Livros e filmes sobre os anos de chumbo ajudam a repensar a história do Brasil
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Iara Iavelberg, a jovem guerrilheira que deixou a vida burguesa, é tema de documentário em cartaz em BH
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Nos
últimos meses, livros e filmes têm sido lançados no país com o
propósito de esclarecer questões que permanecem à sombra da
historiografia relativa ao golpe civil-militar de 1964, que ontem
completou 50 anos. Um bom exemplo é o documentário Em busca de Iara,
dirigido por Flávio Frederico, com roteiro e entrevistas feitas por
Mariana Pamplona.
Mais que produtora, a roteirista é fruto do
golpe. Seu nome homenageia a tia, a aguerrida Iara Iavelberg – que, na
clandestinidade, atendia por Mariana e foi assassinada aos 27 anos, em
Salvador. A morte se deu durante caçada policial à guerrilheira do
Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e a seu companheiro, o
capitão Carlos Lamarca, que desertou das Forças Armadas.
“A ideia
surgiu a partir da filmagem que fiz da exumação dos restos mortais da
Iara, em 2003. A família lutou anos na Justiça por essa exumação”,
afirma Mariana, que estava na barriga da mãe quando a tia morreu. A
versão oficial do governo militar era de que a militante se matou para
não entregar Lamarca. Porém, análise da perícia mostrou que ela foi
executada.
Iara Iavelberg já havia sido retratada no filme
Lamarca, do diretor Sérgio Rezende, em 1994. Mariana explica que muitas
obras trazem a versão errada da morte de sua tia, pois foram lançadas
antes da perícia. A saga da bela judia paulistana que trocou a
confortável vida burguesa pela guerrilha ajuda a compreender por que
tantos jovens como ela aderiram à luta armada.
Na série de
matérias sobre os 50 anos do golpe, o Estado de Minas publica lista com
10 sugestões de livros e filmes essenciais para compreender o período. O
jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira, autor do best seller
O que é isso, companheiro?, garante: ainda há muitas histórias que
merecem ser contadas sobre os anos de chumbo.
“Escrito no final
do exílio, o livro tinha como objetivo dar um depoimento sobre o que vi
durante a ditadura militar, de forma leve e jornalística, para alcançar o
grande público. O que é isso... me trouxe muitas alegrias, inspirou um
filme que concorreu ao Oscar e rendeu algum dinheiro para sobreviver
quando cheguei ao Brasil”, recorda.
EXÍLIOO
mineiro Gabeira trabalhava no Jornal do Brasil quando participou, em
1969, do sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick,
trocado por 15 presos políticos que partiram para o exílio. Preso,
Gabeira deixou a cadeia rumo à Europa depois de ser trocado por outro
diplomata, o alemão Ehreinfried Von Hollenben. Só voltou ao país em
1979, com a decretação da anistia.
Em 1997, quando o filme O que é
isso, companheiro? foi lançado, reacendeu-se o interesse pelo tema,
lembra ele. Dirigido por Bruno Barreto, o longa representou o país no
Oscar. “Isso contribuiu para que mais pessoas, inclusive fora do Brasil,
tivessem uma ideia do que se passou”, destaca.
Para Gabeira, a
produção literária sobre o período poderia ser maior. “A ideia era de
que a censura impedia a publicação de obras e, acabada a ditadura,
muitos livros surgiriam. Mas o clima de falta de liberdade acabou
contribuindo para que não saíssem das gavetas tantas obras assim, embora
já se tenha escrito muito sobre o próprio período ditatorial”.
Cid
Benjamin, um dos companheiros de Gabeira no sequestro do embaixador
americano, vem hoje a Belo Horizonte fazer palestra na PUC Minas.
Benjamin publicou recentemente o livro Gracias a la vida (José Olympio),
que traz o relato de suas experiência como um dos líderes do Movimento
Revolucionário Oito de Outubro (MR-8).
