quarta-feira, 11 de março de 2015

Levantando voo - Martha Medeiros

Zero Hora 11/03/2015

Ontem minha filha embarcou num avião para uma viagem ao Exterior sem data de retorno. Está realizando um sonho antigo, mas que se tornou premente nos últimos meses. Formada, inquieta, faminta por novas experiências de vida, acumulou salários, vendeu alguns pertences, passou madrugadas pesquisando as menores tarifas de passagem e hospedagem, arrumou a mala e se foi.
Muitos pais têm vivido essa ruptura: ver seus filhos partirem em busca de mais conhecimento e amadurecimento, jovens que precisam abandonar o ninho para um voo solo a fim de descobrirem uma nova direção e um ponto de vista que os surpreenda. Querem nascer de novo, agora sem cordão umbilical de nenhuma espécie.
O mundo deu uma encolhida. Pelo WhatsApp, ela poderá postar o que está almoçando, pelo Skype verei seu novo corte de cabelo, pelo Face irei acompanhar suas fotos e bateremos papos digitais, coisa, aliás, que absurdamente já fizemos estando ela no seu quarto e eu na sala. Então, o que significa, mesmo, distância?
Nos dias atuais, as distâncias tornaram-se bem menos dramáticas, não há mais invisibilidade e silêncio, estejamos a poucos metros ou a muitos quilômetros da pessoa amada. O toque continua restrito aos corpos presentes, mas já não perdemos ninguém de vista. E isso nos libera para sofrer menos e pensar com mais positivismo sobre as separações.
Desde que a colocaram nos meus braços, na maternidade, percebi em seus olhos que ela não se conformaria com os limites impostos pela segurança de uma vida regrada. Sempre considerou o mundo seu quintal. A palavra estrangeiro nunca encontrou lugar em seu vocabulário. Todos os seus objetivos foram tratados como realizáveis, independentemente de onde, de quando, de quem, de como.
Os filhos voltam, quase todos. Nem que seja para nos visitar. Se ela não vier, eu irei até ela, não é esta a questão. O que me sensibiliza é que a nossa vida está mudando – mais uma vez. Um ciclo se encerra para dar início a outro. A família até então estruturada se decompõe para que cada um de seus membros forme outros núcleos, novas rotinas. Ela voltará um dia, mas para morar em seu próprio apartamento. Ou voltará para morar em São Paulo. Ou voltará casada. Voltará – mas nunca mais a mesma. O que vivemos juntas nesses últimos 23 anos virou memória desde ontem. A partir de agora, estaremos iniciando uma viagem inédita ao futuro, estando aqui ou estando fora.
Não posso ficar triste, mesmo com o coração apertado. É da vida esse chamado, que é atendido por aqueles que têm coragem de partir e mais coragem ainda de chegar. De chegar neles mesmos, que é onde cada um, não importa a via escolhida, confirma a razão da própria existência.

Privacidade - Eduardo Almeida Reis

Em Tóquio, as pessoas que gostam de gatos podem tomar chá com os bichanos que circulam livremente entre as mesas do Nekorobi Cat Café


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 11/03/2015


Asilado na embaixada do Equador em Londres, o doutor Julian Paul Assange, jornalista, escritor e ciberativista australiano, deu o ar de sua graça publicando um livro em que acusa o Google de acabar com a privacidade em boa parte do planeta. Daí a pergunta que faço ao leitor: você tem preocupação especial com a sua privacidade, acredita em privacidade num planeta em que há câmeras de segurança de 10 em 10 metros e os seus telefonemas podem ser gravados com ou sem autorização judicial?

No mundo em que festejado escritor, membro da Academia Brasileira de Letras, 83 anos feitos, vive escrevendo sobre a bunda de Paolla Oliveira e chega a admitir “que Paolla não é apenas bunda”, privacidade soa como tiro de arcabuz, que faz barulho e tem alcance curto.

Em rigor, privacidade é preocupação de homem sério, casado, quando arranja namorada. Dura poucos dias, porque ele próprio é o primeiro a contar para fazer inveja aos amigos. Ainda que não conte, a cidade inteira fica sabendo sem Google, sem câmeras, sem tecnologia.

Julian Paul Assange, 43 anos, educado na Universidade de Melbourne, em vez de ficar falando mal do Google, melhor faria se deixasse o asilo na embaixada para ser julgado na Suécia, onde é acusado de crimes sexuais.

