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Um novo amor
Regina Teixeira da Costa
Estado de Minas: 02/02/2014
Arthur Rimbaud escreveu um poema chamado “A uma razão”:
Um toque do teu dedo no tambor desencadeia todos os sons e dá início a uma nova harmonia.
Um passo teu recruta todos os homens e os põe em marcha.
Tua cabeça avança: o novo amor! Tua cabeça recua, - o novo amor!
“Muda nossos destinos, passa o crivo as calamidades, a começar pelo tempo”, cantam estas crianças, diante de ti. “Semeia não importa onde a substância de nossas fortunas e desejos”, pedem-te.
Chegada de sempre que irás por toda parte.
Este lindo poema surgiu na minha memória quando li Trem noturno para Lisboa, de Pascal Mercier, agora nos cinemas sob a direção de Billie August. O romance narra a possibilidade de mudar o curso de nossa vida a partir de algumas palavras bem-ditas e benditas. Assim como diz o poema.
Com um toque do dedo, um passo, uma virada de cabeça, encontramos algo novo no qual apostar e podemos, diante de um leque de possibilidades, escutar o desejo. É que frequentemente não damos atenção àqueles pensamentos que riscam o pensamento, passam pela cabeça como estrela cadente e caso não os agarremos caem no esquecimento.
Já ouvi em algum lugar que a vida é um livro em branco a ser escrito. Para pensar assim, é preciso coragem. A ideia de um destino traçado de antemão a ser percorrido, cumprido, traz desalento. Nada que façamos poderia mudar os acontecimentos? Detestaria acreditar nessa hipótese.
Para viver é preciso mesmo coragem para escrever as páginas desse livro como mandar o desejo, não todos, mas aquele que insiste incomodamente. Ele pode parecer inacreditável, inalcançável, além das nossas condições, e pode também nos oferecer uma vida muito mais interessante. Quantas vezes um pequeno ato pode mudar completamente o rumo da história? Quantas vezes uma decisão leva o sujeito ao sucesso ou ao fracasso?
Nem somos totalmente livres para realizar tudo o que idealizamos ou temos vontade, entretanto, há um desejo em cada um de nós que, escutado, pode determinar novo curso, nos fazer entrar em contato com algo muito íntimo e particular que é nosso centro gravitacional.
Um centro de coesão e concordância com o que queremos viver ou não. Nos ensina a decidir ao virar a cabeça qual será o novo amor. Seja o que ou quem estaria ao alcance de nossa mão, muitas vezes débil para tocá-lo. A força motriz para realização desse amor seria o desejo.
A condição para alcançar o novo precisa ser descolar do velho. Precisa ser perder as colas que nos mantém ligados a pessoas, histórias e ao passado. Perder a cola, não o afeto. Nossas colas. Somos colados a muitas coisas e nem nos damos conta disso. Somos colados na demanda de amor, na presença de outras pessoas, dependemos delas para não cairmos na solidão.
E nem mesmo estando sempre em presença de alguém estamos menos sós. E sós não estaremos apenas e no caso da nossa própria companhia nos agradar. Caso possamos nos acolher a nós mesmos e a quem somos, inclusos no pacote nossos sintomas.
E sabendo que é somente a partir das faltas e do espaço vazio que cabe encontrar o novo amor do qual fala Rimbaud neste poema, quando diz: muda nossos destinos, semeia a substância de nossas fortunas e desejos. Amém.
>> reginacosta@uai.com.br
Um toque do teu dedo no tambor desencadeia todos os sons e dá início a uma nova harmonia.
Um passo teu recruta todos os homens e os põe em marcha.
Tua cabeça avança: o novo amor! Tua cabeça recua, - o novo amor!
“Muda nossos destinos, passa o crivo as calamidades, a começar pelo tempo”, cantam estas crianças, diante de ti. “Semeia não importa onde a substância de nossas fortunas e desejos”, pedem-te.
Chegada de sempre que irás por toda parte.
Este lindo poema surgiu na minha memória quando li Trem noturno para Lisboa, de Pascal Mercier, agora nos cinemas sob a direção de Billie August. O romance narra a possibilidade de mudar o curso de nossa vida a partir de algumas palavras bem-ditas e benditas. Assim como diz o poema.
Com um toque do dedo, um passo, uma virada de cabeça, encontramos algo novo no qual apostar e podemos, diante de um leque de possibilidades, escutar o desejo. É que frequentemente não damos atenção àqueles pensamentos que riscam o pensamento, passam pela cabeça como estrela cadente e caso não os agarremos caem no esquecimento.
Já ouvi em algum lugar que a vida é um livro em branco a ser escrito. Para pensar assim, é preciso coragem. A ideia de um destino traçado de antemão a ser percorrido, cumprido, traz desalento. Nada que façamos poderia mudar os acontecimentos? Detestaria acreditar nessa hipótese.
Para viver é preciso mesmo coragem para escrever as páginas desse livro como mandar o desejo, não todos, mas aquele que insiste incomodamente. Ele pode parecer inacreditável, inalcançável, além das nossas condições, e pode também nos oferecer uma vida muito mais interessante. Quantas vezes um pequeno ato pode mudar completamente o rumo da história? Quantas vezes uma decisão leva o sujeito ao sucesso ou ao fracasso?
Nem somos totalmente livres para realizar tudo o que idealizamos ou temos vontade, entretanto, há um desejo em cada um de nós que, escutado, pode determinar novo curso, nos fazer entrar em contato com algo muito íntimo e particular que é nosso centro gravitacional.
Um centro de coesão e concordância com o que queremos viver ou não. Nos ensina a decidir ao virar a cabeça qual será o novo amor. Seja o que ou quem estaria ao alcance de nossa mão, muitas vezes débil para tocá-lo. A força motriz para realização desse amor seria o desejo.
A condição para alcançar o novo precisa ser descolar do velho. Precisa ser perder as colas que nos mantém ligados a pessoas, histórias e ao passado. Perder a cola, não o afeto. Nossas colas. Somos colados a muitas coisas e nem nos damos conta disso. Somos colados na demanda de amor, na presença de outras pessoas, dependemos delas para não cairmos na solidão.
E nem mesmo estando sempre em presença de alguém estamos menos sós. E sós não estaremos apenas e no caso da nossa própria companhia nos agradar. Caso possamos nos acolher a nós mesmos e a quem somos, inclusos no pacote nossos sintomas.
E sabendo que é somente a partir das faltas e do espaço vazio que cabe encontrar o novo amor do qual fala Rimbaud neste poema, quando diz: muda nossos destinos, semeia a substância de nossas fortunas e desejos. Amém.
>> reginacosta@uai.com.br
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