Bruna Sensêve
Estado de Minas: 18/01/2013
“Minha mulher e eu sempre fomos apaixonados e, apesar dos anos de casamento, o fogo da paixão era uma constante. Mas, de um ano para cá, tudo vem mudando e tenho perdido o interesse.” A angústia do administrador de empresas João Paulo*, de 62 anos, era acompanhada pelas desconfianças da mulher, que não entendia a mudança de comportamento do marido e carregava a certeza de que ele tinha uma amante. A disposição para o trabalho também tinha diminuído, “a ponto de toda segunda-feira ser encarada como um suplício”. A reviravolta na vida relatada ao endocrinologista Maurício Bungerd Forneiro e descrita pelo médico no livro Vida e prazer após os 50 tinha, na verdade, uma razão hormonal: João Paulo amargava os efeitos da andropausa.
A doença, cientificamente chamada de deficiência androgênica do envelhecimento masculino (Daem), atinge de 10% a 30% dos homens a partir de 50 anos e tem sintomas parecidos com os da menopausa — a interrupção na produção hormonal que acomete as mulheres, encerrando os ciclos menstruais e ovulatórios. Geralmente, eles também sofrem de insônia, dor de cabeça e impaciência. Mas as principais queixas ouvidas pelos urologistas, como a de João Paulo, referem-se à diminuição do desejo sexual. “Quando está acima do peso ou com pressão alta, o homem não valoriza tanto quanto a questão da disfunção ou da queda da libido. Todos ficam preocupados neste último caso, mas nem todos têm a motivação de procurar o médico”, diz Alexandre Hohl, presidente do Departamento de Endocrinologia Feminina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
Hohl lembra um estudo feito nos Estados Unidos, em 2004, que indicou que apenas 5% dos homens que precisavam de tratamento para andropausa realmente o recebiam. Dados similares não existem no Brasil, mas pesquisa publicada em julho pela Sociedade Brasileira de Urologia mostra que 64% dos brasileiros nunca fizeram um exame de detecção do nível de testosterona, condição básica para diagnosticar o início do problema.
Intervenção segura Como as mulheres, os homens que têm andropausa podem aliviar os sintomas do problema por meio de reposição hormonal. A constatação dos sintomas e a confirmação laboratorial, porém, não são os critérios finais para que o tratamento seja indicado. O terceiro e talvez o mais importante fator é a segurança. Não pode haver qualquer contraindicação, enfatiza o médico e escritor Maurício Forneiro. “A reposição não é para quem quer, mas para quem pode fazer. Nem todo mundo pode, tem que ser elegível para isso e com muito critério”, enfatiza. A terapia não pode ser feita em pacientes com apneia do sono, alta concentração de hemoglobinas no sangue ou câncer de próstata ativo, por exemplo.
Forneiro descarta ainda qualquer relação entre a reposição hormonal e o risco de câncer. De acordo com ele, um artigo publicado em 2004, no New England Journal of Medicine, analisou mais de 5 mil pacientes, metade deles sob tratamento de reposição hormonal. Os resultados mostraram que aqueles com níveis baixos do hormônio tinham uma incidência maior do câncer de próstata. Em contrapartida, os com taxas normais tinham menor incidência de tumores malignos. “Como muitos outros estudos, esse artigo mostra que o indivíduo que está repondo a testosterona a níveis adequados está menos exposto. Essa é inclusive uma das armas que nós, médicos, temos para tratar o paciente após um câncer de próstata”, observa.
* Nome fictício
A prevenção começa na infância
Nos últimos 50 anos, o percentual de idosos no Brasil praticamente dobrou. Somente de 2000 a 2010, foram quase 2 milhões de homens chegando à terceira idade, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O impacto da longevidade sobre a saúde masculina é direto, alertam especialistas. Hábitos de vida mais saudáveis conseguem afastar a ocorrência de problemas, incluindo a andropausa.
Fenômenos externos podem fazer com que a baixa hormonal ocorra mais cedo e de forma mais severa. Tabagismo, obesidade, diabetes, sedentarismo, hipertensão e o uso crônico de medicamentos conseguem despertar os sintomas da andropausa em homens ainda na quarta década de vida, ao mesmo tempo que aqueles com hábitos de vida saudáveis tendem a vivenciar uma queda dos hormônios mais tardiamente, em média aos 70 anos.
Reconhecer fatores de risco precocemente é a chamada prevenção primária, capaz de reverter quadros antes do desenvolvimento de problemas graves de saúde. “Um sujeito com 30 e poucos anos é obeso, tem maus hábitos alimentares, vai ao médico e detecta que a glicose está alta. Se ele é bem orientado, pode perder peso, mudar seus hábitos e evitar um infarto ou um derrame. Sua sobrevida é maior porque fez intervenções importantes antes que elas provocassem lesões”, exemplifica o geriatra Salo Buksman.
Apesar de óbvia, a relação não faz parte da rotina dos homens, independentemente da idade que eles têm. “Nem mesmo os idosos aceitam bem a ida ao consultório. Vejo que grande parte dos homens vai levada pela família. Quando procuram espontaneamente é porque já estão muito mal. Eles detestam reconhecer a própria vulnerabilidade, novos ou velhos”, observa Buksman. (BS)
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