sábado, 31 de janeiro de 2015

Inhotim vira série de TV

Produtora mineira prepara 13 episódios sobre o museu e seu acervo para o canal Curta!, que terá também documentário a respeito de Triz, coreografia de 2013 do Grupo Corpo

Ana Clara Brant
Estado de Minas: 31/01/2015


Detalhe dos jardins de Inhotim. Museu mineiro será tema de série com 13 episódios para TV paga (Rossana Magri/Inhotim/Divulgação)
Detalhe dos jardins de Inhotim. Museu mineiro será tema de série com 13 episódios para TV paga

Dois patrimônios artísticos mineiros, mas que pertencem ao mundo, estão na mira da produtora cinematográfica Camisa Listrada. O Instituto Inhotim, sede de um dos mais importantes acervos de arte contemporânea do mundo e considerado o maior centro de arte ao ar livre da América Latina, vai ganhar uma série de TV.

A série irá focar no espaço e em seu acervo, localizado em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, incluindo registro das obras expostas nos pavilhões, visitas aos ateliês dos artistas; entrevistas com pesquisadores, curadores, colecionadores, astrônomos, botânicos, físicos e matemáticos; trechos de filmes de acervos particulares de artistas.

“Acabamos de ser contemplados pelo Fundo Setorial do Audiovisual, então está bem no início mesmo e por isso o projeto ainda está em desenvolvimento. Já temos uma parceria com o canal Curta! Eles queriam alguma coisa sobre artes plásticas e Inhotim. E como somos uma produtora de Minas, a coisa fluiu”, afirma André Carreira, produtor da Camisa Listrada.

A ideia é que a série, que tem nome provisório de Inhotim: o valor das coisas, tenha 13 episódios, mostrando a trajetória de 13 artistas cuja obra está no museu mineiro. A direção será do carioca Pedro Urano, que também ficará responsável pela fotografia.

Carreira diz que a intenção é dividir cada episódio em dois blocos. O primeiro dedicado à obra do artista e à sua relação com Inhotim e o segundo enfocando a processo de criação e a biografia do artista.

A previsão é de que a série seja rodada no segundo semestre deste ano e vá ao ar no começo do ano que vem.

GRUPO CORPO
Outro projeto da Camisa Listrada em andamento é Por um triz, documentário que acompanha o processo criativo do mais recente espetáculo do Grupo Corpo, Triz, de 2013.

Durante dois meses, uma equipe da produtora acompanhou diariamente na sede da companhia de dança mineira, no Bairro Mangabeiras, os ensaios, a criação dos figurinos e a interação da trilha sonora com a coreografia.

“Virou uma espécie de reality, porque a gente ficou tão imersa lá, era uma coisa tão cotidiana que criamos uma certa intimidade. A nossa equipe passava até meio despercebida”, diz Carreira.

O nome do documentário, que também será exibido no Curta!, tem tudo a ver com o processo pelo qual o coreógrafo do Corpo, Rodrigo Pederneiras, vivenciou na época.

Quando começou a desenvolver o balé, ele se recuperava de uma cirurgia de rompimento do menisco do joelho esquerdo e, com a perna imobilizada, teve dificuldades de demonstrar com o próprio corpo os movimentos que queria transmitir.

“Foi um espetáculo que quase não aconteceu. A gente mostra todas essas dificuldades, essas limitações, inclusive físicas”, afirma o produtor.

Pesquisas - Eduardo Almeida Reis

O aumento da pornografia gratuita é responsável pela diminuição do número de casamentos


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 31/01/2015




Suponho que o Instituto Alemão para o Estudo do Trabalho seja sério. Por isso, perco o meu tempo e tomo o do leitor com as pesquisas daquele instituto, segundo as quais o aumento da pornografia gratuita é responsável pela diminuição do número de casamentos. Os cientistas estudaram as tendências do número de casamentos e a proliferação dos filmes pornô, concluindo que o aumento da disponibilidade e o custo reduzido da pornografia pela internet tiveram “efeito casual”, fazendo que as pessoas optem por não subir ao altar.

“Tradicionalmente, uma das razões para o casamento é a satisfação sexual. Mas, com o crescimento das opções de satisfação sexual fora do casamento, a necessidade está diminuindo”, concluíram os pesquisadores, que perceberam uma rápida ascensão da pornografia internética no mesmo período em que o casamento perdeu popularidade (sic). A internet não somente barateou a pornografia como o custo social de consumi-la, dizem ainda os pesquisadores. Isso porque as pessoas teriam menos riscos de ser estigmatizadas por acessar um website do que comprando revistas pornôs numa loja.

A pesquisa também descobriu que os consumidores de pornografia frequentam menos as igrejas e têm mais oportunidades de trair os parceiros e de pagar pelo sexo. Um estudo anterior também havia identificado no aumento da pornografia o declínio na ocorrência de estupros.

Homessa! Fiquei maluco ou entendi a pesquisa? Quer dizer que os e-mails pornográficos, que os amigos me mandam, evitam meu próximo casamento e me poupam do desejo de sair por aí estuprando pinguins e deputadas petistas? Quem foi que disse que desejo estuprar alguém? O fenômeno filme pornô exige estudo mais sério do pessoal da área psi. Existe uma indústria de cinema pornô e a maioria dos filmes é exibida sem anúncios na tevê a cabo.

Um amigo tem três canais em seu televisor exibindo filmes espantosos, que me mostrou quando o visitei para tomar um uísque e fumar um charuto. Anotei os nomes. Um canal Playboy TV, que faz propaganda da revista, mais um canal Sexy Hot exibindo filmes dia e noite, sem propaganda, muitos deles falados em português e um canal For Man, que suponho significar “para homem” e não tem uma só mulher trabalhando: só homem com homem, homem com travesti e travesti com travesti.

Se isso contribui para o declínio do casamento à moda antiga, de homem com mulher, confesso que não entendo mais nada. E tiro meu time de campo, respeitando embora os pesquisadores do Instituto Alemão para o Estudo do Trabalho.

Álcool

Na véspera do Natal, a lindíssima e inteligentíssima Leila Sterenberg (Leila Braga Sterenberg, Rio de Janeiro, 17 de setembro de 1971) entrevistou um neurocientista sobre os alcoóis e o álcool natalino. Um dos aspectos citados pelo cientista pareceu-me interessante. Começou dizendo que o álcool é droga legal e faz parte de nossa cultura: bidu. Mas chamou a atenção do telespectador para a percentagem de álcool por volume, lembrando que a cerveja tem 5% e o uísque, 40%. Todos sabemos que há cervejas com 8%, 12% e mais álcool por volume, enquanto a maioria das nossas populares tem menos que 5%.

Tomemos o número do cientista admitindo que o bom chope brasileiro tenha 5% de álcool por volume. Uma tulipa de 300ml comporta 240ml em média. Em números redondos, quatro tulipas somam um litro de chope. Qualquer bebedor razoável toma 20 tulipas de uma assentada, portanto cinco litros de chope. A 5% de álcool por volume, são 250ml de álcool puro. Se um litro de uísque tem 400ml de álcool, com os tais chopinhos você bebe mais que meio litro de uísque de uma assentada.

Minhas cervejas prediletas, fabricadas na Bélgica, têm 11% ou 12% de álcool por volume. Sempre que as entornei com entusiasmo cervejeiro conheci pileques divertidíssimos. Não raras vezes, nas noites das sextas-feiras, honrado pelos telefonemas do imenso Mário Palmério dizendo que na manhã seguinte viria a Juiz de Fora, em seu avião, para conversarmos sobre gados e fazendas.

O mundo é uma bola

31 de janeiro de 1542: don Álvar Nuñez Cabeza de Vaca descobre as Cataratas de Iguaçu. Em 1876, o governo dos Estados Unidos obriga os Native Americans a se mudarem para as reservas demarcadas. Em 1917, os cientistas alemães Otto Hahn e Lise Meitner descobrem o protactínio, elemento radioativo, símbolo atômico Pa, da família dos actinídeos.

Em 1918, repito, 1918, a Alemanha realiza um ataque aéreo a Paris despejando 14 mil bombas.

Em 1929, depois que Lenin morreu, Leon Trótski foi expulso da Rússia na luta pelo poder soviético.

Em 1943, cercadas em Stalingrado, as tropas alemãs se rendem ao exército soviético.

Em 1946, constituição da Iugoslávia integrada por seis repúblicas: Bósnia e Herzegovina, Croácia, Eslovênia, Macedônia, Montenegro e Sérvia: deu no que deu.

Em 1951, posse de Getúlio Vargas presidente eleito do Brasil: deu no que deu.

Em 1956, posse do presidente Juscelino Kubitschek.

Em 1961, posse do presidente Jânio Quadros: deu no que deu.

Em 1990, inaugurado em Moscou o primeiro McDonald’s: deu no que deu.

Hoje é o Dia do Engenheiro Ambiental e o Dia Internacional do Mágico.


Ruminanças

“Mágica é a arte de converter superstições em moedas” (Ambroise Bierce, 1842-1914). 

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Lição - Eduardo Almeida Reis

Rastreou o marido com aplicativo de celular, encontrou-o nuzinho, fazendo amor com a cunhada dentro do carro, expulsou-os do veículo, deixando-os pelados no meio da rua


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 30/01/2015




A chinesa Ting Su, de 29 anos, desconfiou que o marido Cheng Su, de 30, mantinha um romance com sua irmã gêmea, obviamente de 29 anos. Rastreou o marido com um aplicativo de celular, encontrou-o nuzinho fazendo amor com a cunhada dentro do carro, expulsou-os do veículo, pegou o volante e foi-se embora deixando-os pelados no meio de uma rua da cidade de Suzhou, que, como sabe o leitor, foi fundada no século V, tem mais de 6 milhões de habitantes, fica na província de Jiangsu, às margens do Grande Canal e também é conhecida como Sucheu ou Soochow. Escusado é dizer que os dois pelados foram fotografados pelos celulares de milhares de chineses e a notícia saiu no The Mirror.

Ting Su não foi original. Em Diamantina, há mais de 100 anos, um respeitado cidadão míope namorava a cunhadinha sempre que sua mulher, muito religiosa, estava na missa das 7 da matina. No dia em que a mulher se esqueceu de levar o véu, sem o qual não assistia à missa, e voltou para apanhar o tecido leve e fino usado sobre a cabeça, surpreendeu a irmã com o maridão na cama. Pegando os óculos de grossas lentes na mesinha de cabeceira, o digno diamantinense olhou para a cunhada e para a mulher, antes de dizer: “Por Deus que eu pensei que fosse você”. Claro que a esposa amantíssima acreditou no marido e expulsou a irmã de casa.

Escuta

“Você não conversa comigo... Você só me quer para fazer amor... Você devia comprar uma boneca inflamável”. “É inflável, sua boba!”, respondeu o idoso namorado, empre às voltas com as altas cousas do espírito, sem tempo de folga para ouvir as tolices da namoradinha neurótica, bafo de gim com campari, sovaquinhos graciosamente peludos, genitália idem.

Falta de escuta do parceiro é reclamação frequente das mulheres e vem de ser comprovada numa pesquisa séria. Estudo encomendado pela Ladbrokes mostrou que os homens se distraem facilmente das conversas, a não ser que estejam falando com um amigo sobre esportes ou sexo, informa o Daily Mail.

Em média, os homens se “desligam” da conversa com uma parceira em seis minutos. Entretanto, se estão ouvindo um amigo sobre esportes ou vida sexual, a atenção dura até 15 minutos.
As mulheres fazem o mesmo: são ouvintes atentas quando estão conversando com outras mulheres, atenção que não têm quando conversam com homens. Durante o papo com as amigas, o assunto predileto da maioria (55%) é sobre relacionamentos.

