sábado, 19 de janeiro de 2013

Mais Matemática, Português e Ciências - CLAUDIA COSTIN

O GLOBO - 19/01/2013


Os desafios que o Brasil enfrentará para crescer com equidade ficam claros ao se observar os últimos resultados do Ideb, índice nacional que avalia a Educação. Indicam, ainda, que os municípios precisam de ações firmes para percorrer este caminho. Foi o que procuramos fazer no Rio de Janeiro. Em 2009, iniciamos o desafio de dar um salto de qualidade. Já avançamos bastante.

No Ideb 2011, passamos ao 4º lugar entre as capitais, nos Anos Iniciais (1º ao 5º anos). Nos Anos Finais (6º ao 9º anos), as escolas da Prefeitura melhoraram em 22%, refletindo uma nota mais elevada na Prova Brasil e uma redução na evasão escolar e na repetência. Vale a pena lembrar que a melhora no Brasil, nos Anos Finais, foi de 2,5%. A importância dos resultados fica evidente ao observarmos o cenário em 2009: no 5º Ano, apenas 29% das crianças tinham os conhecimentos apropriados para a série, caindo de um patamar de 33% em 2005, além de 28.000 alunos analfabetos funcionais do 4º ao 6º Anos.

Era claro que havia muito a fazer. Como as taxas de analfabetismo funcional diziam que algo estava errado, decidimos enfatizar a alfabetização. Investimos forte na formação do professor alfabetizador, produzimos nosso próprio livro de alfabetização e criamos um pacto para alfabetizar todas as crianças no 1º Ano. Não podemos aceitar que a escola privada alfabetize no 1º Ano e a pública, frente à baixa escolaridade dos pais, deixe para fazê-lo mais tarde.

Criamos o programa Escolas do Amanhã, para unidades em áreas conflagradas, com um ensino inovador de Ciências, centrado em experimentação, um método dinâmico para desfazer déficits de aprendizagem criados pela exposição à violência, além de atividades pós-escola de artes, esportes e reforço escolar. Aqui, também avançamos: um aumento de 33% no Ideb dos Anos Finais, fase em que o tráfico recruta os jovens, e uma queda da evasão de 5,1% (2008) para 3,18% (2011).

Também focamos no reforço. Para os adolescentes, um novo modelo de ensino foi criado, o Ginásio Carioca, com protagonismo juvenil, interdisciplinariedade e Educação baseada em projetos. Produzimos também cartilhas para que os pais acompanhem o dever de casa e as tarefas de férias.

Agora, novos desafios se impõem. Temos que garantir às nossas crianças pelo menos 7 horas de aula por dia, como fazem os países nas primeiras posições no ranking internacional de Educação. Criamos, então, o programa Turno Único, que colocará todas as escolas da rede municipal com 7 ou 8 horas de aula até 2030, com mais tempo de aula de Matemática, Português e Ciências e atividades de artes e esportes. Já ao fim de 2016, teremos 35% dos alunos nestas unidades. O Rio merece!

Automedicação não é hábito condenável - NELSON MUSSOLINI


O Globo 19/01/2013

Muito se fala da automedicação como principal fonte de intoxicação, mas os levantamentos disponíveis indicam que, embora seja um hábito arraigado e que deva ser evitado, o consumo de medicamentos sem orientação médica não é um problema grave de saúde pública no país. O brasileiro tampouco consome medicamentos em excesso.

No Brasil, a principal causa de intoxicação por medicamento não está relacionada a nenhum princípio ativo ou grupo de risco. Diz respeito ao consumo abusivo motivado por tentativas de suicídio. Essa razão responde por mais de 40% dos casos registrados no país em 2010 (estatística mais recente).
Dos 86.700 casos de intoxicação humana por agentes tóxicos diversos (agrotóxicos, domissanitários, animais peçonhentos etc.), anotados naquele ano, apenas 655 resultaram de automedicação. Ou seja, 0,75% do total. E nessa circunstância nenhuma morte foi registrada. Esses dados são do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e desmentem a falsa informação que circula há anos na internet — muito citada — segundo a qual a automedicação no país provocaria “20 mil mortes por ano”.

Inexistem estudos que relacionem a sobra de medicamentos nas residências a casos de intoxicação. A sobra decorre com frequência da interrupção intempestiva do tratamento prescrito ou da compra de medicamentos sem a devida orientação médica. Outro equívoco frequente é achar que a automedicação é um hábito condenável. Na verdade, é um procedimento recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), desde que feito com responsabilidade e segundo as indicações do produtor.
Os medicamentos isentos de prescrição são adequados ao tratamento de sintomas e males menores como dores e resfriados porque seus princípios ativos estão bem abaixo das doses tóxicas. Além disso, desoneram os sistemas de saúde públicos e privados, liberando recursos para casos que demandam mais atenção.

A redução dos acidentes com medicamentos requer a educação de pacientes, o aperfeiçoamento das práticas clínicas e uma fiscalização mais atenta por parte das autoridades sanitárias. Tarefa que cabe a médicos, farmacêuticos, empresas e órgãos reguladores. De sua parte, a indústria farmacêutica reafirma seu compromisso permanente em aperfeiçoar práticas que protejam a população e ampliem a segurança no uso de medicamentos.



Nelson Mussolini é presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo

Terra de ninguém - LUIZ FERNANDO JANOT

O Globo 19/01/2013

O processo descontrolado de expansão das cidades brasileiras pode ser visto como um dos principais responsáveis pela acelerada degradação dos nossos ambientes urbanos e naturais. Diante desse quadro, não há como permanecer assistindo passivamente uma vertente do mercado imobiliário — formal e informal — se instalar nas frágeis encostas de morros e margens de rios desprovidas de infraestrutura. Essa forma predatória de ocupação do solo exige dos governantes, dos políticos e das pessoas interessadas na construção de cidades mais humanas e sustentáveis uma reflexão desprovida de posicionamentos ideológicos desgastados. Há que se buscar a superação do abismo que existe entre promessa e ação através de uma perspectiva abrangente e capaz de reverter, na origem, esse quadro desolador. Caso o Rio consiga cumprir essa tarefa, em curto prazo, poderá se tornar um exemplo a ser seguido por outras cidades.

Infelizmente, a falta de uma conduta social em defesa dos interesses da cidade vem perpetuando um círculo vicioso que estimula e alimenta a degradação urbana. É assustador observar, inclusive pelo Brasil afora, o hábito de a população fazer vista grossa diante de atitudes que comprometem o espaço urbano e a qualidade de vida. Até parece que ainda vivemos os hábitos e a cultura dos tempos coloniais. Naquele tempo remoto o desprezo pela coisa pública se justificava na medida em que a população era excluída das decisões sobre a cidade. O povo pensava que a cidade não lhe pertencia.

Esse antagonismo entre o colonizador e o colonizado se instalou no inconsciente coletivo e permanece até os dias de hoje. Só que, atualmente, tal comportamento se transferiu para as relações entre o governo e a sociedade. A vacilante democracia no planejamento e gestão da cidade constitui um elemento a mais para estimular a prática de comportamentos predatórios. Qualquer indivíduo, com o mínimo bom senso, poderá perceber o quanto essa cultura discricionária compromete a vida urbana. A expressão “liberou geral” traduz, com bastante clareza, a maneira como as cidades brasileiras vêm sendo tratadas. Os comportamentos antissociais variam apenas na forma como são praticados e independem do status econômico e social de quem os pratica. Em ambos os casos, a cidade é usada como se fosse terra de ninguém.