Zoofilia
Amizade aos animais, amor protetivo pelos animais, a zoofilia costuma apresentar exageros e esquisitices. Em Tóquio, as pessoas que gostam de gatos podem tomar chá com os bichanos que circulam livremente entre as mesas do Nekorobi Cat Café. É permitido alimentar e brincar com eles, mas o site do café avisa: “Se um gato te machucar, oferecemos os primeiros-socorros. Porém, não reembolsamos ou pagamos as suas despesas médicas”.

O Nekorobi, sozinho, justifica uma viagem à capital do Japão para brasileiros que gostam de gatos. São muitos. Cora Rónai e Fabia Azevedo, inteligentíssimas, escritoras brilhantes, adoram gatos. Milhões de pessoas no mundo inteiro não dispensam a companhia de animais, alguns domésticos, outros estranhos como cobras, lagartos, tartarugas.

Noite dessas a tevê nos mostrou bonita empresária cearense, casada, que trocou seu apartamento próximo do trabalho por uma casa com jardim. Motivo: dar mais conforto para o seu porquinho de estimação. Porquinho é maneira de dizer: o digno suíno já está de bom tamanho, pele clara, raça que não identifiquei, exigindo cremes e protetores solares que a empresária não se esquece de passar amorosamente sobre o lombo do amiguinho.

Pois é, hoje até porco de estimação não dispensa protetor solar. E a empresária, que precisa sair da bela casa para trabalhar, comprou uma cadelinha para fazer companhia ao porco, que sobe nos sofás, toma banho numa piscininha do jardim e tem cama, ração e água na sala de visitas.

Galochas

Com o advento do tênis, foram-se as galochas. Agora, a tecnologia ameaça a humanidade com o desaparecimento de mais cinco invenções. 1. Telefone fixo. Já são quase 7 bilhões de celulares no planeta, aumento proporcional ao sumiço dos telefones fixos, segundo a União Internacional de Telecomunicações. O futuro é dos aparelhos móveis. 2. CD, DVD e Blu-ray. Quando chegaram ao mercado, os discos ópticos aposentaram a fita cassete e o LP. Agora, com o conteúdo armazenado e distribuído pela internet, dizem que é chegada a hora de essas mídias sumirem do mapa. 3. Mouse. Os smartphones e tablets ensinaram as pessoas a usar os dedos para interagir com as telas e o Windows já está sendo modernizado para telas sensíveis ao toque. 4. Pen drive. Na década passada, o pen drive foi febre. Todo mundo (sic) tinha pen drives em casa com fotos, vídeos e música. Com o aumento das velocidades de conexão, o armazenamento em nuvem se tornou viável e o pen drive tende a desaparecer. 5. Homem sério. Os itens anteriores explicam o desaparecimento dos homens sérios.

O mundo é uma bola

11 de março de 1641, índios guaranis treinados pelos jesuítas espanhóis, no Território das Reduções, derrotam uma bandeira paulista de escravistas composta de três mil homens, na Batalha de M’Bororé. Foi a batalha mais relevante da história da América Colonial, di-lo a Wikipédia.

Em 1778, assinado o Tratado de El Pardo entre a rainha Maria I, de Portugal, e o rei Carlos III, de Espanha, pelo qual a rainha cedia territórios portugueses na África em troca de territórios espanhóis na América do Sul anexados ao que hoje é o Brasil.

Em 1851, estreia em Veneza a ópera Il Rigoletto, de Verdi: gosto muito.

Em 1892, realizada no ginásio Armory Hill, em Springfield, a primeira partida oficial de basquete aberta ao público. Esporte bom, mesmo, é um que inventaram recentemente e ainda não aprendi o nome, mas vi na tevê. Consiste em pular, fazer piruetas, equilibrar-se numa faixa de poucos centímetros de largura, de material que ainda não sei qual é.

Em 1942, Getúlio Vargas decreta o confisco dos bens de imigrantes alemães e italianos no Brasil.

Em 1985, Mikhail Gorbachev é eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética e dá início às reformas internas do sistema: a Glasnost e a Perestroika, que culminariam no desmanche da URSS e na introdução da economia de mercado na Rússia, para desespero de muitos conhecidos nossos e alegria dos craques do Chelsea, time comprado por um russo endinheirado.

Ruminanças
 “Pereça a pátria, e seja salva a humanidade” (Proudhon, 1809-1865).