Grande fluxo de turistas esperados para o próximo verão no Brasil e uma provável infestação
do Aedes aegypti podem ser combinação perfeita para transmissão de novo tipo de febre
Paula Takahashi
Estado de Minas: 11/08/2014
Ele ainda não está
circulando por meio dos mosquitos locais, mas é questão de tempo até que
o vírus chikungunya comece a fazer vítimas em terras brasileiras. Este
ano, o Ministério da Saúde já confirmou 30 casos de pessoas
contaminadas, entre elas 27 brasileiros, todos importados de regiões
endêmicas, como República Dominicana e Haiti. Há três casos em
investigação: um no Ceará e dois no Amapá. As chances de transmissões
autóctones (quando os vetores regionais são infectados e contaminam o
homem) serem registradas no país nos próximos meses são reais. O fato de
estarmos no inverno e a população de Aedes aegypti – o mesmo
transmissor da dengue – estar reduzida contribui para protelar a
disseminação do vírus, originário da África. O Aedes albopictus também é
transmissor e circula em território nacional.
Os Estados Unidos
não tiveram a mesma sorte. Em pleno verão, os dois primeiros casos de
contágio em solo norte-americano foram registrados em meados de julho,
no estado da Flórida. Nas ilhas caribenhas e em países da América
Central, os relatos começaram a surgir em dezembro do ano passado e até
agora já foram confirmados mais de 5 mil contágios. Para o médico
infectologista do Grupo Hermes Pardini João Paulo Campos, a época do ano
é a grande aliada dos brasileiros. “Mas já temos casos endêmicos aqui
do lado, como no Caribe e na Costa Rica. Para mim, é só uma questão de
tempo até vir para o Brasil.”
A chegada do verão e
principalmente do carnaval se torna a grande preocupação para os órgãos
de saúde. “Muitas pessoas vêm pra cá a turismo e cria-se um cenário
propício para disseminar a doença”, observa João Paulo. Pedro
Vasconcelos, chefe da seção de Arbovirologia e Febres Hemorrágicas do
Instituto Evandro Chagas (IEC) lembra que a dengue dos tipos 1, 2 e 3
entrarou no Brasil pelo Rio de Janeiro logo depois do carnaval. “Somente
a do tipo 4 entrou por Roraima”, conta. A Secretaria Estadual de Saúde
de Minas Gerais garantiu em nota que o “maior risco de aparecimento de
casos e transmissão sustentada da doença ocorre no verão, com o período
de chuvas e calor”.
O grande fluxo de pessoas esperados para a
próxima temporada de verão no Brasil, associada a uma provável
infestação do mosquito no período, são a matemática perfeita para a
circulação do chikungunya. “A dispersão do vírus muitas vezes depende
mais da quantidade de transmissores do que necessariamente de
infectados”, explica Socorro Azevedo, médica e pesquisadora do IEC, ao
ser questionada se apenas uma pessoa contaminada seria capaz de tornar a
doença endêmica no país. “Se esse indivíduo estiver em um local com uma
população expressiva de mosquitos em condição de disseminar o vírus
para outras pessoas, a possibilidade de transmissão autóctone existe”,
detalha.
PREPARADOS O Ministério da Saúde tem
consciência do risco e vem se preparando desde o final do ano passado
para a ameaça iminente. Além da capacitação de profissionais de saúde em
várias regiões do país, lançou recentemente a cartilha Preparação e
resposta à introdução do vírus chikungunya no Brasil. A Fundação
Ezequiel Dias (Funed) em Minas Gerais faz parte do Laboratório Central
de Saúde Pública (Lacen) do Ministério da Saúde e já está preparada para
realizar o diagnóstico do vírus.
“Fomos capacitados para fazer a
pesquisa de anticorpos tanto na fase aguda da doença como na fase
crônica”, explica Lorena Maciel, farmacêutica analista do laboratório de
dengue e febre amarela da Funed. O Hermes Pardini também tem know-how
para identificar os anticorpos produzidos pelo organismo humano para
combater o vírus. “Também somos capazes de medir a quantidade de vírus
no sangue, mas ainda não surgiu demanda para isso”, afirma João Paulo
Campos.
Articulações são as partes mais atingidas
Paula Takahashi
Publicação: 11/08/2014 04:00
A semelhança do
chikungunya com a dengue não se limita ao vetor de transmissão. Os
sintomas e tratamento também são muito parecidos, o que, a princípio,
pode dificultar o diagnóstico preciso. “Inicialmente, podem ser
confundidos os quadros, mas o que chama a atenção, no caso do
chikungunya, é o comprometimento intenso das articulações”, alerta
Socorro Azevedo, médica e pesquisadora do Instituto Evandro Chagas
(IEC).
Ao contrário da dengue, em que a dor muscular fica mais
evidente, no chikungunya, as dores nas articulações dos dedos, cotovelo e
tornozelo, por exemplo, podem se tornar incapacitantes. “Em alguns
pacientes, principalmente idosos e crianças, considerados de idade
extrema, os sintomas podem ser mais severos”, observa Socorro. Em
pessoas com doenças de base como diabetes e hipertensão também há maior
risco de piora na evolução do quadro.
Já foram relatados casos em
que essa dor pode evoluir para uma artrite e acompanhar o paciente por
anos. Estudos na Índia revelaram que 49% dos pacientes apresentaram
sintomas persistentes 10 meses depois do início da doença. Em casos
extremos, pode ocorrer até mesmo deformidades nas articulações.
Apesar
das sequelas preocupantes, o chikungunya tem poucos casos de
letalidade, ao contrário da dengue. O tratamento também se baseia em
medicamentos sintomáticos, ou seja, que vão combater os sintomas, que
além de febre alta e súbita incluem mialgia, cefaleia e artralgia.
“Hidratação e repouso são fundamentais. Para a artrite, podem ser
associados anti-inflamatórios”, observa João Paulo Campos, médico
infectologista do Grupo Hermes Pardini.
O ácido acetilsalicílico,
grande vilão nos casos de dengue, também deve ser evitado mesmo que as
consequências para a evolução da doença não sejam tão preocupantes. “Não
chega a evoluir para hemorragia, mas pode reduzir as plaquetas e piorar
o quadro de lesão cutânea por exemplo”, alerta João Paulo
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