Diante dessa constatação, não há como ficar de braços cruzados esperando que o poder público faça por nós aquilo que também nos compete fazer. Difundir um comportamento solidário em defesa da cidade e da cidadania é obrigação de qualquer pessoa civilizada. Felizmente, a imprensa vem dedicando um espaço relevante para a divulgação desses princípios e da necessidade de enfrentar com firmeza os descalabros que ocorrem no nosso dia a dia. Mas, se essas denúncias não alcançarem a repercussão desejada, não há dúvida de que, a exemplo de tentativas anteriores, não passará de mais uma página virada no noticiário cotidiano. Resta, portanto, a esperança de que a sociedade assuma, o quanto antes, um comportamento uníssono e solidário em prol da valorização da urbanidade e do combate à selvageria praticada pelos costumeiros predadores urbanos.

O PT e as autocríticas - ZUENIR VENTURA

O Globo 19/01/2013

Sergio Cabral teve que engolir calado o deboche de Garotinho: ‘O Eduardo Cunha já foi meu amigo. Hoje não fala comigo e é amigo do Cabral’

Uma aragem moralizadora está soprando do Sul, vinda de dentro do próprio PT. Primeiro foi o ex-prefeito de Porto Alegre, ex-ministro das Cidades e ex-presidente do partido, Olívio Dutra. Agora é a vez do governador e ex-ministro de Lula Tarso Genro. Descontentes, ambos criticam a postura da agremiação que ajudaram a fundar por ter abandonado sua original e lendária bandeira da ética. Além de ter sido contra José Genoino assumir o mandato depois de condenado pelo STF ("Tu deverias pensar na tua biografia”), Dutra repetiu a advertência que já tinha feito a Lula sobre o preço que iria pagar "por estar cercado de maus companheiros” referindo-se à entrega de cargos a torto e a direito sob o pretexto de garantir governabilidade. Genro, por sua vez, disse essa semana ao repórter Marcelo Remígio, do GLOBO, que "estamos utilizando os métodos de partidos que criticávamos’,’ e por isso defende a adoção de "regras muito rígidas em relação a seus dirigentes, seus quadros e seus vínculos com as empresas privadas” Em suma, "o partido precisa passar por uma profunda renovação’.

Ainda que menos incisiva do que a de Dutra, a crítica do governador gaúcho deixa claro que não concorda, por exemplo, com a tentativa de José Dirceu de "estabelecer uma identidade entre seus problemas e os do partido”. Segundo ele, a agenda do PT não pode ser a da "Ação Penal 470, mas sim a da reforma política e do sistema de alianças”. O que acontecerá com esses dois líderes históricos do petismo após suas autocríticas? Embora sejam atitudes saudáveis, sabe-se que o PT não convive bem com a divergência. Quando isso acontece, ou os dissidentes deixam o partido, como foi o caso de Chico Alencar, Cristovam Buarque, Marina Silva, Plínio de Arruda Sampaio, Cesar Benjamim, Fernando Gabeira, Milton Temer, ou são expulsos, como foram em 2003 a senadora Heloísa Helena e os deputados Luciana Genro (filha de Tarso), João Fontes e João Batista Araújo, o Babá. Por ironia da história, o mesmo PT que, presidido por Genoino na época, decidiu botar para fora seus colegas por conduta radical, não pretende fazer o mesmo com os quatro recém-condena-dos pelo STF no processo do mensalão, embora o estatuto preveja a expulsão por "práticas administrativas ilícitas" e "inobservância grave da ética" Será que "corrupção ativa" não configura ilícito?

Ainda sobre más companhias. Sergio Cabral teve que engolir calado o deboche de Garotinho: "O Eduardo Cunha já foi meu amigo. Hoje não fala comigo e é amigo do Cabral.”

Myrian Rios, de pudica a peladona



Internautas protestam contra lei com fotos da deputada nua



Pôster. Foto de Myrian na web
Foto: Reprodução

RUBEN BERTA
rberta@oglobo.com.br


 RIO — Um dia depois de ter sua lei que cria o “Programa de resgate de valores morais, sociais, éticos e espirituais” sancionada pelo governador Sérgio Cabral, a deputada Myrian Rios (PSD) viveu na sexta-feira momentos de celebridade nas redes sociais. Mas não foi propriamente graças a elogios ou congratulações. Muito pelo contrário. Uma enxurrada de fotos da atriz nua ou seminua, da época do início de sua carreira, caiu na rede. O nome de Myrian ficou entre os assuntos mais citados no Rio no Twitter durante boa parte do dia. A reportagem publicada no site do GLOBO foi recomendada por mais de 30 mil pessoas no Facebook .


Não faltaram gozações. “É aí que a gente vê por que a nossa educação é do jeito que é”, comentou um internauta sobre uma foto de Myrian vestida de colegial. “O mais divertido é que do jeito que foi redigida a lei Myrian Rios, ela serve para qualquer coisa!”, disse outro. “Queria perguntar para ela onde as fotos se encaixam nos bons costumes”, questionou outro no Twitter.

E houve até quem se aproveitou do momento para tentar faturar: num site de vendas, uma revista “Ele & Ela” — um detalhe: usada — com a atriz na capa saía ontem por nada menos que R$ 80 aos interessados. O vendedor se dizia da cidade de Recife, em Pernambuco.

A lei de Myrian que gerou todas essas reações tem a finalidade de “promover o resgate da cidadania, o fortalecimento das relações humanas e a valorização da família, da escola e da comunidade como um todo”.
O texto determina que o governo  deve fazer parcerias “articuladas e significativas” com prefeituras e sociedade civil. O secretário de Assistência Social e Direitos Humanos, Zaqueu Teixeira, encarregado da aplicação da lei foi pego de surpresa e admitiu que terá que discutir como regulamentá-la.

Apesar das milhares de críticas e gozações que recebeu na internet, a deputada, eleita em 2010 ainda pelo PDT, comemorou em sua página no Twitter, numa mensagem postada ontem à tarde: “A repercussão do meu projeto de lei só confirmou que o respeito e amor ao próximo são valores de ouro! Viva a vida!”

