O Globo - 15/10/2013
Está
em discussão neste momento, no Congresso Nacional, o Projeto de Lei
238, que reequilibra os termos contratuais das dívidas entre a União e
os estados e os municípios brasileiros, sem ferir a Lei de
Responsabilidade Fiscal.
Na
década de 1990, o governo federal assumiu e refinanciou as dívidas dos
entes federativos. Em contrapartida, celebrou contratos com os entes da
Federação, refinanciando o saldo dessas dívidas em 360 meses, com
encargos de 6% a 9% ao ano, acrescidos de atualização monetária pelo
IGP-DI.
À
época, tais encargos eram inferiores às taxas com que a própria União
se financiava e essa diferença era intencional, como forma de colaborar
para o saneamento fiscal de estados e municípios. Isso pode ser
comprovado pela própria mensagem presidencial 154, de 3 de agosto de
2000, que acompanhou o projeto: "Como a taxa de juros paga sobre a
dívida renegociada é menor que o custo de captação da União, existe um
subsídio..."
Entretanto,
com a redução significativa dos juros reais no país e do custo de
captação da União, acabou ocorrendo uma inversão desse cenário, que se
transformou num diferencial de taxas favorável à União. Enquanto a taxa
Selic acumulada entre julho de 1999 e dezembro de 2012 foi de 649%, os
encargos acumulados aplicados na cidade do Rio de Janeiro foram de 940%.
Outra evidência da distorção do espírito do contrato é que a
penalização contratual por eventual inadimplência é a substituição do
encargo pela Selic mais i% ao ano. Ou seja, nos termos atuais, São Paulo
paga aproximadamente 16% ao ano de encargos (IGP-DI + 9% de juros).
Mas, se ficasse inadimplente, o contrato mudaria para aproximadamente
10%.
O
PL 238 permite a readequação dos saldos devedores dos entes que tiveram
encargos acumulados superiores ao custo básico de captação de recursos
da União (Selic) e muda os encargos futuros para IPCA mais juros reais
de 4%, limitado ao teto da Selic.
É
importante frisar que não estão sendo concedidos novos benefícios a
estados e municípios, e sim, apenas, readequando-os para que ao menos
não sejam instrumentos de geração de lucro por parte da União. No caso
do município de São Paulo, nos termos atuais, a cidade continuará sem
capacidade de investimento pelos próximos 20 anos (hoje, a parcela
devida anualmente da dívida é mais que o dobro dos investimentos feitos)
e, mesmo assim, não conseguirá pagar sua dívida até o fim do contrato
em 2030.
A
recomposição das condições originais não é favor, refinanciamento,
anistia ou remissão. E não conflita, portanto, com o princípio expresso
no artigo 35 da LRF, que veda refinanciamentos a entes da Federação. Não
se pode homenagear a forma em detrimento do conteúdo. Não se está
alterando a substância dos contratos.
Por
último, vale a pena mencionar que não existe risco de descontrole em
decorrência desta proposta. Estados e municípios continuarão proibidos
de emitir valores mobiliários e os montantes de empréstimos permanecerão
subordinados a Programas de Acompanhamento Fiscal rígidos.
Em
resumo: a aprovação desse projeto de lei permitirá o reequilíbrio de
contratos que há tempos destoam dos objetivos que nortearam sua
celebração, readequando-os ao objetivo primordial da Lei de
Responsabilidade Fiscal, buscando sanear no longo prazo as finanças e
aumentando a capacidade de investimento dos entes que estão mais
próximos das demandas cotidianas da população brasileira.
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