ZERO HORA - 18/12/2013
Na
lista de autores a quem sou fiel, encontra-se a norte-americana Lionel
Shriver, que se destacou no mundo literário com seu perturbador
Precisamos Falar sobre Kevin e desde então vem lançando livros que de
água com açúcar não têm nada: a mulher é craque em colocar o dedo nas
nossas feridas – e inclusive nas dela.
Desta vez, a escritora
inspirou-se num caso real. Em 2009, seu irmão faleceu por problemas
decorrentes da obesidade mórbida. E é sobre esse assunto que trata o
recém-lançado Grande Irmão, um convite a dar uma espiadinha num “Big
Brother” literal e incômodo: Shriver mostra como vive alguém que está
bem acima do peso ideal, e as implicações para os que estão ao seu
redor.
No livro, a personagem Pandora é uma empresária de Iowa,
casada e com dois enteados adolescentes, que um dia resolve hospedar seu
irmão Edison, que mora em Nova York e que ela não vê há quatro anos. Ao
buscá-lo no aeroporto, não o reconhece: ele, outrora um pianista de
jazz bem-sucedido e boa-pinta, hoje carrega 175 quilos de sedentarismo e
fracasso.
Em tempos politicamente corretos, ai de quem falar
dos gordos. Mas sendo um assunto de saúde pública, e com a obesidade
aumentando em níveis alarmantes não só nos Estados Unidos, mas em todos
os cantos do planeta, não dá mesmo para fingir que, dos problemas, esse é
o menor. Até porque nada é pequeno quando se trata de obesidade.
As
consequências de se estar muito fora de um padrão saudável são
conhecidas: dificuldade de realizar movimentos banais, preconceito,
riscos de desenvolver doenças cardiovasculares e diabetes, sensação de
estar fora do mercado amoroso e até mesmo profissional. É tudo dissecado
no livro, mas a autora vai além e se dedica a duas outras questões.
Uma
delas é que engordar não está relacionado apenas a comida, e sim a
outras fomes não saciadas. É quando a autora revela as compensações que
algumas pessoas se concedem a fim de sublimar os outros alimentos que a
vida está lhes negando.
A outra questão diz respeito a todos
nós: se sabemos que alguém está fazendo mal a si próprio e não consegue
mudar seus hábitos, até que ponto os que estão de fora podem e devem se
intrometer? É possível socorrer alguém que está visivelmente doente e
que desistiu de se curar? Aliás, por onde começaria essa cura? Por
alguma dieta milagrosa? Ou por uma tomada de consciência mais profunda?
Certamente,
a cura não virá de uma convocação para participar do “Medida Certa”, do
Fantástico. Lionel Shriver, com esse livro, faz um acerto de contas com
o irmão que partiu, tentando dar outro final à sua história particular,
ainda que de forma fictícia. No fim das contas, todas as histórias
poderiam ser diferentes. Uma angústia que permeia toda a obra da autora,
e as nossas vidas também.
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