Estado de Minas: 15/06/2014
A escritora Maura Lopes Cançado |
Depois do artigo de domingo passado sobre o livro Orates (Unifor), do psiquiatra Musso Greco, recebi de um leitor interessado na loucura, e a quem agradeço a descoberta, o interessante material publicado por Maurício Meireles no jornal O Globo em 14 de abril.
O artigo fala da redescoberta da obra da mineira Maura Lopes Cançado, considerada promessa de literatura nos anos 1960 antes de se autointernar em um manicômio e cair no ostracismo.
Naquela época, não havia leis que regulamentassem o tratamento de doentes mentais. Maura questionava os maus-tratos a que eles eram submetidos. Escreveu dois livros – Hospício é Deus (1965) e O sofredor do ver (1968) – e circulava nas altas rodas literárias do Rio de Janeiro. Uma promessa que não se cumpriu. Recebeu elogios de Carlos Heitor Cony e Ferreira Gullar, quando apareceu no Jornal do Brasil, em 1956, levando seu primeiro livro. Gullar comentou que ela deveria ser mais conhecida por seu talento. Logo depois, a mineira passou a trabalhar no suplemento dominical do JB.
Ninguém previu o alcance de seus problemas mentais: ela jogou a máquina de escrever pela janela e derrubou uma estante em cima de um colega de trabalho. Esquizofrênica, internou-se aos 18 anos por vontade própria. Tinha mania de grandeza, explosões de agressividade e tendência suicida. Passou por várias clínicas psiquiátricas. Numa delas, matou outra interna, degolada, e foi para o manicômio judiciário.
Redescoberta, Maura é estudada em teses de mestrado e doutorado, informa a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que, desde 1987, pesquisa a obra da escritora, ignorada até 2006.
Em 2012, a Confraria dos Bibliófilos lançou uma edição da coletânea de O sofredor do ver para seus associados. Ano passado, no livro Profissionais da solidão (Editora Senac), Cecília Prado lançou um perfil da escritora, que em breve ressurgirá em biografia escrita pela jornalista Daniela Lima.
Presa na penitenciária Lemos de Brito nos anos 1970, Maura foi assunto de O Globo em 1977. A reportagem mostrava o cubículo “imundo e infestado de percevejos” em que ela dormia, cega e entre presos comuns. Em sua coluna, Otto Lara Resende considerou aquilo “uma vergonha imperdoável”. Esquecida, ela morreu em 1993.
“Nós, mulheres despojadas, sem ontem nem amanhã, tão livres que nos despimos quando queremos. Ou rasgamos os vestidos (o que dá ainda um certo prazer). Ou mordemos. Ou cantamos, alto e reto, quando tudo parece tragado, perdido. (...) Nós, mulheres soltas, que rimos doidas por trás das grades – em excesso de liberdade. (...)”, afirma Maura no livro Hospício é Deus.
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