O Globo - 21/10/2013
A
resistência que os Conselhos Federal e Regionais de Medicina vêm
apresentando ao programa Mais Médicos, no-tadamente com o descumprimento
de obrigações legais e de decisões judiciais, não é admissível no
ambiente do estado de direito. A gravidade da situação se evidencia na
medida em que esses órgãos estatais de fiscalização do exercício
profissional da Medicina, criados por lei e submetidos ao regime próprio
das entidades da administração pública, cada vez mais adotam uma
postura de enfrentamento institucional, com a utilização indevida de
suas competências.
Os
Conselhos de Medicina recorreram à Justiça em diversas instâncias
judiciais em todos os Estados da Federação. Dentre outras ações, foram
ajuizadas 27 ações civis públicas na Justiça Federal, uma em cada
Estado. Até hoje, em 18 delas houve pronunciamento favorável à
continuidade do Mais Médicos, inclusive nos recursos por eles dirigidos
aos Tribunais Regionais Federais. No Supremo Tribunal Federal, do mesmo
modo, em duas ações de mandados de segurança, as liminares solicitadas
foram rejeitadas.
O
Poder Judiciário, por diversos juizes, inclusive ministros da
Suprema Corte, não acatou o pleito dos Conselhos de Medicina, com a
manutenção integral do Programa e suas regras, inclusive no ponto em que
se determina aos CRMs que inscrevam em seus quadros os médicos
estrangeiros para que sejam submetidos à fiscalização
A
Advocacia-Geral da União ainda editou um parecer normativo vinculante,
aprovado pela presidente da República, no qual foram afastadas
interpretações jurídicas que tinham por objetivo cons-tranger médicos
brasileiros que atenderam ao chamado para ajudar no Programa.
Nessa
reação dos conselhos, porém, o que causa maior indignação é que o
Programa Mais Médicos não vai prejudicar os médicos que já atuam no
Brasil, tirando-lhes postos de trabalho. Isso já foi demonstrado e
entendido pela população. Como se sabe, a atuação desses médicos
estrangeiros ficará restrita a lugares onde há escassez de médicos —
periferias das grandes cidades e municípios do interior.
Justamente
para manter os médicos estrangeiros nesses lugares é que se optou pela
não revalidação de seus diplomas, pois isso lhes daria o direito pleno
de atuação. Uma vez revalidado o diploma, eles poderiam abandonar o
programa e disputar o aquecido mercado de trabalho médico brasileiro. Do
mesmo modo, e também para aferir-lhes a competência e garantir a
qualidade de sua atuação, é que são submetidos a um processo próprio de
avaliação, tutoria e supervisão feito pelas universidades públicas
brasileiras, mas sem a revalidação de seus diplomas.
A
sociedade brasileira nãò pode ficar refém de órgãos públicos que omitem
suas responsabilidades e promovem ações que contrariam a lei e a
Justiça.
Jean Keiji Uema é consultor jurídico do Ministério da Saúde
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