segunda-feira, 2 de junho de 2014

O presidencialismo de coalizão - Renato Janine Ribeiro

Valor Econômico - 02/06/2014

A única alternativa para o tão criticado presidencialismo de coalizão é o bipartidarismo. Mas será que o queremos?

Tornou-se praxe, no Brasil, acusar o presidencialismo de coalizão de todos os males da vida política e até social. Ele é responsabilizado pelas negociações que dão sobrevida a políticos fisiológicos, em troca de seu apoio no Congresso. O último a criticar esse modelo político foi Eduardo Campos, no "Roda Viva" da semana passada. Só que mudá-lo pode trazer novos problemas, em vez de vantagens.

O que é presidencialismo de coalizão? É a união de um presidente eleito com a maioria absoluta dos votos válidos - no primeiro ou segundo turno, e que por isso mesmo é fortemente representativo - e de um Congresso escolhido junto com o primeiro turno presidencial, no qual nenhum partido tem a maioria - no Brasil nem mais de 20% - dos assentos na Câmara. Negociar é inevitável. O partido ou coligação presidencial nem sempre obtém a maioria parlamentar. Assim, se um candidato com pretensões a se eleger faz, em sua campanha, alianças já duvidosas em busca de tempo no horário eleitoral, uma vez eleito fará alianças ainda mais complacentes, para ter a base legal e orçamentária de seu governo.

Mas como mudar essa situação? O único meio seria assegurar que o partido ou coligação do presidente eleito atinja maioria absoluta nas duas Casas do Congresso sozinho, sem precisar de negociações posteriores a sua eleição. Isso é viável? Se sim, a que preço?

Melhor resolver problemas atuais do que criar novos


Primeira dificuldade: o Senado se renova parcialmente - um terço este ano, dois terços daqui a quatro. Mesmo que o presidente se eleja com uma avalanche de sufrágios, não basta para mudar a maioria no Senado. E essa Casa existe, justamente, para isso: para evitar que maiorias, digamos, "circunstanciais" façam barba, cabelo e bigode. É uma Casa conservadora, que deveria retardar a aprovação de medidas muito radicais - o que, aliás, nem sempre faz, tanto que, em 1997, votou a reeleição sem dificuldades. (Lembro esse episódio porque foi uma de nossas maiores mudanças institucionais da era republicana, rompendo uma tradição que parecia cláusula pétrea no presidencialismo latino-americano - por sinal, o único presidencialismo consistente fora dos Estados Unidos).

Segunda e mais imediata: para ter maioria em qualquer das Casas, será preciso reduzir brutalmente nosso sistema partidário. O pluripartidarismo, outra tradição brasileira importante, teria que ceder a vez ao bipartidarismo. A ditadura militar tentou isso, de 1965 em diante, até com recursos baixos como as cassações e as sublegendas, mas sem êxito. Finalmente, em 1982, cedeu à realidade. Se a vontade brasileira de não se encarcerar num modelo de apenas duas opções resistiu à censura, à tortura, à ditadura, será ela vencida por uma lei eleitoral? Essa lei eleitoral passará no Congresso, expressará a vontade popular? Duvido.

É certo que a arte da governabilidade passa, mais vezes sim do que não, pelo recurso de converter uma minoria de votos na sociedade em maioria absoluta no Parlamento - com sorte, converter uma maioria relativa (mas não absoluta) em metade mais um. Na França, isso se obtém, desde a redução do mandato presidencial aos mesmos cinco anos do parlamentar, por um truque curioso: o presidente da República se elege, e em seguida dissolve a Câmara que, eleita um mês depois dele, lhe dá uma maioria quase esmagadora. Isso liquida a oposição. Queremos isso? É quase o mesmo que governar sem Parlamento.

Na Itália, é pior. Desde 2005, uma lei conhecida como Porcellum (literalmente, "porcaria") dá 54% das cadeiras na Câmara ao partido ou coligação mais votado. O codinome dado pelo cientista político Giovanni Sartori à lei, e que pegou junto ao povo, já diz tudo. A invenção é da direita. Mas em 2013, com 32% dos votos, a centro-esquerda levou 54% da Câmara, enquanto a direita de Berlusconi, com um por cento a menos, obteve 20% das cadeiras.

Mesmo a eventual adoção do voto distrital entre nós - outro sistema do qual não temos experiência no Brasil em regime democrático, tendo vigido apenas no Império e na República Velha - não criará uma maioria absoluta, se continuarmos tendo mais que dois polos políticos. Ou seja, para acabar com o presidencialismo de coalizão, precisaríamos reduzir à margem de erro tudo o que for terceira via, terceiro partido, onde só ficarão os que não receiam ser minoria, os que abrem mão do projeto de governar o país porque preferem usar a tribuna para pregar uma causa - por sinal, muitas vezes digna: verde ou socialista.

Veja-se o problema. Os dois partidos que há 20 anos disputam a hegemonia no país, e que talvez continuem essa disputa, nasceram em ruptura com o quadro político vigente. O PT era "diferente de tudo o que estava aí". Conseguiria crescer num sistema bipartidário? O PSDB era uma dissidência do PMDB. Teria lugar num sistema tal? Improvável. Renovações seriam difíceis. Por isso, o Rede ou o PSB: sem chance.

