Guilherme Leme muda
o sobrenome, enfrenta o câncer e celebra 30 anos de carreira. Ator de
sucesso na TV, ele se destaca no teatro e dirige a 18ª peça, que chega a
BH na sexta-feira
Carolina Braga
Estado de Minas: 30/09/2014Guilherme Leme Garcia ensaia com Miwa Yanagizawa, atriz de Trágica.3 |
Guilherme Leme Garcia tem motivos de sobra para celebrar seus 30 anos de carreira – e não só pela data redonda. A inquietação que marca a trajetória desse paulista, principalmente nos palcos, merece ser comemorada. No Rio de Janeiro, o ator acaba de estrear Uma relação pornográfica, sua 16ª peça, ao lado da atriz Ana Beatriz Nogueira. No fim de semana, chega a BH Trágica.3, a 18ª montagem dirigida por ele. Guilherme nunca parou, mas este momento é especial: a volta à ativa se dá depois de muitos desafios.
É curioso que a essa altura, aos 52 anos e com carreira consolidada, o sobrenome Garcia passe a fazer parte do nome artístico dele. “Meu pai tem uma doença degenerativa e, em curto espaço de tempo, não vai mais saber quem eu sou. Quis fazer a homenagem em vida”, explica Guilherme. O artista nem sabe se o pai se deu conta disso, mas o gesto é importante. Marca uma retomada.
Em 2013, o ator descobriu um câncer na garganta. Houve complicações durante o tratamento e ele chegou a passar 40 dias no hospital – 20 na UTI. “Você fica à mercê da vida”, resume. “Sempre fui muito reflexivo sobre a minha profissão, discuto os rumos dela, o que quero falar da arte, como quero lidar com ela. Sou muito exigente, então não houve nada especial naquele momento”, conta.
A Guilherme interessa lidar com o ofício como uma pessoa de seu tempo. Suas preocupações relacionadas estão muito mais ligadas ao entendimento do papel da arte no processo civilizatório do que a qualquer outra coisa. É isso que ele procura passar ao público; foi isso que o fez se descobrir.
“Chega uma hora em que você tem a necessidade de fazer os seus projetos, ser dono da sua carreira, de seus sonhos e desejos. Só se produzindo isso é possível”, explica. Foram 20 anos só como intérprete – Guilherme integrou o elenco de 27 novelas, entre elas tramas marcantes nas décadas de 1980 e 1990 como Bebê a bordo, Que rei sou eu? e Vamp. Há 10 anos, ele se deu conta de que era preciso avançar. Experimentou as artes plásticas. Pintou, desenhou e hoje incorpora tudo isso às escolhas como diretor.
Trágica.3, que chega sexta-feira ao Centro Cultural Banco do Brasil, é a 18ª montagem dirigida por ele. Trata-se de uma leitura contemporânea de três potentes heroínas gregas: Antígona e Electra, de Sófocles, e Medeia, de Eurípedes, papéis de Letícia Sabatella, Miwa Yanagizawa e Denise Del Vecchio, respectivamente. Fernando Alves Pinto e Marcello H também integram o elenco.
Tragédia
Mergulhos no universo dos clássicos gregos foram recorrentes na carreira de Guilherme Leme Garcia. Com Vera Holtz ele fez Medeia material, na década de 1990. Como diretor, há cerca de quatro anos encenou RockAntygona, com Luis Melo, Miwa Yanagizawa e Armando Babaioff. “Sempre fui apaixonado por tragédia. Fiz como ator, depois dirigi uma leitura contemporânea e fiquei muito instigado com a pesquisa. Pensei: quero voltar”, conta.
Naquela época, Guilherme viva uma experiência totalmente diferente no palco: atuava em Rock in Rio – o musical. Ao fim da temporada, foi diagnosticado o câncer e ele parou tudo para se tratar em São Paulo. Como o projeto de Trágica.3 acabara de ser aprovado pelo CCBB, pensar soluções para a peça se transformou em válvula de escape. Porém, o que o diretor pensou no hospital não está na peça. “Foi bom, porque ela passou por um processo. O resultado foi uma coisa nova”, constata.
Artes visuais
O processo criativo de Guilherme Leme Garcia está diretamente ligado à paixão pelas artes plásticas. Antes de começar uma peça, ele busca conexões entre as duas linguagens. O norte-americano James Turrell, papa de light art, é a inspiração para Trágica.3, enquanto Rockantígona bebeu na fonte do movimento neoconcreto. “Reúno a equipe e falo: gente. a nossa pesquisa é essa. E a peça vai acontecendo a partir daquele rumo”, explica.
No caso de Turrell, as referências estão claras na iluminação e na cenografia: “Ele foi o norte da concepção estética, assim como a eletrônica foi o norte para a trilha”. Composta por Letícia Sabatella, Fernando Alves Pinto e Marcelo H, a música carrega lamentos em vários idiomas. O espetáculo reúne fragmentos das três obras gregas. As adaptações ficaram a cargo de Heiner Müller (Medeia), Caio de Andrade (Antígona) e Francisco Carlos (Electra).
O espetáculo foi indicado a cinco categorias do 27º Prêmio Shell de Teatro de São Paulo: direção (Guilherme Leme), atriz (Denise Del Vecchio), figurino (Glória Coelho), iluminação (Tomás Ribas) e música (Fernando Alves Pinto, Letícia Sabatella e Marcello H).
NA DIREÇÃO
Os adoráveis sem-vergonhas
Felizes da vida
A idade da ameixa
A forma das coisas
Produtor
Eduardo II
Sem-vergonhas
Decadência
Trindade
Quarttet
RockAntygona
Laranja azul
O matador de santas
Shirley Valentine
Filha, mãe, avó e p...
Billdog
O nó do coração
Trágica.3
EM MINAS
Guilherme Leme dirigiu peças em Minas Gerais. Ele comandou A idade da ameixa – incursão de Ilvio Amaral e Maurício Canguçu no drama, espetáculo sensível e marcante na carreira da dupla, conhecida por comédias de sucesso. A parceria deu tão certo que Leme repetiu a dose em Sem-vergonhas.
TRÁGICA.3
CCBB Belo Horizonte, Praça da Liberdade, 450, Funcionários, (31) 3431-9400. Estreia sexta-feira, às 20h. Sessões até 26 de outubro, de sexta-feira a domingo, às 20h. Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia-entrada).
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