Santa Casa cancela cirurgias por falta de materiais e remédios

FOLHA DE SÃO PAULO

Procedimentos não urgentes chegaram a ser suspensos durante a semana; hospital alega falta de repasses
Silva Junior/Folhapress
Pacientes na área interna Santa Casa, no centro de São Paulo, que enfrenta falta de materiais hospitalares e remédios
Pacientes na área interna Santa Casa, no centro de São Paulo, que enfrenta falta de materiais hospitalares e remédios
FERNANDO TADEU MORAESCOLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O Hospital da Santa Casa de São Paulo enfrenta há uma semana problemas de falta de insumos hospitalares e remédios. A situação também atinge o centro cirúrgico.
Na quarta-feira, todas as cirurgias eletivas (não urgentes) chegaram a ser suspensas.
O hospital admite o problema (leia ao lado) e diz que o desabastecimento se deve a problemas de caixa que surgiram por atraso no repasse de verbas das Secretarias Municipal e Estadual de Saúde.
A Santa Casa é uma entidade filantrópica privada que recebe repasses do governo federal pelos atendimentos feitos pelo SUS.
Governo estadual e municipal também financiam. O pronto-socorro do hospital Central realiza em média cerca de 31 mil atendimentos por mês.
Folha apurou que faltam remédios para tratamento de hipertensão, de insuficiência cardíaca e antibióticos, além de materiais como agulhas, esparadrapos, pulseiras de identificação de pacientes e coletores de secreção, usados em pacientes entubados.
Segundo médicos da Santa Casa ouvidos sob condição de anonimato, desde segunda-feira há uma lousa dentro do local em que médicos e enfermeiros se dirigem para pegar materiais e remédios com uma lista dos itens em falta.
A indicação no local é atender os pacientes com materiais improvisados.
Segundo o superintendente da Santa Casa de São Paulo, Antonio Carlos Forte, a crise no centro cirúrgico ficou restrita à quarta-feira. Segundo ele, ontem nenhum cirurgia foi suspensa. A Folha apurou, no entanto, que apenas cirurgias pediátricas, plásticas e de cabeça e pescoço ocorreram ontem.

OUTRO LADO
Hospital diz que há 'furo de caixa' por falta de repasse
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O superintendente da Santa Casa, Antonio Carlos Forte, diz que houve um "furo de caixa" por atraso no repasse de verbas das secretarias municipal e estadual de Saúde.
"O doente está aqui internado, espera ser operado hoje e acaba não sendo, é claro que fica prejudicado." Ele, porém, afirma que nenhum paciente ficou "desassistido".
Procurada, a Secretaria de Saúde do Estado negou o atraso e informou que foram repassados "em dezembro, R$ 12,6 milhões em recursos extras" e que o mesmo valor será repassado até o fim do mês.
Já a secretaria municipal informou que pagou ontem R$ 5,8 milhões referentes a este mês. Sobre as despesas de dezembro, a pasta afirma que o débito de R$ 11,5 milhões também já foi quitado. (FTM)

RAIO-X DA SANTA CASA
Dados do hospital central:
Inauguração: 31 de agosto de 1884
Leitos: 708
Salas de cirurgia: 37
Leitos UTI adulto: 60
Leitos UTI neonatal: 12
Número de médicos: 861
Número de funcionários: 4.673 (sem contar os terceirizados)
31.125
atendimentos por mês
foram feitos nos prontos-socorros em 2011, em média
2.172
cirurgias por mês
foram feitas no hospital no mesmo ano, em média
Fonte: Santa Casa de São Paulo

    Quadrinhos


    CHICLETE COM BANANA      ANGELI

    ANGELI
    PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE

    LAERTE
    DAIQUIRI      CACO GALHARDO

    CACO GALHARDO
    NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES

    FERNANDO GONSALES
    PRETO NO BRANCO      ALLAN SIEBER

    ALLAN SIEBER
    QUASE NADA      FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ

    FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ
    HAGAR      DIK BROWNE

    DIK BROWNE

    Xico Sá

    FOLHA DE SÃO PAULO

    Que venham os embates regionais
    Quanto mais vejo o futebol globalizado mais me interessa a aldeia, porque a vida é como o Baiano
    Amigo torcedor, amigo secador, aqui no embalo do Nego Dito, vos digo: quanto mais conheço o homem mais eu gosto do meu cão. Quanto mais vejo o futebol globalizado mais me interessa a aldeia, o embate regional. Que venham os estaduais Paulista, o Carioca, o Mineiro, o Gaúcho... Porque a vida, amigo, tem idas e voltas, turnos e returnos, a gente apanha e se vinga, a vida é como o Campeonato Baiano.
    Sim, é no embalo de Itamar Assumpção, artista da Penha, zona leste paulistana, que me preparo, a caminho de Sousa, a terra dos dinossauros, para o embate entre o time homônimo paraibano e o Sport. Um dos jogos da primeira rodada da Copa do Nordeste, neste domingo. Não vejo a hora.
    Um torneio deveras emocionante, na região que mais gosta de futebol no país, tanto no sofá como na missa de corpo presente no estádio. Quero ver, por exemplo, quem ultrapassará, por meses e meses, o público da estreia do Santa Cruz no certame. Pega o CRB, o galo da Pajuçara, no Colosso do Arruda.
    O Nordestão tem o Bahia, o Náutico e o Vitória, trinca da elite da Série A do Brasileiro, como favoritos. Ninguém pode esquecer de Ceará, Fortaleza, ABC e o Santinha como candidatos da surpresa. Correm por fora o Asa de Arapiraca e o Salgueiro, o carcará do sertão de PE.
    A taça regional só tem um defeito: a ausência de times do Cariri, a Catalunha brasileira -até já ameaçou virar Estado e tudo. Graças ao seu alto poder histórico e revolucionário, herança que vem da Confederação do Equador e do sangue de Bárbara de Alencar (1760 - 1823), ativista que se tornou a primeira mulher presa política do Brasil.
    É, amigo, falta um Icasa, time da Série B do Brasileiro, falta um Crato, falta um Guarani de Juazeiro, o Leão do Mercado que já faz bonito de novo no já iniciado Cearense.
    E aqui vamos nós rumo a Sousa, Nego Dito nas alturas com a sua banda Isca de Polícia. Em Picuí (PB), uma parada obrigatória para comer a carne de sol dos deuses. Servido, amigo?
    ESTANTE DA BOLA
    Livros jornalísticos ou de histórias do futebol temos às pencas. Ficções sobre o principal esporte do país ainda são raras. A coleção acaba de ganhar, porém, um romance policial ludopédico: o divertidíssimo "Nove contra o 9" (editora Objetiva), de José Roberto Torero, ex-titular desta coluna, e Marcus Aurelius Pimenta. Recomendo as aventuras de Zé Cabala e Gulliver.
    A parada gira em torno da morte de Beleza, gênio e ídolo do time do Banânia Esporte Clube. Um zagueiro adversário, na linha beque de roça, viril e gay, é um dos suspeitos. O mais eu não conto para não estragar a história. Como sou chegado a um trocadilho infame, desses que dizemos nos piores botecos, ri o tempo todo com a leitura.
    Recomendo muitíssimo.

      CLÁUDIA LAITANO - Bons costumes

      Zero Hora:19/01/2013

      Algumas expressões têm a curiosa capacidade de evocar ideias exatamente opostas à do seu sentido original. “Decência”, por exemplo. Você ouve a palavra e imediatamente é atingido por uma incontrolável avalanche de pensamentos indecorosos. “Político honesto”: não importa o quanto você se esforce para lembrar de todos os homens públicos de bem que você conhece, ao ouvir essa expressão é em uma camarilha de pilantras da pior espécie que você vai pensar.

      Outra ilustre representante dessa linhagem de palavras vira-casacas é “bons costumes”. Nada evoca menos um rol de comportamentos razoáveis do que essa expressão que recende ao perfume adocicado das viúvas rancorosas dos romances de época: falou em “bons costumes”, e eu lembro na hora de segredos de alcova e sacanagens reprimidas.