Penso que a soma de um Poder Executivo disputado em termos mais ou menos bipartidários, mas flexíveis (no qual podem despontar Marina ou Eduardo), e de um Legislativo pluripartidário expressa melhor a complexidade de nossa vida social e política.

Agora, se o problema é a corrupção, podemos enfrentá-la com outras armas, sem destruir este delicado arcabouço político: abolir o financiamento de campanhas por empresas (que, ao contrário de pessoas físicas, não são eleitores nem podem ser presas por crime eleitoral), aumentar a fiscalização, agilizar os julgamentos na Justiça Eleitoral, reduzir os candidatos que cada partido pode lançar ao Legislativo, entre outras medidas. Melhor identificar e resolver os problemas que existem, do que criar novos.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo
E-mail: rjanine@usp.br


TeVê

TV paga
Estado de Minas: 02/06/2014


 (Universal/Divulgação)
 Festival de música
O canal Bis abre hoje um especial que vai mostrar toda segunda-feira, às 21h, as principais atrações da última edição do Glastonbury Festival, o maior e mais reverenciado festival aberto de música e artes de todo o mundo, com apresentações de Mumford & Sons (foto), Jake Bugg, Haim, Phoenix, Arctic Monkeys, Elvis Costello e Public Enemy, entre outros. Fique ligado!


Futura avalia produção e consumo de energia

Outra novidade de hoje é a série documental Na trilha da energia, que estreia às 23h, no canal Futura. A produção vai mostrar depoimentos de especialistas e cidadãos sobre a relação entre geração de energia e impactos ambientais e sociais no país. Luciano Gatti apresenta o programa, visitando diferentes locais do país em busca de alternativas mais sustentáveis para a produção e o consumo de energia.

O Brasil é ainda mais bonito visto lá do alto
No canal +Globosat, às 22h30, estreia Brasil visto de cima, que segue a linha de documentários do fotógrafo, jornalista, repórter e ambientalista francês Yann Arthus Bertrand e produções semelhantes. A bordo de um helicóptero, a câmera percorre algumas da mais belas regiões do país, começando pelo trecho da baía de Angra dos Reis e toda a Costa Verde, com suas dezenas de ilhas e praias. A narração é do ator Felipe Camargo.

Novidades nos canais Bio, Discovery e TLC

A primeira semana de junho tem novidades também no canal Bio. Às 22h30, a série A grande competição acompanha 14 jovens bailarinas que disputam um prêmio de US$ 100 mil e uma bolsa de estudos na Joffrey Ballet School, em Nova York. Em seguida, às 23h30, o canal volta a exibir Amigas do peito, em que as sócias da LivRae Lingerie, Molly Hopkins e Cynthia Richards ajudam mulheres a elevar sua autoestima – e os seios também. No Discovery, às 19h, estreia a segunda temporada de Ciência mágica. No TLC, Bar rescue chega ao seu terceiro ano, na faixa das 21h30.

Ação, drama e humor no pacotão de cinema

Na programação de filmes, apenas reprises, oportunas ou não. No Telecine Premium, às 22h, Nicholas Hoult e Teresa Palmer tentam fazer rir com Meu namorado é um zumbi. No mesmo horário, o assinante tem mais seis opções: Divinos segredos, no Glitz; Chumbo grosso, no Studio Universal; O quarto do pânico, na MGM; Pelos olhos de Maisie, no Max; The normal heart, na HBO 2; e Bonequinha de luxo, no TCM. Outras atrações: Horror em Amytiville, às 20h25, no Universal Channel; A outra, às 21h, no Cinemax; Planeta dos Macacos – A origem, às 21h25, no FX; O palhaço, às 21h30, na TNT; e Esposa de mentirinha, às 22h30, na Fox.

CARAS & BOCAS » Mulher vingativa

Simone Castro
simone.castro@uai.com.br




De volta à telinha depois da vilã Catarina, em Lado a lado, Alessandra Negrini também será do mal em Boogie oogie, novela que vai substituir Meu pedacinho de chão (Globo). E será protagonista de uma trama polêmica, em que sua personagem, Suzana, com raiva do amante, que decide não se separar da mulher, ao saber que ela está grávida, trocará a filha dele por outra menina, logo depois do nascimento do bebê. “O grande barato da Suzana é que ela fez uma coisa terrível. Mas mesmo sendo imperdoável, a razão que a levou a isso tem a ver com sentimento. A grande questão é: quando te magoam muito, te arrastam para o fundo do poço, até que ponto você pode ir para se vingar de uma maldade que te fizeram? Por isso, muita gente vai ter raiva do que ela fez, mas vai dizer: ‘ela não tinha o direito, mas eu entendo o motivo’. A força da personagem está aí”, defende o autor Rui Vilhena, em recente entrevista. Boogie oogie será protagonizada por Isis Valverde e Marco Pigossi, que formarão triângulo amoroso com a personagem de Bianca Bin.


GLOBO ALTERA OS TÍTULOS  DE SUAS PRÓXIMAS NOVELAS
Cai o título provisório de Falso brilhante e é divulgado Império como o definitivo da próxima trama de Aguinaldo Silva, que vai substituir Em família (Globo) a partir de agosto. Na sequência, a trama de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga se chamará Babilônia, numa referência ao Morro da Babilônia, que fica no Leme, no Rio de Janeiro, um dos cenários da história. A estreia será no início de 2015.

MUSA BRASILEIRA EM EVENTO INTERNACIONAL DE CINEMA
A atriz Cleo Pires, atualmente como a Kátia do seriado O caçador (Globo), é a estrela brasileira que vai representar o país na 42ª edição do AFI Achievement Awards, que será realizado em 5 de junho, no Dolby Theatre, em Los Angeles, nos Estados Unidos. A homenageada da vez é a atriz Jane Fonda, que receberá o prestigiado prêmio pelo conjunto da obra, o mais alto por uma carreira cinematográfica. Outra que já foi premiada, a atriz Meryl Streep já confirmou presença. No Brasil, a cerimônia será exibida pelos canais da TV paga MGM e TNT, com reapresentação no TCM.

GERAÇÃO BRASIL TERÁ SÓ TRÊS MINUTOS DE DURAÇÃO
Durante a Copa do Mundo, a novela Geração Brasil (Globo) será a mais afetada, pois o seu horário coincide com a realização de algumas partidas de futebol. Por isso, segundo o site Na telinha, a trama não terá exibição normal entre os dias 13 e 21 de junho, indo ao ar apenas pílulas de três minutos da história. Para compensar, serão realizadas ações de interatividade pela internet, com edições especiais. Já Malhação encerra temporada em 11 de junho e a nova só estreia em 14 de julho.

SUPERNANNY NÃO EMPLACA NOVA TEMPORADA NO SBT
A apresentadora Cris Poli, protagonista de Supernanny, e o SBT não renovaram contrato, segundo a assessoria de imprensa da emissora. As edições do reality em que a pedagoga ajuda pais desesperados a disciplinar os filhos e colocar ordem em casa devem continuar a ser reprisadas aos sábados, às 18h30. Supernanny teve nove temporadas produzidas e exibidas no SBT/Alterosa. A última terminou em 2013.

BELEZAS DE MANILA
O mundo segundo os brasileiros desta terça-feira desembarca em Manila, capital das Filipinas. No episódio, a equipe visitou o bairro de Fort Bonifácio, uma das regiões mais modernas da cidade; tomou café da manhã típico filipino: frango com arroz e macarrão com legumes. Além disso, passeou pelo Manila Ocean Park, um parque aquático onde é possível nadar com arraias e tubarões. A atração ainda mostra o shopping Green Hills e um passeio a bordo do “Jipney”, o meio de transporte mais comum e característico da capital. Em Pasaty City, foi flagrada uma briga de galo – prática legal no país –, além de terem conhecido a parte histórica de Manila. Numa viagem até a cidade Tagaytay, a equipe subiu no vulcão Taal, localizado dentro de um lago. O programa vai ao ar às 22h, na Band.

VIVA
Marcelo Adnet acerta a mão e encontra, finalmente, o seu lugar na Globo em Tá no ar: a TV na TV.

VAIA
Termos técnicos da tecnologia espantam telespectador de Geração Brasil. Um reajuste se faz urgente. 

Eduardo Almeida Reis - Burrice‏

Outra coisa que ainda não aprendi é a diferença entre download e upload



Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 02/06/2014





Millôr Fernandes mantinha na revista O Cruzeiro uma seção chamada Ministério das Perguntas Cretinas, em que ministério tinha o sentido de atividade, trabalho, mister, e não o de atribuição de cada ministro na administração dos negócios do Estado ou do conjunto dos ministros de um presidente da República. O substantivo masculino ministério tem diversos significados, inclusivamente o ofício de sacerdote. Governos recentes trocaram as “perguntas” da seção do Millôr pelo plural da palavra providência, que também tem uma porção de significados civis e religiosos. No Brasil atual, Ministério das Providências Cretinas.

Em matéria de perguntas cretinas, acho que ninguém me leva a palma. Até hoje não consegui entender, e não tenho a quem perguntar, qual a vantagem do sistema pré-pago nas tevês a cabo. Deve ter alguma vantagem, porque vive sendo anunciado.

Outra coisa que ainda não aprendi é a diferença entre download e upload. No momento em que escrevo, a velocidade de download é 9.65Mbps, com uma seta apontada para baixo, e a de upload, com uma seta apontada para cima, é de 0.43Mbps. Mais adiante a informação: “Sua internet pode ser considerada RÁPIDA”.
Tudo bem: down deve significar “para baixo” e up, “para cima” e load deve ser “carga, carregar”. A pergunta é a seguinte: por que só 0.43Mpbs de upload? No Google há uma porção de explicações para download e upload, que leio e não entendo.

O Aulete/digital, que é de graça, ensina que download é gravar no computador, geralmente pela internet, arquivo, programa etc. obtido em outro computador, enquanto upload é envio de arquivo de um microcomputador para um computador remoto. Se é assim, como explicar que o @gmail envie arquivos imensos num átimo, enquanto o @terra leve “horas” para enviar arquivos não muito grandes?

