Vai trocar de computador neste Natal? O que vai fazer com o equipamento antigo? Conheça centros de recuperação que transformam eletrônicos velhos em máquinas novas para projetos de inclusão digital
| Victor Moriyama/Folhapress | |
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Técnico faz triagem de placas de computador em recicladora de eletrônicos em Mauá, na Grande São Paulo |
YURI GONZAGACOLABORAÇÃO PARA A FOLHA DE SÃO PAULOA temporada de compras de fim de ano carrega consigo uma questão incômoda: o que fazer com os eletrônicos que serão substituídos?
É uma pergunta de 495 mil toneladas -esse é o peso total do lixo que o país deve gerar em 2012 pelo descarte de computadores, celulares, TVs e outros aparelhos pequenos.
Dados preliminares de um estudo encomendado pelo governo federal ao qual a Folha teve acesso mostram que esse número deve crescer em 80% até 2016 -para 892 mil toneladas.
Quem quiser reduzir um pouco esse peso pode doar aquele PC velho e ainda ajudar um projeto social. Opções para isso não faltam.
Um exemplo recente é o C3RCO (
c3rco.org.br), parceria entre a Prefeitura de Osasco e a ONG Sampa.org. Iniciado no segundo semestre deste ano em Osasco, ele aproveita computadores doados e oferece formação técnica em informática a 60 jovens com idade de 16 a 21 anos e baixa renda familiar.
Além de oficinas culturais, que envolvem atividades de estudo de música, os alunos do projeto recebem uma bolsa de R$ 286 para fazer 16 horas semanais de aulas de software e de montagem e manutenção de PCs.
As máquinas recondicionadas pelo projeto -que recolhe as doações nos bairros paulistanos limítrofes e nos municípios vizinhos- são destinadas a salas de acesso gratuito da cidade.
"O que não é aproveitado é encaminhado a empresas recicladoras", diz Carlo Fabiano Leite, coordenador.
Para Edigelson Menezes Ferreira, 20, um dos alunos do C3RCO, as aulas serviram para canalizar um interesse antigo. "Eu já mexia em
computadores, mas era de qualquer jeito. Agora quero abrir a minha própria empresa de reciclagem", diz.
OXIGENADOS
O C3RCO não é o único centro de reciclagem com preocupações sociais -há pelo menos dez projetos similares em São Paulo e região.
Um dos principais centros de recuperação de computadores da capital, a ONG Oxigênio tem uma proposta semelhante à do C3RCO, mas muito mais tempo de estrada e capacidade de recondicionar máquinas. Fundada em 1988, doou a Telecentros dos governos estadual e federal os 3.000 computadores que recuperou só em setembro.
Para comparar, o Cedir (Centro de Descarte e Reúso de Resíduos de Informática) da USP, referência no Brasil, encaminha a projetos sociais e escolas públicas 200 computadores por ano. O centro, após período de reformas, volta a aceitar doações hoje.
A Abre (Associação Brasileira de Redistribuição de Excedentes) recebe qualquer tipo de eletrônico e envia os aparelhos que ainda funcionam a uma das 85 instituições sem fins lucrativos de seu cadastro. A associação também aceita equipamentos pifados -que são reciclados.
Lei aumenta demanda de empresa por reciclagem
Política Nacional de Resíduos Sólidos ajuda a dar rumo ao "e-lixo"
Metal precioso é parte ínfima do eletrônico, mas capacitação de catadores multiplica valor de remessas
COLABORAÇÃO PARA A FOLHADesde a implementação da PNRS (Política Nacional dos Resíduos Sólidos), em 2010, fabricantes vêm se mostrando mais preocupados em dar um fim ecologicamente responsável aos equipamentos eletrônicos que geram, segundo profissionais da área ouvidos pela
Folha.
José Cristovam, diretor da Vertas, recicladora de eletrônicos situada em Mauá (SP), diz que passou a receber um número maior de consultas e de produtos desde que a lei passou a valer.
Com ela, os fabricantes foram obrigados a dividir a responsabilidade dos resíduos que geram com os revendedores e têm até 2014 para se adaptar às novas regras.
Dell, HP, Itautec, Nokia, Motorola e Positivo dispõem de programas próprios de coleta de produtos no país.
Maria Tereza Carvalho, diretora do Cedir (Centro de Descarte e Reúso de Resíduos de Informática), da USP, diz haver uma "demanda reprimida" pela reciclagem. "Muita gente me procura para montar seu próprio centro."
Herbert Mascarenhas, da Abree (Associação Brasileira de Reciclagem de Eletroeletrônicos e Eletrodomésticos), que tem como parceiras AOC, Panasonic e Philips, concorda que houve aumento na procura. "É hoje uma área bastante assediada. Tenho recebido muito mais consultas sobre a gestão do processo."
PONTOS DE COLETA
Estudo feito a pedido do governo federal mostra que, se as 150 maiores cidades do país receberem a estrutura necessária, como pontos de coleta, dois terços do "e-lixo" brasileiro terão sua reutilização viabilizada.
Mas isso não significa que é o Estado quem vai agir nesse sentido. "A responsabilidade é compartilhada por fabricantes, importadores e comerciantes", diz Zilda Veloso, gerente de resíduos perigosos do Ministério do Meio Ambiente. "Se prefeituras instalarem pontos de coleta, por exemplo, poderão cobrar desses responsáveis."
MINA DE COBRE
Mesmo que metais preciosos representem uma fração pequena (há 0,00001% de ouro no material recebido, em média, segundo a Vertas), a quantidade de cobre que é aproveitada após processos manuais e automatizados de separação torna o negócio lucrativo, mesmo para as pequenas empresas.
"Depois que começamos a desmontar eletrônicos, praticamente acordamos", diz Walison Borges da Silva, da Coopamare, cooperativa de catadores localizada no bairro de Pinheiros (São Paulo).
Silva diz que, depois de fazer um curso sobre reciclagem desse tipo de material (leia texto abaixo), ele pôde multiplicar por 13 o valor de venda dos lotes de computadores processados pela empresa.
), fruto de parceria entre a ONG Instituto GEA e a USP, divulgou o saldo na última semana de novembro: a formação de 182 catadores de 62 cooperativas paulistas e mineiras e a criação de 28 postos de coleta de lixo eletrônico.
Com inscrições gratuitas e transporte e alimentação dos participantes bancados pelo projeto, as aulas foram ministradas por pessoas ligadas ao Lassu (Laboratório de Sustentabilidade), da Poli-USP.
"Foi difícil no começo, mas conseguimos encontrar uma maneira de transmitir aos catadores esse assunto, que é complexo", diz Ana Maria Domingues Luz, coordenadora-geral do curso e presidente do Instituto GEA.
Uma nova edição do curso depende do patrocinador, que deve decidir a renovação do contrato em abril.