Pela primeira vez, cientistas captam neutrinos de alta energia vindos de toda parte do cosmo. Identificação das partículas subatômicas pode ajudar na compreensão da origem do Universo
Isabela de Oliveira
Estado de Minas: 25/11/2013
O laboratório Ice Cube, instalado no Polo Sul: identificação de 28 neutrinos que podem ter sido gerados durante o Big Bang |
Brasília – Em 2010, um laboratório batizado de Ice Cube foi inaugurado no meio do Polo Sul com o objetivo de “pescar” partículas vindas do espaço. Os dados que o superdetector colheu valeram o investimento de US$ 272 milhões feito pela Fundação Nacional de Ciência dos Estados Unidos, dizem os cientistas envolvidos no projeto. Isso porque, pela primeira vez, a máquina conseguiu captar neutrinos de alta energia vindos de pontos distantes do cosmo, csegundo descreve um artigo publicado na edição de sexta-feira da revista Science. A façanha deve ajudar os cientistas a entenderem mais detalhadamente como ocorreu o Big Bang (a expansão acelerada que deu origem ao universo) e inaugurar uma nova fase da astronomia.
Os neutrinos são partículas subatômicas, quase sem massa, que pouco interagem com outros tipos de matéria, e tiveram um papel crucial na formação do universo. Os anunciados agora podem ter surgido da explosão de uma supernova ou do próprio Big Bang. Ou seja, há chances de que os pesquisadores tenham colhido alguns “fragmentos” do fenômeno que deu início a tudo que existe. Isso abre perspectivas incríveis de estudo. “Eu gostaria de poder dizer, dentro de 20 anos, que essa descoberta marcou o início da era da astronomia de neutrinos”, diz Olga Botner, integrante da equipe de 276 pesquisadores envolvidos no projeto.
Os especialistas conseguiram identificar precisamente 28 neutrinos entre 2010 e 2012. Eles tinham energia acima de 30 trilhões de teraeletrovolts (TeV), um milhão de vezes superior a partículas semelhantes observadas em 1987, geradas por uma supernova. Em altas energias, esse elemento se torna uma ferramenta única para o estudo espacial. A maior parte do conhecimento sobre o cosmo veio da análise da radiação eletromagnética, que conta com informações sobre ondas de rádio, raios X e raios gama. No entanto, até chegar aos cientistas, essa radiação é absorvida por interações com a matéria e a luz estelar, por exemplo. Isso faz com que algumas regiões do universo só possam ser alcançadas pela observação de neutrinos, uma vez que eles pouco interagem com outros tipos de matéria.
Apesar da importante descoberta, os autores sabem que ainda têm muito pela frente, incluindo identificar com precisão a origem das partículas. “Estamos muito entusiasmados com a possibilidade de explorar fronteiras desconhecidas. No entanto, antes que esse sonho se torne realidade, precisamos melhorar nossas técnicas. Até agora temos sido incapazes de identificar as fontes de nossos neutrinos de alta energia. Para isso, precisamos melhorar a nossa resolução angular e coletar mais amostras”, diz Botner. Para isso, a equipe do Ice Cube propõe triplicar o volume da matriz usada na pesquisa. Isso deve levar à construção de novos superdetectores, que formarão uma rede instalada no fundo do Mar Mediterrâneo.
Para Peter Leroy Faria, doutor em astrofísica e curador de astronomia do Museu de Ciências Naturais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a identificação é um passo importante na compreensão do espaço. “Essas partículas constituem uma forma de radiação fundamental para estudarmos a estrutura do espaço. Elas são marcadores importantes da formação de tudo. Os neutrinos encontrados por esses pesquisadores podem ser, sim, resultados do Big Bang, mas é bem provável que sejam de uma supernova que explodiu na vizinhança”, ressalta o especialista, que não participou do estudo.
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