Cuspidor
 Num certo hino da Copa, que tem sido veiculado pela tevê, o leitor deve ter notado a tela redonda a certa distância do microfone em que se esgoelam diversas celebridades canoras. Presumo que seja um hino relacionado com a Copa, porque tiro o som do LG de 47 polegadas. Não gosto de hinos, com exceção da Marselhesa. O nosso é pretensioso, tem um monte de palavras que 99% dos brasileiros não entendem e acaba parecido com a Bíblia, entendida por pouquíssimas pessoas que vivem falando nela. Circula na internet um vídeo delicioso com um pastor que interpretou na Bíblia adúltera como adultera, ordem para cometer adultério, violação da fidelidade conjugal com uma gorda vizinha mãe de quatro filhos.

Consultado, o marido da vizinha concordou porque se tratava da palavra de Deus. E o pastor, também casado, vivia um drama de consciência, pois a vizinha não é nenhuma Gisele Bündchen, muito antes pelo contrário, aliás. Advertido pelo repórter para o acento agudo em adúltera, o piedoso pastor terminou concluindo que “uma coisa puxa a outra”.

Volto à telinha diante do microfone, que funciona como aparador de perdigotos e me deixou saudoso do programa de rádio que andei fazendo durante meses. Programa divertido e inteligente, não por mim, mas pela equipe e pelos convidados. Papa finíssima, que tinha tudo para ser um sucesso, mas esbarrou nos patrocinadores.

Patrocínio no Brasil é o tipo do negócio complicado. Digamos que um programa semanal tenha o custo mensal – aluguel de estúdio, gravação e envio para centenas de emissoras, remuneração de dois ou três participantes fixos, modesta retirada de dois realizadores – da ordem de R$ 60 mil. Pois muito bem: você precisa arranjar patrocínio de um milhão, pagar os impostos sobre o milhão, tirar os 60 mil e devolver o resto, em dinheiro vivo, ao patrocinador para “despesas de campanha”. É mole?


Perdeu a graça

A mania da GloboNews de transmitir na íntegra os depoimentos da engenheira Graça Foster, presidente da Petrobras, com perdão do trocadilho perdeu a graça. São horas de perguntas dos ilustres senadores e deputados federais para inglês ver (e ouvir). Televisão tem compromisso com a estética e a presidente da estatal, sendo embora competente, está longe de ser uma Patrícia Pillar. Não é justo que o assinante da tevê a cabo perca o programa Estúdio.i porque na Câmara e no Senado a presidente Graça Foster tenta explicar o inexplicável.

 O mundo é uma bola

2 de junho de 575: eleição do papa Bento I, que tentou restabelecer a ordem na Itália e na França, conturbadas pelas invasões bárbaras e ensanguentadas por discórdias internas. Foi papa até julho de 579.

Em 1098, Antioquia foi conquistada pelos exércitos da Primeira Cruzada, depois de um cerco que opôs os cruzados aos turcos seljúcidas. Que se pode esperar de um turco seljúcida?
Em 1420, Henrique V de Inglaterra
se casa com Catarina de Valois, feia com força, princesa de França, filha do rei Carlos V, cognominado o Louco. Pariu Henrique VI e enviuvou. Por lei, não podia voltar a se casar, mas encontrou conforto emocional em Owen Tudor, um nobre galês, e teve com ele quatro filhos: o monge Thomas Tudor, Edmond Tudor, que se casou com Margareth Beaufort e foi pai de Henry Tudor, futuro rei da Inglaterra, Jasper Tudor e Margareth Tudor.

 Ruminanças


“A ciência informa que a melancia combate a disfunção erétil, mas não ensina como gostar de melancia” (R. Manso Neto).

SAMBA O gigante do Brasil

Equipe do laboratório de vírus da UFMG tem artigo aceito no Virology Journal, descrevendo o maior vírus já isolado no país, encontrado ao longo do Rio Negro, em 2011 
 
Lilian Monteiro
Estado de Minas: 02/06/2014



Os vírus são seres ultramicroscópicos, de algumas dezenas de nanômetros (nm/unidade de medida), bem pequenos. Existe um grupo especial, chamado de Gulliver dos vírus, que são os gigantes, conhecidos como Mimi, que chegam a medir 700nm. Para ter ideia, o da dengue, bem conhecido, tem 50nm em média. A descoberta dos gigantes é importante não só pelo tamanho, mas pela gama de informação no genoma. Professor-adjunto do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (ICB/UFMG) e coordenador do grupo responsável pela pesquisa, Jônatas Abrahão, um dos autores do estudo, conta que os primeiros vírus gigantes foram descobertos na década de 1990, na Inglaterra. Eles foram isolados dentro de uma ameba e caracterizados como bactéria Coccus bradford. No entanto, ninguém conseguia cultivar essas “bactérias”.

“Foi aí que os pesquisadores levaram o material para um laboratório especializado em bactérias que vivem dentro de amebas em Marselha, na França. Esses parceiros tiveram a ideia de usar a microscopia eletrônica (amplia milhares de vezes) e perceberam que se tratava de um vírus com dimensões e complexidade que ninguém conhecia.” A demora nessa descoberta, explica Jônatas, é que os vírus são agentes filtráveis e na hora desse processo, os gigantes simplesmente não passavam.

