Valor Econômico - 26/08/2013
Confesso
ter minimizado, indevidamente, o alcance das aspirações presidenciais
de Eduardo Campos. O governador de Pernambuco não é o candidato com mais
chances em 2014, à primeira vista, mas no quadro atual desfruta de
condições singulares que podem ser bastante favoráveis.
Vejamos.
Campos é o único candidato que, provindo da base de governo, à qual
ainda pertence, é capaz de conquistar votos na oposição. Neto de Miguel
Arraes, o governador mais odiado pela direita golpista de 1964, tem boas
credenciais no campo que vai da esquerda ao centro. E é presidente do
PSB, que disputa com o PMDB o segundo lugar na aliança governamental;
dependendo do critério, é um ou outro.
Também é quem melhor
dialoga com a oposição. Sim, o PMDB pode flertar com ela, mas não
dispõe, nem em Michel Temer, de um líder tão livre como Campos para
dizer o que pensa. E o que ele pensa agrada a uma parte do eleitorado e
dos potenciais financiadores do PSDB.
Se o PT lidera há bom
quarto de século a centro-esquerda em nosso País, e desde 1989 é uma das
duas forças principais na política brasileira, a liderança da
centro-direita cabe, desde 1994, ao PSDB. Mas é essa liderança que agora
entra em xeque. Ou seja, a centro-direita existe e continuará
existindo. Disputará com o PT, no voto, a hegemonia política no País.
Mas hoje sofre uma crise de liderança que, na verdade, é uma crise
interna do PSDB, afetando a vasta faixa de opinião que ele tem
representado.
Os conflitos entre Aécio Neves e José Serra pela
candidatura à Presidência em 2014, intermináveis, são sinal disso. Podem
resultar de ressentimentos, talvez do político paulista. Mas na verdade
se trata de uma crise de destino do PSDB e de uma crise de
representação da centro-direita.
Estas duas crises merecem
tratamento à parte, o que faremos em artigo futuro. Mas, por ora, vamos à
conjuntura que favorece Eduardo Campos.
Caso Serra deixe o PSDB
para candidatar-se por outro partido, quase certamente selará sua
derrota, mas também a de Aécio. Por derrota, aqui, não entendo perder,
no segundo turno, para o PT. Entendo algo maior e pior: nem mesmo chegar
ao segundo turno. Aqui crescem as chances de Campos, assim como as de
Marina Silva.
Agora, o desentendimento interno ao PSDB - ou, se
quiserem, a cisma de Serra se dispondo até mesmo a realizar um cisma
dentro do partido - já basta para enfraquecer os tucanos, mesmo que
Serra não saia. Consta que, na melhor das hipóteses para Aécio, que é
sua indicação presidencial sem a saída de Serra, este último fará corpo
mole na campanha. Isso é ruim em termos de imagem. Basta lembrar a
recente eleição paulistana, em que Marta Suplicy, frustrada pelo dedaço
de Lula no intento de concorrer à prefeitura, se afastou da campanha de
Haddad, somente se integrando nela nas semanas finais e cruciais.
Coincidência ou não, foi quando Haddad disparou para a vitória. Pois é.
Um boicote interno à candidatura Aécio já faria muito mal. Mais uma vez,
a conjuntura favorece Campos - e Marina.
E há mais uma
perspectiva no horizonte. Será lamentável se uma força de opinião
significativa como o Rede não puder concorrer em 2014. Mas, se o TSE
puser paradeiro ao atraso dos cartórios eleitorais na verificação das
assinaturas, o Rede não poderá culpar a ninguém por um eventual
fracasso. Terá sido Marina que demorou mais de dois anos a se definir.
Aliás,
mesmo que Marina concorra, a ausência de palanques nos Estados expõe
sua aspiração a sérias dificuldades. Suas perspectivas de sucesso são as
mais difíceis, hoje, de medir.
O que resultaria de um forfait da
Rede ou do fracasso da candidatura de Marina Silva, somada a uma crise
no PSDB? Aumentarão as chances para Eduardo Campos. Ele pode ganhar a
preciosa indicação da segunda vaga (a primeira sendo do PT) para o turno
final das presidenciais. Pode realizar o que é o sonho de Aécio, o
discurso do político mineiro, que consiste em propor um governo pós-PT e
não anti-PT. Também isso não é fácil, mas Campos não está marcado pelo
ódio ao petismo, longe disso; e soube distanciar-se do PT não nos tempos
de Lula, mas depois que ele deixou a presidência para uma sucessora sem
o seu carisma. Mesmo a eleição no Recife, em 2012, que foi a segunda
vitória de Campos sobre o antigo e ainda atual aliado (a primeira se deu
em 2006), se deu no quadro de um enorme desgaste do então prefeito
petista da capital pernambucana.
Um candidato que vem da
centro-esquerda, comprometido com causas sociais, com fama de bom
gestor, falando aos empresários e que permita vivermos uma campanha que
atenue o clima de ódio que cresceu entre PSDB e PT: este o perfil que
Campos construiu. Isso não basta para vencer mas, numa conjuntura em que
a Rede não compareça e os tucanos se dividam, pode dar certo.
O cerne da coisa é: o que se está disputando?
Serra só pode disputar a Presidência. Estar no segundo turno não lhe basta.
Mas,
para Aécio, Marina ou Eduardo Campos, ganhar um lugar no segundo turno
já é uma grande vitória. Nas últimas três eleições, o segundo turno foi
do PT e do PSDB. Agora, pela primeira vez, o lugar do PSDB está a
perigo. Quem ganhar essa posição se consagra, mesmo perdendo na final do
campeonato presidencial, como líder da oposição num talvez desgastado
quarto mandato petista. Torna-se líder da centro-direita. E, com isso,
muda os termos em que a nossa política está sendo jogada. Imaginem uma
centro-direita cujo lema é o discurso sustentável. Ou que tenha em
Eduardo Campos a expectativa de uma síntese entre o que é melhor do PT e
o melhor do PSDB. Tudo muda.
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