quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Por que gosto de teatro - Martha Medeiros

ZERO HORA 19/11/2014

Assisti ao Bruno Mazzeo no espetáculo Sexo, Drogas e Rock’n’roll, um título com aroma de naftalina, porém não há nada de antigo na peça – a não ser o saudoso politicamente incorreto, que caiu em desuso e, de tão patrulhado, só se encontra no mercado negro.
Pois, então, eu estava no teatro e pensava nisso, em como são poucos os espaços hoje para se permitir uma liberdade gaiata sem temer críticas, perseguições, acusações. Acho que gosto de teatro por isso: porque ele não é impresso, gravado, postado, tuitado, não produz provas contra si mesmo.


É exibido em um determinado tempo e espaço apenas para um seleto grupo que não tem em mãos controles remotos, telefones, nada que interfira na cena – a plateia fica rendida e concentrada em absorver o que escuta e enxerga, ciente de que, ao cerrar das cortinas, tudo se evaporará. O que foi visto ficará sem registro palpável. Teatro é uma ilusão: tudo é possível, tudo acontece, mas sobrevive só o que você permitir que sobreviva – dentro de você.

Cinema tem um pouco disso, mas é possível rever o filme na tevê ou no YouTube, ou comprar uma cópia para ter em casa, então ele se torna palpável, ganha longevidade. É analisado, estudado, decifrado, editado, e como tudo que permanece, tem um destino cruel: envelhece – a não ser que tenha nascido para clássico.
Teatro não envelhece, foi apenas um sonho bom. Ou um sonho ruim. É volátil, uma conexão temporária, sem amarras. É uma relação aberta, uma ficada, desperta paixões momentâneas, te faz rir, chorar, te pega pela mão e te leva para um lugar desconhecido, parece tão real, e de repente você acorda e vê que não. Real foi o que você sentiu, apenas. Você volta para casa e pode contar para os outros o que aconteceu, mas não pode mostrar.
Então, estava eu lá no teatro rindo das situações apresentadas no palco e ao mesmo tempo pensando sobre elas, mergulhada naqueles 60 minutos em que estava sendo homenageada por uma alegoria ao vivo, e que se dissolveria – dissolução que outra espectadora não aceitava, ela não parava de fotografar e assim tentava capturar o sonho, prendê-lo como a um pássaro em uma gaiola da Apple, da Samsung, desvirtuando a mágica. Ela não entendia nada de teatro, claro. No teatro, quem tem que ser capturado somos nós.


Delícia - Eduardo Almeida Reis

Delícia


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 19/11/2014





Fugindo de noticiário chato, dei com este velho costado na ESPN que entrevistava, no programa Bola da Vez, famoso jogador de futebol transformado em comentarista esportivo. Raras vezes me diverti tanto com a interminável sucessão de asneiras do novo comentarista.

Nada impede que um ex-craque se transforme em comentarista esportivo, mania atual dos nossos canais de tevê. Muitos são articulados, divertidos, informados, conhecem os meandros do esporte que praticaram profissionalmente. Vários se transformam em políticos melhores que os políticos profissionais, até porque é impossível que sejam piores.

O rapaz entrevistado no Bola da Vez, que teve sucesso nos gramados, tem uma capacidade de dizer tolices raramente vista em qualquer lugar. Por qualquer motivo fala de paradoxo, como se tivesse noção do que seja um paradoxo, pensamento, proposição ou argumento que contraria os princípios básicos e gerais que costumam orientar o pensamento humano, ou desafia a opinião consabida, a crença ordinária e compartilhada pela maioria.

Várias vezes disse ter aprendido, no primeiro canal em que trabalhou como comentarista, “coisas que não sabia”, como se tivesse cabimento aprender coisas sabidas. E foi por aí, num besteirol inenarrável, dos mais divertidos que já vi.