Entre os homens, sexo, filmes e esportes dominam as conversas. A pesquisa relevou que a pior hora para conseguir a atenção de um homem é quando ele está assistindo a algum esporte ou trocando os canais da TV, bem como quando está usando aplicativos no celular.

Alcoolismo


Ando à procura de um psiquiatra, psicólogo, psicanalista, neurocientista ou paleoantropólogo que explique sem ambages, isto é, sem rodeios, evasivas ou subterfúgios, minha relação com o álcool. Bebi cavalarmente durante séculos e parei há pouco mais de três anos sem ter parado, porque bebo de vez em quando, não tenho ressacas e gosto de um uisquinho, um vinho, uma boa cerveja.

Não creio fazer parte daqueles 12% que têm dependência alcoólica e vivem na sarjeta ou entram para o AA lutando dia a dia contra o vício. Bebi muito sem deixar de cumprir minhas obrigações, evitando o álcool quando sabia que iria dirigir. Resultado: mais de meio século de volante sem um arranhão. Alcoolizado fiz, é certo, os piores papéis: todo mundo faz. No dia seguinte, a gente se arrepende e vai em frente.

O motivo de ter parado, ou quase, continua sendo um mistério. Escrevo três dias depois de ter bebido algumas doses de Dewar’s 12 num jantar em família. Desceram bem, noite bem dormida, manhã seguinte ok. Presente de um leitor ainda em BH, vejo no Google: This 12 year old was created by the master blender at Dewars, Tom Aitken.
A Whisky Magazine, nº 68, de dezembro de 2007, disse que Aitken tinha 40 anos de experiência na indústria da bebida com gim, cachaça e licores de café. O repórter, então, fala de seu encontro com ele quando o entrevistou em Glasgow, Escócia. Aitken é craque, ama seu trabalho e o Dewar’s 12, que andava sendo vendido no Brasil por R$ 105 antes da alta do dólar, desce bem à beça.

O mundo é uma bola

30 de janeiro de 1592: eleição do papa Clemente VIII, nascido Ippolito Aldobrandini. Foi o responsável pela introdução do café na Europa, bebida até então considerada muçulmana. Em 1649, o rei da Inglaterra, Carlos I, foi executado. Ontem ou anteontem, se estou lembrado, falei da morte de Edward II pela introdução de um chifre oco em seu fiofó, através do qual passaram um ferro em brasa. Edward era bissexual, tinha namorados, mas Carlos I foi capturado, julgado e condenado por não admitir a monarquia constitucional. Foi sucedido por seu filho Carlos II.

Em 1933, o presidente Paul von Hindenburg nomeia Adolf Hitler chanceler da Alemanha. Em 1938, emancipação política do município de Governador Valadares, estado de Minas Gerais, terra natal de Eike Fuhrken Batista. Hoje é o Dia do Portuário, da Saudade e da Não Violência.

Ruminanças

“Saudade é ser, depois de ter” (Guimarães Rosa, 1908-1967). 

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Ministérios - Eduardo Almeida Reis

 Qualquer pessoa medianamente informada fica horrorizada com o número de ministérios de um país grande e bobo


Eduardo Almeida Reis
Publicação: 29/01/2015 04:00


De Sarajevo a Sófia são 570 quilômetros de estrada, enquanto de BH a Brasília temos 734 quilômetros de buracos. Por aí, dá para notar que a capital da Bósnia e Herzegovina é muito próxima da capital da Bulgária, o que explica um fenômeno só encontrado no Brasil e na Bósnia e Herzegovina, república federal dos Bálcãs.

Qualquer pessoa medianamente informada fica horrorizada com o número de ministérios de um país grande e bobo, que não se pejou de inventar o ministério da Pesca e o confiou a um cavalheiro que não sabe distinguir um pacu de um lambari, ocupado que sempre esteve pescando fiéis evangélicos para sustentá-lo e aos seus.

A Bulgária entra neste suelto pelas bulgarices que o leitor não ignora, e a sua proximidade com a Bósnia, país com menos de quatro milhões de habitantes, justifica os 350 (trezentos e cinquenta!) ministros bósnios, como contou ao Globo o jornalista e escritor Velibor Colic, refugiado bósnio que vive na França.

Colic disse que a Bósnia é dividida em três partes: a sérvia, a croata e a muçulmana. Cada uma tem o seu próprio governo e os seus ministros. Além disso, a União Europeia impõe um governo federal, que também tem os seus ministros. Resumindo, são 350 ministros para menos de quatro milhões de habitantes.

Notícia

Reza o jornalismo supimpa que é importante ouvir a outra parte, mas no telejornalismo petrolífero a providência é muito chata. Em sua delação premiada, o engenheiro Paulo Roberto Costa, o Paulinho do Lula, afirma que o ministro Fulano, o governador Beltrano, o senador Sicrano receberam milhões de dólares. Pronto: delatou. Ouvir a outra parte dá trabalho, demora e não convence, porque é claro, como também é lógico e evidente, que o ministro, o governador e o senador vão dizer que nunca receberam um ceitil, moeda portuguesa do tempo de D. João I (1385-1433). Toma tempo da produção do noticiário e do apresentador da tevê, bem como do telespectador, sem que a gente acredite no ministro, no governador, no senador.

Vejo no Houaiss que o substantivo masculino petrolato, na rubrica química, significa mistura pastosa de hidrocarbonetos derivados do petróleo, usada em cosméticos, em medicina etc. Na rubrica criminologia, petrolato passou a significar mistura de petróleo com peculato usada pelos governos petistas. E a turma continua solta.

O mundo é uma bola

A Wikipédia começa informando que hoje é o 29º dia do ano, fato que os leitores e o seu philosopho sabíamos sem consultar o Google. Isto posto, deixem-me dizer que neste dia, mas em 1712, iniciaram-se as negociações do Tratado de Utrech, que poria fim à guerra da sucessão espanhola.

Em 1825, é fundada a Faculdade de Medicina do Porto, onde, como vimos noutras edições, foi doutorada uma médica defendendo tese sobre as mãos dos portugueses.

Em 1886, Karl Benz inventa o primeiro motor de automóvel movido a gasolina. Dia desses, recebi vídeo sobre um automóvel que se dobra, invenção do MIT, que muitos dizem ser melhor do que Harvard. Hoje em Portugal é o Dia da Incontinência Urinária.

Ruminanças

“Se o vaso não está limpo, tudo que nele derramares se azeda” (Horácio, 65-8 a.C.).

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

MARTHA MEDEIROS - Aos remos

Zero Hora 28/01/2015

Não sou só eu que tenho a impressão de que estamos sentados sobre um barril de pólvora. É só dar uma espiada nos comentários deixados nas redes sociais, em conversas de bar, nas trocas de mensagens por WhatsApp, nos telejornais. O Brasil descarrilou, e agora?
Apagões, crise hídrica, obras superfaturadas que não terminam, escândalos de corrupção em todas as esferas, ausência crônica de segurança, aumento de impostos, saúde e educação vergonhosas, desgoverno evidente e início de uma recessão de que não se conhece ainda as consequências. Uma amiga pergunta no Facebook: “Todo mundo já decidiu para onde vai se mudar?”.
Ah, se fosse fácil assim. Fazer as malas e se mandar para algum lugar em que se pudesse caminhar pelas ruas sem medo, em que os policiais fossem bem treinados, em que houvesse metrô e muitas ciclovias, em que não se racionasse nada, a luz não caísse no meio da tarde e os tributos pagos revertessem em uma vida digna. É claro que qualquer nação tem problemas, mas o Brasil abusou da prerrogativa.
Eu adoraria fechar minhas contas e zarpar. Tenho condições de que raríssimas pessoas dispõem para fazer isso, a começar pelo meu trabalho, que não depende de nada a não ser de um laptop. Ainda assim, é muito difícil deixar amigos e familiares. E é frustrante desistir. Quem deserta está colocando um ponto final na confiança que um dia teve.
Por ora, ficarei, mas me pergunto: como ajudar este raio de país? De nada adianta declarar guerra à ponderação e incitar a violência. Em termos coletivos, o melhor caminho continua a ser a defesa da imprensa livre e sair todos às ruas de forma pacífica, como fizeram recentemente os parisienses por ocasião do atentado à Charlie Hebdo, como fizeram os argentinos por ocasião da morte do promotor Alberto Nisman, como fizemos nós mesmos em 2013 – é o jeito de exercer pressão e mostrar que nosso povo não é tão mole quanto parece.
Detalhe: de cara limpa, sem máscaras, sem queimar ônibus e destruir agências bancárias. Depredações são prova de fraqueza, não de força.
Nossa indignação coletiva precisa ser fotografada, filmada e difundida para o Planalto e o planeta, sem deixarmos de lado as atitudes particulares, que são fundamentais. É hora de agir com total responsabilidade dentro de casa, apagando as luzes, fechando as torneiras, economizando os gastos do prédio, do condomínio, da empresa.

Essa corja política não merece nossos sacrifícios, eu sei, mas não podemos continuar esperando que eles resolvam hoje o que nunca os preocupou antes. Temos que tomar conta do Brasil, assumir este país que deu profundamente errado, mas que é nosso. Porque até aqui, perdemos de lavada. Eles lavavam dinheiro e nós lavávamos as mãos. Deu no que deu: escassez de água e de futuro.

Maria Sklodowska - Eduardo Almeida Reis

Também não preciso de um Nobel de sexologia para saber que as mulheres normais, de 39 e mais anos, continuam gostando das coisas boas da vida


Eduardo Almeida Reis
Estado de MInas: 28/01/2015 



Nascida em Varsóvia, Polônia, em 1867, falecida em Passy, França, em 1934, Maria Sklodowska foi a única pessoa, até hoje, a receber dois Prêmios Nobel na área científica: de física, em 1903, pelas descobertas sobre a radioatividade e de química, em 1911, pela descoberta dos elementos químicos rádio e polônio. Recebeu-os com o nome de Marie Curie, como passou a chamar-se depois de se casar com o físico francês Pierre Curie (1859-1906), laureado junto com ela com o Nobel de 1903. Tiveram duas filhas. Uma delas, Irene Joliot-Curie, premiada com o Nobel da química em 1935.

Se Pierre morreu em 1906 e Marie em 1934, não preciso de um Nobel de matemática para calcular que ficou viúva durante 28 anos, a partir dos 39 aninhos. Também não preciso de um Nobel de sexologia para saber que as mulheres normais, de 39 e mais anos, continuam gostando das coisas boas da vida.

Até aqui temos uma história incomum e bonita. Marie sofreu o diabo para conseguir estudar. Pierre, ao que parece, tinha boa situação, nunca frequentou escolas. Estudava em casa e, aos 20 anos, já era doutor. Casaram-se, ela ganhou dois Prêmios Nobel na área de ciências, ele só ganhou um porque morreu logo depois.

Agora, vem o final da história. O astrônomo David Grinspoon, pesquisando os arquivos pessoais de Albert Einstein, encontrou uma carta que Einstein escreveu a Marie dizendo-se orgulhoso pela oportunidade de tê-la conhecido pessoalmente, de mesmo passo em que se dizia enojado com o tratamento que ela e as filhas vinham recebendo de parte da imprensa francesa, que a acusava de “destruidora de lares” pelo fato de namorar o físico Paul Langevin, que havia sido aluno de Pierre Curie. Langevin já estava separado e as cartas de amor trocadas entre ele a Marie teriam sido entregues aos jornais pela ex-mulher de Langevin. A campanha de certa imprensa contra Marie e as duas filhas foi tão forte que elas tiveram de se refugiar em casa de amigos. Ao que tudo indica, Langevin e Marie namoraram depois que ela enviuvou. E as fotos da época mostram que Marie era muito namorável.

