Pesquisas revelam que a maioria dos brasileiros concorda em considerar crime a discriminação contra homossexuais
Gilda Paoliello
Psiquiatra, coautora do livro As homossexualidades na psicanálise
Estado de Minas: 01/05/2014
Se revisarmos a
história da homofobia, veremos que a homossexualidade surgiu como pecado
no nascimento do cristianismo, passando, logo depois, a ser considerada
crime e, no século 19, patologizada como doença. Essas heranças de
intolerância são mantidas culturalmente. Mas não podemos deixar de
considerar a homofobia subjetiva, enraizada no medo que uma pessoa
demonstra de ser identificada como homossexual.
Esse componente
da homofobia pode estar relacionado à insegurança sobre a própria
identidade sexual, e a oposição violenta ao homossexual seria um meio de
reafirmar a própria identidade para ganhar uma suposta aprovação
social. Assim, a pessoa inicia um processo de rejeição projetada no
homossexual para encobrir seu próprio desejo inaceitável.
O
Brasil foi um dos primeiros países no mundo a descriminalizar a
homossexualidade, por um ato de dom Pedro II, em 1830. Há evidências
históricas de que a homossexualidade era comum e aceita entre os índios,
antes da chegada dos europeus. Contudo, com a catequização dos índios e
a oficialização da religião católica, que considera ser o ato sexual
destinado apenas à procriação, o preconceito arraigou-se na sociedade
brasileira.
Atualmente, com a disseminação da religião
evangélica, o preconceito se ampliou, e o Brasil acompanha a tendência
mundial à intolerância. Entretanto, seria injusto computar a violência
discriminatória como consequência apenas de preconceitos religiosos.
Freud, em O mal estar na civilização, nos fala que a civilização tem que
utilizar esforços supremos a fim de estabelecer limites para os
instintos agressivos do homem e manter suas manifestações sob controle
por formações psíquicas reativas. Daí o mandamento ideal de amar ao
próximo como a si mesmo, mandamento que é realmente justificado pelo
fato de nada mais ir tão fortemente contra a natureza original do homem.
Portanto,
temos que concluir que a discriminação é parte da natureza humana e,
portanto, necessita ser barrada. O diferente incomoda. Assim, à medida
que os homossexuais conquistam e ampliam seus direitos, os movimentos
homofóbicos crescem como reação, pois essa facção se sente mais
ameaçada. O Brasil é, hoje, um dos países mais homofóbicos do mundo e
onde ocorre o maior número de violência contra homossexuais.
Dentro
dessa realidade, qual a barra eficaz contra a homofobia? Acredito ser
pela educação que mudanças culturais acontecem, ampliando-se a
informação e a educação sexual de forma natural. Em vários países da
Europa, como por exemplo a Inglaterra, as crianças são apresentadas,
desde bem cedo, à questão das diferenças sexuais como um direito de cada
um. A homossexualidade é apresentada apenas como uma das formas de
expressão da sexualidade.
Mesmo no meio médico, há muito
desconhecimento sobre a sexualidade humana. Perguntem a meia dúzia deles
se a homossexualidade é doença. Garanto que mais de 50% não saberá
responder. Em 17 de maio comemora-se o Dia Mundial Contra a Homofobia,
pois nessa data, em 1992, a Organização Mundial de Saúde retirou de seu
Código Internacional de Doenças o diagnóstico de homossexualidade, por
não encontrar embasamento médico que sustentasse tal posição.
Vemos
que o desconhecimento sobre o tema conduz ao preconceito. Entretanto,
junto às medidas educativas, há necessidade de imediatas providências
frenadoras desses atos discriminatórios de violência. Desde 2006,
tramita na Comissão de Direitos Humanos do Senado um projeto de lei que
tem por objetivo criminalizar a homofobia no país. Grandes juristas já
se posicionaram, considerando urgentíssima uma legislação nesse sentido,
pois a homofobia se apresenta como uma verdadeira “epidemia nacional”.
Segundo
pesquisa conduzida pelo DataSenado, em 2008, com 1.120 pessoas de todas
as cinco regiões do Brasil, 70% dos entrevistados posicionaram-se a
favor da criminalização da discriminação contra homossexuais no país.
Mesmo o corte por religião mostra uma aprovação de 54% entre os
evangélicos, 70% entre os católicos e adeptos de outras religiões e 79%
dos ateus. Por que, então, a lei não avança? A quem não interessa?
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