segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Dilma pode jogar bem - Renato Janine Ribeiro

VALOR ECONÔMICO - 17/11/2014

Dilma pode usar o escândalo da Petrobras para convencer a sociedade de que é preciso mudar o financiamento dos partidos. 

  É difícil, hoje, acertar quais serão os desdobramentos de nossa política. A reeleição de Dilma Rousseff não foi fácil. Ela enfrentará dificuldades já sabidas. Mas isso não quer dizer que seu segundo governo esteja condenado. Se ela souber jogar bem, pode reverter as previsões quase apocalípticas que se fazem para seu novo mandato. Dispõe de trunfos para isso.

As dificuldades não são poucas. Nos últimos dias, dois ministros importantes fizeram declarações que complicaram o panorama político. Num gesto de impacto, Marta Suplicy condenou a política econômica, pedindo mudanças no rumo do que quer "o mercado". Não nos iludamos: o nome de Marta era um dos poucos que politicamente estava à altura, ou mesmo acima, do ministério que ocupava. Num gabinete que tem poucos cardeais do PT, ela é um deles. Estava na Cultura - infelizmente, uma pasta que nem sempre é valorizada politicamente tanto quanto merece. Afinal de contas, num mundo melhor, sem miséria e com pouca pobreza, cultura e atividade física serão os ministérios mais voltados para as finalidades da vida, para o que faz a vida merecer ser vivida. Mas, na situação atual, nesta pasta "menor" a ex-vice-presidente do Senado resolveu vários tópicos culturais que estavam parados no Congresso. Até por isso, descontente ao ver sua própria fritura, Marta saiu atirando e dando sinais de que poderia até mudar de partido.


A outra declaração é inteiramente diferente. Gilberto Carvalho, encarregado de boa parte da articulação política, criticou o estilo presidencial de governar - embora tendo a delicadeza de também assumir responsabilidade por ele. Se Marta foi ao limite da ruptura, Carvalho fez uma crítica das que chamamos de construtivas. Mesmo assim, ao fim de um mandato em que Dilma pouco dialogou e pouco delegou, as observações dele passaram a imagem de ministros importantes em desacordo com sua chefe.

Dilma pode usar caso da Petrobras na reforma política


O sinal positivo foi a reação presidencial ao impacto maior, o da demissão de Marta. Dilma reagiu com paz e amor... Se esse novo estilo pegar, e o segundo mandato abrir espaço às negociações, ela cumprirá ao menos metade do que pode - e deve - fazer, a fim de reduzir os descontentamentos com seu primeiro mandato. Gilberto Carvalho resumiu o problema: com os movimentos sociais (à esquerda do governo - os descontentes que apoiaram a reeleição), houve diálogo mas não foram atendidas as reivindicações; com o empresariado (à direita do PT - os descontentes que admiravam Lula mas acabaram votando na oposição), houve pouco diálogo. Portanto, precisa haver diálogo e concessões. Como fazê-las ao mesmo tempo à direita e à esquerda exigirá certa genialidade política. Mas aceitar negociar já será um passo importante.

E agora vêm as denúncias da Petrobras. As declarações de ministros fazem parte da conjuntura, do curto prazo. Já o caso Petrobras pertence ao longo prazo. Este assunto vai precisar decantar. As primeiras reações da oposição foram claras: culpou o PT e organizou protestos que, se no resto do Brasil reuniram poucos ("menos que uma feira de artesanato", disse alguém), em São Paulo congregaram muitos. Mas o fato é que, dos presos de sexta-feira, a maioria não foi de petistas ou funcionários públicos, mas de empresários. Vimos um filme, para lembrar uma antiga série de TV, que foi além da imaginação: quem poderia fantasiar que presidentes de empresas fortes e ricas iriam para a cadeia?


A legislação mudou há pouco tempo, primeiro, para punir severamente os corruptores (e não só os corruptos), quer dizer, as empresas e não só os funcionários públicos e governantes, segundo, para penalizar empresas em cujo nome se faça corrupção. As prisões da operação Juízo Final vão neste rumo. Quer dizer que, agora, poucos sabem até onde isso irá. Devem sair em breve os nomes de políticos envolvidos. De que partidos serão? Se o esquema funcionava havia quinze anos, e o PT governa há doze, a revelação pode incriminar dirigentes dos tempos do PSDB. É provável que nomes de vários partidos, inclusive da oposição, sejam expostos.

As reações imediatas retratam bem este momento em que tudo ainda está vago. A oposição centrou o fogo nos nomes que pôde ligar ao PT, mas omitiu os presos empresários. Já os petistas, nas redes sociais, se dividem entre uma minoria que acusa a operação de pró-tucana e uma maioria que festeja os avanços na luta contra a corrupção.

Nos próximos dias, vai se abrir uma caixa de Pandora.

Dilma pode sair fortalecida. No momento turvo da escolha de novos colaboradores - quando vem a exigência de cargos em troca de apoios - alguns dos nomes mais preocupantes podem ser descartados, se estiverem nas listas de acusados. Isso dará maior poder de alavancagem à presidência. E Dilma pode usar as denúncias para fortalecer a exigência, na reforma política, de medidas que atenuem a maior causa da corrupção - que é o modelo de financiamento das campanhas. É óbvio que os grandes financiadores, pessoas jurídicas ou físicas, doam dinheiro querendo conquistar a "simpatia" do futuro governo. Isso tem de mudar. Ora, esta mudança tem sido defendida mais pelo PT do que pelo PSDB.