      Imagino (espero) que a deputada estadual Myrian Rios não tenha pensado em nada disso ao redigir o projeto de lei, sancionado esta semana pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, que propõe a genérica “promoção da moral e dos bons costumes”. O problema com os “bons costumes” é precisamente este: a gente nunca sabe muito bem o que as pessoas têm em mente quando defendem a sua causa.

      O que quer que sejam, uma coisa é certa: bons costumes mudam conforme a época, o lugar e a ocasião. Você pode achar que não fica bem uma moça desfilar sem a parte de cima do biquíni em Tramandaí – e é provável que a maioria das pessoas que frequentam aquela praia concorde com isso. Mas se você estiver na Praia da Galheta, em Floripa, ou na Praia do Pinho, em Camboriú, prepare-se para aceitar uma ideia um pouco diferente de figurino adequado para o local.

      Jânio Quadros achou que poderia salvar o Brasil da decadência moral proibindo o biquíni em 1961. A ex-atriz, ex-mulher de Roberto Carlos e atual missionária talvez seja a favor da eliminação do sexo para fins recreativos (a deputada já anunciou que não transa há 10 anos) e da sunga branca na praia. Vai saber. Jânio e Myrian Rios têm em comum não apenas a sanha moralista, mas a excêntrica circunstância de terem sido eleitos – o que permitiu que seus delírios reformistas tomassem a dimensão de um assunto público.

      Fascinada pela nostalgia de um passado idealizado e irrecuperável, a patrulha da moral e dos bons costumes ignora a complexidade do mundo e alimenta a ingênua fantasia de que é capaz de corrigir a sua rota – de volta para um lugar onde provavelmente nunca esteve.

      Hábitos e práticas considerados adequados ou aceitáveis são, como todos os organismos vivos, produtos de adaptação, mutação e evolução. Algumas convicções a respeito da vida privada que passavam como verdade absoluta há pouco tempo hoje são questionadas, simplesmente porque mais e mais pessoas foram aprendendo a pensar de forma diferente.

      Certas ideias e crenças vão se tornando, assim, tão anacrônicas quanto os dinossauros e os pássaros dodô – e não será surpreendente se acabarem tendo o mesmo final que eles.

      Lojas físicas desenvolvem 'iscas' para seduzir clientes eletrônicos

      FOLHA DE SÃO PAULO

      Varejo usa a tecnologia para combater hábito de pesquisar preços melhores nos smartphones
      Grandes redes do Brasil já testam tecnologias que dispensam caixas e filas, mas nota fiscal obrigatória é entrave
      MARIANNA ARAGÃOENVIADA ESPECIAL A NOVA YORKO avanço do comércio eletrônico e dos dispositivos móveis está trazendo mudanças profundas no varejo mundial.
      Com a opção de comparar preços ao alcance de um clique ou toque no celular, os lojistas têm criado estratégias para atrair e manter os clientes em suas lojas.
      Segundo pesquisa feita pela IBM em 14 países e apresentada durante evento da associação americana de varejo (National Retail Federation) nesta semana, 48% dos usuários de smartphones afirmam pesquisar produtos e preços dentro das lojas.
      Um quarto dos entrevistados afirma que planeja comprar na loja física, mas desiste por motivos como mau atendimento ou falta de itens em estoque.
      O surgimento dos "show-roomers" -clientes que usam as lojas físicas para interagir e conhecer os produtos, mas concretizam a compra na internet- tem sido estimulado pela Amazon, maior varejista on-line do mundo.
      Em 2011, a empresa lançou um aplicativo grátis que permite aos compradores escanear o código de barra dos produtos nas lojas e imediatamente ver as ofertas para o mesmo item na Amazon.
      REAÇÃO
      Diante disso, grandes redes de varejo investem no uso de tecnologias que agilizem e tornem mais atraente o processo de compra "física".
      Em alguns casos, o contra-ataque é direto, com o lojista reduzindo o valor de seus produtos para bater o preço do concorrente on-line.
      Na última temporada de vendas de Natal nos EUA, as redes Target e Best Buy adotaram a prática, ao se propor a cobrir o preço oferecido na internet para os seus itens.
      DESCONTO
      Outra solução encontrada pelas redes na era do "e-commerce" é usar os dispositivos móveis para localizar e atrair consumidores que estejam nas redondezas para suas lojas, enviando ofertas personalizadas ou promoções.
      "Essas iniciativas atendem a uma demanda do próprio consumidor de hoje, que quer receber informação que realmente lhe interesse", diz Elia Chatah, da área de varejo da empresa de software SAP.
      Uma das tecnologias da empresa, que utiliza análise de dados do consumidor em tempo real para criar ofertas personalizadas, já está sendo testada por redes de varejo nacionais, em projeto-piloto. A rede Casino, na França, já usa o programa.
      O varejo tradicional também tenta se tornar mais atrativo por outras frentes, ao diminuir, por exemplo, o tempo de espera nas filas.
      As lojas da Apple foram as primeiras a adotar o "checkout [caixa]" móvel. Com iPods, os atendentes finalizam a compra ao lado do cliente, dispensando os caixas e as filas.
      Outras redes nos EUA, como a de cosméticos Sephora e a loja de departamentos Nordstrom, seguiram a tendência recentemente.
      No Brasil, segundo a Folha apurou, dois grandes varejistas estão com projetos-piloto para adotar a tecnologia.
      No entanto, ela deverá passar por algumas adaptações. Por causa da obrigatoriedade da impressão de nota fiscal, prevista em lei, o dispositivo móvel terá de se conectar remotamente a uma impressora dentro da loja.
      Para especialistas, é questão de tempo para que as iniciativas das redes norte-americanas cheguem ao Brasil.
      "Apesar de a representatividade do 'e-commerce' em relação ao varejo no país ainda ser menor que a média mundial, essa evolução inevitavelmente vai ocorrer por aqui", diz Rafael D'Andrea, consultor de varejo.
      A repórter MARIANNA ARAGÃO viajou a convite da SAP

