quinta-feira, 13 de março de 2014

Tereza Cruvinel - Procura-se bombeiro‏

Tereza Cruvinel - Procura-se bombeiro

Depois das consequências parlamentares da crise na coalizão, virão os efeitos nefastos para a articulação eleitoral da presidente que busca a reeleição



Estado de Minas: 13/03/2014


Quando um governo perde uma votação por 267 votos a 28, não há dúvida: enfrentará uma crise de governabilidade se tal situação se prolongar. Para completar a surra aplicada ao governo na véspera, oposição e blocão de aliados rebelados, sob o comando do líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), aprovaram ontem pedidos de explicação a 10 ministros. Quatro foram convocados e seis apenas convidados, além da presidente da Petrobras. Com a crise entre o governo e o PMDB da Câmara aproximando-se do ponto de não retorno, a ala governista do partido clama pela atuação de algum bombeiro, pois o vice-presidente da República, Michel Temer, queimou as pontes com a bancada. Até apontam os dois únicos nomes que poderiam atuar como tal: os ex-presidentes Lula e Sarney. Mas até ontem, eles se mantinham fora da confusão. Lula, bem longe, na Itália. Sarney, mudo, apenas ouvindo os aflitos que o procuraram.

Os últimos fatos vão confirmando o que muitos previram, inclusive esta coluna: muita dor de cabeça para o governo, que não mediu riscos ao responder com o isolamento às hostilidades de Cunha, até então verbais e eletrônicas. Se os radares do governo funcionassem, teriam previsto as consequências. Cunha pode ser tudo o que dizem dele, mas tornou-se um líder não só respeitado e seguido como verdadeiramente apreciado, até fora do seu partido. Uma frase que ele gosta de repetir resume seu estilo: “o que é combinado não é caro”, numa referência à importância de cumprir tratos na política, coisa que o Planalto nem sempre faz. Os radares teriam lembrado também que o PMDB é um ajuntamento de facções, não adiantando acertar com os generais para que eles enquadrem os coronéis. Só com o troco das últimas horas o governo vai se incomodar muito. Para começar, não deve ter maioria na comissão que acompanhará investigações sobre a Petrobras, onde os soldados de Cunha mais os da oposição darão as cartas.

Alguns deputados rebeldes disseram ontem a colegas do PT que não vão se manter em oposição ao governo. Queriam apenas mandar um recado. É do jogo, mas o governo continuará se arriscando se apostar no refluxo espontâneo da rebelião. A situação deteriorou-se muito, não está perdida, mas pode piorar, se a insanidade bilateral continuar. Ontem mesmo o presidenciável tucano Aécio Neves fez acenos sedutores ao PMDB, tomando-lhe as dores em relação ao “autoritarismo e truculência” do governo. Obviamente, depois das consequências parlamentares, virão as políticas, os efeitos nefastos para a articulação eleitoral da presidente que busca a reeleição, caso lhe reste a aliança com meio PMDB, mas oficial, garantindo-lhe o tempo de TV.

Muitos observadores se perguntam de quem foi a decisão de aceitar provocações e partir para a queda de braço com a tropa de Cunha. Se foi a presidente, faltou-lhe aconselhamento político, que deveria ter vindo sobretudo do ministro-chefe do gabinete civil, Aloizio Mercadante. Se partiu dele mesmo, tanto pior, pois o que se esperava é que sua presença no Planalto agregasse mais fluidez às relações com o Congresso.

Em verdade, os erros do governo e do PT na relação com o PMDB começaram lá atrás, quando aceitaram entregar ao aliado as duas casas do Congresso. Prosseguiram quando aceitaram a escolha de Cunha, de conhecida indisposição com o Planalto, para a liderança na Câmara. Agora, enquanto o fogo crepita, a turma do “Volta, Lula” esfrega as mãos.

Orelhas em pé

Dilma mandou oferecer ao PMDB o apoio do PT em seis estados. Esqueceu-se de avisar a outros aliados nos estados mencionados, deixando-os de orelha em pé, à espera da reunião de hoje, entre o presidente do PMDB, Valdir Raupp, e o do PT, Rui Falcão, para discutir alianças. Um deles é o senador Benedito de Lira, do PP, candidato a governador de Alagoas. “Ninguém me ligou ou deu qualquer satisfação. Mas vou esperar por esta reunião”, diz ele, sem esconder a mágoa: “Eu sempre votei no Lula e apoiei o PT, que nunca me apoiou em Alagoas. O Lula pelo menos não pisou em Alagoas na eleição passada”. É o que os aliados esperam de Dilma onde houver palanque duplo.

Custo alto

A crise em curso entre o PT e parte do PMDB, com outras siglas no lugar, já ocorreu em governos anteriores. É inerente ao presidencialismo de coalizão que temos. Sem maioria, o partido do presidente terá sempre que pagar o preço das alianças. Uma outra consequência, diz o incansável pregador da reforma política, deputado Henrique Fontana (PT-RS), é a baixíssima qualidade da produção legislativa. “Toda a energia que foi gasta nas últimas horas para aprovar um requerimento de vingança e convocações de ministros poderia ter sido usada para desencalharmos a regulamentação do FGTS das domésticas ou a cota de 20% para afrodescendentes nos concursos públicos.” Sem falar no Marco Civil da Internet, que mais uma vez foi dormir no espaço.

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