terça-feira, 27 de maio de 2014

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Pais e professores devem se capacitar para lidar com a tecnologia e poder acompanhar filhos e alunos no mundo virtual, a fim de evitar excessos e crimes, alerta especialista


Sandra Kiefer
Estado de Minas: 27/05/2014


Com 1,3 aparelho por habitante, o celular tornou-se praticamente uma extensão das mãos dos estudantes no Brasil, onde cerca de 70% dos jovens já têm perfil virtual publicado nas redes sociais. Isso embora o acesso à mais popular delas, o Facebook, seja restrito a maiores de 16 anos. Para se cadastrar, a maioria das crianças e adolescentes aumenta a idade ou inventa identidades falsas. E o pior: conta com a complacência dos pais, que apoiam a iniciativa ou simplesmente desconhecem as atividades dos filhos nas redes sociais.

Segundo a última pesquisa Kids on Line, de 2012, do Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic), ligado à Unesco, 62% das famílias estão pouco ou nada informadas sobre as atividades dos filhos na Web. Somente 38% dos pais estão totalmente inteirados sobre as postagens dos filhos, conforme o estudo, que entrevistou usuários entre 9 e 16 anos em todo o país. Eles divulgam nome próprio, endereço e até o telefone na rede mundial de informações.

“Uma coisa é certa: pais e professores precisam se capacitar para lidar com esta tecnologia e ser capazes de compartilhar informações com os filhos. Não adianta virar a cara para o Facebook”, alerta o psiquiatra Luiz Carlos Brant. Ele reuniu as famílias e profissionais de saúde em evento na UFMG, como forma de discutir estratégias para lidar com a invasão digital no cotidiano.

“Evito usar o Face, porque minhas tias aprenderam a entrar e ficam postando as minhas fotos em família. Apareço sempre com a cara horrível, de boca aberta ou olhos fechados. É o maior mico”, afirma o estudante B., de 12 anos, que, nestas ocasiões, pede socorro virtual à irmã e a uma prima, como forma de denunciar fotos ‘queima-filme’ postadas pelos parentes na internet. “Quando três usuários denunciam a foto, o Face é obrigado a apagar”, ensina o adolescente.

Nem sempre a solução para a publicação de fotos alheias é tão simples. Na escola onde B. estuda, os colegas espalharam as imagens dos seios de uma aluna, que havia enviado fotos íntimas ao namorado. Depois de uma briga do casal, o rapaz espalhou as fotos da menina para os colegas do WhatsApp. O colégio fez uma rápida intervenção, determinando que os alunos apagassem as postagens. Pela nova Lei da Web, constitui crime de pedofilia postar fotos íntimas de menores. Calcula-se que há 870 milhões de fotos eróticas, incluindo as de redes de pedofilia, circulando pela internet.


Fuga do celular no recesso da Copa


Pedro faz diversas atividades, por decisão da   mãe, para evitar ficar apenas ligado nos games (TÚLIO SANTOS/EM/D.APRESS)
Pedro faz diversas atividades, por decisão da mãe, para evitar ficar apenas ligado nos games


Com a proximidade das férias escolares, antecipadas por causa da Copa do Mundo no Brasil, os pais estão ansiosos para arranjar ocupação extra para os filhos. Caso contrário, crianças e adolescentes tendem a ficar ainda mais tempo no computador. “Já fiz a inscrição do Fernando no curso temporário de natação para as férias e também na orquestra do colégio, que vai continuar a ensaiar em junho. É preciso dar uma cutucadinha para eles saírem de casa”, diz a farmacêutica Jane Vilela Brandão, mãe do adolescente de 14 anos. Ela conta, orgulhosa, que o filho também devora livros, especialmente se o tema for mitologia grega.

Com a palavra Fernando Vilela, que concorda com os planos da mãe. “Se deixar, fico o dia inteiro no computador conversando com meus amigos”, admite o adolescente, que brincava no WhatsApp à tarde, quando a reportagem entrou em contato. “Minha mãe acabou de telefonar para ver se eu estava estudando. Tive de ser sincero, pois, se ela descobrisse depois a verdade, iria me colocar de castigo, sem acesso ao computador”, conta ele, que é incapaz de dizer o número da mãe na conversa pelo telefone. “Posso te passar uma mensagem pelo celular?”, pergunta o jovem.

“Aqui em casa, o ritmo é frenético. Não deixo sobrar tempo, senão ele vai direto para os games”, afirma a advogada Rúbia Borba, de 42 anos. Ela é mãe de Pedro, de 12 anos, que faz atividades complementares todos os dias da semana, menos na sexta-feira, quando costuma passear na casa dos amigos. Além de terapia e de inglês, o adolescente faz futebol, basquete e ginástica. “Não fico com dó, porque ele faz o que gosta. A veia dele é o esporte”, afirma a mãe, que já tentou também matricular o filho em aulas de música e teatro, sem sucesso.

“Se existe algo errado com o filho, que está mais arredio, a culpa não é do celular. Os aparelhos não funcionam sozinhos. Eles representam mais um indício de que a causa do problema”, lembra a pesquisadora da UFMG Luciana Alves. No mestrado, ela investigou a vida de crianças e adolescentes que tinham pouco contato com as ferramentas tecnológicas. “Comparando os testes das crianças que jogavam com as que não jogavam, os resultados mostraram que as usuárias desenvolviam maior atenção e inclusive despertavam o interesse de aprender inglês para lidar com os games.

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