Além de relembrar os anos
de chumbo, o autor faz um balanço de sua trajetória política. Depois de
intensa militância no PT, Cid se filiou ao PSOL com críticas
contundentes aos ex-companheiros que hoje estão no poder.
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As atrizes Cláudia Abreu e Beth Lago, em Anos
rebeldes, como a jovem Heloísa, que adere à luta armada, e a mãe, a
socialite Natália |
CONFIRA
50 ANOS DO GOLPE DE 64Bate-papo
com Cid Banjamin. Hoje, às 17h10. Prédio 13 da PUC Minas, Avenida Dom
José Gaspar, 500, câmpus Coração Eucarístico. Entrada franca.
EM BUSCA DE IARADocumentário de Flávio Frederico sobre a guerrilheira Iara Iavelberg.
12 anos. Hoje, às 19h. Cine 104 (Praça da Estação, 104, Centro).
LIVROS A ditadura envergonhada, A ditadura escancarada, A ditadura derrotada e A ditadura encurralada De Elio Gaspari
Editora Intrínseca, R$ 39,90
(cada volume)
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Lançados entre 2002 e 2004, os quatro volumes foram reeditados este
ano. O trabalho de duas décadas do jornalista Elio Gaspari se baseou em
acervo pessoal valioso, além de 25 caixas de documentos de Golbery do
Couto e Silva, criador do Serviço Nacional de Informações (SNI).
Brasil nunca mais – um relato para a históriaDe Paulo Evaristo Arns e equipe
Vozes, R$ 65,70 e R$ 24,90
(edição de bolso)
•
Lançado em 1985, traz o dossiê mais completo da tortura e dos
torturadores que escreveram a página mais sombria dos 25 anos da
ditadura civil-militar.
Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundoDe Mário Magalhães
Cia. das Letras, R$ 60
•
O jornalista escreveu a biografia completa do inimigo nº 1 dos
militares: o comunista Carlos Marighella, líder da Ação Libertadora
Nacional (ALN) e guerrilheiro de fama mundial.
Combate nas trevasDe Jacob Gorender
Ática, esgotado (disponível em sebos, custa cerca de R$ 100)
•
Escrito pelo historiador comunista, o livro publicado em 1987 foi o
primeiro a mapear as organizações de esquerda e o lado sombrio da
repressão. Uma referência para quem pretende compreender o período, de
autoria do intelectual que atuou no combate à ditadura.
O que é isso, companheiro?De Fernando Gabeira
Cia. das Letras, R$ 23 (edição de bolso)
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Gabeira foi o primeiro a escrever sobre detalhes da guerrilha urbana,
ao narrar sua participação no sequestro do embaixador norte-americano
Charles Burke Elbrick, em 1969. O sucesso do livro, lançado em 1979, foi
fundamental para a carreira política do ex-guerrilheiro, que se tornou
deputado federal e disputou o governo fluminense e a Prefeitura do Rio
de Janeiro.
1968: o ano que não terminouDe Zuenir Ventura
Objetiva, R$ 49,90
•
O jornalista consegue capturar o espírito da época e conduz o leitor
para o contexto do ano fundamental para a história do Brasil e do mundo.
Em dezembro de 1968, foi decretado o AI-5, que iniciou os anos de
chumbo.
Gracias a la vida – memórias de um militante De Cid Benjamin
José Olympio, R$ 35
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Pode ser lido como uma antítese à obra de Gabeira – ambos eram
militantes do MR-8. Cid foi um dos mentores do sequestro do embaixador
norte-americano, mas, diferentemente de Gabeira, sempre se posicionou à
esquerda até romper com o PT e se
filiar ao PSOL.
Memórias de uma guerra sujaDe Rogério Medeiros e Marcelo Netto
Topbooks, R$ 43,90
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O depoimento de Cláudio Guerra, ex-delegado do Departamento de Ordem
Político-Social (Dops) no Espírito Santo, traz detalhes das barbaridades
cometidas pelas forças de repressão.
