Cinza é e cor mais quente
A crítica pode chiar, os polemistas de
plantão podem reclamar, mas o açucarado romance sadomasô Cinquenta tons
de cinza não sai da ordem do dia. Menos de uma semana após sua estreia, o
filme já arrecadou US$ 240 milhões %u2013 US$ 81,7 milhões nos Estados
Unidos e US$ 158 milhões no resto do mundo. Isso é apenas a metade do
que preveem analistas de mercado, que acreditam que o filme possa
atingir US$ 500 milhões. A produção custou %u201Capenas%u201D US$ 40
milhões, vale lembrar. Acompanhe abaixo como as fantasias de uma dona de
casa de meia-idade britânica viraram a cabeça de meio mundo e se
tornaram um negócio milionário.
Mariana Peixoto
Estado de Minas: 17/02/2015Antes do livro
Snowqueens Icedragon era uma usuária superativa em sites de fan-fic, a chamada ficção criada por fãs. Em 2009, criou Master of the universe. Fã da tetralogia Crepúsculo, ela deu um tom mais adulto à saga amorosa, adicionando boa dose de sexo. Como era uma história baseada em outra, seus personagens também se chamavam Edward e Bella. Assim que os encontros sexuais se tornaram mais pesados, ela teve que mudar os nomes dos personagens: nasciam Christian Grey e Anastasia Steele. Quando os comentários sobre a “indecência” do texto cresceram, ela criou seu próprio endereço virtual: FiftyShades.com
A autora
“Sou velha o bastante para saber das coisas, mas topo experimentar tudo pelo menos uma vez, exceto incesto e dança folclórica.” Essa foi uma das postagens de Snowqueens Icedragon, na verdade E. L. James, pseudônimo de Erika Leonard James, ex-executiva britânica de TV, filha de chilena e escocês, casada, mãe de dois adolescentes, que cria o romance Cinquenta tons de cinza. Hoje com 52 anos, James, com um único livro, foi considerada, em 2012, uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.
O livro
Cinquenta tons de cinza nasceu na internet, porém não demorou a ser publicado. Com a repercussão on-line, uma editora australiana, The Writer's Coffee Shop, editou o romance tanto em e-book quanto em livro físico. Quando começou a vender que nem pão quente, a Vintage Books, subdivisão da gigante editoral Random House, adquiriu o livro, num contrato de sete dígitos. Até hoje, foram vendidos 100 milhões de exemplares, cinco milhões no Brasil.
O enredo
A história romântica-sadomasô de Christian e Anastasia é bem simples. Ele é um bilionário de Seattle de 27 anos, com passado obscuro, que só se satisfaz sexualmente quando atua como dominador. Escolhe suas submissas e elas têm que assinar um contrato para a relação. Ela é uma recém-formado em literatura inglesa de 21 anos, virgem. Os dois se apaixonam e iniciam uma relação conturbada. Ele quer dominá-la de qualquer maneira (controla até os amigos que tem), ela sonha em viver um romance convencional. Entre idas e vindas e muitas brigas, os dois protagonizam cenas tórridas de sexo. Além da cama, os dois utilizam todo tipo de apetrecho erótico no chamado “Quarto vermelho da dor”. Chicotes, amarras e plugs anais são apenas uma parte do universo de possibilidades do personagem.
A repercusão
Mania mundial, Cinquenta tons e suas continuações (Cinquenta tons mais escuros e Cinquenta tons de liberdade) acabaram nomeando o subgênero pornô para mamães. “Filho” da era do e-book, o livro de E. L. James fez com que várias outras donas de casa “saíssem do armário” e escrevessem seus próprios romances eróticos digitais. Já no mercado editorial, a série nascida a partir do boom que fez maior sucesso é Crossfire, de Sylvia Day. Escritora de livros eróticos muito antes da explosão mercadológica, ela cria personagens tal qual os de E. L. James. Só que não há o clima sadomasô. A repercussão é tanta que a trilogia inicial deu lugar a mais dois livros.
