Tereza Cruvinel
Estado de Minas: 08/12/2013
Até o dia 15, o mundo
e os sul-africanos estarão se despedindo de Nelson Mandela, num rito
prolongado como expressão de sua grandeza e raridade. Depois, ele
habitará a História e seu povo enfrentará, na orfandade, as dificuldades
da política interna que a mídia internacional vem apontando. Será tempo
de reiterar seu ideário de uma sociedade tolerante, democrática e
pluralista.
A saga extraordinária de sua vida, suas virtudes, seu exemplo, seu legado inspirador de tantos povos e líderes, tudo vem sendo contado e cantado à exaustão mundo afora. As circunstâncias tecnológicas ajudaram a fazer de Mandela o primeiro herói ou mito global. Quando ele deixou a prisão, em 1990, a internet começava a se popularizar, as comunicações e a economia, de mãos dadas, se globalizavam. Mas, mesmo antes deste tempo global, da prisão na Ilha de Robben ele já inspirava manifestações em diversas partes do mundo por sua libertação e contra o regime racista do apartheid. Ainda no início dos 27 anos de prisão, que suportou estoicamente, o ex-guerrilheiro Mandela fez sua autocrítica e passou a pregar a transição pacífica para uma sociedade que incluísse, em seu pluralismo, a própria minoria branca opressora.
Para os setores mais radicais de seu partido, o Congresso Nacional Africano (CNA), marcados por anos de humilhação e violência impostos pela minoria branca, isso equivalia a oferecer a outra face ao opressor. Não foi fácil unificar o partido e a maioria negra, mas a estratégia de Mandela foi vitoriosa. Ele era este homem especial que o mundo chora. Mas era, sobretudo, um articulador habilidoso, um orador cativante, um estrategista clarividente. Ou seja, um político excepcional, que por entrega generosa à causa de seu povo tornou-se um dos grandes estadistas do século, senão o maior.
Sua partida propicia ao mundo reflexões sobre a tolerância, a coragem, a generosidade, o compromisso com o sonho coletivo. E, especialmente, uma reflexão sobre a política. Suas virtudes pessoais não teriam produzido os mesmos resultados se ele não as tivesse empregado essencialmente na ação política. Neste momento em que a atividade é tão demonizada no Brasil e em outros países, a morte de Mandela ajuda a lembrar que, na política, vicejam os seres menores que se servem dela no interesse próprio, os corruptos, os espertos e os medíocres . Mas a política produz também grandes e talentosos atores, que proporcionam a seus povos transformações extraordinárias, como as que foram possíveis na África do Sul, sob a liderança de Mandela. Claro que as figuras superiores são raras mas, fora da política, elas seriam pessoas especiais, mas não líderes ou estadistas.
Muitas interrogações pairam sobre a África do Sul sem Madiba, dizem os analistas internacionais. O país, parceiro do Brasil no Brics, é um emergente rico e promissor, mas ainda tem muito a fazer no combate à pobreza. O partido, no poder desde a eleição de Mandela em 1994, já com o terceiro presidente, ganhou ares de partido único, agigantado, reunindo interesses variados. O atual governo teria viés autoritário, e a tolerância andaria em baixa. A evocação de Mandela e sua saga podem ajudá-los a enfrentar essas questões.
Brasil: Madiba e seus irmãos
O mundo chora Mandela, mas alguns países, por razões específicas, sentiram mais o impacto de sua morte. Nos EUA, de passado racista, o presidente Obama admitiu a influência de Mandela na criação das condições que o levaram à presidência. No Brasil, pelo peso da África em nossa formação étnica, cultural e econômica, que fizeram de Mandela uma forte referência para os afrodescendentes em sua luta por mais igualdade racial. A Constituinte de 1988 já criminalizara o racismo, mas as políticas públicas afirmativas, de compensação pela iniquidade com que foram tratados, mesmo depois da abolição, só começaram a acontecer a partir de 1995, no governo Fernando Henrique. Foram aprofundadas na era Lula e prosseguem no governo Dilma, que acaba de criar cotas para negros, índios e deficientes também nos concursos públicos. Mas, à medida que tais políticas produzem resultados, elevam-se contra elas algumas vozes, minoritárias mas estridentes, classificando-as como racialistas, vale dizer, incentivadoras do racismo com sinal contrário. Exatamente o que Mandela rejeitou, a pregação da “África para os africanos”, em favor da conciliação entre brancos e negros. As conquistas dos afrodescendentes brasileiros conectam-se com a luta e a vitória de Mandela sobre o apartheid. Agora que ele virou mito, podem ganhar mais relevância e tolerância.
Pelos estados: Bahia
É tempo de acompanhar mais de perto a política dos estados onde os jogos estão sendo armados para a disputa de 2014. A coluna tentará resumir o quadro de um estado em cada edição, começando hoje pela Bahia. As definições avançaram: o governador Jacques Wagner lançou a candidatura do secretário Rui Costa, acolhida pelo PT. Em discurso no Senado, o preterido Walter Pinheiro aceitou disciplinadamente a decisão. Colheu apartes solidários até da oposição. Jogo jogado. Costa é um nome local, mas será içado pelo governador, que ficará no cargo até o fim do mandato. Se perder a aposta, pagará o preço.
Sem acordo com o PT, o PMDB terá Geddel Vieira Lima como candidato. O PSDB deve lançar o ex-prefeito João Gualberto, para garantir o palanque de Aécio Neves. No dia 19, a ex-corregedora do CNJ Eliana Calmon filia-se ao PSB de Eduardo Campos e deve ser a vice da senadora Lídice da Mata na disputa do governo. Resta o DEM, que pode lançar a candidatura do ex-deputado José Carlos Aleluia ou a do ex-governador Paulo Souto, deixando de retribuir o apoio de Geddel ao prefeito ACM Neto no pleito de 2012. Mas esse é um jogo ainda em curso.