        Acervo arqueológico está amontoado em universidade do AM

        FOLHA DE SÃO PAULO

        Urnas funerárias e cerâmicas de até 9.000 anos estão em caixas de plástico sem proteção contra incêndio
        Petrobras prometeu, em 2006, construir laboratório para abrigar o material; empresa diz que obra foi licitada
        Fotos Alberto César Araújo/Folhapress
        Pesquisadores trabalham em galpão na Universidade Federal do Amazonas que abriga de forma improvisada peças retiradas de sítios arqueológicos
        Pesquisadores trabalham em galpão na Universidade Federal do Amazonas que abriga de forma improvisada peças retiradas de sítios arqueológicos
        KÁTIA BRASILDE MANAUS
        À espera de um laboratório prometido pela Petrobras desde 2006, um acervo arqueológico está há um ano guardado em cerca de 700 caixas de plástico em salas e num galpão da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), em Manaus. Tudo amontoado, sem segurança contra roubos e incêndios.
        O acervo é resultado de 18 anos de escavações do Projeto Amazônia Central e contém restos ósseos, cerâmicas, urnas funerárias e lâminas lascadas, tudo localizado em sítios arqueológicos com datações de 4.000 a 9.000 anos.
        Com esse tesouro arqueológico, por exemplo, cientistas do projeto puderam comprovar a tese de que a bacia amazônica era densamente ocupada por sociedades complexas na Pré-História.
        A construção do Laboratório de Arqueologia da Ufam, orçada em R$ 4,8 milhões, foi prevista como compensação dos impactos ambientais e arqueológicos ocorridos na obra do gasoduto Urucu/Manaus, inaugurado pelo ex-presidente Lula, em 2009.
        Helena Lima, 33, doutora em arqueologia pela USP e atual coordenadora de pesquisas do Museu Amazônico da Ufam, diz que o acervo é o material mais significativo que existe hoje entre as descobertas na Amazônia.
        "Estamos em 2013 e nada foi feito. O acervo está num espaço provisório e o laboratório está na promessa. É um descaso da Petrobras. Nem esperança a gente tem mais", afirma Helena.
        A atual administração da empresa, comandada por Graça Foster, ainda não assinou nem deu prazo para firmar convênio com a universidade para iniciar as obras e contratar profissionais.
        INFILTRAÇÕES
        Além de Helena, a reportagem encontrou Filippo Stampamo, 32, e Marta Cavallimi, 33, ambos da USP, trabalhando num galpão da área sul do campus da Ufam.
        O espaço, que tem abastecimento precário de água e energia, virou um laboratório improvisado. Quando chove, há infiltrações.
        No galpão, estão acomodadas em caixas e estantes dezenas de urnas de até 2.000 anos, muitas encontradas em sítios localizados em Manaus. Parte também foi resgatada na própria obra do gasoduto da Petrobras.
        Ao lado do depósito improvisado, há um lixão a céu aberto com restos de móveis.
        Outra parte do acervo está em três salas do Instituto de Ciências Biológicas da Ufam, sem nenhum sistema de segurança nem climatização.
        Todas essas peças estavam anteriormente em São Paulo. Mas um outro acordo entre a Petrobras, a Ufam e a USP transferiu a guarda do acervo para Manaus em dezembro de 2011.
        O Projeto Amazônia Central foi criado em 1995 pelos cientistas Michael Heckenberger (Departamento de Antropologia da Universidade da Flórida), James Petersen (Departamento de Antropologia da Universidade de Vermont) e Eduardo Góes Neves (Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo).
        Peterson, que escavava em Iranduba (AM), foi assassinado numa tentativa de assalto na cidade, em 2005.


        OUTRO LADO
        Petrobras diz que obra começa após convênio
        DE MANAUSA Petrobras informou que a construção do Laboratório de Arqueologia da Ufam terá início após a assinatura de um convênio ou acordo, mas não divulgou a data de assinatura desse termo.
        A empresa disse à reportagem que já realizou o processo licitatório da obra, orçada em R$ 4,8 milhões.
        Segundo a Petrobras, após a assinatura, o Laboratório de Arqueologia será construído num prazo de 12 meses.
        A empresa afirmou que uma verba de R$ 1,1 milhão será repassada à Ufam para catalogação e guarda dos achados arqueológicos na obra do gasoduto. "O resultado esperado é o de um laboratório de excelente nível técnico, suprindo uma deficiência do Estado do Amazonas", disse a empresa.
        A reportagem procurou o vice-reitor da Ufam, professor Hedinaldo Narciso de Lima, mas ele não respondeu às perguntas enviadas por e-mail pela reportagem.
        Maria Helena Ortolan, diretora do Museu Amazônico, responsável pela guarda do acervo do Projeto Amazônia Central, disse que a Ufam cedeu o terreno para a construção do prédio, mas a Petrobras atrasou o convênio.
        "A Ufam honrou com sua parte, a Petrobras justificou que o orçamento estava acima do valor. É um problema de deliberação política, ficou tudo no papel", afirmou.
        A Superintendência do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico, Artístico e Nacional) no Amazonas disse que os acervos da Ufam estão sendo fiscalizados.
        "Os acervos encontram-se acondicionados dentro das condições mínimas exigidas para sua segurança e preservação. Caso seja constatada irregularidade, o local de armazenamento é advertido por não ter as condições exigidas", afirmou o instituto.

          FRASE
          "A Ufam honrou com sua parte, a Petrobras justificou que o orçamento estava acima do valor. É um problema de deliberação política, ficou tudo no papel"
          MARIA HELENA ORTOLAN
          diretora do Museu Amazônico, responsável pela guarda do acervo Projeto Amazônia Central

          O suco de frutas e a obesidade

          FOLHA DE SÃO PAULO

          PLANTÃO MÉDICO
          JULIO ABRAMCZYC julio@uol.com.br

          Até recentemente, a causa da compulsão por alimentos altamente calóricos era relacionada a problemas emocionais ou hormonais.
          Agora, foi identificado mais um fator, presente até em algumas dietas de emagrecimento. É a frutose, o doce suco de muitas frutas.
          No primeiro número do "Journal of the American Medical Association" deste ano, um trabalho da médica Kathleen Page e colaboradores mostra as diferentes respostas cerebral, metabólica e de saciedade quando do consumo de frutose ou glicose. A área de pesquisas de Page é a regulação do apetite pelo sistema nervoso central.
          No estudo, foram comparados o fluxo do sangue em regiões do cérebro relacionadas ao apetite. Após ingestão de bebida com frutose ou glicose, foram realizados, na Universidade Yale, exames de ressonância magnética cerebral em 20 voluntários.
          Aqueles que tomaram o refresco com glicose mostraram redução no fluxo cerebral, em comparação com os que tomaram a bebida com frutose. Os que receberam glicose apresentaram sensação de saciedade, o que não aconteceu com o grupo da frutose.
          A conclusão é que a ação da frutose na área cerebral envolvida com a regulação do apetite estimula e cria a necessidade de comer um doce, chocolate ou outro alimento. O que não deve significar, entretanto, o abandono dos sucos de frutas e de suas vitaminas ou o abuso do açúcar. E sim, apenas, com bom senso, evitar o excesso.