Baratas


“Um quilômetro! Um quilômetro!” exclamava o muito saudoso José Carlos de Lèry Guimarães advertindo sobre a distância percorrida pelas baratas quando sentiam o cheiro dos restos de cervejas nos copos ou nas garrafas. Daí a necessidade de lavar e emborcar garrafas vazias. Cervejeiro contumaz, o então jovem philosopho repassou o exagero para as funcionárias domésticas que o assistiam, considerando que nunca soube lavar um copo, uma garrafa, um prato, um talher.

José Carlos foi dos mais brilhantes dos meus amigos, inteligência fulgurante que teria estourado na cidade grande, mas se deixou ficar pela aldeia a cavaleiro do salário de procurador federal. No país dos meus sonhos, todos os jornalistas realmente brilhantes teriam aposentadorias de procuradores federais. Como são poucos, as aposentadorias não pesariam no orçamento da nação, que se beneficiaria do brilho dos profissionais.

Lembrei-me do bom gosto das baratas pelas cervejas, ainda que velhas e quentes, na tarde quente em que matei uma trinca de belgas Duvel, antes de dormir o sono dos justos. Lembrei-me também do nome do jornalista Phíntias Guimarães, que não conheci pessoalmente, pai do José Carlos. É fantástico ser filho de um Phíntias. Fui ao Google, que só tem duas mil entradas para o nome, várias em alemão. Se o leitor souber do Phíntias histórico ou lendário, me conte por favor.

Termométricas

Na tarde em que o termômetro aqui da sala de tevê marcou a temperatura mais alta desta primavera, senti menos calor do que nas tardes em que o termômetro anotava menos dois graus. Só pode ter sido a tal de sensação térmica. O sujeito que a descobriu é um gênio, porque a sensação de frio ou calor geralmente não coincide com as marcas do termômetro. Ventos, umidade relativa e outros fatores devem contribuir, como também deve ser importante aquilo que você comeu ou não comeu, bebeu ou não bebeu.

Termômetro sozinho não basta, mas pode matar de susto. Numa de minhas crises de malária, o termômetro chegou a 41.6 e minha santa companheira telefonou para o médico dizendo que o seu marido e senhor estava com febre de 46.1. Troca de números, coisa que acontece.

Do meu leito ouvi o telefonema e concluí: estou morto. E tive a nítida sensação de entrar no céu, porque a temperatura começou a baixar em consequência do remédio que me deram: a sensação é de entrar no céu. Parecida com a sensação que o Microbrachius dicki, um peixe de 7 cm, com o dicki em forma de L, que viveu há 385 milhões de anos num lago da Escócia e deve ter sido, segundo a ciência, o primeiro bicho deste planeta a fazer sexo, fazer amor (peixe faz amor?), copular. Ensinam os anglófilos que dicki é pinto.

Usava seus bracinhos para transar de lado – di-lo a ciência – o que, transcorridos 385 milhões de anos, continua sendo muito bom. No caso do Microbrachius dicki a posição de ladinho tinha a vantagem de não enxergar a fêmea feia pra dedéu.

O mundo é uma bola

19 de novembro de 1499, parte da Espanha o navegador Vicente Yáñez Pinzón, que teria alcançado a costa brasileira em janeiro do ano seguinte, meses antes do descobrimento oficial pelo nosso Pedro Álvares Cabral. Em 1807, Humphry Davy escreve à Sociedade Real Britânica sobre as propriedades do potássio, elemento que acabara de descobrir. Em 1819, inauguração do Museu do Prado em Madrid, Espanha. Em 1889, o governo provisório brasileiro baixa os primeiros decretos regulamentando a bandeira, o brasão de armas, o hino e o selo nacionais. Em 1906, comemora-se pela primeira vez o Dia da Bandeira no Brasil. Em 1969, Pelé marca no Maracanã o seu milésimo gol às 23h11min, no jogo Vasco x Santos, vencido por 2 a 1 pelos santistas. Hoje é o Dia da Bandeira e o Dia do Cordelista.

Ruminanças

“Que mal terá feito a Deus o pequeno coala para cair no colo da senhora Rousseff?” (R. Manso Neto).