Ainda bem que o Brasil, este impávido colosso de 8,5 milhões de km2 e mais de 200 milhões de habitantes, não conhece canalhices do gênero pelo fato de até hoje não ter sido lembrado para o Nobel que merece: o da corrupção.

Enfronhado

Como transitivo direto e pronominal, o verbo enfronhar significa tornar(-se) versado, instruir(-se), fazer tomar ou tomar conhecimento pleno de um assunto. Daí, o adjetivo enfronhado: que se enfronhou. Durante séculos, julguei-me enfronhado no assunto “produção de leite nos trópicos”, mas fui enfrouxecendo e hoje estou enfrouxecido. Pois é: o verbo enfrouxecer existe e significa fazer ficar frouxo, lasso. Não me lembro de o ter visto em letra de forma nem mesmo sobre assuntos sexuais. O pessoal prefere brochar, perder temporária ou definitivamente a capacidade de ter uma ereção, como queria o Houaiss, ou broxar, como defendia o Aurélio, dois dos nossos melhores lexicógrafos.

Não pense o leitor que me sentei diante do computador para escrever chulices ou tabuísmos, philosopho bem-intencionado que sempre fui. Sentei-me aqui para falar do verbo enfronhar no sentido de meter o travesseiro em fronha, uma das coisas mais difíceis que conheço. Escrevo num domingo, pouco antes do almoço, já assustado com a fronha que devo trocar à noite. É função complicadíssima, que já passei da idade de aprender.

Apavora-me a visão do travesseiro já desenfronhado sobre a cama ao lado da fronha lavada e passada, dobrada, à espera do artista incumbido da árdua missão. Com a comadre de folga, domingo é o diabo.

Terminado o belo suelto que você acaba de ler, desandei a philosophar e concluí que passaria a tarde inteira e boa parte da noite pensando na dificuldade que teria para enfronhar o travesseiro. Então, com a decisão de um grande comandante militar, gritei: “Avante!”. Fui ao quarto, lutei heroicamente e consegui enfronhar a peça. Foi duro, mas consegui. Depois, esquentei o almoço e passei o resto da tarde descansando da luta.

O mundo é uma bola


28 de janeiro de 1808: abertura dos portos brasileiros às nações amigas, mesmo porque não faria sentido abrir às nações inimigas. Em 1932, as forças japonesas começam a ocupação de Xangai. Em 1935, a Islândia é o primeiro país a legalizar o aborto, até hoje proibido num país grande e bobo, que prefere assistir ao nascimento dos seus anjinhos para mais tarde matá-los a tiros nas guerras do tráfico. Em 1942, presidido pelo ditador Getúlio Vargas, o Brasil rompe relações com a Alemanha e a Itália. Em 1943, Vargas e Roosevelt, em Natal (RN), iniciam as negociações que levariam à criação da FEB, Força Expedicionária Brasileira, durante a Segunda Guerra Mundial. O craque William Waack, um dos mais brilhantes jornalistas brasileiros, escreveu excelente livro sobre a FEB: As Duas Faces da Glória. Hoje é o Dia do Portuário e o Dia do Comércio Exterior.

Ruminanças

“Há em todas as cousas um sentido filosófico” (Machado de Assis, 1839-1908). 

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Dilma, um e dois - Marcos Coimbra

           Revista Carta Capital - 26/01/2015

                                  
As pesquisas confirmam que somente a economia foi o ponto vulnerável do primeiro mandato

O maior sucesso das oposições ao longo do primeiro governo Dilma Rousseff (e, talvez, o único realmente significativo) foi a destruição da imagem da política econômica.

Todas elas dedicaram-se a promovê-la, desde os partidos aos líderes empresariais, no Brasil e no exterior. Mas a ponta de lança, como de costume, foi o estaclishment midiático. Mais que os políticos de oposição, mais que os porta--ozes do empresariado, quem mais golpeou a condução da política econômica, mais se entristeceu com os sucessos alcançados e mais se alegrou com os fracassos foi a imprensa antipetista.

Não que fosse seu único alvo. Dilma, o governo e o PT passaram dois anos sob tiroteio cruzado, destinado a enfraquecê-los e derrotá-los na eleição. Mas, em todos os fronts, salvo nas questões econômicas, as oposições obtiveram resultados magros.

Não conseguiram, por exemplo, convencer a opinião pública da imoralidade dos governos e políticos petistas. Fizeram o carnaval que puderam com o julgamento do "mensalão" e as acusações de irregularidades na Petrobras, achando que marcariam Dilma, Lula e seus correligionários com a pecha da corrupção. Não houve um dia sem que os colunistas conservadores atirassem contra "escândalos" reais ou inventados.

Foi debalde, no entanto, como vimos nas pesquisas do fim de 2014. Na pesquisa Vox Populi feita entre 5 e 8 de dezembro, 60% dos entrevistados responderam que foram Lula (com 31%) e Dilma (com 29%) os presidentes que mais combateram a corrupção entre os três mais recentes (ficando Fernando Henrique Cardoso com apenas 11% das respostas). No tocante à Petrobras, 69% dos entrevistados afirmaram que "as irregularidades (na empresa) vêm de antes do PT (chegar ao governo federal)".

A incompetência foi outro flanco ao qual as oposições e, em especial, abrigada midiática se dedicaram. Também nesse plano não deixaram passar um dia sem denunciar os sintomas de alguma "crise de gerência", da ameaça do "apagão elétrico" à falta de esparadrapo em um hospital do interior.

Achavam que iam bem nesse combate, à luz dos resultados de pesquisas que mostraram, até agosto, que Dilma, de fato, não alcançava os níveis de aprovação necessários a uma reeleição tranquila. Mas esqueceram-se de que ela teria, a partir do início da propaganda eleitoral na televisão e no rádio, como falar diretamente com a opinião pública, mostrando as realizações de seu governo livre da censura imposta pela "grande imprensa".

Quando terminou a eleição, Dilma exibia taxas de avaliação positiva amplamente suficientes para explicar sua vitória. Na mesma pesquisa Vox Populi, 42% dos respondentes disseram que consideravam "ótimo" ou "bom" o governo, ante 22% que o avaliavam como "ruim" ou "péssimo", restando 33% que afirmaram que o viam como "regular". Na mesma métrica usada durante a campanha por Aécio Neves para dizer que saíra do governo de Minas Gerais com elevadíssima popularidade, Dilma chegou a dezembro de 2014 com 75% de aprovação.

Ou seja: por mais que tenham passado os últimos dois anos insistindo nas teclas da corrupção e da incompetência, nossas oposições não convenceram a quem precisavam persuadir. Talvez tenham conseguido exacerbar o antipetismo mais tosco na sociedade, aquele que se expressa na internet e nas redes sociais, mas foram incapazes de formar maiorias.

Conseguiram, todavia, atingir a presidenta e o governo na economia. Chegamos ao início do segundo mandato com percepções muito negativas em dimensões como inflação, desemprego e desenvolvimento.

Quase metade dos entrevistados diz-se "muito preocupada" com a inflação. No tocante ao desemprego, 53% afirmam estar "muito preocupados" ou "preocupados, ainda que não muito" com a possibilidade de ficar sem emprego.

Tampouco são elevadas as expectativas de melhora do poder de compra dos salários: 28% temem que diminuam, 45% que se mantenham e apenas 19% que aumentem. No tocante à possibilidade de piora do desemprego, números idênticos: 28% esperam que cresça, 45% que permaneça e 19% que se reduza.

Dilma começa seu segundo governo consciente de que as oposições tentam, mas não conseguem caracterizá-la como leniente com a corrupção ou má gestora. E convencida de que precisa alterar as expectativas a respeito da economia.

Não é por outra razão que mudou a aposta na política econômica. Seria ingenuidade imaginar que insistir no que foi feito no primeiro governo agora daria certo.

A evangelização do esporte - MIGUEL MARTINS

           Revista Carta Capital - 26/01/2015

                O PRB arrebanha cargos da pasta de olho na exposição das Olimpíadas e no desenvolvimento de projetos com a Universal  

Braço político da Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo, o Partido Republicano Brasileiro busca arrebanhar o esporte nativo. O novo ministro do Esporte, o inexperiente George Hilton, mais conhecido por ter sido detido em um aeroporto com malas de dinheiro do que por sua atuação política, está na cúspide de uma hierarquia de pastores designados a controlar a pasta no País. O interesse do partido pelo Esporte começou a ganhar forma em 2012. Originalmente de São Bernardo do Campo, o pastor Júlio Cesar Ribeiro foi escolhido pelo PRB naquele ano para ocupar a Secretaria de Esporte do Distrito Federal. Nas eleições de 2014, Ribeiro liderou a votação para a Câmara Legislativa, apesar de residir há pouco mais de dois anos na capital federal. "Não tive votos somente do esporte", garante. "Mas com certeza a minha gestão à frente da Secretaria ajudou muito."

Se estar à frente da organização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo em Brasília serviu de vitrine eleitoral para o pastor, os eleitores ligados à Universal, afeitos a votar em seus líderes religiosos, devem ter aprovado sua atuação. Em Brasília, Ribeiro abraçou publicamente eventos da Força Jovem Universal, grupo da igreja que promove atividades esportivas e organiza palestras contra o uso de drogas. Em 2014, a Secretaria de Esporte do DF promoveu o "Saiba Dizer Não", que atraiu milhares de fiéis ao ginásio Nilson Nelson. Neste ano, o apoio do governo do Distrito Federal ao evento foi acertado entre o deputado e sua correligionária Leila Barros, ex-jogadora de vôlei da seleção brasileira e nova secretária de Esporte. Está marcado para dia 28 de janeiro, no Mané Garrincha, estádio de Copa do Mundo.

A promoção de eventos em parceria com a Universal e a visibilidade política proporcionada pelos Jogos Olímpicos de 2016, cuja emissora oficial será a Record, somam-se no súbito interesse do PRB por ocupar postos relevantes do esporte nacional. A bancada de 24 parlamentares eleita em 2014 chancelou o interesse do partido pelo Ministério do Esporte, oferecido por Dilma Rousseff ao pastor Hilton. O foco na área não ficou restrito ao plano federal. O sucesso da experiência de Ribeiro em Brasília levou o presidente do partido, Marcos Pereira, a costurar acordos com o PSDB em São Paulo, o PSB no Distrito Federal e o PT em Minas Gerais e no Ceará para ocupar as respectivas secretarias de Esporte. Um time de quatro pastores e uma solitária ex-atleta.

A biografia política de Hilton é rasa. Pastor da Universal, teólogo e apresentador de televisão, o novo ministro foi deputado estadual em Minas Gerais entre 1999 e 2006. Em 2000, esteve à frente do programa Minas na TV, da Record. Eleito deputado federal nos últimos três mandatos, Hilton chegou a disputar em 2012 a prefeitura de Contagem, mas ficou em quarto lugar. Fora a assumida paixão pelo Cruzeiro, não acumulou experiência alguma com esportes em sua carreira política. Em 2005, foi flagrado no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, com 11 malas e caixas recheadas de dinheiro. Ao seu lado estava Carlos Henrique Silva, escolhido pelo governador mineiro Fernando Pimentel para ocupar a Secretaria de Esporte estadual. Ambos foram liberados pela Polícia Federal, mas Hilton foi expulso do PFL, seu partido à época. Questionado sobre o episódio, o ministro argumenta que transferia de forma voluntária doações de fiéis da Universal a pedido da igreja. Resta saber por que o partido apressou-se em expulsá-lo.

