quarta-feira, 26 de março de 2014

O abortamento de repetição - Marco Melo

Estado de Minas: 26/03/2014



Os três primeiros meses da gestação, normalmente, são os mais delicados. Uma preocupação constante nesse período é o risco de abortamento. Cerca de 15% a 25% das gestações evoluem para a interrupção espontânea, antes de completar 22 semanas. Uma parte das mulheres ainda convive com outra situação ainda mais angustiante: abortamento por diversas vezes. Recentemente, a Sociedade Americana de Reprodução Assistida divulgou novas condutas médicas para serem adotadas em casos conhecidos como abortamento de repetição, visando orientar especialistas na investigação do problema.

A principal causa de perdas gestacionais são as alterações cromossômicas dos embriões que não são compatíveis com a evolução natural da gestação, ou seja, não geram vida. O abortamento de repetição pode ser definido como a ocorrência de três ou mais perdas gestacionais, antes de 20 semanas consecutivas. A incidência é de 1% a 2%, entre as mulheres na idade fértil. Entretanto, com duas perdas consecutivas, a procura por um especialista já é indicada para iniciar uma investigação para descobrir a causa.

Os dados interessantes são as probabilidades envolvidas no problema. Depois da ocorrência de dois ou três abortamentos, a paciente apresenta 30% de chance de ocorrência de uma nova perda gestacional. Cerca de 85% dos casos ficam sem diagnóstico na investigação das possíveis causas. Se isso é desalentador, pelo menos pode-se dizer que há 70% de chance de uma nova gestação evoluir bem nos casos sem causa definida. Nós, médicos, acompanhamos essa realidade, e sabemos o quão angustiante é esse quadro clínico para o casal. As incertezas são muitas e existe uma grande divergência entre os especialistas sobre quais exames solicitar e como tratar a doença.

A grande novidade, gerada pelos estudos mais recentes sobre o abortamento de repetição, está nas possíveis origens. Baseado em trabalhos científicos, hoje, consideram-se apenas duas doenças, sendo uma delas a de causas genéticas, que são alterações genéticas e cromossômicas dos embriões, e que representam até 68% dos casos. A outra é a síndrome anticorpo antifosfolípide, que aumenta a probabilidade de formação de trombose e coágulos na circulação da placenta, reduzindo a chegada de sangue ao feto, provocando sua morte. O problema representa entre 10% e 15% das causas de abortamento de repetição.

Outros problemas que podem estar relacionados são as alterações do útero, como miomas; trombofilias congênitas, propensão a desenvolver trombose por anomalia no sistema de coagulação; problemas endócrinos, infecciosos e autoimunes, pouco prováveis.

O estudo gerou um impacto grande na rotina do médico especialista que trabalha com essa situação. Antes, solicitavam-se numerosos exames e prescrevia-se medicação, sem a comprovação de efeitos benéficos à paciente, fatos que encareciam os tratamentos e expunham as pacientes a medicações desnecessárias. Por meio dessa nova orientação, será possível direcionar melhor os exames para diagnóstico e avaliação de tratamento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário