Queimando navios, Eduardo Campos tem mais
a perder na aliança com Marina. Mas num tempo de política sem riscos,
isso o distingue de seus pares
Estado de Minas: 13/10/2013
Para a estética da
política, em sua hora de “Geni”, é bonito e quase comovente o discurso
da dupla Eduardo Campos/Marina Silva (PSB) sobre os objetivos maiores de
uma aliança em que os ganhos de cada um seriam secundários em favor de
um projeto alternativo para o país (a ser elaborado) e de uma nova
prática política (que estariam inaugurando). É cedo para saber em que
essa aliança dará, mas, por ora, não são claros os ganhos, reais e
potenciais, do governador, que se arrisca a perder não apenas a cabeça
de chapa para Marina, caso as pesquisas continuem apontando maior
potencial de votos para ela, depois de terem os dois anunciado que o
candidato será escolhido em 2014.
O que eles estão
protagonizando não é mera “oscilação de conjuntura”, como disse a
presidente Dilma Rousseff, para nada dizer sobre esse acidente no
percurso para a reeleição. Alianças entre dissidentes já derrotaram
regimes e também já se revelaram inócuas. Há muito caminho pela frente,
mas as contradições iniciais sugerem mais perdas para o governador do
que para a ex-senadora, que, fora da aliança, estaria fora da disputa ou
faria voo solo pelo PSB, com menor potencial ofensivo ao projeto
continuísta do PT.
A desfeita ao deputado Ronaldo Caiado
rendeu-lhe a hostilidade de uma ala do DEM. Na sexta-feira, o PTB
pernambucano, liderado pelo senador Armando Monteiro, deixou o governo
estadual. O PT também entregará os cargos amanhã, coisa que deveria ter
feito logo que o PSB rompeu com o governo Dilma. Para dar um sinal de
abertura à recomposição, acabou se dando mal. Uma ala do partido aderiu a
Campos e não quer deixar seu governo. Um vexame. Campos perderá também
apoios importantes no empresariado por conta da rigidez de Marina em
questões ambientais. Terá contra a chapa a oposição do agronegócio, que
não engole Marina. Vão aflorar as divergências entre eles sobre energia e
economia.
Será ela capaz de flexibilizar posições nessas
questões? Se for, perderá apoios entre os seguidores que já não gostaram
da adesão a um partido convencional, de forma unilateral e vertical,
depois de falar tanto em decisões horizontais. Sem falar nos doadores de
campanha simpáticos ao governador, agora informados de que ela prefere
campanhas financiadas pela sociedade e a militância. Um sonho lindo, que
o PT já teve no passado.
Descontada a mágoa, Caiado verbalizou o
que alguns pensam, mas não dizem no PSB: “Em vez de a Marina aderir ao
governador Eduardo Campos, de repente ele é quem aderiu a Marina e
incorporou o espírito dela”. Ainda que não houvesse mais remédio para a
aliança com o PT e com Lula, que o fez ministro e o apoiou para
governador, Campos era um candidato com total controle sobre seu
partido, tinha o estado praticamente unido em torno de sua candidatura e
vinha recebendo adesões de forças importantes nos outros estados.
Dispensou Caiado e terá que administrar a aceitação de outros aliados
conservadores, como os Bornhausen (SC) e o ex-senador Heráclito Fortes
(PI). Pedir que deixem o PSB, agora que o tempo de filiação já passou,
seria molecagem.
Campos estava também muito próximo do PSDB, que
continua saudando a aliança, mas agora vai demarcar o terreno. Ainda
que chegasse em terceiro lugar, seu apoio seria valioso no segundo
turno. Rompido com o PT, talvez ganhasse a vice numa chapa tucana
recomposta. Muito jovem, reconhecido como político hábil e bom gestor,
estaria acumulando forças para concorrer em 2018. Se a aliança tiver
sucesso eleitoral, pois foi feita para ganhar votos e não para inovar o
vocabulário, ele estará no panteão, mesmo cedendo a candidatura. Se a
proposta de terceira via para quebrar a polaridade PT-PSDB fracassar,
terá ele perdido mais que ela. Ele está queimando alguns navios. Mas
política sem risco merece outro nome, e nisso ele se distinguiu de seus
pares. Agora, vamos ver o que mais ocorre em um ano de travessia mais
agitada.
Vamos combinar
A procriação de
partidos volta à pauta na provocação do procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), sustentando a perda de
mandato de parlamentares que migram para partidos novos. Como é sabido,
o STF abriu essa janela ao decidir que o nascente PSD teria direito ao
tempo de tevê e ao Fundo Partidário decorrentes das filiações recebidas,
pois tratava-se de partido novo.
Vamos combinar: há poucos
meses, o Congresso tentou fechar essa janela, com o projeto que foi
demonizado pela oposição como sendo um casuísmo para impedir a criação
da Rede e a candidatura de Marina Silva. A crônica política fez coro.
Aprovado na Câmara, teve a votação suspensa no Senado por liminar
insólita do ministro Gilmar Mendes. Quando ela caiu, PT e PMDB,
ressabiados pelas pancadas, desistiram. Agora, o projeto foi aprovado,
como cadeado em porta arrombada.
Reagindo a Janot, o STF pode,
enfim, julgar a ação do PPS contra a decisão anterior que beneficiou o
PSD. Mas o Supremo, tão onisciente, será capaz de reconhecer que errou
e, mais grave ainda, de tomar uma decisão que, aplicada retroativamente,
atearia fogo ao quadro partidário e eleitoral? A decisão só afetaria
mudanças futuras, acha o procurador. Então, não é preciso a palavra do
STF, porque o Congresso já aprovou o projeto que valerá para o futuro.
Mais eficácia terá, para organizar o poleiro, a aprovação da nova
cláusula de barreira, limitando o acesso ao fundo e à tevê aos partidos
que obtenham 3% de votos nacionais e 3% em nove estados. Desde que o STF
não venha a derrubá-la novamente, como já fez em 2006.
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