            Walter Ceneviva

            FOLHA DE SÃO PAULO

            Defeitos da lei mutante
            Mesmo o leitor sem contato com a interpretação da lei saberá que nosso país precisa consolidar seu sistema legal
            O ministro Sérgio Luiz Kukina, recentemente nomeado pela presidente Dilma Rousseff para o STJ (Superior Tribunal de Justiça) tem sua posse marcada para 6 de fevereiro. Em entrevista, o ministro chamou atenção para deficiências de leis fundamentais no campo dos Direitos Penal, Processual Penal, Civil e Comercial. Sua avaliação chegou em momento oportuno, pois o assunto já se tornou inadiável.
            Mesmo o leitor sem contato permanente com a interpretação da lei e sua aplicação saberá que nosso país precisa consolidar seu complicado sistema legal. Há instabilidade no ordenamento, com as numerosas mudanças nele introduzidas. As dificuldades em sua aplicação firme são grandes. Maiores ainda no que se refere à Constituição, a lei das leis. Quando modificada - em grande ou pequena extensão - influencia todo o sistema jurídico vigente. Exige do intérprete o cotejo com as repercussões da alteração da Carta Magna. Por isso mesmo, na composição jurídica da lei escrita, a regra constitucional deveria ter estabilidade, mas não tem.
            É relativamente comum o processo chegar à etapa final de seu julgamento - tanto na área cível quanto na penal - depois de muitos anos decorridos desde seu começo até o encerramento. O tempo passado inclui até decênios, em particular quando o autor da ação é credor do poder público. A demora, nesse espaço restrito, não se deve apenas a muitas regalias que o processo brasileiro concede ao poder público, em face do contribuinte e da cidadania comuns. Quando a administração nacional, estadual ou municipal é devedora, o andamento do processo é um. Quando credora é outro. Mais rápido.
            Esse aspecto injusto do tratamento processual se apresenta em normas processuais. O Código de Processo Civil brasileiro, cujo texto foi publicado em 11 de janeiro de 1973, vigorou a partir do ano seguinte, mas sofreu, em outubro do mesmo ano, dezenas de alterações. Durante 1974 várias outras leis foram adaptadas à codificação processual. Daí até o presente há umas 60 leis novas. A contagem é mesmo confusa, ante muitas mudanças feitas mais de uma vez, na mesma lei, ora de artigos isolados, ora de dezenas de novas normas vigentes, ora em parte do enunciado básico ou de seus parágrafos, daqueles que quebram até a coerência interna.
            Essa confusa espécie legal também é encontrável nos alteradíssimos Códigos Penal e Processual Penal, editados em 1940 e vigorantes a partir de 1942. O primeiro caminha para 250 alterações, desde a origem. O segundo, em um só exemplo básico, sofreu mais de 40 mudanças entre 2000 e 2009. Pense o leitor que certos feitos judiciários demoram muitos anos para serem julgados. As discussões sobre a lei, com alterações do texto legal, aplicáveis ao caso concreto, vão ao infinito. Pode convir ao réu, sobretudo quanto responde solto ao processo criminal. Convém ao poder público, nas duas alternativas, ante a interferência do Executivo na elaboração legislativa.
            Não tomarei mais tempo do leitor com novos exemplos. O panorama é confuso, presente tanto na lei do direito material quanto no direito processual. A confusão das normas e a instabilidade dos julgamentos só aumentam a desconfiança do povo. Que venha a revisão integral.


              LIVROS JURÍDICOS
              PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO
              AUTOR Eduardo Domingos Bottallo
              EDITORA Dialética (0/xx/11/5084-4544)
              QUANTO R$ 44 (191 págs.)
              Bottallo enfrenta o problema da determinação do crédito tributário federal, avaliando a segmentação modificada pelo decreto nº 7.574/11, sob a luz da Constituição. Invoca suas regras essenciais, de dispositivos atinentes ao processo tributário. Ao fim, revê nota à responsabilidade do sócio.
              TEORIA GERAL DO PROCESSO
              AUTOR Paulo R. de Gouvêa Medina
              EDITORA Del Rey (0/xx/31/3284-5845)
              QUANTO R$ 74 (338 págs.)
              Professor da matéria e advogado, Medina é bem-sucedido ao ensinar a teoria geral e ao escrever a respeito. Embora destinado precipuamente para estudantes, o texto também pode ter utilidade para o profissional. São dez capítulos básicos e três com os novos passos da lei no processo penal e na celeridade processual.
              PARTICIPAÇÃO CIDADÃ NA GESTÃO PÚBLICA
              COORDENAÇÃO Carmela Grüne
              EDITORA Saraiva (0/xx/11/3613-3344)
              QUANTO R$ 38 (152 págs)
              Grüne percorre caminho belo e original: cuida, no mestrado da Unisc, da cidadã na gestão pública e ancora na experiência da Escola de Samba da Mangueira. Compõe a partir daí estudo de originalidade para mais além do tema. Com tal visão busca o que chama de efeitos da "valorização da identidade democrática brasileira".
              LAVAGEM DE DINHEIRO
              AUTOR Gustavo Henrique Badaró e Pierpaolo Cruz Bottini
              EDITORA Revista dos Tribunais ( 0800-7022433)
              QUANTO Preço não informado (383 págs.)
              Tema projetado sobre o dinheiro na vida do brasileiro é desenvolvido pelos autores, a contar de alterações advindas com a lei nº 12.683/12 em nosso direito e no processo penal. Maria Thereza Rocha de Assis Moura acentua, no prefácio, a importância e o aspecto político da questão.
              DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL
              AUTORIA Obra coletiva
              EDITORA LTr (0/xx/11/2167-1100)
              QUANTO R$ 60 (231 págs.)
              Com a coordenação de Marco Antônio Chazakine Perfeira, o primeiro volume desta obra tem oito estudos a respeito do assunto essencial nos direitos brasileiro e comparado.
              MANUAL DOS DIREITOS DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
              AUTORIA Obra coletiva
              EDITORA Saraiva
              QUANTO R$ 110 (480 págs.)
              Carolina V. Ferraz, George, Glauber e Glauco S. Leite criaram obra destinada a expor os temas, conforme a lição do ministro Gilmar Mendes apresentada no prefácio.

                A voz do povo- Gustavo Fonseca‏

                Questões referentes à língua, como o Acordo Ortográfico e a correção das redações do Enem, devem ser debatidas de forma ampliada, evitando as abordagens meramente normativas e o viés autoritário 

                Gustavo Fonseca
                Estado de Minas: 19/01/2013 
                Com a proliferação na mídia brasileira do que o professor Ataliba de Castilho chama de consultórios gramaticais, as questões relacionadas à língua portuguesa por muitos anos praticamente se resumiram ao certo ou errado, num viés policialesco das múltiplas modalidades da linguagem, o que limitava a discussão sobre o tema. Recentemente, porém, três fatos evidenciaram o olhar míope desses “guardiões do bom português”, excessivamente presos à divulgação de regras gramaticais quase sempre controvertidas, em detrimento de uma reflexão mais ampla sobre a linguagem. O polêmico Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, inicialmente previsto para entrar definitivamente em vigor em 1º de janeiro deste ano e protelado para 2016, sem dúvida é o mais importante assunto linguístico do momento, mas outros dois também merecem atenção dos especialistas e do público em geral: a batalha dos estudantes pelo acesso à correção das redações do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a ingerência da presidente Dilma Rousseff no uso da língua, levando seus auxiliares do primeiro escalão a utilizar termos que em outras circunstâncias dificilmente empregariam, a começar pelo dissonante “presidenta”.
                Há poucos meses, logo depois dos Jogos Paraolímpicos de Londres, o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, afirmou que a presidente Dilma Rousseff queria vetar o uso da palavra “paralímpico”, voltando-se a utilizar o termo “paraolímpico”, a forma registrada nos principais dicionários brasileiros. Segundo o ministro, para a mandatária “paraolímpico” seria a palavra mais correta e não deveria ter sido substituída em novembro de 2011 por determinação do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) – grafia empregada no site oficial da entidade –, supostamente por exigência do Comitê Paraolímpico Internacional. Além disso, argumentou-se que o CPB visava a se aproximar do termo inglês paralympic e da forma empregada em outros países de língua portuguesa, inclusive a nação lusa e seu Comité Paralímpico de Portugal.

                Apesar de concordar com Dilma Rousseff neste caso e ver nessa troca uma inutilidade e mesmo uma submissão da CPB ao estrangeirismo, é ridículo uma presidente determinar a seu bel-prazer qual grafia a ser utilizada nos documentos oficiais – e mais ainda um ministro de Estado vir a público divulgar essa ordem da chefe. Da mesma maneira, é cômico ver uma senadora da base aliada do governo (a hoje ministra da Cultura, Marta Suplicy) interrompendo o presidente do Senado, José Sarney, que se referia à presidente, para corrigi-lo. E erradamente, deve-se dizer, já que os dicionários registram tanto “a presidente” quanto “a presidenta”.