Descobriu-se assim o primeiro vírus gigante do mundo. O Mimi foi isolado na França em 2003. A partir daí, enfatiza Jônatas, vários grupos passaram a pesquisar. No Brasil, ele afirma que a equipe do Laboratório de Vírus da UFMG é o primeiro e único grupo a pesquisar o vírus gigante, sendo referência. O professor, que trabalha com caracterização biológica e genômica de vírus gigantes, começou com seus alunos a pesquisa em 2011. Ele explica que decidiram iniciar a procura na Amazônia “por ser um ambiente símbolo da diversidade brasileira e pelo fato de poucas pesquisas sobre vírus serem realizadas lá”. No processo, o professor explica que foram coletadas aproximadamente 50 amostras de água do Rio Negro. “O vírus gigante está em qualquer lugar e onde tem ameba (em teoria), ele viverá. O Rio Negro foi escolhido por ser especial ao receber matéria orgânica da floresta e ter um pH com acidez alta. Em 2011, trouxemos as amostras e o aluno Rafael Campos, primeiro autor do artigo, isolou o vírus, caracterizado como o primeiro gigante de origem brasileira”, explica Jônatas.

O professor conta que a pesquisa durou dois anos e, assim, nasceu o Samba, maior vírus isolado no Brasil, que também teve a colaboração dos pesquisadores franceses de Marselha. Os parceiros, aliás, que sugeriram o nome. “Sequenciamos o genoma completo do vírus, o seu ‘DNA’, que nos informa o quão autônomo ele é em relação à ameba. Ele tem genes que são únicos e 50 mil pares de base a mais que o Mimi, sugerindo uma maior quantidade de proteínas que ele pode codificar.”
Outra descoberta de enorme importância, que abre vastos caminhos no universo dos seres microscópicos, foi a existência do virófago (vírus que infecta outro vírus), que também foi isolado e vive como partículas do vírus gigante dentro da ameba. Os virófagos reduzem a multiplicação do vírus gigante.  “É o primeiro virófago isolado nas Américas.” O virófago precisa do vírus gigante para se multiplicar (viver) e o vírus gigante depende da ameba. “Só que a ameba estaria em apuros se existisse só o vírus gigante. Então, o virófago “auxilia” a sobrevida da ameba, já que sem ameba ninguém viveria.” Ou seja, é um ciclo, em que ameba, vírus gigante e virófago dependem um do outro para existirem.

PNEUMONIA A importância da descoberta do Samba é apontada em duas linhas pelo professor Jônatas. “Primeiro, para mostrar a diversidade e a riqueza de espécies microbiológicas da Amazônia. E, em segundo lugar, o fato de o vírus gigante estar associado com casos de pneumonia em seres humanos.” Mas ele enfatiza que tais resultados “estão em estudo e não são conclusivos. No entanto, há fortes evidências.” Ele lembra que 50% dos casos de pneumonia não têm agente etiológico descrito. “Não acredito que os vírus gigantes sejam agentes epidêmicos da pneumonia, mas podem fazer parte de um percentual.”

Jônatas Abrahão destaca ainda que os Mimi (os vírus gigantes) foram encontrados em animais, como os macacos e bovinos na região da Amazônia. “E já foi demonstrado que o Samba e o Mimi se multiplicaram em algumas células do ser humano.”
Depois da descoberta do Samba, Jônatas revela que há pesquisas atrás de vírus gigantes em diversos biomas do Brasil. Ele cita o Pantanal, lagoas urbanas, cerrado, mata atlântica e caatinga, que são ambientes com características bem diferentes um do outro. “Já foram isolados mais de 30 vírus gigantes. Tem o Niemeyer, da Lagoa da Pampulha, o Kroon, de Lagoa Santa, e o Cipó, da Serra do Cipó. Todos em processo de análise e estudo”, revela.

Agora, conforme Jônatas, é preciso buscar entender a relação do vírus gigante com os vertebrados, como os seres humanos e os outros animais. “Temos uma aluna de mestrado que conseguiu demonstrar que os mimivírus são capazes de controlar alguns elementos do sistema imunológico humano; e no Hospital das Clínicas da UFMG, nosso parceiro, estamos estudando os fatores de risco dos vírus gigantes no ambiente hospitalar.”

A descrição da descoberta do vírus Samba foi publicada em artigo científico no periódico internacional Virology Journal com o nome Samba virus: a novel mimivirus from a giant rain forest, the Brazilian Amazon, de autoria dos cientistas Rafael K. Campos, Paulo V. Boratto, Felipe L. Assis, Eric Aguiar, Lorena C.F. Silva, Jonas D. Albarnaz, Fabio P. Dornas, Giliane S. Trindade, Paulo P. Ferreira, João T. Marques, Catherine Robert, Didier Raoult, Erna G. Kroon, Bernard La Scola e Jônatas S. Abrahão. O documento pode ser acessado pelo site: www.virologyj.com

MEIO AMBIENTE » GUARDIÃES DA MATA‏

MEIO AMBIENTE » GUARDIÃES DA MATA Proximidade da temporada de queimadas mobiliza vigilantes informais de reservas ambientais, que usam técnicas simples e ecológicas para evitar ou combater incêndios 
 
Tiago de Holanda
Estado de Minas: 02/06/2014


Da varanda de casa, no Vale do Sol, em Nova Lima, o artesão Gláucio Flores fica atento a queimadas na Estação Ecológica de Fechos
Da varanda de casa, no Vale do Sol, em Nova Lima, o artesão Gláucio Flores fica atento a queimadas na Estação Ecológica de Fechos


Às margens de um trecho da BR-040, estendem-se os quase 1,1 mil hectares da Estação Ecológica de Fechos, pertencente ao Parque Estadual Serra do Rola-Moça. A reserva é habitada por dezenas de espécies de plantas, algumas típicas do cerrado, outras de transição entre esse bioma e a mata atlântica. Em Nova Lima, na Grande BH, o rincão verde tem um vigilante informal. Ao menos duas vezes por dia, no Bairro Vale do Sol, o artesão Gláucio Flores, de 55 anos, vai até uma varanda no primeiro andar de sua casa e, com um binóculo, faz uma varredura na paisagem. Ele fica atento a qualquer emissão de fumaça e teme que incêndios destruam a mata.

