segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Roteiro para o voto - Renato Janine Ribeiro

Valor Econômico 29/09/2014
Um roteiro prático para escolher o candidato a presidente mais adequado a suas convicções

Pensei num pequeno roteiro para o voto no primeiro turno da eleição presidencial. O ideal seria desenhar um fluxograma mas, não tendo eu esta habilidade, vai em texto mesmo.

A primeira pergunta é: você vai votar para seu candidato vencer, ou para marcar posição? Se aposta na vitória dele, como a maior parte provavelmente faz, leia este parágrafo e o seguinte, mas só para sua reflexão. Agora, se para você o principal é afirmar uma ideia ou ideal, sem se preocupar com a vitória imediata mas querendo transmitir um recado forte aos políticos e à sociedade, este é o seu lugar. Sua posição é plenamente legítima, ainda mais num sistema de dois turnos, porque poderá, no segundo, votar "útil". E a pergunta será: você é um firme defensor das liberdades pessoais? Se sim, seu candidato é Eduardo Jorge. Ele está a favor de tudo o que é liberdade individual. É o mais moderno dos postulantes, deste ponto de vista. É uma Marina sem religião ou religiosos, mas com muita natureza. Dos candidatos, é o mais cool - e, brinde, o mais bem humorado. Um tuíte seu é antológico. Uma admiradora lhe escreveu: "Como você é lindo!"; ele respondeu: "Você está louca querida". Imbatível.

Mas há também outro nome, se sua questão for afirmar um ideal. Para você, o mais importante são os direitos sociais? Se sim, sua candidata é Luciana Genro. Apesar da retórica marxista, seu partido, o PSOL, não é tão radical. Em vários pontos, quer apenas aplicar a Constituição. Muitos direitos ainda não foram consagrados em lei. Assim como Eduardo Jorge, ela tem a sinceridade de quem não disputa a eleição para ganhar a curto prazo, fazendo concessões em prol da governabilidade, mas para firmar posições que, a médio ou longo termo, mudem o mundo.

E não esqueça o nome do deputado em quem votou

Sem esses dois, a campanha teria um teor elevado de tédio.
Agora, se você quer a vitória de seu candidato, a coisa muda de figura. Comecemos pela pergunta: os programas sociais são prioridade zero para você? a ponto de não se importar muito se a economia vai bem ou mal? Se sim, sua candidata é Dilma Rousseff. Vejam, não estou dizendo que ela - ou você - é economicamente irresponsável. É questão de prioridade. Se para você conta, acima de tudo, a inclusão social - e se não dá crédito ou relevância aos rumores de uma iminente catástrofe na economia, sua posição é essa.

Vamos à pergunta seguinte. Para você, uma economia saudável é a chave de tudo o mais? Você pode ser contra os programas sociais, ou a favor deles, mas acreditar que sem uma boa economia eles não terão dinheiro. Neste caso, você não vota no PT - mas já sabia disso. Não estou dizendo nada de novo... Sua próxima etapa é decidir entre Aécio Neves e Marina Silva.

Aqui temos um primeiro conjunto de questões. Você considera a privatização uma das principais iniciativas que foram tomadas na economia brasileira, e que talvez deva ser retomada? E dá importância crucial a uma gestão responsável, testada, da economia? Receia imaginação demais e eficiência de menos? Um "sim" a este conjunto de perguntas leva a um voto em Aécio. Por um lado, porque no atual discurso tucano a defesa da economia privada é central. Segundo, porque o PSDB tem o melhor nome que a oposição possa colocar na Fazenda, a saber, Arminio Fraga. E, sobretudo, porque o núcleo duro dos que votam em Aécio não quer correr riscos com a economia.

Quem votará, então, em Marina? Não é tão fácil formular a pergunta agora. Você não gosta da economia petista, mas aceita uma dose de risco maior do que os votantes de Aécio, na economia e no pacote completo? Pensa que a sociedade deva substituir um modelo predatório de desenvolvimento por um sustentável? Acredita que os recursos naturais devam ser explorados com parcimônia e critério? Crê que o que retiramos da natureza - por exemplo, ar e água - deve ser devolvido a ela com a mesma qualidade que tinha antes da utilização? Isso significa que a água que esfriou as turbinas da fábrica volte ao rio despoluída, que o carbono gerado por uma viagem de carro ou avião seja compensado pelo plantio de árvores. Se concordar com isso, você vota em Marina porque acredita num mundo melhor. Sua opção não é prudente e conservadora como a do parágrafo anterior, é conservacionista e em alguma medida utópica - embora um dos principais conselheiros da candidata diga ter horror desta palavra, "utopia".

Há outras possibilidades, neste G3 + 2? (G3 são os três principais candidatos, 2 são os do voto idealista, que mencionei no começo). Há. Certamente muitos votarão em Marina sem concordar com seus ideais, apenas por acreditar que ela tem mais chances de derrotar o PT. Será um voto útil. E haverá quem vote em Aécio, mesmo receando que num segundo turno ele seja derrotado por Dilma, por prudência, por convicção de que sua equipe é a melhor. Mas procurei percorrer as opções principais.

Em tempo: o segundo turno é outra coisa. Se o seu candidato ficar fora, você não precisa seguir o que ele recomendar. A decisão é sua. Mas não desvalorize o voto do primeiro turno. Ele não elege, mas é precioso, porque é sua voz.
Uma última sugestão: anote no computador os nomes em quem votar para deputado, federal e estadual. Se forem eleitos, passe os próximos anos acompanhando, por algum site (há vários), o que cada um faz e não faz. Mande e-mails a eles com frequência, apoiando ou reclamando. Dispender uns minutos por mês nisso não tem preço. Ajudará a mudar, para melhor, a representação nos legislativos - que hoje é bastante ruim. Isso depende de você e de seus amigos. E não importa em quem vote, faça isso.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo. 
E-mail: rjanine@usp.br


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