segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Mais que mil palavras - Mariana Peixoto

Belo Horizonte recebe exposição que conta a história do fotojornalismo no Brasil a partir do acervo de imagens da revista O Cruzeiro, uma das mais importantes publicações do país 


Mariana Peixoto

Estado de Minas: 09/09/2013 


Índio iaualapiti, 1949, Serra do Roncador, Mato Grosso (José Medeiros/Acervo IMS  )
Índio iaualapiti, 1949, Serra do Roncador, Mato Grosso
 A imagem em movimento antes da imagem em movimento. No período pré-televisão, cabia principalmente à fotografia a missão de documentar a realidade. A revista semanal O Cruzeiro (1928–1975) fez muito mais do que isso. Em seu auge, nas décadas de 1940 e 1950, a publicação criada por Assis Chateaubriand e editada pelos Diários Associados apresentou ao brasileiro um olhar acurado para um país em transformação e um mundo que, estarrecido pela guerra, tentava se recuperar. É justamente esse período o foco da exposição As origens do fotojornalismo no Brasil – Um olhar sobre O Cruzeiro, organizada pelo Instituto Moreira Salles, que chega amanhã a Belo Horizonte. A abertura, terça-feira, será para convidados; a partir de quarta-feira, para o público em geral. A mostra tem apoio do Estado de Minas, detentor de parte do acervo da publicação.

Getúlio Vargas em seu gabinete, década de 1940, Rio de Janeiro (Jean Manzon/Arquivo Cepar Consultoria  )
Getúlio Vargas em seu gabinete, década de 1940, Rio de Janeiro

“Na primeira fase, ela era uma revista que utilizava a imagem de maneira mais ilustrativa. Foi no começo dos anos 1940 que nasceu a proposta de reformulação, em que se pensou a revista a partir de duas vertentes: o uso intensivo de fotos e o conceito de reportagem absolutamente associados à imagem”, afirma o coordenador de fotografia do IMS, Sergio Burgi, que assina a curadoria da exposição com Helouise Costa, professora e curadora do Museu de Arte Contemporânea da Universidde de São Paulo. Dois nomes contratados em 1943 são peças-chave para essa mudança: o jornalista David Nasser, o fotógrafo francês Jean Manzon, que chegou ao Rio de Janeiro fugindo da guerra e tornou-se seu parceiro. Juntos, formaram a grande dupla do jornalismo brasileiro daqueles anos.


Presidente Juscelino Kubitschek se dirige ao palanque do Palácio da Alvorada, 1960, Brasília (Luiz Carlos Barreto/EM/O Cruzeiro  )
Presidente Juscelino Kubitschek se dirige ao palanque do Palácio da Alvorada, 1960, Brasília

“No período anterior ao fim da Segunda Guerra (1945) todo o jornalismo foi mais baseado na notícia da vertente mais sensacionalista, no sentido da aventura. Eles ‘criavam a notícia’, havia menos compromisso com a objetividade. No pós-guerra, havia uma geração que iria se comprometer com um jornalismo mais humanista, engajado e objetivo”, continua Burgi. A exposição, que já foi vista nos centros culturais do IMS do Rio, São Paulo e Poços Caldas (e gerou um livro-catálogo impecável, que traz, além de textos do curadores e convidados, fotos e edições fac-símile d’O Cruzeiro), traz o trabalho de 17 fotojornalistas.


Guerra da Coreia, 1951    A exposição do IMS destaca o trabalho de nomes como Jean Manzon, Pierre Verger, Eugênio Silva e José Medeiros, que documentou o negro   e o índio, nos anos 1950, de uma maneira nunca antes vista no país, além de Luiz Carlos Barreto, que saiu da revista para se tornar fotógrafo do Cinema Novo e depois um dos grandes produtores brasileiros. Entre eles, nomes hoje francamente reconhecidos, há o de Luciano Carneiro, menos falado mas tão importante para a revista quanto. %u201CFoi o nosso Robert Capa%u201D, afirma Sergio Burgi a respeito do cearense, morto aos   33 anos. Correspondente internacional, Carneiro trabalhou uma década na revista. Também piloto e paraquedista, ele, por exemplo, saltou   ao lado do Exército norte-americano sobre as linhas inimigas durante   a Guerra da Coreia (1950%u20131953). Voltou para o Brasil somente em 1955. Quatro anos mais tarde, em dezembro de 1959, na falta de outro fotógrafo, foi convocado para cobrir o primeiro baile de debutantes   de Brasília. Na volta da reportagem, morreu num desastre aéreo.  (Luciano Carneiro/Acervo IMS)

Guerra da Coreia, 1951 A exposição do IMS destaca o trabalho de nomes como Jean Manzon, Pierre Verger, Eugênio Silva e José Medeiros, que documentou o negro e o índio, nos anos 1950, de uma maneira nunca antes vista no país, além de Luiz Carlos Barreto, que saiu da revista para se tornar fotógrafo do Cinema Novo e depois um dos grandes produtores brasileiros. Entre eles, nomes hoje francamente reconhecidos, há o de Luciano Carneiro, menos falado mas tão importante para a revista quanto. %u201CFoi o nosso Robert Capa%u201D, afirma Sergio Burgi a respeito do cearense, morto aos 33 anos. Correspondente internacional, Carneiro trabalhou uma década na revista. Também piloto e paraquedista, ele, por exemplo, saltou ao lado do Exército norte-americano sobre as linhas inimigas durante a Guerra da Coreia (1950%u20131953). Voltou para o Brasil somente em 1955. Quatro anos mais tarde, em dezembro de 1959, na falta de outro fotógrafo, foi convocado para cobrir o primeiro baile de debutantes de Brasília. Na volta da reportagem, morreu num desastre aéreo.

Entre os grandes temas apresentados nas imagens está a temática indígena. “A Marcha para o Oeste, de ocupação territorial da região e os primeiros contatos com populações indígenas”, exemplifica Burgi. Há também campanhas criadas pelo próprio Chateaubriand. “Os museus de arte de São Paulo, principalmente o Masp. No processo do pós-guerra, Chateaubriand, com Pietro Maria Bardi, comprou obras de mestres europeus da pintura a preços super-reduzidos. Ele usou O Cruzeiro para fazer com que as elites paulistanas se comprometessem com a compra dos quadros. E o acervo do Masp viajou para a Tate, em Londres, Metropolitan, de Nova York. Foi como uma apresentação da elite política brasileira ao mundo.”


Retirante nordestina, 1952 (Eugênio Silva/Acervo EM/O Cruzeiro)
Retirante nordestina, 1952

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