sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Agropecuária pode perder, por ano, R$ 7 bi com aquecimento - Andrea Vialli

Fonte: Valor Econômico 
Temperaturas médias em elevação, reduções da vazão de importantes rios, alterações nos padrões de chuvas e vazões dos principais rios, perdas bilionárias para a agricultura e aumento da vulnerabilidade das zonas costeiras fazem parte do cenário traçado pelo primeiro relatório de avaliação nacional do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), divulgado ontem em São Paulo. O levantamento reúne a produção científica de 345 pesquisadores que estudam os impactos das mudanças climáticas no Brasil e reforça as tendências já traçadas pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU, que reúne a nata da produção científica global sobre o tema.
Segundo o relatório de avaliação nacional, o Brasil poderá registrar um aumento médio das temperaturas no país entre 3°C e 6°C, que pode variar conforme o bioma e a região do país. O quarto relatório do IPCC, publicado em 2007, apontou para um cenário de aumento médio das temperaturas globais entre 1,8 ºC e 4ºC até 2100, podendo chegar a 6,4ºC no cenário mais pessimista.
No final de setembro, o IPCC lança a primeira parte do seu quinto relatório, com atualizações dos estudos de cientistas de todo o mundo sobre as mudanças climáticas. "Todos os modelos matemáticos aplicados no Brasil convergem para um aumento nas temperaturas médias. Em relação às chuvas, há cenários de queda entre 25% e 30% da precipitação na Amazônia, e aumento de 30% no Sul e Sudeste", afirma Tércio Ambrizzi, pesquisador da Universidade de São Paulo e coordenador do relatório que trouxe as bases científicas sobre as mudanças climáticas no país.
Um dos setores mais vulneráveis às mudanças do clima no Brasil é a agropecuária: se for mantido o atual patamar de emissões de gases que causam o efeito estufa, as perdas de produtividade na agricultura podem chegar a R$ 7 bilhões por ano a partir de 2020. "A produção de alimentos no Brasil tende a ser afetada diretamente pelas mudanças climáticas, especialmente culturas como café e feijão", diz Eduardo Assad, coordenador do grupo de pesquisas sobre mudanças climáticas da Embrapa.
A variação nas temperaturas e as mudanças nos regimes de chuva nas diferentes regiões do país deverão ser os principais fatores de impacto. Um agravante é que as emissões de gases de efeito estufa do setor agropecuário estão crescendo: as emissões absolutas do setor subiram 37% de 1990 a 2005, devido especialmente aos gases metano e óxido nitroso, ligados à pecuária e uso de fertilizantes.
A redução da vazão de alguns dos principais rios brasileiros também deve impactar a produção agrícola. O relatório aponta para um cenário de redução da vazão de até 30% do rio São Francisco - se isso realmente ocorrer, tanto o uso para irrigação quanto a transposição se tornarão inviáveis, pois os recursos hídricos terão de ser dimensionados para o abastecimento público. Mesmo cenário é projetado para a bacia do Tocantins.
O cenário sombrio, contudo, pode ser minimizado com investimentos na chamada agricultura de baixo carbono e no investimento em pesquisa e desenvolvimento de espécies adaptadas às variações climáticas. Segundo Assad, a mitigação dos impactos ambientais da agricultura requer um investimento anual da ordem de R$ 50 bilhões até 2050. Já os custos de adaptação das culturas agrícolas, com espécies mais tolerantes à seca, por exemplo, é da ordem de US$ 900 milhões/ano.
De modo mais amplo, os cientistas do clima reforçam a necessidade de um investimento anual da ordem de 3% do PIB em iniciativas de adaptação às mudanças climáticas. "Não há como não nos adaptarmos. As ações têm de ser no sentido de tornar a economia do país mais resiliente às mudanças climáticas, já que o relatório reforça que elas são inevitáveis", ressaltou Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisas e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Com esse intuito, o terceiro grupo de trabalho que compôs o relatório se encarregou da mitigação das mudanças, e preparou um conjunto de subsídios para o país adotar no âmbito de sua Política Nacional de Mudanças Climáticas.
Apesar de ter assumido metas voluntárias de redução das emissões de gases de efeito estufa até 2020, o cenário traçado pelo relatório do PBMC aponta para uma tendência de retomada das emissões após esse período, caso não sejam tomadas medidas de redução da poluição. "Porém, há um potencial de abatimento de 1,5 bilhão de toneladas equivalentes de CO2 até 2030", afirma Mercedes Bustamante, pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do capítulo sobre mitigação.
Segundo a pesquisadora, entre as estratégias para reduzir o carbono da economia brasileira está a expansão do sistema de plantio direto na agricultura brasileira, a recuperação de 15 milhões de pastagens degradadas, a redução da queima da cana de açúcar e o avanço nas políticas de eficiência energética e o investimento fontes renováveis, além de mudanças no modal de transportes. "Se não mudarmos o padrão energético atual, as emissões do setor de energia e transporte podem crescer em até 97% até 2030. É preciso quebrar barreiras e incentivar o transporte coletivo em detrimento do individual, fomentar o transporte ferroviário e aquaviário e não só o rodoviário", diz Bustamante.


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