A saga extraordinária de sua vida, suas virtudes, seu exemplo, seu legado inspirador de tantos povos e líderes, tudo vem sendo contado e cantado à exaustão mundo afora. As circunstâncias tecnológicas ajudaram a fazer de Mandela o primeiro herói ou mito global. Quando ele deixou a prisão, em 1990, a internet começava a se popularizar, as comunicações e a economia, de mãos dadas, se globalizavam. Mas, mesmo antes deste tempo global, da prisão na Ilha de Robben ele já inspirava manifestações em diversas partes do mundo por sua libertação e contra o regime racista do apartheid. Ainda no início dos 27 anos de prisão, que suportou estoicamente, o ex-guerrilheiro Mandela fez sua autocrítica e passou a pregar a transição pacífica para uma sociedade que incluísse, em seu pluralismo, a própria minoria branca opressora.
Para os setores mais radicais de seu partido, o Congresso Nacional Africano (CNA), marcados por anos de humilhação e violência impostos pela minoria branca, isso equivalia a oferecer a outra face ao opressor. Não foi fácil unificar o partido e a maioria negra, mas a estratégia de Mandela foi vitoriosa. Ele era este homem especial que o mundo chora. Mas era, sobretudo, um articulador habilidoso, um orador cativante, um estrategista clarividente. Ou seja, um político excepcional, que por entrega generosa à causa de seu povo tornou-se um dos grandes estadistas do século, senão o maior.
Sua partida propicia ao mundo reflexões sobre a tolerância, a coragem, a generosidade, o compromisso com o sonho coletivo. E, especialmente, uma reflexão sobre a política. Suas virtudes pessoais não teriam produzido os mesmos resultados se ele não as tivesse empregado essencialmente na ação política. Neste momento em que a atividade é tão demonizada no Brasil e em outros países, a morte de Mandela ajuda a lembrar que, na política, vicejam os seres menores que se servem dela no interesse próprio, os corruptos, os espertos e os medíocres . Mas a política produz também grandes e talentosos atores, que proporcionam a seus povos transformações extraordinárias, como as que foram possíveis na África do Sul, sob a liderança de Mandela. Claro que as figuras superiores são raras mas, fora da política, elas seriam pessoas especiais, mas não líderes ou estadistas.
Muitas interrogações pairam sobre a África do Sul sem Madiba, dizem os analistas internacionais. O país, parceiro do Brasil no Brics, é um emergente rico e promissor, mas ainda tem muito a fazer no combate à pobreza. O partido, no poder desde a eleição de Mandela em 1994, já com o terceiro presidente, ganhou ares de partido único, agigantado, reunindo interesses variados. O atual governo teria viés autoritário, e a tolerância andaria em baixa. A evocação de Mandela e sua saga podem ajudá-los a enfrentar essas questões.
Brasil: Madiba e seus irmãos
O mundo chora Mandela, mas alguns países, por razões específicas, sentiram mais o impacto de sua morte. Nos EUA, de passado racista, o presidente Obama admitiu a influência de Mandela na criação das condições que o levaram à presidência. No Brasil, pelo peso da África em nossa formação étnica, cultural e econômica, que fizeram de Mandela uma forte referência para os afrodescendentes em sua luta por mais igualdade racial. A Constituinte de 1988 já criminalizara o racismo, mas as políticas públicas afirmativas, de compensação pela iniquidade com que foram tratados, mesmo depois da abolição, só começaram a acontecer a partir de 1995, no governo Fernando Henrique. Foram aprofundadas na era Lula e prosseguem no governo Dilma, que acaba de criar cotas para negros, índios e deficientes também nos concursos públicos. Mas, à medida que tais políticas produzem resultados, elevam-se contra elas algumas vozes, minoritárias mas estridentes, classificando-as como racialistas, vale dizer, incentivadoras do racismo com sinal contrário. Exatamente o que Mandela rejeitou, a pregação da “África para os africanos”, em favor da conciliação entre brancos e negros. As conquistas dos afrodescendentes brasileiros conectam-se com a luta e a vitória de Mandela sobre o apartheid. Agora que ele virou mito, podem ganhar mais relevância e tolerância.
Pelos estados: Bahia
É tempo de acompanhar mais de perto a política dos estados onde os jogos estão sendo armados para a disputa de 2014. A coluna tentará resumir o quadro de um estado em cada edição, começando hoje pela Bahia. As definições avançaram: o governador Jacques Wagner lançou a candidatura do secretário Rui Costa, acolhida pelo PT. Em discurso no Senado, o preterido Walter Pinheiro aceitou disciplinadamente a decisão. Colheu apartes solidários até da oposição. Jogo jogado. Costa é um nome local, mas será içado pelo governador, que ficará no cargo até o fim do mandato. Se perder a aposta, pagará o preço.
Sem acordo com o PT, o PMDB terá Geddel Vieira Lima como candidato. O PSDB deve lançar o ex-prefeito João Gualberto, para garantir o palanque de Aécio Neves. No dia 19, a ex-corregedora do CNJ Eliana Calmon filia-se ao PSB de Eduardo Campos e deve ser a vice da senadora Lídice da Mata na disputa do governo. Resta o DEM, que pode lançar a candidatura do ex-deputado José Carlos Aleluia ou a do ex-governador Paulo Souto, deixando de retribuir o apoio de Geddel ao prefeito ACM Neto no pleito de 2012. Mas esse é um jogo ainda em curso.
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