A vitória não foi dos condenados. Foi do
estado democrático de direito e da observância do devido processo legal,
que fundamentaram o voto do ministro Celso de Mello
Estado de Minas: 19/09/2013
Com o voto de
ontem do ministro Celso de Mello, garantindo a réus do mensalão o
direito de interpor embargos infringentes, a vitória foi do estado
democrático de direito e da observância do devido processo legal. Muito
provavelmente, ele manterá, na apreciação dos embargos, a mesma
severidade com que condenou os 12 réus aos quais garantiu o direito de
um novo exame de suas condenações, nos casos em que tiveram quatro votos
favoráveis. O voto de Mello deverá ser visto, no futuro, quando as
paixões tiverem se dissipado, como referência na arte e responsabilidade
de julgar: seja pelo valor técnico intrínseco ao voto, seja pela
coragem de proferi-lo apesar das pressões internas e externas ou pela
virtude de ter separado o direito dos réus do juízo formado sobre suas
condutas.
Haverá desgaste para o STF e o Judiciário? No calor da
hora, sim. As redes sociais foram tomadas por protestos dos que desejam
ver todos os réus presos e algemados o mais rapidamente possível. Alguns
poucos se manifestaram defronte ao STF e muitos ligaram para o gabinete
do ministro dizendo impropérios. Todos movidos por convicções formadas
sob o signo da paixão e da indignação, não do compromisso com a o ordem
jurídica. Uma coisa, porém, é aplaudir ou censurar o STF no julgamento
desse caso, que reproduz o Fla-Flu político-partidário em que se divide o
Brasil de hoje. Outra, bem diferente, é a opinião dos brasileiros sobre
a Justiça como um todo. As pesquisas estão sempre indicando a
insatisfação com a morosidade, com o difícil acesso dos mais pobres, com
a burocracia e os custos da Justiça. E isso não virá com o julgamento
do mensalão, mas com mudanças de maior alcance, legais e operacionais,
no que pese o simbolismo da condenação de pessoas influentes e notáveis.
A criação do CNJ já produziu alguns resultados, mas falta muito ainda
para que tenhamos uma Justiça digna de aplausos, em toda sua extensão.
Logo, é balela dizer que o acolhimento dos embargos desmoralizará um
Judiciário que já tem a moral tão baixa.
Nas preliminares de seu
voto, Celso de Mello confrontou-se, transversalmente, com os colegas que
justificaram a rejeição dos embargos alegando que o STF não poderia
decepcionar a parcela da opinião pública contrária à concessão da
segunda chance aos condenados. O juiz, ponderou, não é um delegado ou
representante popular. Seu dever não é atender ao clamor externo, mas
assegurar as garantias que o regime democrático reserva a todos. “Se é
certo que a Suprema Corte constitui por excelência um espaço de proteção
e defesa das liberdades fundamentais, não pode expor-se a pressões
externas como as resultantes do clamor popular e pressões das multidões,
sob pena de completa subversão do regime constitucional de direitos e
garantias individuais". Uma carapuça, que vestirá quem puder ou quiser.
A
parte técnica do voto também ofuscou a singeleza dos argumentos dos que
votaram contra os embargos. Uns se apegando ao clamor popular, outros à
hipótese de a Lei 8.030/90 ter revogado, embora sem explicitá-lo, o
artigo do regimento do STF que admite tais embargos. Mello revisitou os
cânones que vêm do Império e das ordenações filipinas, passando por
todas as constituições democraticas do Brasil, destacando a de 1946 –
promulgada em 18 de Setembro, como ontem, após uma ditadura –
encontrando sempre a garantia ao duplo grau de recurso. No que toca à
divergência entre os ministros, sobre a vigência dos embargos diante do
silêncio da Lei 8.030/90, que os suprimiu para outras instâncias, mas
calou-se em relação ao Supremo, fez uso do mesmo argumento aqui
apresentado anteontem pelo relator da lei, ex-deputado Sigmaringa
Seixas: eles foram suprimidos nas instâncias inferiores por
desnecessários, na medida em que, nestes casos, existirá sempre a
possibilidade de recurso à instância superior. Não cogitou o Congresso
de suprimi-los no STF por não haver acima da Corte outra instância
recursal, a não ser o próprio colegiado.
Outro elemento
apresentado por Mello, e que nenhum outro ministro havia citado, foi
também mencionado aqui anteontem: a rejeição da proposta de eliminação
de tais embargos no STF, proposta pelo ex-presidente Fernando Henrique
em 1998, por emenda supressiva do então deputado Jarbas Lima, acolhida
pelos plenários da Câmara e do Senado. Logo, o legislador já havia
manifestado sua vontade: a de manter os embargos. O colegiado devia
saber disso.
Agora, segue-se outra etapa. Qualquer que seja o
resultado para os réus, não se poderá acusar o STF de ter violado as
garantias para atender às ruas. A corte deverá isso à erudição e à
independência de Celso de Mello.
Sucessão acelerada
Com
a decisão do PSB de deixar o governo Dilma, a sucessão ganha novo
ritmo. Já ninguém terá dúvida de que o presidente do partido e
governador de Pernambuco, Eduardo Campos, será candidato. Isso mudará o
jogo para a coalizão dilmista nos estados e também para a campanha do
senador Aécio Neves (PSDB-MG), em que só faltaram fogos ontem para
celebrar a decisão. Eduardo no páreo é quase uma garantia de que haverá
segundo turno.
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