Hilton e Silva são neófitos na matéria entregue a seus cuidados. O novo ministro, não sem candura, reconhece nada entender de esporte em geral. Compensa a falha, diz ele, pelo conhecimento da alma humana. O mesmo não pode ser dito dos outros secretários do PRB. Medalhista olímpica, Leila Barros é naturalmente afinada com a área. A frente da pasta em São Paulo, o pastor e vereador paulistano Jean Madeira foi um dos primeiros coordenadores da Força Jovem Universal e articulou nos últimos anos parcerias com as prefeituras paulistas para realizar eventos esportivos e religiosos no estado. O radialista e pastor David Durand, secretário no Ceará, colaborou na criação de uma liga de futebol no estado formada por jovens participantes de grupos de reabilitação para dependentes químicos.

O governo estadual do Rio de Janeiro, cuja capital será sede das Olimpíadas, também priorizou os acordos políticos em sua escolha. Embora não tenha responsabilidade direta sobre as Olímpiadas, sob alçada do prefeito Eduardo Paes, Luiz Fernando Pezão, do PMDB, escolheu para a secretaria alguém não apenas com parca experiência na área, mas na própria vida. Filho do ex-governador Sérgio Cabral, Marco Antônio Cabral tem 23 anos e ainda sequer concluiu seu curso universitário. A ausência do PRB no esporte fluminense explica-se pela disputa política de 2014: o adversário de Pezão nas eleições do ano passado foi o senador Marcelo Crivella, pastor da Universal e principal liderança do partido.

Apesar das desconfianças quanto às motivações do PRB em dominar a pasta, Hilton garante que vai articular os atores envolvidos e massificar a prática esportiva no País. "Responderei com muito diálogo e muito trabalho", afirma a Carta Capital. "Espero mudar essa impressão inicial." As primeiras críticas partiram da ONG Atletas pelo Brasil, formada por mais de 50 desportistas de diversas modalidades, entre eles o ex-nadador Gustavo Borges, a ex-jogadora de basquete Hortência e a ex-atacante de vôlei Ana Moser, que preside o grupo. Após Hilton ser anunciado em dezembro passado, o grupo chiou. "Infelizmente, há anos, o Ministério do Esporte é usado na barganha política", afirmou a ONG por meio de nota. Apesar da oposição inicial, Daniela Castro, diretora-executiva da Atletas pelo Brasil, garante que o momento de críticas passou. "O nosso interesse agora é falar de agenda. Precisamos de uma política e de um Sistema Nacional de Esporte. O País está longe das potências olímpicas." Após assumir, Hilton sinalizou manter parte da equipe que integrou a gestão de Aldo Rebelo, do PCdoB, mas começou a realizar mudanças importantes. Para a Secretaria de Alto Rendimento do Ministério, que coordena investimentos no esporte profissional, foi escolhido Ricardo Trade, diretor-executivo da Copa do Mundo da Fifa no Brasil. Substituirá Ricardo Leyser, do PCdoB.

Principal demanda dos atletas, a formulação de um Sistema Nacional de Esporte está entre as prioridades do ministério, diz Hilton. O objetivo é criar um fundo que conjugue ações integradas entre União, estados, municípios, escolas e federações esportivas para pinçar e formar talentos. O projeto foi alvo de debates de três conferências organizadas pelo PCdoB enquanto esteve à frente da pasta, mas não houve avanços relevantes.

Coma iminência das Olimpíadas do Rio de Janeiro, o Brasil perde tempo para debater sua gestão esportiva. Dez anos antes de sediar as Olimpíadas de Londres, o Reino Unido iniciou um programa para incentivar a prática de esportes pelos britânicos e desenvolver um laço com as escolas para fortalecer as modalidades olímpicas. Hilton explica de forma curiosa as limitações do projeto olímpico nacional em relação ao britânico. "Somos um País com pouco mais de 500 anos. Estamos ainda construindo uma nação." Esquece o ministro que o Brasil tem cerca de 200
milhões de habitantes enquanto o Reino Unido não chega a 70 milhões e que o número de praticantes influi no resultado. Esquece também que o atletismo e a natação, esportes de base em uma Olimpíada, são acessíveis à população mais pobre. De fato, o ministro claudica no assento.

A discussão sobre o legado social e esportivo das Olimpíadas soma-se o debate sobre a gestão e a transparência dos clubes brasileiros e das federações. Debatido no Congresso, o refinanciamento da dívida dos principais clubes brasileiros, próxima de 6 bilhões de reais, foi alvo de diversas interferências recentes da CBF. No fim do ano passado, o deputado petista Vicente Cândido, sócio em um escritório de advocacia do futuro presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, apresentou emendas para retirar do texto final da Lei de Responsabilidade Fiscal no Esporte as contrapartidas a ser apresentadas pelos clubes para renegociar seus débitos, entre elas o pagamento em dia de funcionários e jogadores.

O Bom Senso F.C., grupo de jogadores que busca racionalizar a gestão do futebol no País, queria incluir no texto a exigência de a CBF manter balanços financeiros públicos e limitar a reeleição de seu presidente a apenas um mandato. Em meio às discussões, outro integrante da bancada da bola, o deputado Jovair Arantes, do PTB, incluiu o refinanciamento das dívidas dos clubes em uma Medida Provisória relativa a temas tributários gerais, sem estabelecer contrapartidas para os clubes e a CBF. A presidenta Dilma Rousseff vetou o artigo de Arantes na terça 20.

Por mais incrível que possa parecer, Hilton teve boa impressão de Del Nero e do atual presidente, José Maria Marin, dois fiéis seguidores do ex-mandatário Ricardo Teixeira. "Os dirigentes da CBF estão atentos à nova realidade que se impõe sobre os clubes e as entidades esportivas", comenta. "A própria CBF assumiu publicamente o compromisso de incluir nos regulamentos de suas competições obrigações aos clubes quanto ao fairplay financeiro e trabalhista." Sobre a necessidade de as federações esportivas garantirem transparência de seus gastos, Hilton concorda com a exigência, especialmente se forem beneficiárias de recursos públicos. "Mesmo as entidades privadas buscam se abrir. A transparência é um valor importante no mundo hoje." Em meio à investigação de desvios de 30 milhões de reais do patrocínio do Banco do Brasil à Confederação Brasileira de Vôlei para favorecer dirigentes e ao desconhecimento sobre o destino dos lucros vultosos da CBF, uma reforma do esporte brasileiro tem de começar pelas federações. A confiança do ministro em Del Nero e Marin é um mau presságio.

O perigo da extrema direita - Renato Janine Ribeiro

Valor Econômico 26/01/2015


A extrema-direita brasileira acaba apoiando o PSDB. É bom ela não ter identidade própria - ou ela contamina o partido tucano?

Cresce a extrema direita no Brasil. Felizmente, tirando os deputados Feliciano e Bolsonaro, tem pouca presença institucional. Mas, de duas uma: ou criará um partido novo, ou continuará numa relação ambígua com o PSDB, que lhe dá votos mas perturba a identidade.
A extrema direita não elege quase ninguém aqui. Para cargos executivos, menos ainda. Mas se fortalece na expressão de suas ideias. É fraca em poder, mas avança no berro. Para usar a expressão de Gramsci, disputa a hegemonia. Degrada o debate no país.
Durante alguns anos, PSDB e PT, representando nossa centro-direita e centro-esquerda, viveram uma aproximação na prática - ainda que ela fosse negada no discurso de ambos. Mas nos últimos anos a retórica subiu em decibéis. Temos um paradoxo: candidato, Aécio Neves prometeu continuar a política social do PT; reeleita, Dilma Rousseff adotou medidas econômicas dos tucanos. Portanto, a realidade não os afasta tanto - mas, na aparência, eles parecem estar quase em guerra. O que vale, a realidade fria ou a aparência raivosa? As políticas econômicas e sociais, ou a retórica desenfreada? a razão ou a paixão? Porque guerras favorecem os extremos.
Onde é mais fácil ver a extrema direita é na internet. Ela povoa os comentários das redes sociais e das edições online dos jornais. É incrível o ódio que destila. Há poucos dias, lendo as notícias sobre o fuzilamento de Marcos Archer na Indonésia, me surpreendeu a quantidade de comentários atacando o PT, que nada tinha a ver com o assunto. A maior parte era escrita por pessoas desinformadas da realidade e desacostumadas ao cultivo da língua. Mas são veementes. Felizmente, não vão muito além do Facebook e dos blogs.
Ou não iam. Saíram da internet e foram para as ruas nos últimos meses - numa paródia, em menor, das manifestações de 2013. Pediram que os militares rasgassem a Constituição e tomassem o poder. No diagnóstico, erram. Misturam em seu ódio homossexualidade, Hugo Chávez e programas sociais. Nas suas propostas, nem percebem que o mundo atual não está para golpes. O que fariam as Forças Armadas, se tomassem o poder? Meio século atrás, os golpistas tinham uma agenda inteira montada. Os militares não tinham afeição pela democracia. Os empresários receavam os movimentos sociais, que avançavam. A economia estava em grave crise. O governo norte-americano apoiava qualquer golpe de direita na América Latina. Hoje, nada disso existe. Os extremistas são, literalmente, reacionários. Querem que o mundo recue. Não têm projeto viável.
Esse público nas ruas e na Internet vai além de seus próprios pregadores na mídia. Alguns colunistas de jornal chegaram perto de declarar ilegítima a eleição de 2014, o que é uma afirmação bastante grave de se fazer numa democracia, mas não lembro nenhum que tenha pedido a derrubada do governo eleito. Entre os ideólogos e seus seguidores que foram às passeatas ou escrevem em blogs, há uma distância. Os primeiros são mais informados, mais inteligentes. Os segundos, não. Apenas radicalizam.
Mas um problema sério é que essa extrema direita, que tem votado no PSDB nos momentos decisivos, pressiona nosso partido que porta em seu nome a social-democracia - uma denominação típica da esquerda - a ir para a direita. E isso traz alguns resultados. Assim se entende o uso do aborto na campanha tucana em 2010 ou a ênfase de Alckmin numa política repressiva de segurança. Esse fato cria problemas de identidade no PSDB, reduzindo o peso do passado glorioso de Montoro, Covas, Ruth Cardoso. É óbvio que FHC não deve se sentir confortável com esse avanço dos extremismos.
Pode essa extrema direita, que é mais forte em São Paulo, mas cujo tamanho exato ninguém no Brasil é capaz de mensurar, alterar a natureza do PSDB? Não me parece provável. Ela deve manter seu papel de aliada subordinada. Presta o serviço de destruir imagens petistas e recebe alguma compensação midiática por isso. Mas é uma aliada incômoda. Não gosta dos direitos humanos, com os quais o PSDB histórico tem um forte compromisso. Não gosta dos programas sociais, dos quais os tucanos não querem ou não podem abrir mão.
Pior, a extrema direita carrega o risco de convencer demais. Ela ajuda o PSDB na medida em que reforça o antipetismo de parte razoável do eleitorado - mas, se crescer em votos, pode fazer os tucanos perderem os votos de seus eleitores iluministas e, pior, tornar-se dominante em algumas seções regionais do PSDB, o que poria o partido em sério risco.
Há outra possibilidade, para a qual me alertou o cientista político português Álvaro Vasconcelos, ora professor visitante no IRI da USP. Sem o PSDB, a extrema direita pode se tornar um partido próprio, e este pode ganhar força. É o que sucede na Europa. A Frente Nacional ameaça a política francesa há anos. Tem uma votação elevada, embora o sistema eleitoral francês traduza esses sufrágios em pouquíssimos cargos de efetiva significação.
Mas essa é uma possibilidade remota. Como a extrema direita brasileira, dado o seu exacerbado antipetismo, acaba apoiando o PSDB, ela não se organiza para tomar o poder. Prefere operar nas laterais. Sabe que - hoje - teria poucos votos, se disputasse as eleições para valer. Mas é preciso fazer constantemente o balanço do que é melhor para o país e para os tucanos - se é a extrema direita continuar subordinada, sem voz independente mas podendo minar um partido sério, com história e com futuro, ou se é ela adquirir voz e identidade próprias, com o risco de crescer mais. Porque o atual, talvez crescente, desencanto com os políticos favorece aventuras.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo. 