Assim como Gláucio, muitas pessoas buscam fazer sua parte para evitar que chamas devastem florestas mineiras. Elas adotam uma série de medidas de prevenção durante todo o ano, mas a preocupação se acentua nessa época, quando o tempo seco e quente contribui para aumentar as ocorrências. Este ano já foram registrados 55 casos até 24 de maio, mais que o triplo da média de 15 casos para o mesmo período de 2009 a 2013, segundo a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). O fogo já destruiu 573,21 hectares nas áreas protegidas, contra uma média de 155,91 nos últimos cinco anos.

O ano será “crítico”, na avaliação do capitão Valdeck Rodrigues, responsável pela Adjuntoria de Emergências Ambientais do 1º Comando Operacional do Corpo de Bombeiros, que engloba a Região Metropolitana de Belo Horizonte e as duas regiões do estado que costumam sofrer mais com incêndios florestais, Norte e Nordeste. Apesar da previsão negativa, o capitão ressalta que gestos simples podem ajudar a proteger as matas. Uma é não jogar guimba de cigarro em terreno com vegetação. Aquela brasa miúda pode gerar um violento fogaréu. “Muita gente não sabe o prejuízo que uma atitude pequena pode causar. A grande maioria dos incêndios é provocada por descuidos”, enfatiza.

O artigo 41 da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 1998) diz que “provocar incêndio em mata ou floresta” é passível de reclusão de dois a quatro anos e multa. Se o crime for culposo (não intencional), a pena é de detenção de seus meses a um ano e multa.

Nas unidades estaduais de conservação, é proibido fazer fogueira ou acender churrasqueira, salvo em locais previamente definidos. Ao visitar uma área de mata onde fogueiras sejam permitidas, é importante tomar precauções antes de acendê-las: ao redor do local onde se acenderá o fogo, deve-se remover as folhas secas e fazer um círculo com pedra. Ao apagar as chamas, para se certificar de que elas não se reavivem, é recomendável exterminá-la com água e terra.

Segundo o artigo 42 da Lei de Crimes Ambientais, “transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação” pode acarretar detenção de um a três anos e multa. “Além disso, perto dessas áreas não se deve soltar fogos de artifício”, acrescenta o capitão Rodrigues. Ao constatar um incêndio, ainda que esteja no início, ou situações que apresentem risco de provocar queimada, deve-se ligar para a Polícia Militar (190) ou os bombeiros (193).

de olho Nas varreduras que faz de sua varanda no Vale do Sol, onde mora há 14 anos, o artesão Gláucio já avistou diversos incêndios incipientes. “Onde tem fumaça, tem fogo, diz o ditado. Consegui controlar o fogo várias vezes. Eu sempre corro com meu equipamento”, diz, referindo-se ao extintor de incêndio de seu carro e a um abafador feito por ele mesmo, que recortou em tiras a câmara de ar de um pneu e as fixou a uma extremidade de uma comprida vara de bambu. Ele se queixa de que algumas vezes ligou para os bombeiros, mas ninguém apareceu. “O jeito foi esperar o fogo se extinguir sozinho, com o tempo, às vezes com a chuva, depois de ter destruído um pedaço de mata”, lembra.

Além da inspeção com o binóculo, Flores percorre parte da reserva vizinha ao menos duas vezes por dia, de manhã e à tarde, sempre atento a qualquer problema que ponha em risco a flora e a fauna. “É uma pena que o poder público invista tão pouco em campanhas educativas”, lamenta Gláucio, integrante da organização não-governamental Primatas da Montanha, que promove ações de conscientização ambiental. “Essa estação ecológica é um patrimônio riquíssimo, um legado para nossos descendentes. Quem não cuida, não merece tê-lo”, defende.



"A compostagem é uma ótima opção para dar um bom destino aos resíduos sem pôr o meio ambiente em perigo", Gustavo Passos, agricultor

Queima controlada

Na agropecuária é comum o uso de fogo para eliminar vegetação indesejada ou restos de cultura. A prática, porém, é uma das causas mais frequentes de incêndios florestais. Antes de adotá-la, o produtor rural é obrigado pela legislação a consultar o poder público. Em 24 de maio, foi publicada no Diário Oficial uma resolução conjunta da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e do Instituto Estadual de Florestas (IEF) estabelecendo as normas para a queima controlada, que busca usar as chamas de forma controlada, evitando que elas atinjam matas vizinhas.

