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Está chegando ao fim a Feira do Livro de Frankfurt. Amanhã, começam a retornar os 70 escritores brasileiros que aqui vieram. Impossível falar desta feira de 2013 sem me lembrar de 20 anos atrás, da feira de 1994, quando o Brasil foi, pela primeira vez, o país homenageado. Uma coisa é ter vindo agora como simples convidado, outra foi ter participado da organização da mostra em 1994 como presidente da Fundação Biblioteca Nacional.
A lembrança se espraia para coisas que não são pessoais, mas nacionais. Acontece que estávamos aqui, em Frankfurt, quando chegou a notícia de que Fernando Henrique Cardoso havia sido eleito com 54% dos votos. Uma votação espantosa resultante da implantação, no governo Itamar, da nova moeda – o real. Não fosse o êxito da nova moeda, FHC nunca teria sido presidente.
Então ocorreram os oito anos do governo FHC, os oito de Lula e agora Dilma. São uns 20 anos. E 20 anos parecem uma medida literária. Aí cabe uma geração. T. S. Eliott dizia ter vivido 20 anos entre as duas guerras mundiais. Drummond indaga se poderia esperar 20 anos pela poesia. Por isso, olho esses escritores que estão junto a mim e que naquela época eram rascunhos de si mesmos. Onde estava Luiz Ruffato, que fez agora um provocador discurso na abertura falando das mazelas do país? E Paulo Lins, que foi meu aluno na UFRJ nos anos 1980?
Considero-me então um escritor sênior. Eu, Ignácio de Loyola Brandão, Sérgio Sant’Anna, Nélida Piñon, Marina Colasanti e muitos que aqui retornaram. Era, então, o apogeu da geração 70, que tinha também Moacyr Scliar, Antonio Torres, Ivan Ângelo e outros. O presidente da Academia Brasileira de Letras que fez o discurso de abertura era o Josué Montello, já falecido; agora é Ana Maria Machado, segunda mulher a presidir aquela instituição.
Vendo a Alemanha liderando a Europa, lembro-me forçosamente do passado. O muro de Berlim havia sido posto abaixo em 1989. O país renascia e tinha que absorver toda a parte comunista, bastante inoperante. Bem antes, nos anos 1970, eu havia atravessado o muro pra ver o que era Berlim Oriental: uma tristeza. Em 1994, na programação da feira, fui a Berlim Oriental fazer leitura de poemas na casa que pertenceu a Bertolt Brecht.
O Brasil decidiu trazer agora sua parte menos exótica, mais moderna. Alguns acham que este é um viés paulista: querer ser tão europeu e americano quanto os americanos e europeus. Já em 1994 houve mesa-redonda sobre “O Brasil no imaginário europeu”. Essa é uma questão recorrente. Há um jogo de espelhos entre a América e a Europa. Um imagina o outro, um vê no outro o seu ideal e o seu contrário. Bem dizia Américo Castro que o latino-americano não vai à Europa, mas retorna à Europa.
Os discursos sobre periferia e violência que aparecem nos nossos filmes e romances talvez estejam substituindo o exótico de ontem. Seriam estereótipos?
Os discursos de abertura feitos por alemães e brasileiros foram sintomáticos disso tudo. Falou-se muito de cultura e de mercado. E esta feira, que recebe 300 mil pessoas, é o grande mercado do livro, aqui se decide onde estamos e para onde vamos. Como disse uma das autoridades alemãs, o tripé autor-editor-leitor foi alterado. Há uma infinidade de elementos mediadores criados pela internet. Fico pensando no que será a literatura em nossos países daqui a 20 anos.
Umberto Eco e Jean-Claude Carrière escreveram Não contem com o fim do livro. Também acredito nisso. De qualquer maneira, acho meio difícil estar de novo aqui, daqui a 20 anos, em 2033 ou 2034.
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