Brasil: História indiscreta da ditadura e da aberturaDe Ronaldo Costa Couto
Record, R$ 50
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Secretário no governo Tancredo Neves e historiador, o mineiro analisa
as causas que levaram o Brasil à ditadura militar. Escrito a partir de
tese de doutorado defendida na Sorbonne, o livro dá a palavra a
militares e civis, à esquerda
e à direita.
Almanaque 1964De Ana Maria Bahiana
Cia.das Letras, R$ 54,50
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Leitura leve, em estilo almanaque pop. Em vez de armas e conspirações, a
jornalista fala de Nara Leão, Bob Dylan, Glauber Rocha e Rolling
Stones, entre outros artistas que deram o tom à vida cultural dos anos
1960
FILMES E MINISSÉRIEO que é isso, companheiro? (1997) – De Bruno Barreto•
O maior sucesso entre os longas que tratam do período. Baseado no livro
de Fernando Gabeira, concorreu ao Oscar de filme estrangeiro e é focado
no episódio do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick.
Batismo de sangue (2007) – De Helvécio Ratton•
Baseado no livro homônimo de Frei Betto, lançado em 1983. Aborda a ação
dos dominicanos em apoio à Ação Libertadora Nacional (ALN) e a
crueldade da tortura. Um dos frades, Tito, suicidou-se em decorrência
dos maus tratos infligidos pelo delegado Sérgio Fleury.
Cabra marcado para morrer (1984) – De Eduardo Coutinho•
O documentário sobre a vida da família do camponês João Pedro Teixeira,
assassinado por capangas de latifundiários em 1962, foi interrompido
com o golpe em 1964. Retomado em 1981, depois de Coutinho ter escondido
os negativos da repressão, o longa é um símbolo dos anos de chumbo e da
volta da democracia.
Zuzu Angel (2006) – De Sérgio Resende•
Traz a história da estilista mineira que enfrentou os militares para
exigir o corpo do filho, o militante Stuart Angel. Zuzu denunciou a
ditadura nos EUA e morreu em acidente de carro atribuído a agentes da
repressão.
Pra frente, Brasil (1982) – De Roberto Farias•
Um dos primeiros longas sobre o tema, foi rodado ainda na ditadura,
graças ao processo de abertura política. A trama de ficção retrata a
repressão e o clima de euforia com a conquista da Copa do Mundo de 1970,
no México. O filme levou à demissão do então presidente da Embrafilme,
Celso Amorim, atual ministro da Defesa.
O ano em que meus pais saíram de férias (2006) – De Cao Hamburguer•
Outra ficção sobre os anos de chumbo, a tortura e a Copa de 1970.
Protegido pela comunidade judia, criança aguarda a volta dos pais,
presos pela repressão.
Anos rebeldes (1992) – Minissérie da TV Globo•
Uma das obras de maior sucesso sobre os anos 1960/1970, a minissérie em
20 capítulos tinha como pano de fundo um caso de amor e abordava a
opção de jovens pela luta política e a clandestinidade. Influenciou
fortemente o movimento dos caras pintadas, que foi às ruas pedir o
impeachment do presidente Fernando Collor.
Jango (1984) – De Silvio Tendler • Documentário essencial para entender a trajetória do presidente gaúcho deposto pelos militares. Com trilha sonora
de Milton Nascimento e Wagner Tiso,
o filme levou meio milhão de espectadores ao cinema.
Que bom te ver viva (1989) – De Lucia Murat
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Militante de esquerda, a diretora foi torturada e sua obra é marcada
por essa experiência. O documentário traz depoimentos de oito mulheres
que optaram pela luta armada. A atriz Irene Ravache é uma espécie de
alter ego de Lucia Murat.
Em busca de Iara (2013) – De Flávio Frederico
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Mariana Pamplona, sobrinha da militante Iara Iavelberg, é autora do
roteiro e fez as entrevistas sobre a trajetória da guerrilheira e
companheira de Carlos Lamarca, ícone da esquerda. O filme mostra que
Iara foi assassinada – ela não se suicidou, como concluíram inquéritos
oficiais.