É sobre isso tudo o filme em que não acontece nada.
Saí do cinema envolvida por aqueles seres humanos que, na tela, mostram o quanto somos diferentes uns dos outros e o quanto a necessidade de se ajustar iguala a todos. Me identifiquei com os pais que buscam encurtar as distâncias com os filhos e fiquei mais tolerante com os filhos que precisam de distância para continuar a se relacionar bem com os pais.
Vi a mim mesma nos variados papéis já interpretados até aqui (filha, mãe, mulher etc.) e com papel nenhum, à deriva. Mas sem melancolia, apenas com o reconhecimento sereno de que o tempo passa, dando a impressão de que os dias se repetem idênticos, mas na verdade cada dia vivido encerra em si uma história apaixonante com começo, meio e (melhor de tudo) com um fim sempre em aberto, com continuidade amanhã.