ZERO HORA - 08/09/2013
Alguns poucos leitores às vezes me confundem com conselheira sentimental
e me revelam seus conflitos internos, acreditando que eu possa apontar
um caminho para que eles vivam melhor. Logo eu! Escrevo sobre assuntos
que me interessam e, se servirem para alguém, é uma honra, mas não me
sinto à vontade e nem tenho preparo para entrar na intimidade de cada
leitor em particular já me atrapalho o suficiente comigo mesma.
Mas já que todos gostam de conselhos, eu inclusive, uma dica posso dar: leia o livro Pequenas Delicadezas, de Cheryl Strayed.
Já falei dessa autora antes. Foi ela que percorreu sozinha uma
trilha nos Estados Unidos e narrou a experiência no aclamado Livre, que
frequentou a lista dos best-sellers. Eu nem imaginava que ela escrevia
uma coluna de aconselhamentos. Pois me tornei fã declarada dessa mulher.
Pequenas Delicadezas é uma seleção de perguntas e respostas
publicadas no site The Rumpus, mas de forma alguma é literatura de
bisbilhotice, aquela coisa de olhar pelo buraco da fechadura dos dramas
alheios, o que tantas vezes revela-se piegas.
Cada carta gera um ensaio em que Cheryl conta experiências próprias
para ilustrar seu pensamento sobre as questões levantadas. Esbanjando
sensatez (coisa que não anda sobrando por aí), ela equaliza causas e
efeitos com docilidade, mas sem abusar do bom mocismo e sem encontrar
solução para tudo.
Ao contrário, ela reconhece que a vida é bem sacana às vezes. Nossos
pais nem sempre foram uns anjos, nossa infância “feliz” pode ter sido
uma farsa e a maneira como estamos narrando nossa história para nós
mesmos pode estar cheia de ficções que já não conseguimos sustentar. Dá
para mudar o passado? Não dá. A única coisa que dá para mudar é a
maneira como enxergamos tudo o que nos aconteceu (e ainda acontece) e
ver o que é possível perdoar, esquecer ou redimensionar.
É comum considerar o escritor como uma espécie de guru – parece que
ele é imune a problemas. Cheryl se atreve no papel e se dá como exemplo
justamente porque sua vida não foi um passeio de carrossel.
Porém, ela encontrou suas ferramentas de superação – a própria
coluna deve ser uma delas. Sem constrangimento e com absoluta empatia,
envolve-se com a dor de quem lhe escreve, mesmo suspeitando que todos
sabem direitinho o que devem fazer de suas vidas, só estão aguardando
que alguém, mesmo um desconhecido, lhes dê uma espécie de licença. “Se é
por falta de licença, sinta-se autorizado”, é o que ela parece dizer.
Pequenas Delicadezas não explora as churumelas do amor nem pretende
ser um oráculo. Apenas confirma que viver não é fácil, mas é o que temos
pra hoje.
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