MARIA ESTHER MACIEL »
Escrever a mão
Sei que, a muito curto prazo, a caligrafia será apenas uma arte antiga. Se é que já não é
Estado de Minas: 26/11/2013
>> memaciel.em@gmail.com
Recebi, há poucos dias, um envelope manuscrito vindo da Itália. Meu nome e endereço estavam em tinta azul, com letra elegante, mas sem rebuscamento. Curiosa, virei-o para identificar o remetente. Era de minha amiga Élida, que em viagem a Veneza tinha se lembrado de mim e enviado um cartão-postal. Ao abri-lo, deparei-me com uma foto da cidade acompanhada de palavras de carinho. E senti, nesse momento, como é bom receber cartões e cartas manuscritas, pelo correio.
Escrever a mão, nestes tempos digitais, é atividade em plena extinção. Uma pena, pois a caligrafia carrega nos traços toda a energia do corpo de quem escreve, somada às modulações da alma, do desejo e da memória. Ao manuscrever um texto, nele deixamos um pouco de nossa intimidade. E ao ler um texto manuscrito sentimos a força vital da mão que o escreveu. O jeito de traçar uma vogal, a forma pessoal de acentuar os “is”, de cortar um t, inclinar um l, puxar a “perninha” de um f ou um p, inserir uma vírgula ou um ponto de interrogação, tudo isso evidencia um ritmo particular. Cada escrita ganha, assim, uma personalidade própria.
Vários escritores, ainda hoje, não abrem mão de um lápis ou uma caneta. O brasileiro Milton Hatoum é um deles. A portuguesa Lídia Jorge também gosta de escrever a mão em cadernos, de preferência vermelhos. Já o americano Paul Auster prefere os cadernos de capa azul.
Tenho um amigo de longa data que às vezes me manda notícias em folhas quadriculadas de papel. Ele não gosta de computador e tem um certo fetiche por blocos e canetas-tinteiro. Uma vez cheguei a comprar, também, um kit de caligrafia em Londres. Ele vem com uma pena, quatro pontas (ou “bicos”) de diferentes tamanhos, um tinteiro e um bloco de cartas com envelopes. Mas quando tentei usá-lo, lambuzei-me toda, e a letra ficou um desastre. Acho que não peguei a técnica certa. E ele ficou apenas como relíquia na gaveta.
Em geral, quando escrevo uma carta a mão, uso caneta-tinteiro convencional ou uma boa caneta esferográfica. Meu único fetiche é o papel. No dia a dia, sempre faço anotações em cadernos e cadernetas. Gosto dos de uma marca japonesa, Muji, que são simples e baratos. As páginas, macias, têm boa densidade e linhas estreitas. Nelas, o lápis ou a caneta desliza com desenvoltura. Já em horas especiais, nada como um papel de linho ou seda. Já nas horas informais, quando não se acha um papel para escrever, serve até um guardanapo ou pedaço de papel de embrulho. Esses papeis improvisados também têm lá o seu encanto e mostram que o mais importante é, mesmo, o que se escreve neles.
Sei que, a muito curto prazo, a caligrafia será apenas uma arte antiga. Se é que já não é. Vejo que, agora, caligrafia virou sinônimo de letra enfeitada que se usa nos envelopes de convites de casamento e de formatura.
Apesar de não viver mais sem computador, creio que nunca deixarei de prezar a escrita a mão. Talvez esse fascínio venha da infância, por influência de uma de minhas tias, que sempre teve uma letra linda e inconfundível. Por muito tempo, quando garota, tentei imitá-la. E isso levou-me a desenvolver o gosto pela letra caligrafada.
Já me arrependo de não ter escrito esta crônica a mão.
Recebi, há poucos dias, um envelope manuscrito vindo da Itália. Meu nome e endereço estavam em tinta azul, com letra elegante, mas sem rebuscamento. Curiosa, virei-o para identificar o remetente. Era de minha amiga Élida, que em viagem a Veneza tinha se lembrado de mim e enviado um cartão-postal. Ao abri-lo, deparei-me com uma foto da cidade acompanhada de palavras de carinho. E senti, nesse momento, como é bom receber cartões e cartas manuscritas, pelo correio.
Escrever a mão, nestes tempos digitais, é atividade em plena extinção. Uma pena, pois a caligrafia carrega nos traços toda a energia do corpo de quem escreve, somada às modulações da alma, do desejo e da memória. Ao manuscrever um texto, nele deixamos um pouco de nossa intimidade. E ao ler um texto manuscrito sentimos a força vital da mão que o escreveu. O jeito de traçar uma vogal, a forma pessoal de acentuar os “is”, de cortar um t, inclinar um l, puxar a “perninha” de um f ou um p, inserir uma vírgula ou um ponto de interrogação, tudo isso evidencia um ritmo particular. Cada escrita ganha, assim, uma personalidade própria.
Vários escritores, ainda hoje, não abrem mão de um lápis ou uma caneta. O brasileiro Milton Hatoum é um deles. A portuguesa Lídia Jorge também gosta de escrever a mão em cadernos, de preferência vermelhos. Já o americano Paul Auster prefere os cadernos de capa azul.
Tenho um amigo de longa data que às vezes me manda notícias em folhas quadriculadas de papel. Ele não gosta de computador e tem um certo fetiche por blocos e canetas-tinteiro. Uma vez cheguei a comprar, também, um kit de caligrafia em Londres. Ele vem com uma pena, quatro pontas (ou “bicos”) de diferentes tamanhos, um tinteiro e um bloco de cartas com envelopes. Mas quando tentei usá-lo, lambuzei-me toda, e a letra ficou um desastre. Acho que não peguei a técnica certa. E ele ficou apenas como relíquia na gaveta.
Em geral, quando escrevo uma carta a mão, uso caneta-tinteiro convencional ou uma boa caneta esferográfica. Meu único fetiche é o papel. No dia a dia, sempre faço anotações em cadernos e cadernetas. Gosto dos de uma marca japonesa, Muji, que são simples e baratos. As páginas, macias, têm boa densidade e linhas estreitas. Nelas, o lápis ou a caneta desliza com desenvoltura. Já em horas especiais, nada como um papel de linho ou seda. Já nas horas informais, quando não se acha um papel para escrever, serve até um guardanapo ou pedaço de papel de embrulho. Esses papeis improvisados também têm lá o seu encanto e mostram que o mais importante é, mesmo, o que se escreve neles.
Sei que, a muito curto prazo, a caligrafia será apenas uma arte antiga. Se é que já não é. Vejo que, agora, caligrafia virou sinônimo de letra enfeitada que se usa nos envelopes de convites de casamento e de formatura.
Apesar de não viver mais sem computador, creio que nunca deixarei de prezar a escrita a mão. Talvez esse fascínio venha da infância, por influência de uma de minhas tias, que sempre teve uma letra linda e inconfundível. Por muito tempo, quando garota, tentei imitá-la. E isso levou-me a desenvolver o gosto pela letra caligrafada.
Já me arrependo de não ter escrito esta crônica a mão.