Tereza Cruvinel - Erosão de capital
Com suas ações monocráticas na execução
das penas dos condenados do mensalão, o ministro Barbosa coloca em risco
a elevada credibilidade que amealhou no julgamento
Estado de Minas: 26/11/2013
Do primeiro ato, o
julgamento do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa saiu com a aura de
grande justiceiro, de implacável cavaleiro da lei que liderou o Supremo
na condenação de ex-dirigentes do partido no poder, banqueiros e
empresários. Mas, no segundo ato, a prisão dos primeiros condenados e a
execução das penas, com seus procedimentos monocráticos e, para boa
parte do meio jurídico, heterodoxos, Barbosa corre o risco de dilapidar
seu elevado capital em prestígio, que já lhe valeu a lembrança de seu
nome como candidato a presidente da República.
Na sequência de
decisões que tomou a partir do dia 14, quando decretou a prisão de 11
dos 25 condenados, Barbosa alijou o juiz da Vara de Execuções Penas,
Ademar Vasconcelos, substituindo-o pelo auxiliar Bruno André Silva
Ribeiro, que seria mais dócil e menos resistente ao cumprimento de suas
decisões. Pelo inusitado, a iniciativa ontem lhe rendeu críticas da
Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e do Conselho Federal da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que acionará o Conselho Nacional de
Justiça (CNJ). As duas instituições podem ter arestas com Barbosa, mas
são insuspeitas de viés partidário. A medida foi criticada por juízes
diversos, que vão do “progressista” Celso Bandeira de Mello ao
“conservador” Claudio Lembo, filiado ao DEM. Com a mesma disposição para
a polêmica que afirmou existir no Brasil uma “elite branca”, Lembo
afirmou, no programa É notícia, veiculado à meia-noite de domingo pela
Rede TV, que há “bases legais” para o impeachment de Barbosa. “O poder
judiciário não pode ser instrumento de vendeta”, disse ele. No plano da
realidade, obviamente, não existe ambiente para tal hipótese mas, ao
dispensar o concurso de seus pares na execução penal e assumir sozinho
atitudes tão polêmicas, confiando em seu elevado prestígio, Barbosa pode
estar seguindo uma estratégia de autoerosão.
A troca do “juiz
natural” pelo de sua preferência elevou o tom das críticas, mas elas
alcançam outros atos, como o fato de ter escolhido apenas 11, que
incluem os três ex-dirigentes do PT, para a prisão imediata, embora
existam condenados sem direito a recursos que seguem soltos; a escolha
do 15 de Novembro para executar as prisões, com a espetaculosa
transferência de avião para Brasília, quando a lei faculta o cumprimento
de penas nas proximidades do domicílio; o encaminhamento irregular dos
presos ao regime fechado, nos primeiros três dias, sem a devida cópia da
sentença e da guia de encaminhamento dos presos, motivo de sua primeira
divergência com o juiz Ademar; e a demora na concessão do regime
hospitalar/domiciliar provisório a José Genoino, pela qual
responsabilizou também Ademar, que não lhe teria dado informações
precisas.
A escolha do juiz substituto Bruno Ribeiro, ainda que
buscando apenas maior sintonia na execução, gerou críticas estridentes
nas redes sociais pelo fato de ele ser filho de um dirigente do PSDB-DF,
Raimundo Ribeiro. Sua mãe, Luci Rosane Ribeiro, também é ativista do
PSDB local . Em sua página no Facebook, exibe manifestos contra o PT e o
governador Agnelo Queiroz e convocações aos militantes tucanos para
acompanhar o julgamento. Um post exibe uma foto de Joaquim Barbosa e uma
frase que, naturalmente, ele nunca disse: “eu me matando para julgar o
mensalão e você vota no PT? Francamente!”. Um outro pergunta quando
seria o “mês da consciência branca”, em aparente crítica ao Dia Nacional
da Consciência Negra.
Enquanto isso, os demais ministros
continuam em obsequioso silêncio. Mas alguns estariam incomodados,
receando que a impulsividade de Barbosa seja danosa ao próprio e também a
todo o esforço realizado para levar a termo o julgamento da mais
complexa ação criminal que já aportou na mais alta Corte.
Trilha do dinheiro
São
abundantes na internet os comentários de cidadãos indignados dizendo
que, além das prisões dos réus do mensalão, querem a recuperação do
dinheiro desviado. O Banco do Brasil deu o primeiro passo na busca dos
R$ 73,4 milhões que, segundo o STF, foram desviados por Henrique
Pizzolato, da fatia do banco no Fundo Visanet para o valerioduto. Foram
utilizados, concluiu o ministro Barbosa, para comprar o voto de
parlamentares, usando como biombo empréstimos fictícios junto ao Banco
Rural. O trabalho que o Banco do Brasil fará agora , em busca dos
recursos, acabará por dirimir a dúvida suscitada categoricamente pelos
réus, especialmente pelos publicitários Ramon Hollerbach e Cristiano
Paz, condenados a penas altíssimas. Garantem eles que a campanha do
cartão Ourocard Visa, correspondente aos recursos, foi executada, com
peças veiculadas nas maiores emissoras de tevê do país, em outdoors,
mobiliário urbano e patrocínios. Apontam uma contradição no fato de
terem sido condenados por peculato, por ter a agência DNA, da qual eram
sócios, ficado com os bônus de volume da campanha, um desconto dado
pelas emissoras às agências. Se houve bônus, houve veiculação, dizem.
Notas e comprovantes estariam nos autos. A perícia técnica do BB, como
cliente, revisitará tudo isso para propor as ações de recuperação do
dinheiro, oriundo da Visa Internacional.
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