Chute revolucionário
Tecnologia desenvolvida por pesquisador
brasileiro ajudará uma pessoa paraplégica a caminhar e dar o pontapé
inicial da Copa do Mundo
Estado de Minas: 12/06/2014
Brasília – Nos
assentos do Itaquerão, 70 mil torcedores estarão ansiosos pelo início do
Mundial de 2014 na tarde de hoje. Para um grupo de cientistas e
deficientes físicos, porém, o chute que antecederá a partida será ainda
mais importante que o desferido por um dos jogadores de Brasil ou
Croácia. A alguns metros do centro do campo, um paraplégico se levantará
da cadeira de rodas e, após caminhar, dará um pontapé na bola. É o gol
que o neurologista brasileiro Miguel Nicolelis espera ver desde a década
de 1990, quando começou a idealizar um equipamento capaz de devolver o
movimento de membros paralisados a partir da leitura de sinais
cerebrais.
Embora ainda longe de aposentar as cadeiras de rodas, o
exoesqueleto que será usado no início da cerimônia da Copa do Mundo
representa, literalmente, o primeiro passo para a autonomia completa de
pessoas que não conseguem se sustentar sobre as pernas. Experimentos
anteriores, realizados por outros cientistas, já possibilitaram que até
mesmo tetraplégicos – com movimento dos quatro membros comprometidos –
deslocassem braços eletrônicos e pegassem objetos apenas com o
pensamento. Contudo, a veste robótica, batizada de Brasil Santos Dumont
1, é a primeira a usar sensores capazes de fazer um deficiente físico
ficar de pé e caminhar. Mais do que isso, o equipamento pode enviar
sinais de volta ao usuário. Ou seja, quando ele chutar a bola, sentirá
um estímulo tátil.
O projeto Andar de Novo é resultado da união
de neurociência, robótica, nanotecnologia e prostética de um grupo
internacional de pesquisadores. Nicolelis, que trabalha na Universidade
de Duke, nos Estados Unidos, foi responsável pelo desenvolvimento dos
sensores que “leem pensamentos” e os enviam ao exoesqueleto, um sistema
conhecido como interface cérebro-máquina-cérebro. O trabalho robótico
ficou a cargo de cientistas alemães e, na França, construiu-se a veste.
Suíços também participaram do projeto, que recebeu R$ 33 milhões da
Agência Brasileira da Inovação (Finep).
A estreia do Brasil
Santos Dumont 1 está cercada de mistério. A identidade dos oito
pacientes treinados desde novembro em um laboratório montado na
Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em São Paulo, é
mantida em segredo. Todos eles, com idades entre 20 e 35 anos, já deram
passos e chutes usando o exoesqueleto. O ritual que um deles seguirá na
estreia da Copa também não foi divulgado. Embora Miguel Nicolelis já
tenha afirmado que o paciente sairá da cadeira de rodas, andará 25
metros e dará o chute, ele disse recentemente ao Portal da Copa que isso
ainda será definido. Tudo, porém, parece estar pronto para o grande
momento. “Exo BRA-Santos Dumont 1, controlado por um dos nossos
voluntários, completa com total sucesso testes no gramado onde será
realizada a abertura da Copa do Mundo”, escreveu Nicolelis em sua página
no Facebook no último dia 3.
A veste robótica ainda é um
protótipo e será preciso fazer muita coisa antes que se torne uma
realidade – a bateria, por exemplo, dura apenas duas horas. Contudo,
para a área de reabilitação, significa um avanço que, segundo Nicolelis,
se compara à ida do homem à Lua. “Esse é um grande passo para a
humanidade”, costuma dizer, brincando com o duplo sentido.
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