domingo, 12 de outubro de 2014

Novos tempos - Eduardo Almeida Reis

Poucos anos depois de cometer duplo homicídio, Jossiel, que era e continua sendo bandido incurável, volta às ruas


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 12/10/2014


No Banco do Brasil, um dos nossos melhores colegas de trabalho, iniciais J. C. de S. Filho, mulato, casado, duas filhas, atendia pelo apelido carinhoso de Zé Macaco. Hoje o apelido não seria politicamente correto, além de ser crime de racismo. Outro colega, iniciais A. C. F., homossexual exuberante, sempre requisitado para taquigrafar as reuniões da Excelentíssima Diretoria, era o Princesinha, hoje crime de homofobia. Presidente e diretores formavam a Excelentíssima Diretoria, que teve alguns pilantras, é certo, mas ainda não era o valhacouto de ladrões dos governos petistas.

Num país grande e bobo, em que a política nada tem de correta, falar de politicamente correto é um contrassenso. Talvez fosse melhor dizer socialmente correto, para contrastar com o incorreto, mas o mote desta nossa conversa é outro. Ontem à noite, diante do televisor que exibia pela milésima vez aquela imagem do Estado Islâmico, em que um cavalheiro de sotaque britânico se prepara para decapitar um jornalista ocidental, ocorreu-me a seguinte pergunta: que é pior, um médico brasileiro de boa clínica, que se estrutura para dar sumiço num filho de 11 anos ajudado pela mulher, madrasta do guri, e por uma amiga do casal, assistente social, ou o cavalheiro de sotaque britânico, que, filmado em cores, decapita um cavalheiro que nunca lhe fez mal?

Não posso falar do Estado Islâmico, porque seria socialmente incorreto, configurando quadro de islamofobia, palavra que aprendi ontem à noite através do mesmíssimo televisor LED de 47 polegadas. Por isso, deixo a critério do leitor a avaliação dos fatos relatados e lhe peço o favor de me explicar o papel de uma assistente social no assassinato de um menino de 11 anos, ainda que motivada pela promessa de ganhar 20 mil reais. Em favor do muçulmano de sotaque britânico, parece que decapita de graça.

Escolha

Lanche programado para as sete da noite coincidindo com o remédio do final da tarde, comprimido que custa R$ 10. A julgar pelo preço, deve ser ótimo. Computador interrompido antes das seis, há dois programas em vista: o jornal da GloboNews, edição das 18 horas, ou o programa da Band. Não simpatizo com a jornalista da GloboNews nem com o doutor José Luiz Datena, mesmo sabendo que em julho de 2012 foi eleito “um dos 100 maiores brasileiros de todos os tempos” em concurso realizado pelo SBT com a BBC de Londres. Repito: de todos os tempos!

Entre o grande brasileiro, cujo programa é focado nos crimes cometidos no país que o elegeu, e a ruiva que nunca foi de minha particular afeição, opto pela ruiva que deve estar de folga, pois o programa é apresentado pelo xará Eduardo Grillo. E aí, senhoras e senhores do egrégio conselho, vejo uma série de crimes de fazer inveja ao programa do maior brasileiro de todos os tempos.

A lista começa com o caseiro Jossiel Conceição dos Santos, que matou em 2003 o casal norte-americano Stahelli, residente havia três meses num condomínio da Barra, deixando quatro filhos menores já recambiados para os EUA. Condenado a 25 anos de reclusão, Jossiel cumpriu pequena parte da pena e vem de ser autorizado pela Justiça, baseada em parecer de psicólogo, psiquiatra e assistente social, para passar ao regime semi-aberto, antes da liberdade condicional. O brasileiro matou o casal a golpes de pé de cabra, alavanca metálica que tem a extremidade fendida como um pé de cabra e serve para arrancar pregos e abrir juntas de caixotaria; arranca-pregos. Na linguagem de delinquentes, instrumento usado para arrombar portas.

Assustado com o fato de o duplo homicida, um ano antes do último parecer, ter sido considerado inapto para voltar ao seio da sociedade, Eduardo Grillo ouviu a psicóloga Márcia Badaró, com larga prática em pareceres do gênero. Perguntou à profissional se em 12 meses é possível passar de inapto para capaz, ouviu explicação demorada, não entendeu absolutamente nada, como também não entendi, agradeceu a explicação e passou ao outro crime analisado na mesma edição das 18 horas. Fugi da sala, antecipei o lanche da tarde, tomei o remédio, repassei os últimos cadernos de um dos jornais que assino e concluí: está ficando difícil. Poucos anos depois de cometer duplo homicídio, Jossiel, que era e continua sendo bandido incurável, volta às ruas: leis de m., país de m.

 O mundo é uma bola


12 de outubro de 1492: Cristóvão Colombo chega à Ilha de São Salvador, nas Bahamas, convencido de que atingira a Índia por falta de um GPS em sua caravela. Em 1807, Napoleão Bonaparte dá ordem a Junot para entrar em Espanha, o que é mais chique do que entrar na Espanha. Em 1809, tentativa de assassinato do mesmíssimo Napoleão no Palácio de Schönbrunn, em Viena. No dia 12 de outubro, mas em 1808, o Banco do Brasil era fundado pelo regente dom João, mais tarde João VI, de Portugal. No BB do final do século XX e do início do século XXI pontificaria o petista Pizzolato, que rima com peculato. Depois dele, conseguiram nomear alguns ainda piores.

Ruminanças

“As mulheres são extremas: são melhores ou piores que os homens” (La Bruyère, 1645-1696). 

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