Solitação - Eduardo Almeida Reis

Rapariga, substantivo feminino em nosso idioma desde o século 13, é mulher adolescente, jovem, moça, raparigota


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 26/01/2015


Não por acaso o substantivo susto começa com SUS, que o honoris causa costuma elogiar antes de correr para o Sírio-Libanês e o Albert Einstein: é analfabeto e desonesto, mas não é burro. O SUS tem coisas admiráveis, como a radiografia que tirou de um menino de 11 anos, filho do eletricista que me presta serviços.

O menino é tido no grupo em que treina como um novo Neymar, tamanha sua identidade com a bola. Só pensa em futebol, respira futebol, vai mal na escola. Há um ano pedi ao Alexandre Kalil, que tinha na conta de amigo, que marcasse um dia para o eletricista levar o menino ao CT do Atlético abrindo caminho para sua futura inclusão na turma da base. Kalil não disse que sim, nem que não, muito antes pelo contrário, aliás: indicou o nome de uma funcionária da diretoria que me enrolou durante meses.

Há 90 dias, depois de passar um domingo inteiro jogando futebol, o menino amanheceu queixando-se de dores numa perna. Com o pai trabalhando, a avó levou-o ao SUS, onde foi radiografado e diagnosticado como tendo a patela fora do esquadro. Saiu da consulta com a lista de uma porção de remédios e as muletas, que a avó comprou na esquina.

Uma semana, quinze dias, um mês, o craque de muletas, entupido de remédios, sem dores no osso sesamoide situado na parte anterior do joelho, anteriormente denominado rótula. Desconfiado, o eletricista marcou uma consulta com ortopedista conceituado aqui na praça. Ao olhar a radiografia do SUS, o ortopedista mandou radiografar o menino lá mesmo na sua clínica, comparou as duas chapas e explicou ao pai: “Este menino não tem nada. Tiraram a primeira radiografia com ele torto. Joga fora as muletas, suspende os remédios, volta ao futebol e traz o menino daqui a vinte dias, quando acabar o efeito dos remédios”.
Dito e feito: o craque está zero bala. Agora, preciso conhecer alguém que me apresente ao Dr. Gilvan de Pinho Tavares para mandar avaliar o menino na Toca da Raposa. Guilherme Mendes, diretor de comunicação do Cruzeiro, brilhante jornalista formado pela UFJF, Universidade Federal de Juiz de Fora, bem que podia cuidar disso.

Consulta
Telefonema de velha amiga, que não vejo há milênios, identifcando-se como mãe do Paulo, jovem amigo que não vejo há séculos. Não atino como ela possa ter conseguido o novo número do meu celular. A consulta era simples: ela disse que tem a Coleção do Centenário, do Eça, sabe que também tenho e quer saber onde encontrar o texto “As singularidades de uma rapariga loura”.

Pergunto o seu e-mail, que anoto num bloquinho, informo que estou no meio de um suelto sobre a Petrobras, depois procuro no Eça e informo via e-mail. Terminado o suelto, foi fácil: fiz a pesquisa e informei: “Volume VIII, página 269”.

Rapariga loura me lembra das raparigadas em que andei metido quando procurei fazenda para comprar no Norte de Minas: casas de raparigas, regionalismo brasileiro: mulheres que vivem da prostituição, meretrizes, prostitutas. Os amigos procuravam as raparigas e o jovem philosopho, solidário, os acompanhava.

Rapariga, substantivo feminino em nosso idioma desde o século 13, é mulher adolescente, jovem, moça, raparigota, mas tem um monte de significados, entre os quais o regionalismo prostituta. Em Portugal, o regionalismo é para moça do campo, roceira.

Aproveitei a embalagem para reler o conto do Eça, que foi filmado pelo cineasta português hoje a caminho dos 104 ou 105 aninhos, não o filme, e sim o cineasta.

O mundo é uma bola
26 de janeiro de 1531: terremoto em Lisboa mata 30 mil pessoas, mas o terremoto lisboeta famoso, mesmo, só ocorreria em 1755. Em 1546, Brás Cubas funda a cidade de Santos, no litoral paulista. Em 1654, rendição dos holandeses em Recife retirando-se definitivamente do Brasil e se livrando do frevo, que é dose. Em 1788, desembarque dos primeiros colonos ingleses na atual Sydney, Austrália. Em 1827, o Peru anuncia o fim de sua união com a Colômbia e se declara independente. Em 1839, elevação da vila de Santos à condição de cidade. Em 1870, com o fim da Guerra da Secessão, o estado de Virginia é readmitido na União. Em 1887, início da construção da Torre Eiffel em Paris. Corre na internet um conjunto de fotos de torres modernas, algumas bonitas, outras espantosas, geralmente nos países que nadam em petróleo. Em 1905, encontrado na mina Premier, África do Sul, um diamante de 3.106 quilates, o maior do mundo. Chama-se Cullinan em homenagem a Thomas Cullinan, dono da mina. Em 1950, proclamação da República da Índia.

Em 1998, o presidente Bill Clinton, dos EUA, nega pela derradeira vez ter mantido relações sexuais com a estagiária Monica Lewinsky no Salão Oval da Casa Branca, mas a moça guardou sem lavar o vestido respingado pelo sêmen presidencial.

Ruminanças
“Observo em minhas viagens esta prática para aprender sempre algo com outrem (que é uma das mais belas escolas que possa haver) de levar sempre os com que me entretenho a conversar das coisas de que mais entendem” (Montaigne, 1533-1592). 

domingo, 25 de janeiro de 2015

MARTHA MEDEIROS - Encrencas domésticas

Zero Hora 25/01/2014

O chuveiro está esquentando demais. A pia da cozinha não para de pingar. A porta do armário não está fechando direito. A geladeira está fazendo um barulho estranho. O interruptor de luz está com mau contato. Os azulejos da área de serviço estão descolando da parede. Escorre água por baixo da máquina de lavar. A vizinha do andar de baixo está reclamando de uma infiltração no teto do banheiro dela, e adivinhe de quem é a culpa.
Está tudo 100% com seu doce lar? Nada quebrado, nada precisando de reparos, nenhuma necessidade de chamar o eletricista, o bombeiro hidráulico, um faz-tudo? Permita que eu abrace você, vá que sua sorte seja contagiosa.
Não moro num prédio em ruínas, mas mesmo jovens edifícios aprontam das suas. Não importa a idade, em que bairro, qual a situação do imóvel: sempre tem uma coisinha para consertar. E, assim que ela for resolvida, outra coisinha virá reclamar seus direitos. A umidade deixou manchas na parede. A basculante do banheiro está com o vidro trincado. O forno está custando para acender. O liquidificador está dando choque, não estará na hora de trocar?
Sempre está na hora de trocar, pintar, arrumar, dar um jeito. Sua casa deve ser que nem a minha, um ser vivo que pede atenção constante. Ou estarei pagando por erros cometidos em encarnações anteriores?
Na classificação das tragédias, consertos domésticos nem contam. Não tenho dúvida de que sou uma abençoada por ter, numa única semana, apenas trocado a bandeja do ar-condicionado, ficado sem internet por 24 horas por pane no modem e ter chamado meu fiel socorrista para reforçar alguns rejuntes. E nem estou considerando o barulho de uma furadeira vindo do apartamento ao lado, que isso já não faz parte do meu universo e não sou eu que pago a conta.
Melhor pular essa parte, a conta.
Está tudo bem e estou calma – mas entrou agora um e-mail pedindo para que eu imprima um documento e o assine. Isso significa que deverei utilizar minha impressora. Você tem uma impressora caseira? Diga que a sua não trava no meio da impressão, que não engole a folha de papel, que cumpre sua função como se fosse uma eficiente impressora de escritório. Me convença de que impressoras caseiras não fazem complôs e de que estou aqui, quase histérica, sem motivo.

Liguei a geringonça. Ela fez alguns barulhos similares ao início de uma batucada e depois silenciou. A luz que deveria ficar permanentemente acesa está piscando como quem alerta para uma explosão em 30 segundos. Tem sido assim nas últimas semanas. Clico em imprimir e nada acontece. Impressoras não fazem complôs, você me convenceu. Está tudo bem, estou calma e agora meu gato se dependurou na cortina, abrindo um rasgão. Adoro trabalhar em casa.

Japonesismos - Eduardo Almeida Reis

Só depois de conhecer a libido é que o macho da espécie se enrola e se mete nas enrascadas de que se arrepende pelo resto dos seus dias


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 25/01/2015





Segundo Nascentes, o diacronismo obsoleto suruba, adjetivo de dois gêneros, que significa muito bom, excelente, capaz – “um trabalhador suruba” – veio do tupi suru’ba. Como substantivo feminino, regionalismo brasileiro de uso informal, tem uma porção de significados desde namoro escandaloso até sexo grupal.

Salvo melhor juízo, diz aqui o philosopho, sexo grupal nos dá ideia de confusão, de bagunça, de orgia sexual em que vale tudo e mais alguma coisa que não posso descrever por dois motivos, o primeiro dos quais é o seguinte: sou virgem de experiências do gênero. E o segundo é a minha notória pudicícia.

Circula na internet um vídeo demorado envolvendo dezenas de jovens japoneses, que não contei mas tive a impressão de que passam dos 250 casais. Tudo escrito em japonês, mas dá para ler 500 Y sex. É das cerimônias sexuais mais impressionantes de que tive notícia. Primeiro entram num salão imenso as mocinhas vestidas e descalças, assumem os seus lugares, se despem e ficam feito estátuas sobre o piso forrado de tecido claro e almofadado.

Depois aparecem os rapazes em cuecas, procuram suas companheiras e formam os pares. Presumo que os pares sejam agendados, porque não há brigas. As 250 mocinhas, no vídeo, são todas da maior palatabilidade e nenhuma parecia menstruada como seria natural numa quantidade tão grande de jovens púberes.

É tarde da noite. Interrompo em “púberes” esta bela crônica para ir dormir. Agora cedo, bem dormido, banho e café tomados, charuto aceso, retomo nossa conversa depois de ver o vídeo pela segunda vez: dura 10 minutos. É difícil calcular a idade de japoneses, que ouso estimar em pouco mais de 20 anos. A função grupal começa com as moças desnudas, em pé, e os rapazes em cuecas, por trás delas, em ósculos bucais bem mais chiques do que beijos nas bocas. Junto com o oscular temos a manipulação das mamas, isto é, dos mimos que as japonesas têm no lugar dos seios. A terceira etapa é a manipulação genital das jovens. Alguém tirou do chão as roupas das mocinhas. Depois, somem as cuecas dos rapazes e acontece, em perfeita sincronização dos 250 (!) pares, tudo quanto se possa imaginar: duplo sexo oral, papai e mamãe, já então com uma gritaria das mocinhas em japonês e uma derradeira atividade que me permito não descrever.