                Menos engraçada, porém, é a discussão a respeito das privatizações dos aeroportos e estradas brasileiras, que Dilma e seu governo insistem em chamar de “concessões públicas” para tentar diferenciá-las das medidas adotadas pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Neste ponto, evidencia-se o viés político da linguagem, e o que inicialmente era tido apenas como uma preferência pessoal da “presidenta” Dilma passa a ter implicações sérias ao rumo do país. Afinal, ao eleitor, interessa diretamente saber o que diferencia uma privatização de uma concessão pública. Mais ainda, por exemplo, ao velho militante petista que tanto criticou as medidas econômicas de FHC.

                Já a importância de ter acesso às redações corrigidas do Enem e eventualmente contestá-las, inclusive judicialmente, é mais óbvia. Por décadas, os critérios e disparidades na avaliação escrita dos candidatos ao ensino superior foram mantidos longe do conhecimento da população e quem se aventurou a tentar analisar o trabalho dos corretores de redação se viu impedido por inúmeros obstáculos. Afinal, em nada interessaria às universidades abrir essa caixa de Pandora. Atualmente, contudo, a questão vem se modificando, apesar da relutância e dos recursos impetrados pelo Ministério da Educação (MEC), e os alunos, espera-se, terão acesso às provas corrigidas. A inevitável enxurrada de contestações, sem dúvidas, vai trazer à tona as falhas de nossas bancas examinadoras, sempre tão céleres a divulgar na internet as já famosas “pérolas do Enem”. Mas, como crítica sempre é melhor com autocrítica, esses profissionais sem ética vão se ver forçados a rir dos próprios erros e incoerências.

                Pela natureza da atividade, é inevitável que haja disparidades nas correções e isso em si não é um problema. O problema é tentar impedir a contestação das falhas e a exposição de gente inapta ao serviço, o que só deporia mais uma vez contra o MEC, responsável pelas trapalhadas recorrentes do Enem. Se o propósito do governo petista, porém, é democratizar o acesso ao ensino superior no país, dando mais oportunidades a camadas sociais que antes se viam impedidas de cursar uma faculdade, é mais do que necessário que o próprio processo seletivo seja transparente e esteja aberto à contribuição popular, inclusive com críticas e contestações.

                No caso do Novo Acordo Ortográfico, não seria viável democratizar as decisões a tomar, já que o assunto exige expertise nos estudos linguísticos e em língua portuguesa, mas também não parece ser uma boa decisão tê-lo deixado no Brasil a cargo de apenas uma pessoa: o professor e gramático Evanildo Bechara. Com dezenas de linguistas e filólogos de nível internacional espalhados pelas melhores faculdades de letras do país, foi temerário não consultá-los quanto às novas regras, bem como outros intelectuais e escritores consagrados, o que limitou os pretensos avanços que justificaram as novas regras. Não por acaso, as críticas às mudanças proliferam nas academias e nos meios de comunicação. Um debate saudável que deveria ter sido realizado antes da publicação do acordo. Agora, com seu adiamento para 2016, abre-se uma janela de oportunidade para remover esse obstáculo e trazer à discussão outros especialistas e autoridades, uma medida que não interessa aos que ungiram mestre Bechara juiz supremo da grafia em língua portuguesa. Mesmo porque, comprometeria o próprio acordo tal qual elaborado. 

                Meios e fins Como bem frisaram vários autores na imprensa nacional recentemente, muitas das finalidades do novo acordo são em si questionáveis, a começar pela melhora do intercâmbio cultural entre os países de língua portuguesa e a aproximação dessas nações. A simples modificação de regras de acentuação e emprego do hífen e trema, entre outros tópicos contemplados no acordo, em nada facilita esse estreitamento de laços, que requereria outras políticas mais eficazes, como melhor difusão pelos países de língua portuguesa do que se publica nas nações dessa comunidade e maior acesso de estudantes aos centros educacionais dos países irmãos. E aqui novamente as medidas a serem adotadas deveriam passar por ampla análise de especialistas e autoridades de todos os países de língua portuguesa, visando às melhores soluções.

                Quanto às novas regras ortográficas em si, elas mereceriam um artigo à parte para discutir muitos de seus pontos. Mas deve-se dizer que saltam aos olhos vários problemas, como o uso do hífen, ainda com um sem-número de exceções que acabam por jogar por terra a regra, além de disparidades entre os principais dicionários brasileiros. O Houaiss e o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), por exemplo, registram “francoatirador”, “proativo”/“pró-ativo”, enquanto o Aurélio grafa “franco-atirador” e registra apenas a forma “proativo”. Por outro lado, as três publicações mantiveram a grafia “cor-de-rosa” e “mais-que-perfeito” devido ao “uso consagrado”, critério que não foi considerado em milhares de outros termos, nos quais prevaleceu a regra de que não se emprega hífen em locuções (Escrevendo pela nova ortografia: como usar as regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa). Além disso, há vários exemplos de absurdos, como grafar “ponta-esquerda” e “ponta-direita” (com hífen) e “lateral esquerdo” e “lateral direito” (sem hífen), segundo o Aurélio e o Houaiss, como bem observado pelo colega da editoria de Esportes Benjamin Abaliac. Por que da diferença?

                Esses poucos casos, apenas relacionados ao hífen, talvez pareçam de menor relevância, mas não são por explicitarem que as novas regras deixam margem a muitas possibilidades e variações de grafia. Mais um exemplo de problema cuja solução não deve ser deixada às mãos de apenas uma pessoa, por mais competente que ela seja. Não por acaso, muitas mudanças desnecessárias acabaram sendo dicionarizadas, como a nova grafia de “bem-feito”, o horroroso “benfeito”. Fora situações com dois pesos e duas medidas, como eliminar o acento diferencial de “pára”, do verbo parar, mas aceitar as grafias “fôrma” e “forma” para designar o vasilhame.

                No fim das contas a pergunta que resta é: de que maneira alterações como essas facilitariam o intercâmbio cultural entre os países de língua portuguesa e aumentariam o peso de nossa língua em âmbito internacional? A conclusão a que se chega é clara: não parece haver argumentos convincentes para defender a reforma ortográfica como meio eficiente de obter esses resultados. Da mesma forma, não há como apontar diferenças substanciais entre a privatização empreendida pelo governo Fernando Henrique Cardoso e as concessões públicas do governo Dilma Rousseff. Muito menos explicar por que candidatos a uma vaga no ensino superior do país não podem ter acesso à correção de seus textos nem questioná-la, até judicialmente. 

                Como resultado do debate desses temas, sobretudo a respeito do novo acordo, espera-se que o brasileiro se envolva mais ativamente com os assuntos relacionados à língua portuguesa e que as colunas jornalísticas dedicadas a ela ampliem definitivamente seu enfoque, indo além da mera divulgação da gramática normativa. De preferência com maior participação dos linguistas e filólogos brasileiros, hoje praticamente confinados nas universidades país afora, sem contato com o público leigo. Afinal, na língua e na política, quanto mais amplo o debate, melhor. Sem margem a imposição alguma, seja de um gramático, seja da presidente.

