O Globo 25/12/2013
Papai Noel tem sido rigoroso. Acha que Dirceu não se comportou bem durante o ano e está negando o presente. Tô dizendo que Papai Noel não está nada camarada este ano
Esta coluna e o Natal nunca se deram
muito bem. Nãoque esta não seja uma das
datas favoritas do colunista.O colunista adora
o Natal.Adora as comidas típicasda época.
Adora músicas de Natal. Adora receber
presentes. O problema é que a publicação
da coluna e o Natal propriamente dito estão
sempre em desacordo. Como este texto é
fechado com antecedência e o colunista é
meio distraído, o mais comum de acontecer é
que a coluna nem se dê conta de que, como
diria Simone, então é Natal. Aí chega o dia 25,
todos os colunistas em volta desejam Feliz
Natal aos leitores, e eu banco o bobo falando
de uma novela que não faz muito sentido,
adiantando um candidato com chances de
ganhar a Mala do Ano ou chamando a atenção
para a bobagem de um político qualquer
(como se políticos não estivessem sempre fazendo
bobagem). Não que o uso de um avião
da FAB pelo senador Renan Calheiros para ir
a Pernambuco se submeter a um implante de
cabelo não seja um assunto que mereça ser
comentado aqui. Mas é que é Natal, poxa,
uma vez no ano a gente pode tentar esquecer
o baixo nível dos políticos brasileiros. E, depois,
pensando bem, o Renan acha mesmo
que implante capilar vá resolver seus problemas
de visual? Coitado!
A coluna paga mico maior ainda quando,
em vez de esquecer, o colunista se lembra de
que é Natal. Só que — eu já falei do fechamento
com antecedência, não falei? —, quase
sempre, quando ele se lembra, a coluna
acaba sendo publicada... depois da data máxima
da cristandade (é assim que se chamava
o Natal no meu tempo). Aí já é dia 26 ou 27,
todo mundo está pensando no Ano Novo, e o
colunista defasado encerra a coluna desejando
um Feliz Natal para seus leitores. Ninguém pensa
que ele está se referindo ao Natal do ano que
vem, embora seja esta a desculpa que ele costuma
dar aos que reclamam do atraso nos votos
de Boas Festas.
Mas, neste 2013, a coluna vai ser publicada
(pelo menos eu espero que esteja sendo) exatamente
no dia 25 de dezembro. Não dá para ignorar.
É Natal. Hoje é Natal. Eu tenho que usar a
data como assunto desta crônica. Mas este Natal
não está ajudando. Ele está pouco inspirador,
não está? Por exemplo, antigamente, quando
o Natal chegava, já era verão. E então eu pergunto:
cadê o verão? Mais cedo ou mais tarde,
eu sei que ele vai chegar. Mas Natal sem verão
não é Natal. Papai Noel tem sido bem pouco camarada
neste quesito.
É difícil escrever sobre o Natal com tanta notícia
triste nos jornais. As chuvas no Espírito Santo
e o acidente com o ônibus que vinha de Curitiba
tiram o estímulo de qualquer coluna que
pretenda se contagiar com o espírito de Natal.
Chuvas em excesso e acidentes nas estradas são
notícias que sempre acompanham o cotidiano
brasileiro, mas no Natal elas se tornam mais
tristes ainda. Se Papai Noel fosse mesmo camarada
suspenderia esse tipo de notícia, pelo menos
no Natal.
Li outro dia no blog do Fernando Moreira, aqui
no GLOBO, que um aposentado irlandês, cansado
de passar o Natal sozinho, pôs um anúncio no
jornal procurando companhia para passar com
ele a noite do dia 24. O blog em questão procura
notícias inusitadas em todo o mundo. Mas será
que um velhinho que passa as noites de Natal sozinho
é mesmo uma notícia inusitada? Quantas
pessoas não associam Natal à solidão? Muitas,
certamente, o que não ajuda em nada a nossa
busca por inspiração para uma coluna natalina.
Porque coluna triste, nem pensar. De triste
já basta o Natal de 2013.
Lendo o noticiário dos últimos dias, fico
imaginando o que cada um dos personagens
brasileiros que nunca deixam de ser
notícia pediram em suas cartinhas para Papai
Noel. Zé Dirceu, por exemplo, deve ter
pedido um emprego, qualquer colocação
que o livre da Papuda, pelo menos durante
o dia. Se o salário for de R$ 20 mil ou de R$ 2
mil, pro Dirceu tanto faz. Papai Noel tem sido
rigoroso. Acha que Dirceu não se comportou
bem durante o ano e está negando o
presente. Tô dizendo que Papai Noel não
está nada camarada este ano. Ele não atendeu
também ao pedido que chegou na cartinha
de Renan Calheiros. Ou vocês acham
que o implante capilar em Recife foi a primeira
opção do senador? Antes, ele tentou
receber o cabelo como presente de Natal.
Mas, como já percebemos, Papai Noel não
está dando colher de chá este ano.
Não tá fácil pra ninguém. Nem pra Papai
Noel. Aquele que um dia já foi chamado de
Bom Velhinho deve estar por aí distribuindo
biografias não autorizadas para os integrantes
do grupo Procure Saber. Implicante, esse
Papai Noel. Nem um pedido singelo, como o
de um colunista em busca de inspiração natalina,
ele é capaz de atender.
Mesmo sem inspiração — Zé Dirceu e Renan
Calheiros não inspiram ninguém —, a
coluna de Natal está quase chegando ao fim.
E publicada na data certa. Só falta desejar
Boas Festas para os fiéis leitores que, entra
ano e sai ano, entra Natal sai Natal, continuam
prestigiando este colunista pouco inspirado.
Então não falta mais: Feliz Natal