Que é aquilo? Cerimônia religiosa? Filme pornô? Há takes tão próximos que os operadores de câmeras devem circular entre os casais. É vídeo impressionante. Se o leitor já assistiu e entendeu alguma coisa, porque fala japonês ou residiu no Japão, me explique, por favor.

Perigo
O latim nos deu libído,ìnis ‘desejo violento, paixão’, procura instintiva do prazer sexual, que Freud dizia ser a energia que está na base das transformações da pulsão sexual, a energia vital. E é por ela, pulsão sexual, que o macho da espécie humana se mete em cada situação que vou te contar.

Viver é negócio muito perigoso, já dizia Guimarães Rosa, e o recém-nascido se vê às voltas com o estado puerperal de sua mãezinha, em que há intensas alterações psíquicas e físicas capazes de deixá-la sem condições de entender o que está fazendo, em situação de semi-imputabilidade. Não todas as mães, mas algumas que chegam ao infanticídio: “morte do filho provocada pela mãe por ocasião do parto ou durante o estado puerperal”.

Só depois de conhecer a libido é que o macho da espécie se enrola e se mete nas enrascadas de que se arrepende pelo resto dos seus dias: ibidem porcina cardam torquet – é aí que a porca torce o rabo, diria o condutor da biga de Cícero. Figura máxima da Latinidade Clássica, Marcus Tullius Cicero (106-43 a.C.), filósofo, orador, escritor, advogado e político romano, foi morto e teve sua cabeça e mãos cortadas por Herênio, seguindo ordens de Marco Antônio. Cortadas e pregadas na rostra do Fórum Romano, não por ser filósofo, orador e escritor, mas por advogar e politicar.

O mundo é uma bola
25 de janeiro de 1308: Eduardo, de Inglaterra, se casa com Isabel, de França. Em 1327, Eduardo, de Inglaterra, é obrigado por sua mulher Isabel, de França, e seus nobres, a abdicar o trono em favor de seu filho Eduardo III.

Em 1533, casamento de Henrique VIII, de Inglaterra, com Ana Bolena, tadinha, executada aos 35 aninhos pelo bandidão do rei. Quando informada de sua iminente execução, Ana fez chegar a Henrique uma exigência: não aceitaria ser morta por um carrasco inglês, que utilizava o machado para a decapitação. Exigia a importação de um carrasco francês, pois na França a decapitação era feita com uma espada. Justificando sua exigência, teria dito que uma rainha da Inglaterra não curva a cabeça para ninguém em nenhuma situação. Releva notar que as decapitações com espada eram feitas com a vítima ajoelhada, mas com a cabeça erguida. Consta que foi atendida em sua justa reivindicação.

Em 1554, fundação da cidade de São Paulo, que já teve a subida honra de ser administrada pela senhora Marta Suplicy, figura extraordinária de mulher que hoje ilustra o Senado com a vastidão do seu gênio. Hoje é o Dia do Carteiro.

Ruminanças

“Admiro quem lê manuais e diz entender o que neles está escrito” (R. Manso Neto).

EM DIA COM A PSICANÁLISE » Seja o que quiser!!!

EM DIA COM A PSICANÁLISE » Seja o que quiser!!!

Regina Teixeira da Costa
Estado de Minas: 25/01/2015



Encontrar a satisfação plena. Alcançar tudo o que almejamos e sonhamos. Viver infinitas experiências. Abolir limites. Mudar o corpo. Alterar a cor da pele. Implantar próteses. Fazer preenchimentos deformadores. Liberdade plena e irrestrita.

Esses ideais rondam o imaginário coletivo enquanto todas as facilidades nos intimam a alcançar o impossível. Mesmo sabendo que a realização plena está fora de alcance, ainda assim insistimos em botar fé e pilha nesse imaginário. E as coisas vão se desenrolando até o extremo.

Temos crédito ilimitado! Podemos adiar as contas, pagar tudo a prazo com juros oferecidos como baixos, fazendo muito banqueiro feliz com a eternização das dívidas do sonhador. É muito fácil o acesso a todos os tipos de produtos e, assim, sustentar o sistema, que oferece gozo imediato e imperativo.

Podemos adiar as responsabilidades e as consequências de nosso imediatismo fingindo não ser preciso pagar por tudo o que fazemos. A ideologia “seja o que quiser” sustenta a ilusão de muitos. Como se cada um fosse seu próprio criador e pudesse manipular o próprio eu, reinventando-se.

Como se pudéssemos sair por aí promovendo a autocriação, rompendo limites, ultrapassando barreiras reais, limites legais de sociabilidade e do próprio corpo. Manuais de autoajuda não faltam: como ganhar dinheiro, como emagrecer, como fazer amigos, como ser feliz.

Pessoas para quem as proibições sociais e os limites do corpo não são operativos encarnam essa ilusão como possibilidade real. Isso expõe uma falha simbólica com consequências drásticas para si próprio e para aqueles com quem se convive. É a indústria da propaganda combinada com o alto capitalismo. Nesta aldeia global, temos a impressão de que o mundo pirou e quem compra essa pílula perde a noção.

Um exemplo disso é veiculado por jornais, TVs e internet a cada instante, em tempo real. A grande polêmica do último sábado foi a execução de Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos, na Indonésia, por crime de tráfico de drogas. A oportunidade de grandes lucros e a promessa de enriquecimento o levaram a ignorar a lei da pena capital daquele país. Ignorou o perigo e o resultado foi nefasto. Tentou escapar, mas a lei foi cumprida. É função da lei conter excessos e abusos.

Não discuto aqui a pena de morte, e sim a atitude de desafio à lei na qual o sujeito se joga quando acredita que pode tudo. As coisas não funcionam assim no real, embora no Brasil nem sempre tenhamos essa impressão.

Outro “sem noção”: o americano que se submeteu a quase uma centena de intervenções cirúrgicas (implantes de silicone nas nádegas, tríceps e bíceps; redução e afinamento do nariz) para ficar parecido com o boneco Ken, namorado da Barbie. “Adoro me metamorfosear. Quanto mais estranha é a cirurgia, melhor”, disse. E continuará tentando...

Esses exemplos extremos fazem parte do cotidiano, embora em menores proporções. O culto ao corpo, ao luxo e à felicidade total faz muitos reféns, pois realizar esses ideais é missão impossível.

Viver é perigoso, disse Guimarães Rosa. Para viver, é preciso fazer escolhas, mesmo que cada uma delas implique em perdas necessárias. Acatar limites e perdas em tempos de excesso é um grande desafio. 

Brasília em foco

Brasília em foco Fernando Meirelles filma na capital do país trama sobre traição e atos corruptos


Silvana Arantes
Estado de Minas: 25/01/2015



É uma pena sermos tão vaidosos ou mesquinhos. Se alguém %u2018de dentro%u2019 tivesse um pouco de bom senso,perceberia que autocrítica é construtivo, me parece que é só isso que a Marta (Suplicy) está tentando fazer%u201D (Cartunista Quinho)
É uma pena sermos tão vaidosos ou mesquinhos. Se alguém de dentro tivesse um pouco de bom senso,perceberia que autocrítica é construtivo, me parece que é só isso que a Marta (Suplicy) está tentando fazer

O diretor paulistano Fernando Meirelles conquistou fama no cinema com um surpreendente retrato do universo das favelas cariocas pelo lado de dentro em Cidade de Deus (2002), que teve quatro indicações ao Oscar.

Atualmente mais interessado em TV do que em cinema, Meirelles voltou suas lentes para Brasília, onde filmou a minissérie Feliz para sempre? , que estreia amanhã na TV Globo. A opção por ter a capital federal como cenário foi “100% estética”, ele diz. “Usamos sempre a câmera baixa para explorar ao máximo o céu do planalto e voamos livres com nossos drones pelo meio daqueles lindos monumentos. Isso foi um prazer do

No entanto, a política tem ocupado cada vez mais espaço na vida do cineasta, que apoiou a candidatura de Marina Silva à Presidência da República em 2014 e diz ser o “aquecimento global” o tema que mais o “mobiliza hoje em dia”.

Na entrevista a seguir, ele critica o gabinete ministerial da presidente Dilma Rousseff, defende a atitude da senadora Marta Suplicy de questionar publicamente seu sucessor no ministério da Cultura e afirma que “os ruralistas reescreveram a fábula da galinha dos ovos de ouro. Eles optaram por secar as nascentes para faturar o ouro”.

Meirelles falou ao Estado de Minas por e-mail de Paris, onde conduz reuniões preparatórias para a abertura da Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro.


Brasília foi usada como metáfora de um cemitério por Nelson Pereira dos Santos em Brasília 18% (2005). Você usa Brasília como metáfora de quê em Felizes para sempre?

Minha opção foi 100% estética, apesar de eu ter usado o argumento de que, como a trama política da série envolve o Congresso e um ministério, seria interessante usar esses locais de verdade. E foi assim mesmo.

O Senado nos deixou filmar em algumas áreas, o que achei bastante democrático. Já a Câmara não nos autorizou. É a velha confusão daquela turma que acha que a coisa pública na verdade é deles. Mas o que estávamos buscando não era cutucar parlamentar, eram principalmente os grandes vazios daquele lindo espaço urbano que reflete lindamente a alma solitária dos personagens.

Usamos sempre a câmera baixa para explorar ao máximo o céu do planalto e voamos livres com nossos drones pelo meio daqueles lindos monumentos. Isso foi um prazer do tamanho da Esplanada.

Você apoiou a candidatura Marina Silva à Presidência e vem expressando no Twitter sua indignação com os rumos deste segundo governo Dilma, especialmente com a designação de Kátia Abreu para a Agricultura. Uma parcela da sociedade teme que o descontentamento de eleitores que apoiaram candidatos derrotados nas eleições se transforme em respaldo a um movimento golpista. Como vê o cenário político brasileiro para os próximos quatro anos?
Se há uma coisa que conquistamos foi a democracia. Não creio que haja qualquer risco de golpe no Brasil, apesar de alguns malucos terem sugerido esse absurdo. Pessoalmente, respeito a decisão da maioria. Mas isso não me impede de achar uma pena que, em uma hora destas, na qual o Brasil precisa e está pronto para uma mudança profunda, tenhamos sido agraciados com um ministério tão antigão destes. Não há sequer uma ideia que nos traga alguma expectativa de transformação interessante, já os receios são muitos.

Minha questão com a Kátia Abreu não é pessoal, é pelo fato de ela considerar produção só o que é plantado, colhido e vendido (para a China, de preferência). Para a ministra, uma floresta não é área produtiva, apesar de cada árvore ali estar produzindo 180 mil litros de chuva por ano.

Produção, no pensamento ruralista, é apenas o que pode encher um navio para virar dólares. Ao apoiar com fúria o novo Código Florestal, aliás, criado pelo nosso Ministro da Ciência e Tecnologia (que piada), a longo prazo nossa ministra da Agricultura deu o maior tiro no pé da história.

Os ruralistas reescreveram a fábula da galinha dos ovos de ouro. Eles optaram por secar as nascentes para faturar o ouro. Já não está dando certo. Qualquer fazendeiro hoje te dirá que suas águas vêm diminuindo ao longo dos anos. São Paulo que o diga. Hoje, com a ajuda da ciência e da tecnologia, era a hora de reverter este caminho equivocado de décadas.

