Sérgio Rodrigo Reis
Estado de Minas: 20/09/2013
Autorretrato em esfera espelhada (detalhe), 1935
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Gênio da imaginação lúdica e artesão habilidoso das artes gráficas, Maurits Cornelis Escher (1898–1972) é espelho dos paradoxos que produziu. Trabalhou solitariamente, foi incompreendido, criticado, teve as criações depreciadas pelos que julgavam sua estética antiquada, inspirada em preceitos matemáticos, até que conseguiu dar a volta por cima. Na década de 1950, quando o público americano reconheceu seu talento, o sucesso foi tanto que ele passou a reclamar da falta de tempo para se dedicar às impressões. A xilogravura Nunca pense antes de agir, de 1921, na qual um homem percorre um caminho estreito, à beira de um abismo, tendo à mão uma lanterna, é metáfora do que ele passou na realidade.
“Nas minhas gravuras tento mostrar que vivemos em um mundo belo e ordenado, e não em um caos sem regras... Eu não consigo deixar de brincar com as nossas certezas estabelecidas. Tenho grande prazer, por exemplo, em confundir deliberadamente a segunda e a terceira dimensões, plana e espacial, e ignorar a gravidade”, registrou. Ao potencializar efeitos e as consequências de alguns fenômenos de espelhamento, perspectiva e matemática em diversas instalações interativas e lúdicas, recursos que o tornaram conhecido, a exposição propõe uma viagem pela vida e obra de um dos nomes mais criativos da história da arte contemporânea.
De cima, de baixo, 1947 |
Até 17 de novembro, nas galerias Alberto da Veiga Guignard, Arlinda Corrêa Lima e Genesco Murta, do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). De terça a sábado, das 9h30 às 21h; domingo e feriados, das 16h às 21h. Entrada gratuita. Classificação
Razão e fantasia
Obra de Escher, em sua rigorosa composição matemática e liberdade de imaginação, vem desafiando a crítica sem nunca deixar de encantar o público de todo o mundo
Sérgio Rodrigo Reis
Cada vez menor (detalhe), de 1958 Sobre o trabalho, Escher explicou: %u201CNessa xilogravura adotei uma redução contínua, quase maníaca, até alcançar o limite da execução na prática%u201D |
Ao se deparar com mosaicos mouros numa viagem à Espanha, Escher se sentiu estimulado ainda a desenhar utilizando-se do preenchimento regular do plano. Os efeitos de como as formas das figuras se entrelaçavam e se repetiam, formando padrões geométricos, estimularam sua imaginação. Ao usar nos desenhos uma malha de polígonos, regulares ou não, surgiram modificações sem alterar a área do polígono original. O processo o inspirou a criar figuras de homens, peixes, aves, lagartos, todos envolvidos de tal maneira que nenhum poderia mais ser alterado. Quando decidiu representar o espaço tridimensional no papel, a técnica deu novo salto, originando representações distorcidas e os paradoxos. “Talvez esteja sempre em busca do espantoso e, por isso, procure apenas provocar espanto no espectador”, justificou o artista.
Confira alguns dos recursos dos quais Escher lançou mão para criar efeitos que fazem dele um dos mais importantes artistas gráficos contemporâneos, amado pelo público em todo o mundo, o que confirma a universalidade de seu trabalho.
Ambiguidade
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Certa vez Escher disse: “É preciso haver certo grau de mistério, mas que não seja imediatamente aparente”. A litografia Desenhando (foto), de 1948, serve de exemplo desse raciocínio. Tachas fixam um papel em um suporte. Uma mão direita segurando um lápis esboça sobre a folha um punho de camisa. Uma mão esquerda emerge de outro punho e, elevando-se em relação ao plano, ganha vida. Por sua vez, a mão esquerda esboça o punho de onde sai a direita. Mesmo com composição rigorosa, o efeito é de pura fantasia.
Espelhamento
O artista brincava com espelhos e imagens refletidas. Explorou o recurso de vários modos, até mesmo em grande número de autorretratos, que sempre envolviam o uso de um espelho. Sempre trabalhou com um espelho convexo. A distorção produzida cria uma visão ampla do entorno. A litografia Três esferas II (foto), de 1946, ilustra essa pesquisa.
Ladrilhamento
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O conceito de divisão regular do plano – o ladrilhamento – é considerado por Escher como seu tema mais importante. Era sua maneira de expressar a fascinação pela eternidade e pelo infinito de diferentes formas. Na xilogravura Céu e água I (foto), de 1938, as silhuetas dos peixes brancos se fundem para formar o céu para as aves, enquanto na metade inferior os pássaros pretos se misturam para dar forma à água para os peixes. Já na litografia Encontro (1944), o recurso é usado para criar dois tipos de figuras que se fundem.
Impossível
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Escher induz o espectador a perceber uma situação impossível como realidade. Muitas vezes é necessário um olhar mais atento para perceber que o que se vê não pode ser real. Em De cima, de baixo (1947), a mesma cena é vista duas vezes: na metade superior da gravura, o ponto de vista é o de cima para baixo. A metade inferior oferece a mesma vista, porém nem toda perspectiva parte do nível térreo. “Às vezes parece-me que ficamos aflitos e possuídos por um desejo pelo impossível”, dizia. São exemplos da reflexão o entalhe Outro mundo (1947) e a litografia Cascata (foto), de 1961.
Eternidade
A combinação de técnicas artísticas tradicionais e conhecimentos matemáticos específicos é fundamental para obra de Escher. Os temas matemáticos vão além dos limites tradicionais de arte e dão às gravuras o poder de criar formas e propor mitologias. A xilo Fita de Moebius II (foto), de 1963, foi feita a partir deste raciocínio.
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