Zero Hora - 12/03/2014
A reforma ortográfica é um assunto que muitos já debateram e poucos
aceitaram com resignação, tanto que, em vez de as novas regras se
tornarem obrigatórias no início de 2013, como estava previsto, a
obrigatoriedade foi adiada para 1º/01/2016, a fim de que todos tenham
tempo para se adaptar. Até lá, seguiremos divididos entre obedientes e
rebeldes, cada grupo colocando e retirando os acentos de acordo com seu
grau de inconformismo.
Eu estou no grupo dos obedientes, já que fui criada para ser boa
moça. Mas boas moças também têm seus dias de falta de paciência, e hoje é
um deles, portanto me permitam a reclamação: quem teve a ingrata ideia
de retirar o acento diferencial de para, do verbo parar? Hoje, com a
nova ortografia da língua portuguesa, só analisando o contexto da frase
para distinguir o verbo para da preposição para. Mas o contexto será
mesmo suficiente para eliminar qualquer dúvida? Não concordo, e você
provavelmente também não, se teve dificuldade de entender o que foi
escrito neste parágrafo – não é fácil mesmo fazer a diferenciação numa
leitura rápida.
Para tudo, há uma solução, diria um gramático.
Para tudo, que quero descer, digo eu.
“Quando o trem de Porto Alegre para São Paulo sai atrasado, ele não
para em Curitiba.” Esta frase, lamentavelmente, é fantasiosa, já que não
temos trens de passageiros circulando pelo país, mas é bem realista do
ponto de vista ortográfico. É assim mesmo que deve ser escrita, sem
acento diferencial no “para em Curitiba”. Para desconsolo de todos.
Acompanhe uma amiga minha: ela não para em casa, e assim não
encontra tempo para esperar o moço encarregado de fazer reparos no seu
telhado, que está apinhado de goteiras, a sala fica encharcada, só seca
quando a chuva para. E meu primo? Vive para cima e para baixo, esquece
de fazer as compras para a semana, não para empregada na casa dele. Mas
caduco mesmo está meu cachorro, que quando para de latir, é para alertar
que tem gente estranha parada junto à porta, ou seja, faz o contrário
da maioria dos cães, que late para alertar e só para quando o perigo
passou.
Ficou claro para você?
Para mim a única coisa que está clara é que fazia muito mais sentido
quando escrevíamos que uma hora a chuva pára, que empregada não pára em
casa bagunçada, que cachorro pára de latir quando não vê mais motivo
para alertas e que tudo fica bem confuso quando uma colunista tem seu
dia de rebeldia e não para de reclamar – mesmo a reclamação não servindo
para nada.
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