De que lado você se posiciona no tiroteio entre a senadora e ex-ministra da Cultura Marta Suplicy e o atual ministro, Juca Ferreira?
Juca tem um programa claro para a Cultura, o que é bom, mas Marta também tem o mérito de ter criado o vale-cultura, programa que, espero, seja um dos focos do novo ministro. Entendo por que ela está irritada ou decepcionada com seu partido.

E também entendo por que os que estão do outro lado ficam tentando desqualificá-la. É uma pena sermos tão vaidosos ou mesquinhos. Se alguém “de dentro” tivesse um pouco de bom senso, perceberia que autocrítica é construtivo, me parece que é só isso que a Marta está tentando fazer.

Você se encontra na França para tratar de algum projeto de cinema? Quais serão seus próximos trabalhos?

Estou aqui em Paris para uma série de reuniões e testes da área técnica da abertura dos Jogos Olímpicos, que estou criando com a Daniela Thomas e o Andrucha Waddington.

Nós inventamos umas maluquices no ano passado e agora estamos aqui falando com gente de diferentes áreas para saber como podem ser realizadas.

Fora esta abertura, que não é pouca coisa, irei daqui para Londres, para um encontro com um produtor da BBC, para quem estou começando a desenvolver uma série para TV sobre o tema que mais me mobiliza hoje em dia: aquecimento global.

Em abril, dirijo dois episódios de uma série canadense cômica/dramática chamada Sensitive skin, com a Kim Cattrall (a loira de Sex and the city).

Fora isso, no tempo que sobrar vou estar ocupado em sair de São Paulo, que, aparentemente, terá que ser evacuada parcialmente pela falta de água. E isso não é uma piada e nem tem graça.


VIDA E OBRA
» Fernando Meirelles nasceu em São Paulo, em 1955
» É formado em arquitetura pela FAU-USP
» Foi um dos fundadores da produtora Olhar Eletrônico. Hoje possui a O2 Filmes
» É diretor de seis longas-metragens, entre eles, Cidade de Deus, O jardineiro fiel e Ensaio sobre a cegueira
» Concorreu ao Oscar de melhor diretor com Cidade de Deus e à Palma de Ouro no Festival de Cannes com Ensaio sobre a cegueira
» É casado com Ciça Meirelles, que assina a trilha de Felizes para sempre?. O casal tem dois filhos

Série tem paralelo com a Operação Lava-Jato Protagonista da trama é empreiteiro que financia campanhas eleitorais e se torna alvo de investigação da Polícia Federal

Silvana Arantes

Adriana Esteves, João Miguel, Maria Fernanda Cândido, Enrique Diaz, João Baldasserini e Carol Abras estão no elenco da série (Zé Paulo Cardeal/TV Globo)
Adriana Esteves, João Miguel, Maria Fernanda Cândido, Enrique Diaz, João Baldasserini e Carol Abras estão no elenco da série

Um empreiteiro financia campanhas eleitorais em troca de obras do Estado e acaba sendo investigado pela Polícia Federal. O paralelo entre a trama de Felizes para sempre? e a Operação Lava-Jato ocorreu por “pura coincidência (ou sorte?)”, segundo o diretor Fernando Meirelles, já que a série foi escrita em 2013, por Euclydes Marinho. No trecho a seguir da entrevista ao Estado de Minas, o cineasta fala sobre a colaboração com Marinho, o desempenho do elenco e comenta a polêmica sobre a adaptação que a TV Globo fez do longa Tim Maia, de Mauro Lima, ao formato de série, suavizando o papel desfavorável do cantor Roberto Carlos contido no filme.


Quem ama não mata (1982) teve grande impacto em sua época, pré-Lei Maria da Penha. Qual é o eixo da discussão em torno das relações amorosas que essa releitura da obra propõe?
Felizes para sempre? não tem um gancho como o da Lei Maria da Penha, mas, sem querer, acabou sendo muito atual, pois o protagonista é um construtor que financia campanhas em troca de obras do Estado e acaba sendo o foco de uma operação da Polícia Federal. O paralelo entre esta trama e a Operação Lava-Jato foi pura coincidência (ou sorte?), pois a série foi escrita em 2013, antes da Lava-Jato. Do ponto de vista do comportamento, o mérito do texto é justamente não problematizar alguns aspectos, como uma relação gay. O fato acontece sem nenhum comentário. Vida normal. Não falar sobre isso acaba sendo um posicionamento.

Você já disse que "o longa virou o conto, a TV virou o romance". Que tipo de romance a minissérie Felizes para sempre? lhe dá chances de contar?
O comentário era em relação à duração da obra. Se você tem só uma hora e meia para contar sua história, você tem que estar focado no protagonista e na sua jornada, pois não há tempo para digressões. Numa série, cada personagem tem seu conflito. É possível criar mais relações entre eles, e as tramas também podem ser mais diversas ou mais complexas, já que há mais tempo para desenvolvê-las. Talvez seja por isso que, em geral, ficamos mais ligados a personagens de séries do que aos personagens de filmes. Convivendo mais tempo com eles, eles ficam mais tridimensionais. É justamente por esta possibilidade que tenho gostado mais do que assisto na TV do que daquilo que vejo no cinema. Em Felizes para sempre? o tema central são os casamentos ou as relações. Cada casal da família vive um tipo de problema que, creio, fará com que a maioria dos espectadores se identifique. Há a mulher que se sente meio abandonada pelo marido, o marido que se sente pouco amado, ciúmes, traição, culpa, impotência. São sentimentos que todos experimentamos na vida.

Em geral, nas produções da Globo, a palavra final é do autor. No caso de Felizes para sempre? ela é sua ou de Euclydes Marinho?
O Euclydes tem a palavra final no texto, é o autor da série. Tudo que eu quis mudar em relação à história ou mesmo alguns diálogos que reescrevemos durante os ensaios foram mandados para ele, para receber uma revisão ou sua bênção. Na hora da produção, a coisa se inverte. Euclydes participou da escolha do elenco e de outros aspectos da realização, mas a palavra final era minha. Foi uma colaboração muito rica e sem conflitos. Acho que ambos nos mantivemos sempre abertos e dispostos a ouvir o outro.

O que vai surpreender o espectador em Felizes para sempre??
O elenco traz boas surpresas, como o Enrique Diaz, o protagonista, que, além de excelente, por não ser uma cara tão conhecida, traz um frescor à série. Há outros atores também não muito presentes na TV que vão surpreender, como João Baldasserini, Carol Abras, Perfeito Fortuna ou a Selma Egrei. A partir da série, a Paolla Oliveira deverá ser vista de uma outra maneira. Ela fez seu trabalho com total entrega. Maria Fernanda Cândido é de uma delicadeza espantosa. João Miguel também faz um trabalho muito interiorizado, e a Adriana Esteves mostra por que é a Adriana Esteves. Brasília também é um personagem na história e nossos quatro fotógrafos conseguiram mostrá-la de uma forma muito interessante. A escolha das músicas, feita pela Ciça, minha mulher, dá um tom inusitado também.

A Globo acaba de ter uma experiência tumultuada com a adaptação do longa Tim Maia, de Mauro Lima, para uma série de TV. O que achou dessa polêmica? Há chance de a Globo converter Felizes para sempre? num longa, como ela tem feito nas comemorações de seus 50 anos com séries já exibidas?
Não consegui assistir à série (Tim Maia) no ar, mas li que o diretor não aprovou a versão para TV. Acho interessante um filme virar série ou uma série virar filme e também gosto que as versões não sejam iguais. Mas talvez devessem ter pedido para o próprio diretor fazer a adaptação. Sobre a ideia de resumir várias séries em longas para comemorar os 50 anos, achei uma grande sacada e gostaria que isso fosse feito com Felizes para sempre? nos 60 anos (da Globo).

 Daniel Filho assina versão original


Felizes para sempre?, série em 10 capítulos dirigida por Fernando Meirelles, que estreia amanhã na TV Globo e terá exibição após o BBB 15, é uma releitura de Quem ama não mata, exibida em 1982. As duas versões são assinadas por Euclydes Marinho.

O título da obra original fazia referência à palavra de ordem pintada em muros de Belo Horizonte em protesto pelo assassinato, em 1976, de Ângela Diniz, cometido por seu companheiro, Doca Street. Estrelada por Claudio Marzo e Marilia Pêra e exibida na faixa de programação Série Brasileira, Quem ama não mata teve direção de Daniel Filho e inaugurou o núcleo da Globo batizado com seu nome.

O casal de protagonistas é agora interpretado por Enrique Diaz e Maria Fernanda Cândido e se chama Claudio e Marilia, em homenagem aos atores da primeira versão. Com mais focos do que a trama original, mas igualmente ancorada em relações em crise e emoções como o ciúme, Felizes para sempre? acompanha agora a rotina de cinco casais e incluiu em seu roteiro relacionamentos abertos e homossexualidade.

“Todo mundo já viveu, não digo necessariamente um caso extraconjugal, mas uma tentação ou os limites do casamento. Qual o prazer que você tem, diferentemente dos seus pais, em ficar casado? Que tipo de relação que você tem de afeto e de amizade que não está no casamento? Que tipo de chamado isso produz em você, e o que você faz com isso? Depende da sua vida, do que você já viveu ou não. De qualquer maneira, são questionamentos muito contemporâneos. São coisas que as pessoas estão vivendo, assim como os novos tipos de famílias, novas sexualidades, casais gays, casais gays que adotam etc.”, afirma Diaz.

Personagem enorme Meirelles assistiu a uma atuação do ator e diretor Enrique Diaz no teatro e o convidou para o papel. “O mais engraçado é que tenho sido mais diretor do que ator nos últimos anos. Por isso, não faço parte dos portfólios de atores que muitos diretores acessam. Propus um projeto de série para o Fernando (Meirelles) e conversamos. Ele foi ver a minha peça e, depois, me chamou do nada para fazer um personagem enorme como esse”, conta Diaz.

A personagem de Maria Fernanda Cândido “é uma mulher sensível, romântica e ingênua”, segundo a atriz. “Marilia é muito apaixonada pelo marido. O casal está fora de sintonia, e o reflexo disso acaba incluindo problemas sexuais”, afirma.

No contexto dos problemas sexuais, surge a proposta de sexo a três feita pelo marido de Marilia e uma experiência dela com a garota de programa interpretada por Paolla Oliveira. “Ali, nesse caso, é a vida que se apresenta. Aconteceu! É muito interessante, é um espaço sendo preenchido. O legal é que essa relação mostra como as pessoas não controlam a vida. Onde colocar o desejo é uma questão que vamos discutir na minissérie”, diz.

Paolla Oliveira conta que batalhou para ter o papel. “Essa personagem é algo que busquei. E posso dizer que fui atrás, porque fiz a primeira leitura e fui chamada para fazer um teste. Fiz a preparação e, depois, passei por outro teste. Venho buscando personagens diferentes. Esse é um discurso talvez bobo para quem está ouvindo, mas essa é uma personagem diferente e que tem desafios. Uma personagem complexa. Porém as cenas de nudez não têm esse tamanho que as pessoas criam. Faz parte do nosso trabalho de ator.” 

sábado, 24 de janeiro de 2015

Da beleza e do caos

Rio noir reúne autores selecionados por Tony Bellotto para descortinar os mistérios e as sombras da cidade maravilhosa, que vai muito além dos ensolarados cartões-postais


André di Bernardi
Estado de Minas: 24/01/2015



 (Ricardo Moraes/Reuters)


Existe um Rio de Janeiro de lindas praias, um Rio maquiado feito para turistas, de dias ensolarados, de pessoas bonitas e simpáticas correndo, lindas, pela orla de Copacabana. Mas existe ali, meio que pairando, uma outra cidade, contraditória e feia. Pois a Editora Casa da Palavra acaba de lançar Rio noir, iniciativa que dá prosseguimento a uma série de sucesso nos Estados Unidos, Brooklin noir, que reúne contos policiais de grandes autores.