O jogo não está jogado. Se Dilma construir propostas concretas e efetivas, pode ganhar a partida. E isso com a sorte grande para um político, que é quando ele ganhar significa o País ganhar. Foi isso o que deu poder a FHC, quando apoiar o Plano Real era apoiar os interesses do Brasil, ou a Lula, quando a inclusão social se tornou causa nacional. Este é um cenário otimista, mas nem por isso impossível. Precisará, sim, de nervos de aço e sobretudo de capacidade política.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.
E-mail: rjanine@usp.br


Parede - Eduardo Almeida Reis

Parede


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 17/11/2014





Eugênio Ferraz seria o melhor administrador público do Brasil se houvesse outros. Como não há, o são-lourenciano Eugênio é único. Revolucionou nossa Imprensa Oficial, que está festejando 122 anos de existência. Impossível dizer tudo que fez e continua fazendo. O salário é modesto, a verba, curta e as realizações, imensas. Restaurante, telhados, sala de cinema, pisos, museu, gráfica, editora, tudo reconstruído e remodelado. A parede das placas dá ideia da inventiva do sul-mineiro, que encontrou o imenso prédio com uma porção de placas indicativas dos nomes das salas ao longo dos anos. Uma delas, Sala Fausto Alvim, me fala ao coração. Tive a honra de ser amigo do doutor Fausto Figueira Soares Alvim, sendo embora muito mais moço que o honrado ex-prefeito do Araxá e ex-diretor do Banco do Estado da Guanabara, entre os muitíssimos cargos que ocupou em sua vida pública.

Pois fique o leitor sabendo que a placa da Sala Fausto Alvim dava para um corredor, depois que a sala original foi dividida em várias outras. Assim, também, com dezenas de outras placas homenageando administradores mineiros, que lá estavam encimando as portas que abriam para cômodos e cubículos construídos no passar dos anos. Uma das placas homenageava mineiro ilustre e abria para um banheiro com lavatório e privada, sem bidê.

Que fez o diretor-geral da Imprensa Oficial? Mandou retirar todas as placas para afixá-las numa única parede. Assim, os ex-administradores continuam homenageados, sem que as placas mintam sobre o que existe além das portas onde estavam afixadas.

Barulhos

O Rio de Janeiro acabou descobrindo e condenando a barulheira nos restaurantes. Os frequentadores conversam com os seus parceiros de mesa como se estivessem gritando para um amigo do outro lado da rua, fenômeno que se explica pela falta de educação generalizada e pelo gosto de fazer o tipo cheguei. Na roça, tive esmeril e serra circular elétricos. Cinco serras circulares trabalhando ao mesmo tempo não fazem a metade do barulho de oito desquitadas conversando à mesa de um restaurante. Assuntos variados, enquanto o pensamento é único: descolar novo casamento. Mulheres sérias, inteligentes, cheirosas, bonitas, padecem de masoquismo existencial: sonham com um novo marido. Geralmente para começar a sofrer ao cabo de três meses, porque está para nascer marido que não mereça divórcio litigioso, perdendo os bens e os filhos para a santa.

Danuza Leão passou a almoçar às cinco da tarde para fugir da barulheira dos restaurantes chiques. Melhor dizendo, tentar fugir, porque às cinco da tarde restam mesas com alcoolizados falando ainda mais alto que os barulhentos. Há diversos casos de frequentadores que se dirigem diretamente aos barulhentos, com risco de briga generalizada, ou chamam o gerente. Claro que o gerente não faz nada para não perder a clientela. Em rigor, falar alto só se justifica nos casos em que o falante sofre de problemas de audição e perde a noção do barulho que faz.

A cidade-polo da Zona da Mata de Minas, barulhenta como BH, tem velho e famoso Centro Cultural com relevantíssimos serviços prestados à boa música. Nele trabalhava havia muitos anos um auxiliar de limpeza fascinado pelos músicos, pelos instrumentos, pela orquestra que tocava no prédio faxinado por ele. Tendo confessado seu fascínio ao diretor do Centro Cultural, foi recompensado com o convite para fazer parte da orquestra nas seguintes condições: cordas do violino afrouxadas, fingir tocar e trocar as páginas da partitura sempre que os outros violinistas trocassem. Sapatos, meias, terno, camisa e gravata presenteados pelo diretor do Centro Cultural.

Até que um dia, (esse caso é rigorosamente verdadeiro e conhecido de todos os idosos da tal cidade) entraram no auditório dois maestros muito amigos, um dos quais falava alto porque estava ficando surdo. “Olha lá, aquele violinista não está tocando”, disse o maestro para o colega surdo, que respondeu aos berros: “Faz muito bem. Não sabe, não toca. É melhor do que os outros, que não sabem e tocam”.

O mundo é uma bola

17 de novembro de 1558: Elizabeth I, da Inglaterra, torna-se rainha e é a última representante da Dinastia Tudor a ocupar o trono. A Casa de Tudor foi uma dinastia que reinou na Inglaterra entre 1485 e 1603. Em 1717, tem início a construção do Convento de Mafra, a 25 quilômetros de Lisboa, monumental palácio e mosteiro em estilo barroco na vertente alemã. Iniciativa de dom João V, de Portugal, cumprindo promessa caso a rainha Maria Ana de Áustria lhe desse descendência.

A biblioteca de Mafra, estantes estilo rococó e chão de mármore, tem mais que 36 mil livros encadernados em couro, gravações a ouro, rivalizando com a biblioteca da Abadia de Melk, na Áustria. A biblioteca portuguesa abriga morcegos que ajudam a preservar os livros. Saem durante a noite das caixas em que vivem por baixo das estantes: cada um se alimenta de insetos equivalentes à metade do seu peso. Hoje é o Dia da Criatividade e o Dia Nacional de Combate à Tuberculose.

Ruminanças

“Mulher, arma e cavalo de andar, nada de emprestar” (J. Simões Lopes Neto, 1865-1916).