Mariana Peixoto
Estado de Minas: 11/11/2013
As esculturas de corte estão entre as mais conhecidas do artista. É como uma marca registrada de Amilcar |
Ao visitar o Instituto Amilcar de Castro, em Nova Lima, para preparar exposição sobre o escultor mineiro que seria apresentada durante o Ano do Brasil na França (2005), o curador e artista plástico Evandro Salles se deparou com uma imagem marcante. “Uma sala estava cheia de esculturas de corte (em ferro, mais de uma centena delas). Ver esse conjunto de esculturas é diferente de ver uma e outra sozinhas. Há uma articulação entre elas, a massa parece conversar entre si. A escultura passa a ser um corpo significante que se articula numa espécie de sinfonia. Percebi, ali, que aquela era uma outra forma de se ver o trabalho dele”, afirma o mineiro radicado no Rio de Janeiro.
Essa é uma das ideias que norteiam Amilcar de Castro – Repetição e síntese, exposição que será aberta esta semana no Centro Cultural Banco do Brasil – amanhã para convidados e quarta-feira para o público. Um número mais do que expressivo de obras – cerca de 550, entre desenhos, gravuras e esculturas em aço, madeira e vidro – será exposto até o fim de janeiro no terceiro andar do prédio da Praça da Liberdade.
Alguns conjuntos chamam a atenção pela sua unidade conceitual |
Quatro esculturas de grande porte também serão vistas em outros andares: três redondas no pátio e outra de 2,20m x 2,40m que o crítico Ronaldo Brito apelidou “Maria Callas”, no hall do edifício. As obras integram as três maiores coleções do artista, todas em Minas Gerais: do Instituto Amilcar de Castro, que reúne seu espólio; de Márcio Teixeira, seu maior colecionador particular; e de Allen Roscoe, que tem 572 gravuras das estimadas 600 produzidas por Amilcar ao longo da vida.
Estrela, primeira escultura abstrata de Amilcar (a original é de 1953 e foi apresentada naquele ano, durante a 2ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo) é uma das peças históricas que estará na mostra. “Estrela já continha a escultura que ele foi fazer 50 anos depois. Ou seja, trabalhou a vida toda numa estrutura de ideia, que é a mesma, mas nunca é a mesma. Essa é uma outra forma de entender o trabalho dele, de que uma obra contém todas elas, mas cada uma é diferente da outra”, continua Salles. A peça foi criada sob a influência do designer e escultor suíço Max Bill, que Amilcar conheceu dois anos antes, na edição de estreia da Bienal – em 1951, Bill levou o prêmio máximo pela escultura Unidade tripartida, que influenciou definitivamente a geração de artistas brasileiros da época.
Em grupos Para desenvolver tais conceitos, o curador agrupou grandes grupos. Nas primeiras salas da exposição serão vistas esculturas de madeira negra (braúna) que ele produziu no fim da vida, um conjunto que nunca foi mostrado. Há outros grandes conjuntos escultóricos: um de corte em ferro, que ele começou a produzir na década de 1980; outro com 140 peças (também nunca exposto) de corte e dobra, a técnica criada por Amilcar; e um terceiro, este pouco conhecido, de obras em madeira bruta e vidro chamadas Colunas.
As gravuras, muitas delas em grandes dimensões, também ocupam espaços privilegiados na mostra |
O lado desenhista de Amilcar também ganha extensos conjuntos. Numa sala, desenhos com pincel e nanquim buscam entrar no universo da concepção, entender como era seu processo criativo. Em outra, 52 gravuras (10% da coleção de Allen Roscoe, o maior conjunto já exposto) sintetizam esse lado do artista. E há ainda telas de grandes pinturas – ainda que Amilcar se recusasse a ser denominado pintor – produzidas nos anos 1990. “Toda a obra do Amilcar tem uma unidade. A exposição mostra a interpenetração das várias técnicas que ele usou”, sintetiza Salles.
AMILCAR DE CASTRO – REPETIÇÃO E SÍNTESE
Evandro Salles, curador da mostra |
Centro Cultural Banco do Brasil (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). Abertura quarta-feira, às 9h. Visitação de quarta a segunda, das 9h às 21h. Entrada franca. Até 27 de janeiro. Informações: (31) 3431-9400.
Corte e dobra
A grande invenção de Amilcar de Castro (1920–2002) foi a chamada técnica de corte e dobra. Evandro Salles explica: “A origem vem de Malevich (pintor abstrato russo que viveu até a metade da década de 1930 e foi mentor do chamado Suprematismo), quando se radicaliza ao máximo a invenção da perspectiva. Ele faz o quadrado preto sob um fundo branco, deixando figura e fundo em sua relação mais extrema. A partir desse momento, o quadro, o plano, vão para o espaço. Para a pintura isso significa que ela não representa mais alguma coisa, ela é um objeto em si, de significação puramente plástica”. No final dos anos 1950, os neoconcretos – Amilcar, como também Franz Weissmann, Lygia Clark e Lygia Pape – retomam essa ideia, cada um dentro de suas próprias questões. “E o Amilcar inventa essa forma (corte e dobra, a partir dos anos 1960) de realizar um problema.”
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