Para usar o fogo com fins produtivos, o agricultor ou pecuarista precisa de autorização do IEF ou da Semad, por meio das Superintendências Regionais de Regularização Ambiental e seus núcleos regionais de regularização ambiental. De porte da licença, ele deve tomar medidas de precaução, segundo a resolução. Uma delas é fazer a queima em dias e horários mais frios, úmidos e de pouco vento. Também é preciso construir aceiros com largura mínima de seis ou três metros, dependendo do lugar. De acordo com uma portaria expedida pelo IEF em 2010, a prática controlada fica suspensa quando o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) apontar que a umidade relativa do ar local é inferior a 20%.

“O fogo não pode ser usado por mera vontade do produtor, mas existem pessoas a quem a informação não chega. Um dos desafios é fazer com que todas, mesmas as mais simples, tenham acesso ao que impõe a legislação”, diz a coordenadora da assessoria de meio ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária de Minas (Faemg), Ana Paula Mello.

Já nas cidades, é corriqueiro o emprego das chamas para ajudar a exterminar lixo, inclusive o que sobra da capina de um terreno. “Tem gente que queima o mato seco que capinou e não têm noção de que o fogo pode sair do controle”, constata o capitão Valdeck Rodrigues, responsável pela adjuntoria de emergências ambientais do 1º Comando Operacional do Corpo de Bombeiros Militar.

ABAFADOR Há alguns dias, Gustavo Passos, de 44 anos, estava andando por uma rua do Bairro Vale do Sol, em Nova Lima, na Grande BH, e viu lixo sendo consumido por chamas em um lote vago, a poucos metros de um dos limites da Estação Ecológica de Fechos. Preocupado, ele pegou emprestado o abafador de um vizinho e correu para apagar a labareda. Quando precisa extrair a vegetação de um terreno, o agricultor jamais tenta eliminá-las com fogo. Em vez disso, usa os resíduos para fazer compostagem e aproveita o resultado para adubar o solo de sua horta: “A compostagem é uma ótima opção para quem quer dar um bom destino a esses resíduos, sem pôr o meio ambiente em perigo”.

As regras e a emoção do futebol - Antônio José Cabral

Engenheiro e empresário
Estado de Minas: 02/06/2014 


O futebol é apenas um jogo. O advérbio aí não tem a intenção de diminuí-lo, pretende somente registrar o seu caráter. Aliás, a ideia de que o futebol é apenas um jogo está fortemente introjetada nas nossas mentes, tanto que aceitamos que ele seja regido apenas pelas suas 17 regras, que o árbitro tenha a última palavra, que o seu poder seja absoluto e as suas decisões inquestionáveis, mesmo quando discricionárias. Ninguém, via de regra, exceto se for néscio ou louco, recorrerá à Justiça comum para, em outra jurisdição, tentar alterar o resultado de uma partida, mesmo que os erros de arbitragem possam ser provados por filmagens e vídeos.

Sendo o futebol apenas um jogo, suas regras não estão sujeitas às nossas constituições nacionais, nem aos nossos códigos jurídicos, sob pena de parecerem ridículas as interpretações contrárias. Os jogos têm suas próprias regras e as suas lúdicas diretrizes. Tomando emprestada a expressão com que Guimarães Rosa se referia ao amor, os jogos são “o descanso da loucura”.

Da mesma forma, para que sejam realizados os campeonatos, é preciso que haja os regulamentos. Não há campeonatos sem regulamentos. E, sendo eles meras extensões do jogo, têm o mesmo caráter, são coisas da mesma natureza. Os regulamentos são uma espécie de pacto, pelo qual se obrigam os participantes a obedecer regras de conduta e normas de comportamento. E, é claro, também neles estão previstas as punições pelo desrespeito a elas.

Há quem defenda a ideia de que, nos campeonatos, “devam prevalecer os resultados do campo”. Supõe-se que quem assim pensa, acha que a infração aos regulamentos não tem importância, desde que se ganhe no campo. Ou seja, que os regulamentos possam ser ignorados pelos vencedores. É uma opinião irrefletida, digamos assim. Como é próprio dos jogos, as decisões e punições pelo desrespeito às regras e aos regulamentos têm julgamento de caráter sumário e definitivo.

No futebol brasileiro isso cabe ao árbitro no campo e, fora dele, ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que aqui faz o papel das comissões disciplinares da Europa. É preciso admitir que o STJD é, de fato, um exagero da nossa Constituição Federal (art. 217), e nem é o único. Portanto, as punições à Portuguesa e ao Flamengo no fim do Campeonato Brasileiro de 2013 não deveriam ter causado nenhum estranhamento. Apenas foram aplicadas as que estavam previstas no regulamento. Já o espanto foi justificado, pelo fato inusitado de as infrações terem ocorrido na última rodada, quando as posições relativas já pareciam definidas e, é claro, também pelas surpreendentes consequências.

Todas essas considerações nos remetem às regras do jogo, que vêm sendo bastante questionadas por parte da nossa imprensa esportiva, que deseja, entre outras coisas, que seja permitido aos árbitros o acesso às gravações dos lances da partida, o que elevaria o grau de certeza das decisões. É preciso ter em conta que a incorporação dessas alterações, que seriam profundas e importantes, muito provavelmente teria como resultado um outro jogo, muito diferente do atual e também muito provavelmente menos empolgante, já que a busca da exatidão e da certeza poderiam torná-lo um tanto insosso.