                O mundo do trabalho - João Paulo‏

                Estado de Minas: 19/01/2013 

                As greves vão voltar. O que é muito bom para a economia, para a política e para a sociedade. Os momentos de confronto entre capital e trabalho foram, historicamente, determinantes da evolução das relações laborais. Sem greves, não teríamos jornada de trabalho regulamentar, férias, salário mínimo e outros direitos trabalhistas. Foi por meio do conflito que se plasmaram os avanços, até criar um solo inegociável de regras, que pode ser traduzido como dignidade.

                No entanto, de uns tempos para cá, a falsa noção de modernidade vem tentando solapar as bases sobre as quais se fundam as relações trabalhistas, em nome da competitividade que tem como objetivo apenas os resultados econômicos. Assim, vai ganhando corpo a ideia da desregulamentação extrema, que transforme o direito trabalhista em um conjunto de acordos, quase sempre feitos em torno de situações extremas, em que a parte mais fraca é sempre o trabalhador.

                O curioso é que, muitas vezes, partem de alguns sindicatos, ou de entidades que se dizem sindicatos, propostas de desmontagem da estrutura de proteção social criada ao longo dos séculos pela luta dos trabalhadores. A atual situação econômica do país não deixa dúvida: precisamos de mais direitos, não de menos garantias. A todo momento, continuam a ser denunciados de trabalho escravo a formas perversas de assédio moral que visam tornar o trabalhador o elo mais fraco dessa cadeia.

                A situação do mundo do trabalho vive um momento especial no Brasil. A recente incorporação de milhões de pessoas ao mercado formal, à primeira vista, parecia ter fortalecido a classe trabalhadora como um todo. Afinal, mais pessoas trabalhando na formalidade levariam à alteração do jogo de forças entre capital e trabalho. No entanto, a chamada nova classe C, de acordo com padrões aferidos pelo consumo, vinha do terreno da desmobilização absoluta, aquém do proletariado, numa situação que foi chamada por alguns sociólogos de precariado e, por outros, de ralé. 

                Em outras palavras, a nova classe trabalhadora não evoluiu de um campo de labor que carregasse a história de organização e representação política. Não conhecia sindicatos e, mesmo com expressa vontade de transformação, se coloca sempre dentro da ordem, de onde espera que as transformações venham de forma natural. A vida sindical ensina: não se abrem caminhos sem derrubar barreiras. Talvez a grande confusão venha da forma de usar os conceitos, principalmente a noção de classe.

                Há um certo prazer – e má-fé – em nomear os novos trabalhadores como classe média. A noção de classe se liga ao lugar na cadeia de produção e não à ponta do sistema, no momento do consumo. Ao definir a classe C pelo número de bens que as pessoas adquirem no mercado, o que se pretende é despolitizar a relação de trabalho em favor de uma inexistente paz social feita de consumidores felizes. Não há consumo feliz, ele é sempre feito de frustrações e alienação.

                Por isso, o que a evolução social dos novos trabalhadores parece indicar é a recuperação da capacidade de organização política, seja em torno de objetivos imediatos que compõem a pauta de alguns movimentos sociais, seja a partir de novos projetos relacionados ao conflito estrutural com o capital (diminuição de jornada e aumentos reais de salário), ou mesmo de fortalecimento dos partidos políticos de base operária de todos os extratos – não apenas os trabalhadores do setor de ponta da economia. 

                A situação brasileira tem algumas singularidades promissoras. Pode-se observar, a partir do mundo do trabalho, que a politização tende a substituir certo conservadorismo que por muito tempo alimentou a classe média tradicional. Posto no espectro político como abrigo prioritário da ordem, esse segmento da sociedade nunca gostou de mudanças, acha que ordem é progresso e que o moralismo é a mais avançada das atitudes políticas. Carrega a UDN na alma, o rancor no discurso e o preconceito no coração.

                A “nova classe média” pode até ter começado com a mesma inspiração antimudancista, feliz em participar da festa do consumo, mas começa a perceber que lhe cabe alterar as situações sociais que por tanto tempo a deixaram na expectativa de transformações ditadas de cima para baixo. Há, também, uma alteração da chamada opinião pública, que deixa de emanar dos meios de comunicação e ecoar na sociedade reacionária por meio dos partidos da ordem e dos sindicatos alinhados, para se tornar mais plural e complexa. A dissonância entre o noticiário e os resultados eleitorais, por exemplo, é sinal desse novo cenário, habitado por novos sujeitos.

                Fogo amigo O que se passa no Brasil é, de certa maneira, um símbolo do desconforto que varre o mundo. Depois do consenso neoliberal, que fez da globalização um projeto inevitável e vitorioso, o planeta começa a colher o lado B dessa história. Hoje, o desemprego e a desvalorização do trabalho tomam conta de nações orgulhosas de seu passado. O humanismo de ontem foi substituído pelo descarte humano de hoje. O que parece chocar os países centrais é que o veneno que exportaram por décadas para o Terceiro Mundo retorna hoje a eles mesmos como doença. Por séculos, quiseram convencer que o receituário da eficiência e da competição interessava à maioria das pessoas, ainda que os derrotados, pobres e marginalizados estivessem do outro lado do mundo. Hoje a carne dói dentro de casa.

                O sociólogo polonês Zygmunt Bauman, em seu mais recente livro, Danos colaterais, explica essa dinâmica da história de maneira cristalina. Para ele, a classe política sempre tratou a pobreza como um problema da lei e da ordem, não da estrutura da economia. Além de esconder as raízes sociais e acusar o pobre por seu fracasso, ela oferecia a contrapartida do consumo vazio, da individualização extrema, da censura dos laços sociais e da despolitização.

                Os desfavorecidos, explica o pensador, faziam parte de um risco calculado, da minoria que por incapacidade ficaria pelo caminho. Os valores humanos, como a segurança do Estado social (ele se recusa a falar em Estado de bem-estar social, o que seria tautologia), foram derrotados pelas palavras de ordem do crescimento econômico. O resultado, que hoje se vê na Europa, é o coquetel explosivo de desemprego, desigualdade social, discriminação racial e aumento de marginalizados. 

                Com isso, os danos colaterais vão se avolumando até tornar o homem vítima de sua incompetência e algoz de seu despreparo. Com isso, as soluções políticas, quando não caminham em direção ao preconceito e à xenofobia, costumam passar por cima de valores humanos para punir as pessoas por uma derrota que é estrutural. 

                Bom exemplo dessa operação é o que se vê no Brasil, quando se fala do problema do crack. Em vez de enxergar aí o signo de nossa injustiça social e de buscar alterar o quadro em dimensão política mais ampla, os viciados são considerados o problema e por isso não podem ser tratados como gente, legitimando ações que vão além de conquistas dos direitos humanos. Todos querem afastar o problema, e o problema não é a injustiça social, mas suas vítimas.

                Brasil e mundo emanam sinais diferentes, de otimismo e derrota. Mas parecem se igualar em alguns pontos fundamentais. Talvez o mais importante deles seja a necessidade de tomar novamente o destino nas mãos. O que isso tem a ver com as greves? Tudo.