João Paulo
Estado de Minas: 02/09/2013
Malhas em preto e branco criam seres mitológicos em movimento |
As estreias são sempre arriscadas. No entanto, em Triz, novo balé do Grupo Corpo, o risco permanece. A coreografia de Rodrigo Pederneiras para a trilha original de Lenine se mantém na cabeça do espectador depois do espetáculo terminado. De certa maneira, quem estreia é o público: Triz obriga a repensar o que todos achavam que sabiam de dança, de música e do Corpo.
Alguns elementos ajudam a definir este espetáculo: a trilha com 10 temas arranjados para instrumentos de cordas, sempre trabalhados na forma de variação (com espelhamentos, inversões e mudanças de ritmo constantes); a contenção da caixa cênica numa falsa geometria limitada por cabos de aço, que compõem a parede ao mesmo tempo sólida em sua textura e vazada pela luz; os movimentos inovadores, que incorporam ao repertório e à gramática da companhia a criação coletiva dos bailarinos; os figurinos com malhas em preto e branco coladas ao corpo, segmentado longitudinalmente, “dividindo” o bailarino ao meio e criando, com o movimento, a ilusão de novos seres mitológicos paridos pelo movimento.
A soma do trabalho de Rodrigo Pederneiras (coreografia), Lenine (música), Paulo Pederneiras (cenografia e iluminação, esta com Gabriel Pederneiras) e Freuza Zechmeister (figurino), aliada à interpretação dos bailarinos, poderia resumir um grande espetáculo. Sem dúvida, é. Mas tem mais.
Triz tem identidade própria, que dialoga com a história do grupo, mas incorpora elementos originais que desafiam o espectador. O primeiro deles é a mescla, quase impossível, de caos e ordem. O coreógrafo foi longe em sua ousadia ao misturar tempos e formações, com duos e trios criados e desmanchados o tempo todo. Os conjuntos se deslocam lateralmente, dando sensação de bidimensionalidade, para depois explodir em outras configurações de volume e espaço.
O cartesianismo vicário da estrutura do palco, que poderia ser pensado como o mecanismo interno de um grande instrumento, faz bailarinos se moverem como objetos que se entrechocam e interferem na sonoridade. Convoca-se o olhar de quem a assiste a buscar nova ordem na aparente desordem. Na vida não há puro caos ou cosmos, mas “caosmos”.
Outro elemento é a sensação de momento decisivo, que alude ao conceito de Triz: a aceitação dos limites e do risco em enfrentá-los. Há momentos em que a contagem dos compassos vaza da trilha para o palco e em que aquilo feito atrás do cenário se revela mais essencial que a cena. Essas passagens sintetizam toda a busca do espetáculo, que vai se construindo como um risco permanente aos olhos do público.
Triz não tem medo de enfrentar barreiras. É um exercício de coragem. Para o público que costuma esperar a perfeição, o Corpo foi adiante.
TRIZ
Palácio das Artes, Av. Afonso Pena, 1.537,
Centro, (31) 3236-7400. Hoje, 21h (sessão extra);
amanhã, 20h30 (ingressos esgotados).
R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia).
Nenhum comentário:
Postar um comentário