Tereza Cruvinel - Procura-se bombeiro
Depois das consequências parlamentares da
crise na coalizão, virão os efeitos nefastos para a articulação
eleitoral da presidente que busca a reeleição
Estado de Minas: 13/03/2014
Quando um governo
perde uma votação por 267 votos a 28, não há dúvida: enfrentará uma
crise de governabilidade se tal situação se prolongar. Para completar a
surra aplicada ao governo na véspera, oposição e blocão de aliados
rebelados, sob o comando do líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), aprovaram
ontem pedidos de explicação a 10 ministros. Quatro foram convocados e
seis apenas convidados, além da presidente da Petrobras. Com a crise
entre o governo e o PMDB da Câmara aproximando-se do ponto de não
retorno, a ala governista do partido clama pela atuação de algum
bombeiro, pois o vice-presidente da República, Michel Temer, queimou as
pontes com a bancada. Até apontam os dois únicos nomes que poderiam
atuar como tal: os ex-presidentes Lula e Sarney. Mas até ontem, eles se
mantinham fora da confusão. Lula, bem longe, na Itália. Sarney, mudo,
apenas ouvindo os aflitos que o procuraram.
Os últimos fatos vão
confirmando o que muitos previram, inclusive esta coluna: muita dor de
cabeça para o governo, que não mediu riscos ao responder com o
isolamento às hostilidades de Cunha, até então verbais e eletrônicas. Se
os radares do governo funcionassem, teriam previsto as consequências.
Cunha pode ser tudo o que dizem dele, mas tornou-se um líder não só
respeitado e seguido como verdadeiramente apreciado, até fora do seu
partido. Uma frase que ele gosta de repetir resume seu estilo: “o que é
combinado não é caro”, numa referência à importância de cumprir tratos
na política, coisa que o Planalto nem sempre faz. Os radares teriam
lembrado também que o PMDB é um ajuntamento de facções, não adiantando
acertar com os generais para que eles enquadrem os coronéis. Só com o
troco das últimas horas o governo vai se incomodar muito. Para começar,
não deve ter maioria na comissão que acompanhará investigações sobre a
Petrobras, onde os soldados de Cunha mais os da oposição darão as
cartas.
Alguns deputados rebeldes disseram ontem a colegas do PT
que não vão se manter em oposição ao governo. Queriam apenas mandar um
recado. É do jogo, mas o governo continuará se arriscando se apostar no
refluxo espontâneo da rebelião. A situação deteriorou-se muito, não está
perdida, mas pode piorar, se a insanidade bilateral continuar. Ontem
mesmo o presidenciável tucano Aécio Neves fez acenos sedutores ao PMDB,
tomando-lhe as dores em relação ao “autoritarismo e truculência” do
governo. Obviamente, depois das consequências parlamentares, virão as
políticas, os efeitos nefastos para a articulação eleitoral da
presidente que busca a reeleição, caso lhe reste a aliança com meio
PMDB, mas oficial, garantindo-lhe o tempo de TV.
Muitos
observadores se perguntam de quem foi a decisão de aceitar provocações e
partir para a queda de braço com a tropa de Cunha. Se foi a presidente,
faltou-lhe aconselhamento político, que deveria ter vindo sobretudo do
ministro-chefe do gabinete civil, Aloizio Mercadante. Se partiu dele
mesmo, tanto pior, pois o que se esperava é que sua presença no Planalto
agregasse mais fluidez às relações com o Congresso.
Em verdade,
os erros do governo e do PT na relação com o PMDB começaram lá atrás,
quando aceitaram entregar ao aliado as duas casas do Congresso.
Prosseguiram quando aceitaram a escolha de Cunha, de conhecida
indisposição com o Planalto, para a liderança na Câmara. Agora, enquanto
o fogo crepita, a turma do “Volta, Lula” esfrega as mãos.
Orelhas em pé
Dilma
mandou oferecer ao PMDB o apoio do PT em seis estados. Esqueceu-se de
avisar a outros aliados nos estados mencionados, deixando-os de orelha
em pé, à espera da reunião de hoje, entre o presidente do PMDB, Valdir
Raupp, e o do PT, Rui Falcão, para discutir alianças. Um deles é o
senador Benedito de Lira, do PP, candidato a governador de Alagoas.
“Ninguém me ligou ou deu qualquer satisfação. Mas vou esperar por esta
reunião”, diz ele, sem esconder a mágoa: “Eu sempre votei no Lula e
apoiei o PT, que nunca me apoiou em Alagoas. O Lula pelo menos não pisou
em Alagoas na eleição passada”. É o que os aliados esperam de Dilma
onde houver palanque duplo.
Custo alto
A
crise em curso entre o PT e parte do PMDB, com outras siglas no lugar,
já ocorreu em governos anteriores. É inerente ao presidencialismo de
coalizão que temos. Sem maioria, o partido do presidente terá sempre que
pagar o preço das alianças. Uma outra consequência, diz o incansável
pregador da reforma política, deputado Henrique Fontana (PT-RS), é a
baixíssima qualidade da produção legislativa. “Toda a energia que foi
gasta nas últimas horas para aprovar um requerimento de vingança e
convocações de ministros poderia ter sido usada para desencalharmos a
regulamentação do FGTS das domésticas ou a cota de 20% para
afrodescendentes nos concursos públicos.” Sem falar no Marco Civil da
Internet, que mais uma vez foi dormir no espaço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário