ZERO HORA - 20/02/2013
Passei duas semanas à beira-mar, caminhando, pedalando, rindo com os
amigos e mergulhada em boas leituras. Aproveitei o descanso para me
extasiar com Os Enamoramentos, de Javier Marias, para conhecer a ironia
cativante de David Foster Wallace em seu Ficando Longe do Fato de já
Estar meio que Longe de Tudo e voltei a consultar o filósofo Cioran,
cuja amargura não deixa de ter um lado divertido.
No último dia de praia, antes de retornar a Porto Alegre, li por
coincidência o seguinte trecho em um dos seus livros: “Se um governo
decretasse em pleno verão que as férias fossem prolongadas
indefinidamente e que, sob pena de morte, ninguém deveria abandonar o
paraíso em que se encontra, se produziriam suicídios em massa e
massacres sem precedentes”.
Fechei o livro e olhei para o mar azul à minha frente, com veleiros
brancos a navegar suavemente, parecendo propaganda de cartão de crédito,
e pensei em como eu reagiria se alguém decretasse: agora será esse
idílio para sempre, baby. Acho que desataria a chorar. O paraíso não tem
a mínima graça se não for confrontado com o inferno.
Às vezes, me pego sonhando com uma casinha num balneário pouco
movimentado, onde eu pudesse passar o ano inteiro nadando, escrevendo,
lendo, comendo peixe e demais alimentos saudáveis, e tudo me parece
encantador, ou então imagino uma casinha na serra, cercada de verde por
todos os lados, o clima frio, lareira, vinho tinto, eu igualmente
afastada da baderna urbana, fazendo minhas caminhadas contemplativas, e
também me parece um espetáculo de bem viver, até que alugo uma dessas
casinhas por 15 dias e acho tudo de fato sensacional, mas, lá pelas
tantas, percebo um formigamento na alma: até do trânsito da Nilo Peçanha
começo a sentir falta.
Onde me sinto verdadeiramente em casa? Não é no meu idealismo, e sim
na concretização das minhas atividades profissionais e pessoais. Me
sinto em casa em aeroportos, conhecendo gente nova, aceitando trabalhos
que produzem um glupt na garganta (misto de medo e excitação), fazendo
malabarismo para dar conta das tarefas programadas, acordando a cada
manhã sem saber direito o que o dia me trará.
E, apesar de toda a carga adrenalínica, finalizo essa odisseia
jogada no sofá ouvindo música, com a satisfação de ter cumprido o que
pretendia e de ainda ter sobrado tempo para o nada (sempre reservo um
tempo para coisa nenhuma). “Lar” é onde cabem todos os eus que me
habitam, não só o eu preguiçoso e indolente, mas também tudo o que
precede a ele.
Talvez mais adiante eu invista num segundo endereço em outra cidade e
alterne minhas permanências – um pouco lá, um pouco cá –, mas, por ora,
não pretendo me acomodar a um calendário composto só de domingos,
evitando o confronto com as angústias, as dúvidas, os desafios. Férias
só se justificam por serem provisórias, são fantásticas porque terminam,
é essa consciência do finito que faz com que valorizemos cada segundo
vivido.
Que bom estar de volta à imprevisibilidade dos dias.
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