quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Câmara abre o voto para limpar imagem‏

Após o vexame na votação que manteve o mandato de Donadon, deputados aprovam PEC que acaba com o sigilo em todas as decisões do Poder Legislativo. Proposta agora vai para o Senado



Adriana Caitano, Karla Correia e Juliana Braga


Estado de Minas: 04/09/2013 


Deputados fizeram campanha ontem em defesa da proposta que extingue o voto secreto e tramitava desde 2001 na Casa. A PEC terminou aprovada por unanimidade dos 452 parlamentares presentes     (Laycer Tomaz/Agência Câmara)
Deputados fizeram campanha ontem em defesa da proposta que extingue o voto secreto e tramitava desde 2001 na Casa. A PEC terminou aprovada por unanimidade dos 452 parlamentares presentes

Brasília – Na ânsia de dar uma satisfação imediata à sociedade após manter o mandato do deputado presidiário Natan Donadon (sem partido-RO), o plenário da Câmara aprovou ontem, em votação aberta, por unanimidade dos 452 presentes, o fim do sigilo em todo tipo de votação no Congresso, nas assembleias legislativas e nas câmaras municipais. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 349/2001, que agora segue para o Senado, acumulava poeira na Casa desde 2006, quando tinha sido aprovada em primeiro turno, e enfrentava resistências de todos os lados. De repente, acabou ressuscitada e aplaudida por todos os parlamentares, fazendo com que a outra proposta que acabaria com o voto secreto apenas para a cassação de mandatos, já aprovada no Senado, perdesse força. Com a ação, a Câmara completa o jogo de empurra sobre o tema, em que uma Casa vota uma versão do assunto e envia a conclusão do problema para a outra. O resultado, por enquanto, é que o voto aberto continua sendo somente uma promessa.

A PEC 349 havia sido aprovada em primeiro turno exatos sete anos atrás (setembro de 2006), às vésperas das eleições e sob pressão popular após o réu do mensalão João Paulo Cunha (PT-SP) ter sido absolvido em sessão com voto secreto. Na época, temia-se que os parlamentares envolvidos no chamado escândalo dos sanguessugas também escapassem sob o manto do sigilo. Todos os acusados acabaram se livrando antes de serem julgados em plenário. Mas, desde então, a falta de transparência no voto já beneficiou, além de Donadon, a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), que manteve o mandato, apesar de ser flagrada em vídeo recebendo dinheiro de Durval Barbosa, delator do mensalão do DEM em Brasília. Entre a primeira votação e ontem, foram apresentados 23 requerimentos para que o tema voltasse à pauta – todos em vão.

Cobrado pela sociedade durante as manifestações de junho, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), exigiu que a PEC 196/2012, que acaba com o voto secreto apenas em caso de cassações de mandato, caminhasse na Casa. Ela havia sido aprovada no Senado em julho de 2012 e só saiu da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara em junho deste ano. Henrique tentou convocar a comissão especial que tratava do tema, mas PT e PMDB demoraram dois meses para indicar os integrantes. Ontem, ao colocar a PEC mais abrangente em pauta, ele garantiu que a 196 continuará tramitando.

Vontade política A virada para aprovação da PEC mais abrangente veio principalmente com uma declaração do líder do PT, José Guimarães (CE), na noite de segunda-feira. Irritado com os comentários de que o partido foi um dos responsáveis pela absolvição de Donadon, ele declarou que iria “radicalizar”, defendendo o voto aberto para todas as votações do Congresso. Mesmo sabendo que a PEC 196 poderia ser aprovada com maior rapidez, caso houvesse vontade política, Guimarães sugeriu que as atividades da comissão especial fossem encerradas para que os esforços se concentrassem na 549. “Prefiro o caminho mais longo e abrangente ao faz de conta”, afirmou, repetindo o discurso ontem na reunião de líderes. O petista teve o apoio do líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), que também demorou a indicar nomes para o colegiado.

O temor de boa parte dos parlamentares que já defendiam o voto aberto antes era de que o fim da novela seria adiado ao se aprovar primeiro a PEC que extingue todo tipo de voto secreto, que ainda terá tramitação no Senado. “Esse tema é sério e não pode se transformar em manobra protelatória”, preocupou-se o presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Voto Aberto, Ivan Valente (PSOL-SP). “O vaso já se quebrou, não adianta tentar colar os pedacinhos agora”, comentou Júlio Delgado (PSB-MG).

Alguns senadores também entenderam o ato de Henrique como forma de empurrar o problema para o Senado. “Quem está em dívida com a sociedade é a Câmara”, disse o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). O próprio presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), aproveitou para cobrar da Câmara a aprovação dos temas da pauta positiva já enviados a ela. “Seria mais racional que a Câmara tivesse apreciado em primeiro lugar a proposta que o Senado aprovou há um ano, como um primeiro passo”, ponderou. (Colaborou Leandro Kleber)

DELIBERAÇÕES

Como é hoje

Situações em que a votação é secreta (e que a PEC aprovada ontem extingue):
» Eleição da Mesa Diretora
» Suspensão das imunidades
» Escolha de autoridades (magistrados, ministros, procurador-geral da República, diretores de agências reguladoras, diretores do Banco Central, chefes de missão diplomática)
» Exoneração do procurador-geral da República
» Perda de mandato parlamentar
» Vetos presidenciais

Em tramitação

PEC 349/2001
» Extingue a votação secreta em todo o poder Legislativo, incluindo Congresso Nacional, assembleias legislativas e câmaras municipais
Autor: deputado Luiz Antônio Fleury (PTB-SP)
Situação: aprovada ontem na Câmara, segue agora para o Senado, onde deve passar pela CCJ, por uma comissão especial e pelo plenário em dois turnos

PEC 196/2012
» Acaba com o voto secreto em caso de cassação de mandato
Autor: senador Alvaro Dias (PSDB-PR)
Situação: já passou pelo Senado e aguarda prazo de emendas na comissão especial da Câmara. Precisa ainda ser aprovada em dois turnos no plenário

PEC 20/2013
» Prevê a adoção de voto aberto em todas as decisões do Congresso Nacional
Autor: senador Paulo Paim (PT-RS)
Situação: aprovada na CCJ do Senado, ainda aguarda votação no plenário para depois seguir para a Câmara

PEC 4/2007
» Inclui a infidelidade partidária como causa de perda de mandato e extingue o voto secreto no processo de cassação de deputados e senadores
Autor: ex-deputado Flávio Dino (PCdoB-MA)
Situação: passou pela CCJ da Câmara e aguarda criação de comissão especial




Análise acelerada no Supremo


 (Fellipe Sampaio/SCO/STF)

O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), reuniu-se ontem com o ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa (foto) para pedir uma decisão célere do plenário da Corte sobre a situação do deputado presidiário Natan Donadon. Segundo Alves, o presidente da Corte disse que tentará colocar em pauta já na próxima semana a apreciação da liminar do ministro Luís Roberto Barroso suspendendo a sessão que manteve o mandato do deputado. Ainda ontem, o ministro do STF Gilmar Mendes avaliou que a solução encontrada por Barroso para o caso abre espaço para distorções ao permitir que políticos cumprindo pena em regime semiaberto exerçam o mandato. O entendimento fixado na decisão tem potencial para beneficiar três dos quatro deputados condenados no caso do mensalão: José Genoino (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP).

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