O músico e escritor Tony Bellotto organizou um grupo de apaixonados pelo Rio para descortinar as famosas paisagens da Cidade Maravilhosa. Eles apresentam um mundo de vultos, sangue, intrigas, violência, desvãos e mistérios, com pitadas daquele insubstituível humor tipicamente carioca.

A cidade do Rio de Janeiro, capital do Brasil de 1763 a 1960, é muito mais do que mostram os cartões-postais. Em meio a névoas e neblinas, entram em cena Luiz Alfredo Garcia-Roza, MV Bill, Luiz Eduardo Soares, Guilherme Fiuza, Arthur Dapieve, Victoria Saramago, Arnaldo Bloch, Adriana Lisboa, Alexandre Fraga, Marcelo Ferroni, Flávio Carneiro, Raphael Montes, Luis Fernarndo Verissimo e, como não poderia deixar de ser, o próprio Tony Belotto.

Cada conto apresenta como pano de fundo um bairro carioca – do Leme (Tony Belotto) a Bangu (Luis Fernando Verissimo), passando pela Lapa (Luiz Alfredo Garcia-Roza), Cidade de Deus (MV Bill), São Conrado (Luiz Eduardo Soares), Leblon (Guilherme Fiuza), Cosme Velho (Arthur Dapieve), Floresta da Tijuca (Victoria Saramago), Jacarepaguá (Arnaldo Bloch), Largo do Machado (Adriana Lisboa), Ipanema (Alexandre Fraga), Barra da Tijuca (Marcelo Ferroni), Centro (Flávio Carneiro) e Copacabana (Raphael Montes).

Transitam nesse universo descabido proxenetas, cartomantes, policiais, traficantes, coronéis, socialites, favelados, estelionatários, turistas, corretores, detetives, jornalistas, políticos, assassinos, editores, bandidos, escritores e amantes. Ou seja, cidadãos comuns e ordinários, como é ordinário o sol escaldante de todo dia.

Sob uma perspectiva contemporânea e urbana, Rio noir apresenta contos de personagens tipicamente cariocas, o que não é óbvio, embora possa parecer num primeiro momento, pois a universalidade e o caráter das atitudes de cada um podem ser encontrados em todos nós. Cada situação extrema de cada conto pode muito bem ocorrer em qualquer esquina.

Aquele que conhece o Rio de Janeiro sabe (conheço pouco, pouquíssimo, mas conheço) que ali não cabe embuste. Aquela cidade não é e nunca foi uma cidade mentirosa. É linda, mas também é feia de ser horrorosa. O Rio é uma cidade perplexa, e, arrisco a dizer, sem personalidade. Tudo está ali, escancaradamente pronto, cru, áspero. O Rio de Janeiro, cidade feita de misturas, extrapola versos e reversos.

Trata-se de uma urbe que sabe que é linda, que sabe ser cafajeste – como só as mulheres lindas sabem ser. Tudo ao mesmo tempo, e agora. Ali não existe o meio-termo. Praia e balbúrdia, drogas e poesia, calma e trovão. Carnaval é sinônimo de alvoroço. Tudo é preto no branco, e vice-versa, com direito a azuis desconcertantes e paisagens, muitas paisagens deslumbrantes, pouco mentirosas. A paz está no hidrogel, nas bundas, no desbunde da melhor ditadura, a da alegria.

A cidade que abrigou o poeta Carlos Drummond de Andrade carrega muito de um claro enigma. O Rio é escancaradamente magnífico e misterioso. Sabem disso os 14 autores do livro. Por ser tanto visto, o Rio de Janeiro se tornou barbaramente desassistido. Certas luzes mais cegam que iluminam.

O livro, assim, tenta reverter esse processo. Outros olhares vestem um já vestido Rio. São camadas e camadas de puro paradoxo. Do lindo ao feio, do feio ao lindo, apenas parágrafos, palavras e ideias, histórias desconcertantes. O indesejável muito se presta para a literatura. Escrever sobre o asco é mais difícil e promissor do que falar sobre a esperança de um Cristo de braços abertos diante de tanto esplendor.

De Bic a Mont Blanc, tiros e poesia, caos e glória, medo e puro deleite. O Rio de Janeiro não é uma cidade partida. O Rio de Janeiro é uma cidade estúpida, submersa em si mesma, sem perspectivas que não vão além do próximo pagode, do próximo funk. Só mesmo essa amplidão inviável, esses desvios.

Os autores recolheram lástimas, discórdias, breus, tudo liquidificado no brusco. O romance é mais lânguido, a poesia é um relâmpago. Assim, só mesmo o conto para dar conta de tanta tensão, de tanto tesão e intensidade. O Rio de Janeiro é uma cidade feita para a poesia e para os poetas. Se São Paulo é o inferno, se Belo Horizonte não existe, o Rio de Janeiro é a nossa Paris piorada, com um quê de Londres e Afeganistão. Como diz Rubem Fonseca, na epígrafe do livro: “A cidade não é o que se vê do Pão de Açúcar”.

SÉRIE NOIR

Akashic Books é uma editora independente com sede no Brooklyn, em Nova York, dedicada à publicação de ficção literária urbana. Cada volume da Série Noir traz contos de escritores famosos e iniciantes tendo como pano de fundo alguma cidade dos Estados Unidos. O sucesso foi tão grande que a editora, além de lançar a própria série em outros países, preparou edições especiais com cidades de outros países: Nova Délhi, Paris, Copenhague, Londres e Havana, entre outras. Rio noir é o primeiro volume publicado no Brasil.

RIO NOIR

. Vários autores
. Org: Tony Belotto
. Casa da Palavra, 304 páginas, R$ 39,90

Philosophar - Eduardo Almeida Reis

 A espécie humana, em seus presumíveis 200 mil anos, sempre se drogou


Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 24/01/2015






Álcool é droga? É. Cafeína é droga? É. Nicotina é droga? Claro que é. No entanto, bebidas alcoólicas, cafés finíssimos e produtos com nicotina, pagando impostos, podem ser produzidos e vendidos no Brasil. Com os nicotínicos vem acontecendo fenômeno curioso. Podem ser fabricados, comercializados, pagam impostos altíssimos e o tabagismo, toxicomania caracterizada pela dependência psicológica do consumo de tabaco, está sendo transformado em crime. Enquanto isso, o Santo Daime é “religião”. Não invento. A ayahuasca, bebida alucinógena preparada com o caule do caapi (Banisteriopsis caapi) e folhas de chacrona (Psychotria viridis), é usada ritualmente por populações amazônicas e milhares de adeptos de diversas seitas em todo o Brasil e no exterior. Vou acabar fundando a Igreja Evangélica Tabagista para ficar riquíssimo e fumar charutos de 150 dólares a unidade, como aqueles que os chineses compram em Cuba.

O problema da droga começa pelo fato de não ser uma droga no sentido de gosto ruim, de comida ou bebida de má qualidade, de algo insignificante. Saudoso amigo/irmão, brasileiro notável, inteligentíssimo, cultíssimo, viajado e rico, me disse que experimentou a heroína injetável e a sensação imediata foi a de estar entrando no paraíso.

A espécie humana, em seus presumíveis 200 mil anos, sempre se drogou, o que não impede os animais irracionais de se drogarem. Você já deve ter visto aqueles vídeos com elefantes, macacos e outros bichos cambaleantes de tão bêbados depois de comer os frutos da Sclerocaraya birrea, árvore de tamanho médio originária do bioma das savanas da África Oriental. Tenho aqui na adega um litro ainda virgem do licor Amarula, produzido com os frutos daquela árvore, importante fonte de alimentos para diversos animais da região. A Sclerocraya birrea foi espalhada pela África seguindo as migrações do povo banto.

Existe algo melhor do que boa cerveja, de alto teor alcoólico, ou um chope bem tirado? Que existe, existe, mas não posso explicar neste espaço imaculado de nossa mídia porque sou de uma pudicícia que encanta e comove. Fiquemos na cerveja, no uísque, nos vinhos, nos champanhas e assemelhados. O pilequinho social é muito gostoso. E você contribui para o bem do povo e felicidade geral da Nação pagando impostos altíssimos, criando empregos, fazendo amigos.

Todos sabemos das consequências da Lei Seca norte-americana. Daí a pergunta que lhes faço: por que não liberar a produção e comercialização de todas as drogas? Quem quiser cheirar, fumar, injetar-se, que cheire, e fume e se injete pagando impostos. O sistema que aí está não funciona, o tráfico está cada vez mais violento e organizado, o Brasil, com 3% da população mundial, responde por 10% dos homicídios cometidos no planeta. Creio desnecessário repetir que sou virgem de pós, fuminhos e drogas injetáveis. Bastam-me os uisquinhos e os charutinhos ainda permitidos. Portanto, não estou advogando em causa própria.

Tristeza

Nada mais fácil e mais feio do que ficar sentado numa poltrona, em casa, criticando os jornalistas que lá estão maquiados nos estúdios das tevês, ao vivo, em cores, de improviso, tentando fazer o seu trabalho honestamente. Sobretudo quando a jornalista é um docinho de coco, linda, voz aveludada, objeto dos sonhos de onze entre dez cavalheiros sérios solteiros, casados, viúvos ou divorciados.

Faz mais de uma hora que estou aqui diante do computador, depois de desligar a tevê na sala, me perguntando: escrevo, não escrevo, comento, não comento, critico, não critico? Nesse meio tempo, aproveitei para cortar as unhas das mãos e aceitei o copo com água gelada que a comadre me ofereceu.

A mesma comadre que veio correndo ao living onde fica o televisor, com os gritos que dei diante da ignorância da jornalista que é um docinho de coco, linda, voz aveludada, objeto dos sonhos de onze entre dez cavalheiros sérios solteiros, casados, viúvos ou divorciados.

De unhas cortadas, copo vazio da água que bebi, acabo de tomar uma sábia decisão: não vou falar o nome da moça nem comentar o assunto. Não sou palmatória do mundo. Reservo-me o direito de ficar calado e triste, muito triste mesmo, porque a derrapada foi de entristecer um continente, ou dois, ao vivo e em cores com um interlocutor que falava diretamente da Austrália.

O mundo é uma bola


24 de janeiro de 41: Gaius Julius Caesar Augustus Germanicus, o Calígula, é assassinado aos 28 anos por sua Guarda Pretoriana, algo assim como a guarda presidencial matar um presidente da República Federativa do Brasil. O apelido Calígula, ou “botinhas”, veio dos legionários comandados por seu pai, que se divertiam vendo o menino calçando pequenas caligae (sandálias militares) ao acompanhar as tropas. Germanicus, o pai do guri, é considerado um dos maiores generais da história de Roma. Militar supimpa, teve um filho maluco, que foi imperador romano durante quatro anos, de março de 37 a janeiro de 41. Hoje é o Dia da Previdência Social e o Dia dos Aposentados.

Ruminanças


“No Reino Unido, água mineral está custando mais que o leite. Para salvar a pecuária britânica, só dando um jeito de botar leite na água” (R. Manso Neto).