Estudo aprovado pelo CNPq na área de
medicina integrativa vai ser desenvolvido em Minas, associando o metal à
cavalinha para combater a artrite reumatoide
Celina Aquino
Estado de Minas: 03/02/2014
O
ouro pode voltar a integrar o arsenal terapêutico da artrite
reumatoide. Indicado desde o século 20 para pacientes que desenvolvem a
doença, que leva a uma inflamação das articulações, o metal deixou de
ser usado por causar, a longo prazo, efeitos colaterais. Aprovada no
primeiro edital do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) voltado para a área de medicina integrativa, uma
pesquisa mineira investigará nos próximos dois anos a eficácia e o
impacto de um medicamento com ouro ligado à antroposofia, ciência que
estuda plantas, metais e minerais. A Sociedade Brasileira de
Reumatologia alerta, no entanto, que tratamentos alternativos não devem
substituir os tradicionais.
“O ouro é considerado um modificador
do curso da doença. A inflamação desaparece e o estado geral do paciente
melhora, mas o depósito dele nos tecidos provoca grandes efeitos
colaterais”, esclarece a clínica geral, especialista em antroposofia
aplicada à saúde, Ana Maria de Araújo Rodrigues. Apesar da eficácia, o
uso continuado gera consequências como problemas nos rins e lesão na
medula. Por isso, a pesquisadora decidiu testar uma nova forma de
aproveitar o metal, seguindo o método antroposófico. Ao evaporar, o ouro
perde a ação densa sobre órgãos e tecidos do corpo humano, responsável
pelos efeitos colaterais, mas não perde suas propriedades terapêuticas.
Em casos de artrite reumatoide, ele ajuda por ser anti-inflamatório,
antidepressivo e imunogênico (agente que melhora a imunidade).
No
estudo que será realizado no Ambulatório de Reumatologia da Santa Casa
de Belo Horizonte, o metal será associado pela primeira vez a uma planta
abundante no Brasil: a cavalinha. “Ela é osteogênica, pois regenera os
ossos, anti-inflamatória, cicatrizante e contém silício, o maior
componente dos ossos junto com o cálcio”, destaca a especialista,
acrescentando que tem alcançado bons resultados com as duas substâncias
para tratar a artrite reumatoide. Ana Maria comenta que os medicamentos
antroposóficos, usados há 30 anos no Brasil, são autorizados pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em Belo Horizonte,
eles são disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 1994.
Setenta
e cinco mulheres com grau de inicial a moderado de artrite reumatoide –
que ainda serão recrutadas – usarão por seis meses o medicamento
antroposófico Aurum metallicum/Equisetum arvense. Além de analisar a
eficácia das substâncias, os pesquisadores vão testar uma nova maneira
de administrar a medicação. Ana Maria explica que as voluntárias
receberão as doses por via subcutânea, método menos doloroso e que
permite ao paciente aplicar sozinho, seja na perna ou no braço, duas
vezes por semana. Os outros participantes tomarão o medicamento em
gotas, duas vezes ao dia.
No tratamento convencional da artrite
reumatoide, utilizam-se medicamentos para alívio da dor, entre
analgésicos, corticoides e anti-inflamatórios, e outros de uso contínuo
que previnem lesões nas articulações, em especial o metotrexato, usado
em todo o mundo. Integrante da equipe de pesquisadores que vão analisar a
eficácia do ouro, a reumatologista Adriana Kakehasi pontua que uma
parcela dos pacientes não responde bem ao uso da droga, porque
desenvolve intolerância ou sofre com efeitos colaterais, daí a
necessidade de se buscar alternativas. “É preciso entender que alguns
pacientes sempre vão se beneficiar de alternativas. O ouro não vai ser
pior nem melhor, vai ser mais uma possibilidade”, defende a professora
do Departamento do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenadora do
Ambulatório de Artrite Reumatoide do Hospital das Clínicas.
Adriana
conta que muitos pacientes já chegam ao consultório com o interesse de
associar a medicina alopática à integrativa. “Indico desde atividade
física até acupuntura e homeopatia. Desde que não faça mal à saúde, só
tem a ajudar. Um tratamento trabalha em colaboração com o outro.”
Aliado
do tradicional A coordenadora da Comissão de Artrite Reumatoide da
Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), Licia Maria Henrique da
Mota, revela que 75% dos pacientes recorrem a tratamentos alternativos.
Diante da necessidade de uso contínuo da medicação e da falta de
perspetiva de cura, eles tentam buscar outras soluções. Apesar de
concordar com o uso de terapias que não trazem malefícios, a
reumatologista adianta que não é possível comprovar a eficácia da
maioria delas para tratar a doença.
“Para a quase totalidade não
há evidências de que tragam benefícios. Isso sempre deve ser comunicado
ao médico para que ele possa avaliar com muito cuidado. Mas orientamos
que, em hipótese alguma, o tratamento alternativo deve substituir o
convencional. Ele deve ser um aliado”, opina a médica, que também é
professora de pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de
Brasília (UnB).
Como revela Licia, o cenário do tratamento da
artrite reumatoide no Brasil é um dos mais favoráveis em todo o mundo.
As opções eram limitadas há três décadas, mas hoje os pacientes podem
contar com uma gama de alternativas terapêuticas voltadas para a doença
que são oferecidas pelo SUS. A reumatologista comenta que o metotrexato
apresenta eficácia adequada, o que acabou contribuindo para que
medicações menos seguras, incluindo o ouro, fossem substituídas ao longo
do tempo.
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