Produção do filme
Mal o livro iniciava sua dominação mundial, a Universal Pictures e a Focus Features compraram os direitos de adaptação cinematográfica. O acordo foi fechado em 2012 e E. L. James teria recebido 5 milhões de libras. Fechado o acordo, começou a correria para ver quem participaria do projeto. A diretora Sam Taylor-Johnson não foi a primeira opção. Entre os cotados estavam Joe Wright, Bill Condon e Steven Soderbergh. Quanto ao elenco, a história foi mais complicada. Fãs iniciaram campanhas on-line para escalar os protagonistas, principalmente Christian Grey. Entre os mais cotados estavam Robert Pattinson, Ian Somerhalder, Ryan Gosling e Matt Bomer. Pois em setembro de 2013 saíram os escolhidos: Charlie Hunnam e Dakota Johnson. A decepção foi geral. Pois Hunnam não durou muito tempo: um mês mais tarde, saiu do projeto, alegando que havia conflito de datas com as gravações da série Sons of anarchy. Jamie Dornan foi confirmado em outubro do mesmo ano.
Os atores
Dakota johnson
Nascida em Austin, Texas, a filha de Melanie Griffith e Don Johnson e neta, por parte de mãe, de Tippi Hedren, uma das musas de Alfred Hitchcock, tem 25 anos. Até ser escalada para o papel de Anastasia, Dakota era loira como a mãe e a avó. Não teve nenhum papel de destaque antes do filme, mas participou de projetos conhecidos. Estreou no cinema em Loucos do Alabama (1999), dirigida pelo próprio padrasto, Antonio Banderas, em papel em que era filha da própria mãe e irmã de sua meia-irmã, Stella Banderas. Na década seguinte, estudou atuação e teve seus momentos de modelo. Só voltaria ao cinema em 2010, com um pequeno papel em A rede social (2010). Ainda participou de Anjos da lei e Cinco anos de noivado (ambos de 2012). Com o blockbuster, a estrela de Dakota só fez crescer. Serão lançados este ano ou no próximo três filmes com ela, agora como protagonista.
Jame Dornan
Até chegar ao papel masculino mais falado dos últimos anos, Jamie Dornan fez de tudo um pouco. Nascido em Belfast, filho de um prestigioso médico irlandês, o ator de 32 anos já teve uma banda (Sons of Jim), foi modelo (já fez campanhas com Gisele Bündchen e Kate Moss) e foi conhecido durante um bom tempo como o namorado de Keira Knightley, com quem chegou até a dividir apartamento. No cinema, fez sua estreia numa participação ínfima no badalado Maria Antonieta (2006), de Sofia Coppola. Depois de alguns filmes e séries sem expressão, começou a aparecer como Caçador da série Once upon a time (2011). Mas o papel que foi definitivo para que ele se tornasse Christian Grey foi o psicopata Paul Spector na série The fall. Com as duas primeiras temporadas disponíveis no Netflix, é esperada uma terceira para este ano. Também em 2015, Dornan participa de outros dois filmes. E se diz um cara comportado (“o oposto de Christian Grey”), é casado com a cantora Amelia Warner e tem uma filhinha.
Cena de sexo
Para quem esperava uma explosão de sexo nas telas, a realização no cinema foi pífia. O primeiro dos três filmes de Cinquenta tons de cinza (o segundo começa a ser rodado em junho) é bem tímido nos números. São apenas quatro cenas de sexo. Não há nenhum nu frontal, apenas três parciais de Anastasia (fãs de Dornan não vão ver muito mais do que seu torso e o traseiro). A garota é amarrada por ele com cordas duas vezes, outras duas com uma gravata (cinza, claro). Ele dá cinco tapas, cinco chicotadas e meia dúzia de “cintadas” na personagem.
Muuuuito sexo
Vá à locadora mais próxima e deleite-se em casa com clássicos do gênero:
O último tango em Paris (Bernardo Bertolucci, 1972), mais conhecido como o filme em que Marlon Brando utiliza manteiga como lubrificante anal para Maria Schneider; Saló ou Os 120 dias de Sodoma (Pier Paolo Pasolini, 1975), inspirado na obra do Marquês de Sade, que utiliza toda sorte de perversão (incluindo coprofagia, necrofilia, mutilação) para falar sobre dominação social. Ou O império dos sentidos (Nasgisa Oshima, 1976), que mostra a relação obsessiva entre ex-prostituta e seu patrão no Japão pré-Segunda Guerra. A cena antológica é aquela em que um ovo cozido é colocado na protagonista, que depois o devolve ao amante.
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