quinta-feira, 2 de abril de 2015

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  A cantora Valéria Lobão comanda seleção de 23 pianistas em disco com releituras da obra do Poeta da Vila. Repertório valoriza hits e surpreende com canções pouco conhecidas


Kiko Ferreira
Estado de MInas: 02/04/2015



Valéria Lobão gravou Sinhá Ritinha e Minha viola, pérolas do cancioneiro interiorano de Noel (Edu Monteiro/Divulgação)
Valéria Lobão gravou Sinhá Ritinha e Minha viola, pérolas do cancioneiro interiorano de Noel

Formato difícil, mas com uma solução bem resolvida. Autor consagrado, mas com um repertório que equilibra temas clássicos e pouco conhecidos. Graças a isso, Noel Rosa em preto e branco, álbum duplo com 22 composições do Poeta da Vila interpretadas por voz e piano, é um conjunto coeso que reafirma a genialidade do autor, além de trazer mais de uma dúzia de canções pouco conhecidas, mas nunca menores.

O segundo disco da cantora carioca Valéria Lobão – que tem no currículo discos em homenagem a Gil (Expresso Gil, de 2000) e Milton Nascimento (Um gosto de sol, de 2004), com o grupo Vocal Equale – busca a essência da obra do Poeta da Vila em trabalho feito com paciência e dedicação. Gravado três anos depois do álbum de estreia, Chamada, com repertório contemporâneo, o CD traz uma solução doméstica, no melhor sentido da palavra. Casada com o músico e produtor Carlos Fuchs, dono do estúdio Tenda da Raposa, ela aproveitou o fluxo constante, no espaço do marido, de alguns dos melhores pianistas em atividade. Foi gravando aos poucos, respeitando o tempo de cada acompanhante. A escalação é respeitável: João Donato, Gilson Peranzzetta, Leandro Braga, André Mehmari, Cristóvão Bastos, Vitor Gonçalves, Itamar Assiere (com quem ela faz o show), Adriano Souza, Rafael Vernet, Duo GisBranco (formado por Bianca Gismonti e Claudia Castelo Branco), Tomás Improta, Claudio Andrade, Rafael Martini, Fernando Leitzke, Marcos Nimrichter, Robert Fuchs, Cliff Korman, Adriano Souza, Eduardo Farias, Marcelo Caldi, Gabriel Geszti e, claro, Carlos Fuchs.

Com equilibrada direção vocal de Felipe Abreu, o trabalho inclui participações de Joyce Moreno, Marcelo Pretto (do Barbatuques), João Cavalcanti (Casuarina), Moyseis Marques e Nina Wirty. São temperos adicionais para um conjunto inspirado de releituras. Para começar a entender os caminhos (bem) escolhidos, basta ouvir os temas mais conhecidos. Em Meu barracão, o piano de Marcelo Caldi assume ares de pianola de sessão de filme mudo com ecos de Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga. Positivismo traz o mineiro honorário Cliff Korman duelando com a voz, conduzindo a melodia com sotaque contemporâneo e meio jazzístico.

Já Pastorinhas (com o genial Andre Mehmari) e Filosofia (com Itamar Assiere) fogem da pegada passadista da maioria das versões famosas. Assiere acrescenta dramaticidade à melhor das releituras contemporâneas, feita por Chico Buarque. Último desejo, com Carlos Fuchs nos teclados, chega a lembrar o Ney Matogrosso de Pescador de pérolas, assim como Feitio de oração (com Itamar Assiere nas pretas e brancas). Pra que mentir ganha classe camerística pelas teclas de Vitor Gonçalves.

Entre toada, fox-canção, sambas de diversas matizes (claro) e outros formatos que Noel dominava com boêmia facilidade, Valéria segue segura, exibindo destreza e certeza de suas escolhas. E ainda recupera o raro Noel interiorano de Sinhá Ritinha (com André Mehmari) e Minha viola (com Leandro Braga). O resultado é a visão, ao mesmo tempo, clássica e contemporânea de um de nossos maiores compositores conduzida por uma voz bela, afinada e convicta de suas habilidades.

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