segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Filantropia ainda corre risco‏

Filantropia ainda corre risco 
 
Renato Dolabella - Advogado especialista em terceiro setor e propriedade intelectual

Estado de Minas: 11/11/2013


A Lei 12.873/13, publicada no dia 25/10/13, instituiu o programa de Fortalecimento das Entidades Privadas Filantrópicas e das Entidades sem Fins Lucrativos que Atuam na Área da Saúde e que Participam de Forma Complementar do Sistema Único de Saúde (Prosus). O fundamento dessa norma foi a situação de penúria financeira na qual se encontram várias santas casas no país. Nesse sentido, o programa destina-se a conceder, no âmbito federal, moratória e remissão de dívidas tributárias de entidades que se encontrem em grave condição econômica.

As santas casas são pessoas jurídicas que integram o terceiro setor, que é composto por instituições sem fins lucrativos que executam atividades de interesse social. Usualmente, se constituem por uma reunião de pessoas que desejam atuar nesse campo (associações) ou por meio de um patrimônio destinado por um instituidor, com o objetivo de executar a ação em prol da sociedade (fundações).

Dada a sua importância, a legislação estabelece uma série de mecanismos de incentivo para sua atuação. Um exemplo são as imunidades tributárias estabelecidas na Constituição da República de 1988. As entidades de caráter filantrópico isentas de impostos sobre renda, patrimônio ou serviços, e das contribuições sociais, nos termos dos artigos 150, IV, “c” e 195, parágrafo 5º da CR/88. Por força do artigo 146, II da própria Constituição, eventuais requisitos para gozo de tais benefícios só podem ser exigidos por meio de leis complementares. Como essas normas demandam maior quórum de aprovação pelo Legislativo, essa previsão é uma proteção às entidades filantrópicas, visando evitar que eventual arbítrio governamental possa criar regras ao seu bel-prazer e, assim, tornar impossível o gozo da isenção tributária devido excesso de exigências. Tecnicamente, a lei complementar que hoje estabelece tais requisitos é o Código Tributário Nacional (CTN).

Apesar da previsão constitucional, o que se viu nos últimos anos é uma postura, especialmente por parte do governo federal, no sentido de não respeitar essa isenção tributária e buscar o recolhimento desses tributos de variadas formas.

O exemplo mais comum é a imposição de exigências extraordinárias – que não estão previstas no CTN – para que as entidades filantrópicas possam gozar dos benefícios que lhes foram conferidos pela Constituição. É o caso da Lei de Filantropia (Lei 12.101/09), que estabelece diversos requisitos para que as instituições fiquem dispensadas do pagamento de contribuições sociais. Um dos mais questionados é a exigência de obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas), o que, aliás, tem sido objeto de ações diretas de inconstitucionalidade no Poder Judiciário.

Tais requisitos não são criados por meio de leis complementares, contrariando a Constituição de 1988 e prejudicando as instituições, uma vez que é comum que tal situação acabe impedindo o gozo da isenção tributária. Assim, várias santas casas, que agora são aparentemente socorridas, se encontram em delicada situação financeira porque estão sendo cobradas por tributos que, na verdade, nem sequer deveriam recolher.

A Lei 12.873/13 e o Prosus são implementados em caráter de ajuda emergencial, uma vez que várias entidades hoje se encontram entre a vida e a morte. Porém, é fundamental que essas medidas provoquem um debate mais profundo, especialmente para que, no futuro, o governo não tenha que apresentar soluções urgentes para problemas que ele mesmo criou.

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