 Ora, o futebol é hoje o esporte mais popular do mundo, o interesse por ele cresce exponencialmente, a ponto de termos para a final dos campeonatos mundiais de seleções um público telespectador esperado de mais de 2 bilhões de pessoas, 1/3 da população mundial. Não há, tanto quanto se possa vislumbrar o futuro próximo, o menor sinal de desgaste ou desinteresse pelo jogo com as regras atuais, a ponto de recomendar qualquer mudança. Por isso os ouvidos em Zurique estão moucos. E moucos provavelmente continuarão.

Na verdade, os jogos de uma maneira geral, pela sua natureza, talvez possam prescindir de modernização e dos avanços tecnológicos. Tomemos o xadrez como exemplo: sua longevidade sem alteração das regras é notável. Elas hoje ainda são as mesmas de sempre, não obstante os reis agora serem poucos, as torres terem perdido há muito tempo o seu significado estratégico e os bispos terem se recolhido apenas às suas funções eclesiásticas.

Seu caráter ancestral pode ser comprovado pela alusão que a ele é feita pelo imenso Omar Khayyam no seu Rubaiyat. Eis os versos: “Tu, cuja face humilha a rosa silvestre; tu, cujo rosto assemelha-se ao de um ídolo chinês; sabes que o teu olhar aveludado faz o rei da Babilônia parecer o bispo do jogo de xadrez, que recua diante da rainha”.

 O Rubaiyat foi escrito há quase 10 séculos. Mas a analogia entre as regras de xadrez e de futebol não será aceita por todos. Haverá os que dirão que a comparação é imprópria, dado que os jogos são muito diferentes. Então vamos considerá-la apenas uma digressão, um exercício de divagação que não deve ser tomado em conta. Mesmo assim, é muito improvável que as regras de um jogo que faz tanto sucesso sejam alteradas com tal profundidade.

A qualidade oferecida emalguns centros não reflete a realidade do atendimento aos pobres Luiz Francisco Corrêa

Contrastes da saúde no país 
 
A qualidade oferecida emalguns centros não reflete a realidade do atendimento aos pobres 
 
Luiz Francisco Corrêa
Jornalista, diretor da Via Comunicação, membro do Conselho Curador da Fundação de Pesquisa e Ensino da Cirurgia (Fupec)
Estado de Minas: 02/06/2014

O próximo governante do Brasil, seja quem for, encontrará sérios problemas para resolver, principalmente na área de saúde. A população pobre do país, ou das novas classes médias, como queiram, sofre muito em todos os setores, especialmente na saúde. Pronto-atendimentos lotados, consultas rápidas, filas para exames, muitas macas pelos corredores, insegurança com diagnóstico e tratamento (realidade da área pública pelo país), em contraposição a uma outra realidade, uma vez que o país é referência na área médica e mantém serviços de excelência nas mais diversas especialidades, na área privada e pública.

Na saúde pública, temos vários serviços da melhor qualidade, como, por exemplo, em cirurgia cardiovascular, tratamento da Aids, em hemodiálise e em ortopedia e traumatologia, só para citarmos alguns. Somente em Belo Horizonte, podemos destacar o Ambulatório de Tumores Hepáticos do Hospital das Clínicas da UFMG, que atende, com eficiência, unicamente pacientes do SUS. Importante lembrarmos que em vários locais encontramos médicos e outros profissionais de saúde que atendem o paciente da melhor forma possível, independente do caos ao seu redor. Mas, o quadro da saúde em geral é grave e pode causar vários transtornos para o novo governante. Para o paciente, sobretudo o mais pobre, nem se diga. Além da própria doença, ou doenças, há ainda questões psicológicas e emocionais decorrentes do estado físico como também da baixa auto-estima, estresse, ansiedade, pânico e depressão oriundos de todo esse processo – da doença em si e da realidade de atendimento que lhe é oferecida. O próximo governante do país vai encontrar ainda nas instituições hospitalares as consequências da violência urbana, pois o Brasil é um dos países mais violentos do mundo, sobretudo nas periferias das grandes cidades. Somos também um dos países com maior índice de acidentes de trânsito, principalmente com motos, com elevado índice de óbitos e de vítimas com sequelas graves e permanentes, com altíssimo custo para o governo. Temos um número significativo de pessoas com necessidades especiais, com problemas de assistência médica-hospitalar e de locomoção, bem como a violência das drogas e a falta de infraestrutura no tratamento dessas pessoas. Vai encontrar também uma sociedade combativa, a exemplo das manifestações de junho. Outro aspecto é a crescente insatisfação dos médicos com os valores que recebem dos convênios médicos e valores pagos pela área pública.

O dinheiro do povo desviado pela corrupção no Brasil daria para ajudar muito a saúde pública. A sociedade está cada vez mais consciente dessa realidade. Os políticos corruptos vivem com inúmeros privilégios, como se estivessem em uma monarquia com as suas estratificações. Essas figuras carimbadas são recebidas rapidamente nos grandes hospitais privados do país, sobretudo nos paulistanos, com direito a equipe multidisciplinar, muito conforto, foto nas revistas de celebridades e até, se necessário, coletivas de imprensa. E se esses senhores tivessem que esperar nas filas dos hospitais? Se tivessem que aguardar dias para fazer um exame que deve ser urgente? Muitos já teriam desaparecido. É importante ressaltar que a boa saúde da população está associada a um bom saneamento, moradia, transporte e uma melhor educação.